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SEUS PARADIGMAS

3.5 AS ABORDAGENS CONCEITUAIS DO TERRITÓRIO: MOBILIDADE E GENEALOGIA

3.5.1 Território sobre a perspectiva da mobilidade

Para um entendimento mais claro do território sob o auspício da mobilidade, é necessário fazer um resgate das teorias clássicas da economia regional, as quais mostram de forma nítida que a distância, a localização, ou seja, a mobilidade dentro desses modelos são elementos chaves para explicar a dinâmica econômica do território.

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3.5.1.1 Modelos precedentes

O surgimento da ciência regional, e consequente da economia regional deve-se aos primeiros modelos da denominada escola germânica, que teve como inovador para época serem os primeiros a inserir o espaço na teoria econômica. Merecem destaques Von Thunen (1826) com o seu modelo pioneiro da localização agrícola, Alfred Weber (1909) com o modelo de localização industrial, Christaller (1933) com a teoria dos lugares centrais, Losch (1940) com a conformação hexagonal dos mercados. E por fim veio a contribuição de Isard (1956) que sistematizou o pensamento da escola alemã, sob uma plataforma neoclássica e formou a denominada escola anglo-saxônica da economia regional.

A escola anglo-saxônica ficou marcada além da determinação da localização ótima em diversos setores (agricultura, indústria, serviço), como o cálculo da minimização do custo de transporte, pela utilização das hipóteses da economia clássica, que se tornou a base teórica da escola germânica e a teoria neoclássica por Isard (1956).

Os modelos utilizam a clausula ceteris paribus nas demais variáveis, uma vez que o que importava era a localização ótima. Dessa forma utilizavam mercados com concorrência perfeita, onde os recursos eram perfeitamente distribuídos no espaço, o “uso do solo” é a unidade decisória que os agentes econômicos deveriam levar em conta para os seus cálculos, para garantir um menor custo na mobilidade. (BRANDÃO, 2007)

A estreiteza metodológica dos primeiros modelos da economia regional é um reflexo da inserção do espaço na análise econômica. Apenas pela ótica da mobilidade, mostrou-se demasiadamente insuficiente para explicar as dinâmicas socioeconômicas internas ao território.

Contudo, o paradigma da mobilidade é o mais perpetuado pela teoria econômica, em que os modelos de análise possuem um “vocabulário” específico, como “localização ótima”, “custo de transporte mínimo”, entre outros. Há uma percepção de que há sobreposição do conceito de mercado no conceito de território, pois ele que definiria as “localizações” e “distâncias” ótimas, sendo portanto visto, como coloca Brandão (2007), território mercadejado, ou seja, o território é somente importante na categoria de definir algumas variáveis de mercado, e nada além disso, como será posto a seguir.

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O termo território mercadejado foi utilizado por Brandão (2007) caracterizando-o como algo plano, sem formas, como apenas um receptáculo de investimento, como se os territórios não influenciassem de forma mais incisiva a dinâmica econômica. Desta forma, o território é visto apenas como uma plataforma econômica que busca criar vantagens comparativas para atrair investimentos em capitais modernos que garantam uma acumulação de capital de forma mais rápida. (BRANDÃO, 2007)

Como foi colocado na seção anterior, o território nesta abordagem é marcado pela mobilidade dos recursos tanto humanos como materiais, e neste sentido se apresenta como uma firma neoclássica que busca atrair os melhores recursos dentro de uma racionalidade que tem como o objetivo a maximização do lucro. (BRANDÃO, 2007)

Dentro do arcabouço das relações sociais os territórios mercadejados utilizam o consenso como pressuposto, e não algo a ser construído com seus conflitos inerentes. Sendo assim, o território representa um coletivo que não existe na realidade, ou seja, o coletivo orquestrado com interesses comuns, em que os conflitos são administrados de forma constitutiva, sempre com perspectiva de progresso do território. Desse modo, o território mercadejado se apresenta de forma mais sofisticada do que apenas o território, o qual faz o resgate do paradigma da mobilidade. (BRANDÃO, 2007)

No processo da intensificação da globalização, o território mercadejado se apresenta de forma interessante para esse movimento, uma vez que os territórios agora disputam em arenas globais a entrada de capitais financeiro e produtivo, que adentram nessas plataformas (território) de acumulação de capital apenas pelas condições “extraordinárias” que esses podem oferecer em relação aos demais.

Desse modo, esse movimento se intensifica de maneira diversificada: pela forma produtiva, pelos novos modelos de produção, como o da produção flexível, em que os territórios disputam as etapas produtivas de um único bem, como exemplo da indústria automobilística; ainda quanto a questão produtiva, pela guerra fiscal promovido para atração de grandes empreendimentos; e a parte financeira, pela flexibilização jurídica e institucional de alguns territórios que permitem criar além de bolhas especulativas, os paraísos fiscais.

Logo, percebe-se que um elemento essencial na ótica para o território passa ser o regime jurídico-institucional. Além disto, ocorre uma exogenia exagerada, que serve como contraponto do que já foi dito até aqui, como por exemplo o território determinado por forças exógenas. O autor discute o desenvolvimento endógeno do território quando trata da interação social, e nessa visão o território pode tudo, desde que haja uma organização política e

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incentive os agentes a trabalharem de forma conjunta, pois não há conflito, e o consenso é um pressuposto para levar o desenvolvimento econômico.

Portanto, vimos que na abordagem do território mercadejado há uma contradição, ao mesmo tempo em que o território é dependente das forças globais, onde atuam os grandes conglomerados financeiros, este também possui agentes locais que se interagem de modo a formar um consenso coletivo que busca alavancar o crescimento econômico. Devido a essa capacidade de poder agregar essas duas visões, como foi posto anteriormente é que os territórios na visão mercadejada ganha status analítico na ciência, por tratar ao mesmo tempo de uma visão macro, com advento principal da globalização, vendo os territórios como meras plataformas de mobilidade de recursos que tem escala global, e no plano micro com uma interação social débil e passiva dos agentes que são representados pelo consenso (não construído) que representa o território.

Assim o território mercadejado é constituído como “ornitorrinco”, com uma indeterminação do seu crescimento econômico, já que não há uma discussão para entender qual é o principal fator, se o exógeno ou endógeno e até mesmo se há necessidade do Estado ou não, já que na corrente mais endogenista os agentes locais podem tudo, e o Estado poderia ser um empecilho na medida em que poderia influenciar a comunidade local através de seu aparato jurídico-legal, e na visão exogenista o Estado é de suma importância para “ajustar” o território aos movimentos da globalização.

Diante disso, em suma, pode-se dizer que o território mercadejado é marcado pelo paradigma da mobilidade, uma vez que é apenas um receptáculo de investimento. Contudo o conceito vai além de um simples resgate da escola germânica, já que se considera as relações sociais presentes no território, apesar de passivas, logo elas são marcadas pelo consenso é a ausência de conflito.