• Nenhum resultado encontrado

TERRITORIALIDADES DO ASSENTAMENTO JONCON TRÊS IRMÃOS: TERRITÓRIO, CULTURA E SENTIDOS

Dinâmicas regionais, identidade e cultura

TERRITORIALIDADES DO ASSENTAMENTO JONCON TRÊS IRMÃOS: TERRITÓRIO, CULTURA E SENTIDOS

A partir desse breve histórico do Assentamento percebe-se a profundidade do poder exercido por diversos agentes, representados por movimentos sociais, pelos assentados, por organismos estatais, dentre outros. Cada sujeito territorializado no referido assentamento possui uma história de vida, que se entrelaça com os múltiplos territórios, com o lugar e com a cultura, sobre tal perspectiva Geertz(2015) afirma que:

[...]a cultura não é um poder, algo ao qual podem ser atribuídos casualmente os acontecimentos sociais, os comportamentos, as instituições ou os processos; ela é um contexto, algo dentro do qual eles (os símbolos) podem ser descritos de forma inteligível – isto é, descritos com densidade (GEERTZ, 2015, p.10).

Essa abordagem que considera a “cultura como sistema simbólico” foi desenvolvida nos Estados Unidos, um de seus representantes é Clifford Geertz. A cultura pode ser entendida de diversas formas, para Laraia (1986) endossa a discussão enfatizando que as civilizações se espalharam e se perpetuaram pelo uso de símbolos, pois o exercício de simbolização, cria a cultura, portanto toda cultura depende de símbolos, pois:

tomando em seu amplo sentindo etnográfico cultura é este todo complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, leis, costumes ou qualquer outra capacidade ou hábitos adquiridos pelo homem como membro de uma sociedade” (LARAIA, 1986, p.25).

Para entender o sentindo da terra e as suas plurissignificações, problematiza-se o vínculo de afetividade que determinados sujeitos mantêm pelo espaço que ocupam, ou seja, tornando o espaço como lugar. “Na experiência, o significado de espaço frequentemente se funde com o de lugar. “espaço” é mais abstrato do que “lugar”. O que começa com espaço diferenciado transforma-se em lugar à medida que conhecemos melhor e dotamos de valor” (TUAN, 2013, p. 14). O cheiro, os sons, o tato, permeiam a

criação de sentimento pelo lugar. Nesse caso específico, para os assentados do Assentamento Joncon/Três Irmãos, ressaltando que não é somente descrever determinados fenômenos, mas buscar a essência e as formas que essas percepções possuem dentro de um contexto social, político, econômico, cultura, ou seja, entender as suas teias e as suas cosmografias, Little(2002) aponta que:

A cosmografia de um grupo inclui seu regime de propriedade, os vínculos afetivos que mantém com seu território específico, a história de ocupação guardada na memória coletiva, o uso social que dá ao território e as formas de defesa dele. (LITTLE, 2002. p.4)

O assentamento Joncon Três Irmãos está sendo territorializados, há mais de três décadas, nesse viés quando enfatiza-se a luta pelo homem na terra, procura-se olhar os sentidos que os fizeram resistir e enfrentar os mais diversos tipos de poder, presentes no território em estudo. Ressalta-se que a luta pela terra não encerra somente com a legalização do projeto de assentamento, mas outras lutas, ainda permanecem, como por exemplo, ter uma infraestrutura básica para desenvolver os diversos tipos de cultivos, poder diversificar os tipos de produções, bem como realizar as trocas de mercadorias em regiões circunvizinhas, pois o predomínio da subsistência é inerente ao modo de vidas de assentado, bem como manifestar suas atividades culturais.

Mas, por quer permanecer em regiões onde as contradições espaciais e os conflitos pela terra são aflorados? É nela que as famílias se territorializam, tiram seu sustento, criam seus animais, formam seus filhos. O espaço, torna-se lugar, pois a afetividade expressa o sentimento que os sujeitos dão ao seu local de vivência, seja de seus animais, sua casa, suas ferramentas de trabalho, o pé de laranja, o cultivo de mandioca, o pé de caju que esperou meses para florescer, sãos esses sentidos que estão imbricados nos sujeitos e se projetam na terra.

Nesse viés a cultura pode ser percebida como a produção de significados. Enxergar essas perspectivas da experiência dos sujeitos e desvendar o olhar sobre o território, lugar e sobre a cultura. Cultura não é estaticidade, é movimento é vivência, ou seja, é um conjunto de sistema simbólico criados pelos sujeitos. Geertz em suas abordagens nos faz refletir ao esclarecer que

O conceito de cultura que eu defendo […] é essencialmente o semiótico. Acreditando, como Max Weber, que o homem é um animal amarrado a teias de significados que ele mesmo teceu, assumo a cultura como sendo essas teias e a sua análise; portanto não como uma ciência experimental em busca de leis, mas como ciência interpretativa, à procura de significado. (GEERTZ, 2015, pág. 4)

Faço aqui uma relação com White (1994) quando aborda sobre urdidura do enredo, nos fazendo questionar o caráter narrativo da história. “[...] por urdidura do enredo entendo simplesmente a codificação dos fatos contidos na crônica em forma de componentes de tipos específicos de estruturas de enredo” White (1994, p.100). Ginzburg (2004) discorre que o discurso narrativo das histórias é reescrito ao passar do tempo, pois a história sempre está em busca de novos questionamentos, não na busca pela verdade, mas de indagações sobre os percursos dos sujeitos, Geertz (2015) argumenta que:

“[...]o que inscrevemos (ou tentamos fazê-lo) não é o discurso social bruto ao qual não somos atores, não temos acesso direto a não ser marginalmente ou muito especialmente, mas apenas aquela pequena parte dele que os nossos informantes nos podem levar a compreender” (GEERTZ, 2015, p.14).

Portanto a cultura afeta a percepção, o olhar, pois é uma criação do homem e está à disposição para enxergar as miudezas, e as teias de significados dos indivíduos. Segundo Geertz (2015) é no texto que o exercício da compreensão cultural se realiza. Somente os “nativos” fazem leitura de primeira mão de sua cultura, pois o pesquisador, utilizo como exemplo, o antropólogo, ficciona as narrativas e os comportamentos dos sujeitos pesquisados, e nessa busca interpretativa que se compreende os territórios, as territorialidades.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Compreender as múltiplas territorialidades presentes na Amazônia, vai muito mais além do que essas primeiras abordagens. É necessário inquietar-se no sentido de aprofundar o debate iniciado acerca do processo de territorialidades presentes no Assentamento Joncon Três Irmãos, é necessário ir a campo a campo, ouvir as narrativas dos sujeitos pesquisados, poder vivenciar e sentir os anseios e os símbolos construídos por tais indivíduos, permeando assim o seio cultural.

Nessa parte da Amazônia oriental encontra-se inúmeros contrastes sociais, políticos e econômicos, bem como múltiplas formas de expressões culturais e territoriais. Percorrer por esses vieses é compreender os significados e sentidos dos sujeitos sobre o território e sobre o lugar. Os conflitos da luta pela terra desse território

não são recentes, perpassa desde os primeiros ordenamentos territoriais tomados pelo Estado, bem como dos próprios sujeitos presentes nessas localidades. Desde sua ocupação a Amazônia, e neste caso a região do sudeste do Pará é voltado para exploração de seus recursos naturais e expropriação de seus sujeitos, o que faz com que a luta pela terra seja uma constante.

Perceber a afetividade que tais sujeitos possuem pelo lugar é compreender seu modo de vida, notando-se que a terra tem múltiplos usos, e para cada agente ela possui um significado. Tramar a trajetória do território e das territorialidades na localidade em estudo e perceber as várias Amazônias que existem dentro desse território, ou seja, é dar significados ao sujeito em suas pluralidades e singularidades. A partir do que foi narrado é possível incitar problematizações e desvendar as relações, os processos e os fios das territorialidades na Amazônia. Portanto não é dar voz a esses sujeitos históricos, mais é narrar fenômenos vivenciados por tais atores em suas diversas territorialidades. REFERÊNCIAS

GEERTZ, Clifford. A interpretação das Culturas. 1ª ed, 13 reimp. Rio de Janeiro: LTC, 2008.

HALL, A. L. Amazônia Desenvolvimento para quem? Desmatamento e conflito social no programa grande Carajás. Rio de Janeiro, 1991.

IANNI. O. A Luta pela Terra. Petrópolis: Vozes, 1979.

LARAIA, Roque de B. Cultura: um conceito antropológico. Rio de Janeiro: Zahar, 1986.

LITTLE, Paul E. Territórios Sociais e Povos Tradicionais no Brasil: por uma antropologia da territorialidade. Brasília: UNB, 2002.

PEREIRA, Airton dos Reis. Do posseiro ao sem-terra: a luta pela terra no sul e sudeste do Pará. Recife: Editora UFPE, 2015. Pag.275.

RICOEUR, Paul. Tempo e Narrativa. Tomo I: A Intriga e a Narrativa Histórica. São Paulo: Popular, 2010.

TUAN, Yi-Fu. Espaço e Lugar: A perspectiva da experiência. Londrina: Eduel, 2013. WHITE, Hayden. Trópicos do Discurso: Ensaios sobre a crítica da cultura. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo,1994.

A9 GT1 - ANÁLISE SOCIOECONÔMICA E EDUCACIONAL DAS