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4. Questões associadas à tributação de derivados

4.1. Noção de derivado e conceitos relacionados

4.1.2. Tipos e objectivos de derivados

4.1.2.1. Tipos de derivados

A organização de derivados em categorias estanques revela-se uma tarefa árdua considerando a tendencial intermutabilidade destas figuras (leia-se a capacidade de utilização de diferentes instrumentos de modo a obter o mesmo fim). Não obstante, a bem da harmonização de refe- rências intentaremos uma aproximação à sua categorização em função de riscos, tipos / cate- gorias stricto sensu (considerando a respectiva forma / mecanismo contratual) e objectivos.

A divisão em função do risco a que respeitam derivados é fútil na medida em que aqueles (os riscos) são praticamente ilimitados mas ainda assim podemos enunciar os mais comuns. Assim, os derivados podem, deste prisma, ser agrupados nos seguintes grandes grupos: juro, crédito, preço de mercadorias, preço de instrumentos financeiros (individualmente considera- dos ou em portfolio / index), preço de moeda (câmbio ou inflação), performance de invest i- mentos, outros riscos.

Reiterando que não pretendemos efectuar uma análise detalhada dos tipos de derivados exis- tentes parece-nos ainda assim útil proporcionar um organigrama genérico dos mesmos, bem

como oferecer a sua oposição aos instrumentos de investimento mais tradicionais, o qual pode ser encontrado no Anexo V a esta obra90.

Do referido organigrama decorre desde logo que, como tipos básicos de derivados, encontra- mos as opções, os futuros e forwards, e ainda os contratos de nocional onde, por sua vez, pon- tificam por excelência os swaps. Ao lado dos derivados ditos básicos podemos encontrar a figura dos (i) derivados híbridos, i.e. aqueles que aglomeram simultaneamente componentes de divida e de capital, os quais se subdividem em a) derivados de investimento – onde, ao contrário dos restantes, é exigida a realização de um investimento em termos comuns (como vimos é condição tradicional de um derivado a não exigência de pagamento inicial ou o pagamento de um valor diminuto face aos instrumentos subjacentes ou ao que seria exigível em mercado de modo a possibilitar o acesso às mesmas circunstâncias económicas (v. 4.1.1.1.)) – ou b) outros derivados híbridos e ainda dos (ii) derivados de derivados – sendo estes aqueles que têm por activo subjacente primário um outro derivado (assim, a titulo exemplificativo, podemos dizer que um swaption incorpora uma opção (sobre) e um swap e só secundariamente (sem prejuízo da eventualidade de aposição de outros derivados intermé- dios) o vero activo subjacente (secundário).

A classificação apresentada é meramente indicativa e destina-se a facilitar referências internas ao longo deste trabalho nem sempre reflectindo com perfeição categorias dogmáticas delimi- tadas.

Por fim, é também usual proceder à divisão teleológica destes instrumentos podendo os mes- mos ser utilizados com intentos de cobertura de risco (hedging), especulação (trading)91 ou de arbitragem (arbitrage) como abaixo se explica em maior pormenor.

4.1.2.2. Objectivos dos derivados

Como referido, os derivados podem, grosso modo, assumir funções de cobertura de risco (hedging), especulação92 (trading) e arbitragem (arbitrage).

No primeiro dos casos (cobertura) a intenção é acautelar eventuais perdas ou diminuição de ganhos, reduzindo, eliminando ou meramente determinando um intervalo de risco, decorren- tes de um dado item, através da aposta em posições simétricas. É usual distinguir entre macrocobertura – aquela que é efectuada em relação a um conjunto agregado de activos com tipos diversos (maxime toda a empresa) – e microcobertura – onde o elemento de cobertura cobre o risco relativo a um determinado item coberto ou itens do mesmo tipo.

A título de exemplo passamos a descrever uma das estratégias de eliminação de risco mais correntes usualmente denominada por protective put (opção de venda protectora), paradigmá- tica pela sua simplicidade:

A sociedade A detém uma acção representativa do capital social da sociedade B (“Acção B”), actualmente cotada em bolsa a EUR 100 (preço spot), cuja desvalorização pretende acautelar. Nesse sentido, adquire (assume portanto uma posição longa) uma opção de venda (put option) da Acção B, a um ano, de tipo americano93, i.e. que pode ser exercida a qualquer momento, pelo preço de EUR 5, e com um preço de exercício (strike) de EUR 100. O gráfico exposto no Anexo VI exemplifica a potencial situação futura da sociedade A em função da evolução do valor da put.

Num cenário onde a acção desça abaixo de EUR 100, A poderá exercer a sua opção de venda sendo que, a partir de EUR 95, estará a efectuar um ganho (ex.: se acção cotar a EUR 80 a possibilidade de venda a EUR 100 representa um ganho bruto de EUR 20 a que deduzido o

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Refira-se que a componente especulativa está presente em praticamente todos os investimentos sendo a noção de risco siamesa da de retorno.

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preço da opção traduz um ganho liquido de EUR 15, não perspectivando por ora o efeito da tributação). No caso da Acção B valorizar ao invés de desvalorizar, a opção expirará sem ser exercida mas A manterá a Acção B, agora valorizada, sendo que a partir de EUR 105 com- pensará o custo daquela opção. Na situação em análise A encontra-se protegido contra o risco de desvalorização da Acção B. Por outras palavras, A como que contratualizou um seguro pelo preço de EUR 5 e pode agora gerir o seu portfólio ciente de que nunca perderá mais que este valor.

Analisemos agora a posição curta daquela put, i.e., a parte que vendeu a opção (se comprome- teu a comprar a Acção B a EUR 100). Na medida em que não procurasse cobrir o risco de desvalorização da Acção B abaixo de EUR 95 (momento a partir do qual estaria a registar uma perda)94 estaria a especular, i.e. a apostar que o mercado não evoluirá para uma desvalo- rização superior a EUR 5, podendo incorrer numa perda de até EUR 95 (no caso hipotético onde a Acção B passasse a valer zero e a put fosse exercida nesse momento). Em princípio esta parte agiria do modo descrito na expectativa de que o activo não iria desvalorizar.

A este respeito cumpre referir que, na medida em que um derivado utilizado com intuitos especulativos consubstancia uma forma alternativa de investir no activo subjacente / exposi- ção ao respectivo risco económico, esse derivado é um Lugar Económico Paralelo face ao activo subjacente. Apesar de jurídico-formalmente distintos partilham a sua substância eco- nómica, i.e. são economicamente iguais latu sensu e também stricto sensu ainda que apenas proporcionalmente95.

Já nos casos de arbitragem, raros, uma vez que o mercado, fruto do jogo da oferta e da procu- ra, tende a adaptar-se automaticamente à nova realidade impedindo a infinitude de “money machines”, reflecte o aproveitamento de discrepâncias entre mercados. Não se trata aqui de

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Por exemplo através de aquisição de uma posição longa numa put com o mesmo strike.

qualquer especulação uma vez que o ganho é (alegadamente) garantido. Exemplificando (de forma claramente redutora), imaginemos que num dado mercado uma onça de ouro cota a EUR 200 e que a taxa de juro anual efectiva sem risco é de 4%. Num outro mercado o for- ward de uma onça de ouro a um ano cota por EUR 220. O arbitragista pediria emprestado EUR 200 no primeiro mercado com os quais adquiriria uma onça de ouro, e venderia um dos referidos forward no segundo por EUR 220. No final do ano entregaria a onça de ouro pre- viamente adquirida contra a recepção de EUR 220 e pagaria o capital do empréstimo e o juro contratualizado (EUR 200+8) realizando um ganho de EUR 12 (EUR 220 – EUR 208)96.

Sem prejuízo daquelas categorias tradicionais os derivados podem ser usados como platafor- ma de aproveitamento de determinadas vantagens ínsitas aos mesmos. Assim, a titulo de exemplo, os derivados permitem (i) o acesso a mercados a que de outro modo os investidores não teriam acesso, bem como (ii) a exposição a riscos de forma financiada (o que os torna tão atractivos (dado não prejudicarem em demasia os ratios de endividamento da entidade, i.e. permitindo o acesso a financiamento ulterior em melhores condições) quanto perigosos), naquilo que se convencionou apelidar do efeito alavancagem dos derivados97, possibilitam a partilha de vantagens competitivas98, e no que aqui surge como mais relevante, permitem muitas vezes optimizar a sujeição tributária99, com e sem abusos, como teremos oportunidade de analisar em detalhe.