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5.1 Os motivadores para permanência ou abandono escolar em números

5.2.3 Trabalhadores “da” ou “na” Educação Profissional?

É mais fácil formar um exército do que formar capitães. Antonio Gramsci

Nas instituições e cursos pesquisados, a maioria dos docentes são engenheiros. De acordo com o INEP (2012) essa é uma realidade nacional, na qual no mínimo 49% dos docentes não possuem preparação pedagógica alguma, razão pela qual se busca nesta categoria a reflexão sobre a educação profissional: os atuais trabalhadores são da educação ou estão na educação?

Para os sujeitos que participaram da pesquisa, em geral, esses trabalhadores são bons profissionais da educação, conforme se observa em alguns relatos, abaixo transcrito:

P107 – O núcleo pedagógico é de excelente qualidade eles gostam dos alunos!

A17 – O que teve de positivo foram os professores qualificados, que eu vejo como um ponto positivo que todos os professores ali são engenheiros, são todos com bom qualificações né.

A25 – Pontos positivos... professores são muito bem qualificados.

0,0% 10,0% 20,0% 30,0% 40,0% 50,0% 60,0% 70,0% 80,0%

Ótimo Bom Péssimo Ruim Não Sei

A coordenação do curso

Os professores Equipe Pedagógica

Gráfico 14 – Avaliação dos Trabalhadores da Educação – Dados Gerais dos Permanecentes. Fonte: autoria própria (2014), baseado em dados dos questionários.

0% 5% 10% 15% 20% 25% 30% 35% 40% 45% 50%

Ótimo Bom Ruim Péssimo Não Sei

A coordenação do curso Os professores

Equipe Pedagógica

Gráfico 15 – Avaliação dos Trabalhadores da Educação – Dados Gerais dos que deixaram de frequentar. Fonte: autoria própria (2014), baseado em dados dos questionários e entrevistas.

Em geral, os desistentes também avaliaram positivamente os servidores, porém destaca-se que dos estudantes que deixaram de frequentar os cursos técnicos, 28% deles não conheciam os trabalhadores que faziam parte da equipe pedagógica institucional e 32% desconheciam a coordenação do curso que faziam. Como se observou no gráfico 15 e relatos abaixo transcritos:

A22 – Não. Eu sabia que tem a coordenação lá, acho que eles se apresentaram no começo assim sabe, mas a gente não tinha muito contato. Eu não posso nem avalia. Pesquisadora – Não. Vocês tiveram ambientação? Quando vocês entraram, vocês

A22 – É... teve lá um dia lá uma apresentação dos professores, do... é um apanhado geral né, mas num dia, no primeiro dia de aula. Lembro assim que eles apresentaram todo mundo, falaram ah esse cuida disso, esse cuida daquilo...

Pesquisadora – A equipe do apoio pedagógico? Núcleo pedagógico, equipe de apoio pedagógico...

A22 – Quem é essas pessoas? Tu diz...

Pesquisadora – Pedagogo, hoje entrou também assistente social, psicólogo,

A22 – Naquela época não tinha [...] tinha uma outra lá... eu não sei o nome dela, uma loira de cabelo comprido, também muito gente boa, quando tu procurava ela pra conversa.

Pesquisadora –Tu sabia que o X (instituição) tem assistente social, psicólogo, pedagogo é a coordenadoria pedagógica...

A14 – não, essa parte eu não sabia, eu . Pesquisadora – você chegou a ter contato.

A14 – eu ouvi falar porque a gente tinha no site né e naquele encartezinho quando a gente faz da prova do vestibular também veio uma informações.

Pesquisadora – na primeira semana de aula tem uma palestra com um coordenador e com a equipe pedagógica, tu lembra dessa palestra não?

A14 – não, não lembro... na verdade se for a palestra que a gente foi pro anfiteatro, que eles levaram nos pro anfiteatro aí foi,na verdade eles não deram tanto uma palestra né, eles apresentaram mais o colégio, ai ponto positivo, ponto negativo e até que eles bateram bastante que não era pra gente desistir, que eles iam fazer de tudo pra ajudar a gente, mas que não era pra gente desistir, mas em si assim, eles não entraram a fundo tinha uma senhora baixinha de cabelo curto assim, cabelo preto, essa mulher falou bastante, mas daí faltou algumas pessoas, daí mais ela falou e daí depois acabou a aula né, daí eles tavam com algumas dificuldades com professores também. [...] olha...eu acho assim que eu fiquei pouco tempo né, mas acho que pra mim assim essa parte que nem tu falou do psicólogo assim essa área abrangente de eles apresentar que nem tu falou das dificuldades da pessoa que desistem assim, por locomoção essas coisas acho que eles deveriam ter falado mais né, mas talvez eles falaram nos outros dias, dai eu acabei desistindo não fui mais né.

Além da questão de desconhecimento da coordenação e equipe pedagógica, aponta-se também o descrédito de alguns desses setores de apoio ao ensino por parte de alguns estudantes, como se observa nos relatos transcritos:

P235 - Quando percebimos a alta desistência dos alunos pedimos ajuda ao ensino, mas não tivemos apoio, ouvi dizer que nos semestres seguintes o mesmo professor mudou sua postura, mas não conseguimos trazer de volta os que desistiram, então, acredito que se tivessem tomado uma decisão assim que levantamos o problema, em dezembro estaríamos em muito mais técnicos formados.

A16 - É complicado né porque tanto uma parte como a outra é ser humano né e dize que a Instituição pode faze mais pra reverte isso... eu acho que assim ó... que não sei se tem como, mas é porque muito alunos também não levam o problema pro núcleo pedagógico.

A16 – Alguns porque eu escutei da própria boca “não adianta”, outros por medo de represaria,

A18 – [...] tanto que o professor até falou, vocês podem ir pra onde quiser, falar com quem vocês quiser eu não quero nem saber aqui na sala de aula quem manda aqui sou eu. Então aconteceu isso aí eu meio que discuti com ele e tal, ai ele falou se você também quiser procurar o núcleo pode ir quando eu acabei saindo da sala de aula. Daí ele falou também se já quiser ir procurar o núcleo pode ir, mas isso foi bem depois que ele tirou esses rapazes aí. Eu peguei fui lá conversei.

Pesquisadora –Tu viu alguma ação contra isso que aconteceu, tu viu algum movimento da instituição?

A18 - Não, não, não aconteceu nada, não aconteceu simplesmente nada e tanto que têm alunos ali que já são mais velhos que já tão tentando o curso já faz um tempo eles falaram cara é perca, eles já falaram quando no terceiro dia de aula que nós tava tendo no Y (instituição) ali, no terceiro dia de aula que ele veio se apresentar pra nós tudo os caras me falaram com esse cara, com o professor X não respire, não fale só veja e procure entender a matéria só, se você for perguntar alguma coisa vai levar pancada, se você for falar alguma coisa tu vai levar pancada porque aqui o único que sabe é ele e como que deve ser é com ele, eu falei não mais tem o núcleo, tem um conselho dá pra correr atrás, não adianta já foi varias vezes falado, varias vezes falado [...] Não teve conversa e não teve tipo... uma movimentação, ninguém, bom não houve algum contato ó chamaram atenção dele por esse motivo por aquele motivo.

Pesquisadora – Nem chamaram vocês de volta depois pra dar um retorno.

A18 – Não, não chamaram [...] não teve nada simplesmente caiu ali, não sei se foi passado pra frente, ou se foi passado pra frente morreu também ali e acabou-se...não teve uma outra conversa.

Além do descrédito de alguns estudantes, observa-se no relato a desvalorização do apoio pedagógico por outro servidor, como se destaca a fala do docente relatada pelo entrevistado A18.

Em outra entrevista, observa-se o descrédito nas avaliações de desempenho institucionais, bem como medo que os educandos possuem em abordar problemas com docentes.

Pesquisadora – O que você acha que a instituição poderia fazer pra diminuir? Essas barreiras, essas dificuldades e pra diminuir esse abandono?

A15 – Pois então é complicado porque a gente acaba tendo professores que são coordenadores do curso em contato com o aluno, daí acontece o que vamos reclama para o coordenador... quem é o coordenador? É o professor da matéria, isso são um dos fatores que já inibe o aluno, lógico que se a gente quere corre atrás a gente consegue sabe que tem gente maior que ele né, então tem como a gente corre atrás, só que acaba inibindo os alunos a corre... eu creio, eu vi já a parte, participei de pesquisas sobre professores...uma dessa parte como aluno.

A15 – Sim, avaliação de desempenho, eu não vi melhoras, semestre passado a gente acabou pegando professor que a gente tava com problemas, avaliamos mal porque [...] hoje em dia tem professores que passam slide e acabam saindo da sala ficando vinte minutos, meia hora, depois voltam, fizeram? Não, não fizemos porque não damo conta e fazem rapidinho se você pergunta alguma coisa no meio da explicação ele pede pra você esperar ele terminar a explicação até lá você á criou varias outras,outras duvidas e você já se perde tudo, é uma falha nossa de como alunos de se unir e conversar com os professores. Só que a gente vê que se for fazer isso aqui...marcados.

Pesquisadora – Vocês sentem que os alunos têm muito medo disso? A15 – Sim, temos...eu generalizo.

Observa-se também no relato do permanecente abaixo o medo discente:

P40 - Favor não mostrar para meus professores, não gosto de ser marcado.

Como se observa nas tabelas apresentadas no item 4.1, referente aos motivadores da permanência (tabela 11), dos 270 estudantes que responderam a pesquisa, 61% sinalizaram que a “qualidade docente” é decisiva para permanência escolar. Em relação ao incentivo de professores e equipe pedagógica para permanência escolar, apenas 26% dos permanecentes sinalizaram que esse é um fator decisivo para sua permanência no curso.

Dentre os que deixaram de frequentar, em Jaraguá do Sul (tabela 16) o fator mais decisivo para a desistência foram problemas de relacionamento com docentes, representando 50% dos pesquisados. Já para os desistentes de Joinville (tabela 15) uma das questões decisivas foram as dificuldades de aprendizagem. Entende-se que a aprendizagem também envolve o professor e neste sentido se questiona se a dificuldade é de aprendizagem ou de ensinar, questões essas que, pela sua relevância na pesquisa, ao lado da relação professor- aluno serão analisadas em outro momento.

Embora os estudantes de Joinville que abandonaram os cursos não sinalizassem diretamente o fator docente como decisivo para desistir do curso, este se apresenta como uma das principais queixas dos estudantes em ambas as instituições, tanto dos que deixaram de frequentar quando dos permanecentes, como se observa nos relatos transcritos:

A6 – Não tinha professor. (motivo do abandono).

A18 – O que me desestruturou foi o professor. [...] aí que ta o problema né o curso é bom, o problema é o professor. Digamos assim, com os outros professores que nem eu falei não tive problema nenhum tive problema com esse professor não só eu como alguns naquele período ali né. Eu acredito digamos assim que se esse professor não tivesse essa cabeça que ele tem o curso seria excelente.

P85 – Professor X vem despreparado para as aulas, não passando confiança sobre o que ensina.

P228 – Alguns professores não possuem nenhum conhecimento sobre didática e não conseguem obter o máximo do ensinamento para o aluno; deveriam ter licenciatura em alguma área relacionadas com os cursos ministrados.

P234 - Alguns professores não possuem conhecimento prático.

Diante do exposto, fortalece-se a necessidade de investimento na formação docente, pois no Brasil a preparação de professores da área técnica vem sendo tratada como algo “especial”, “emergencial”, “sem integralidade própria” e por meio de programas, sinalizando assim uma “política de falta de formação” pedagógica dos professores técnicos, por parte do governo. (OLIVEIRA, 2006, p.04).

Para os sujeitos pesquisados, o professor tem um papel essencial para o êxito escolar.

Pesquisadora – O professor tem um papel muito importante pra você né?

A22 – Tem, imagina se não. Acho que é o principal né, acho que é o foco é o professor né. Se ele não souber ensina a gente quem vai sabe? Que a gente vai lá pra aprende né...

Essa resposta concorda com a posição de Rui Canário (2004, p. 67) sobre a importante relação existente entre docente e discente no trabalho escolar, para quem

A situação e a natureza do trabalho desenvolvido, nas escolas, pelos professores e pelos alunos, estão inextrincavelmente ligados. Formam um sistema que só em conjunto pode mudar. A “desalienação” do trabalho escolar dos alunos não é possível sem a correspondente “desalienação” do trabalho dos professores.

Entretanto, não se pretende nem se pode apontar o professor como um culpado pelo abandono, pois as atuais políticas públicas não oportunizam formação inicial e continuada para esses sujeitos. Pelo contrário, percebe-se que esse professor, por não ter formação acadêmica específica para a prática docente, depende de sua vontade em buscar formação para o seu exercício profissional.

Por desempenhar função crucial na formação dos alunos, a questão do papel docente como fator concorrente para a permanência ou abandono escolar será tratada na sua relação com os educandos e a práxis educativa, pois compreende-se que,

Vinculadas à Pedagogia da Práxis podemos identificar as formulações críticas que propugnam uma educação referenciada em conceitos marxistas e gramscianos, como escola unitária, politecnia e formação onilateral. Nesta Pedagogia o trabalho, processo de construção da/para a existência humanizada, localiza o trabalhador na humanidade a partir da consciência de sua realização na/para a construção histórica

nesta pedagogia, orienta-se e orienta no mundo social e natural instruindo pelo/no trabalho. (ARAUJO, 2008, p. 55)

Isto é, o docente, juntamente com o discente, é um sujeito ativo no processo pedagógico que envolve sua realidade social, política e ideológica em seu trabalho educativo, portanto orienta, reproduz ou transforma a realidade, sua e dos alunos, através da educação.

Outra questão apontada na pesquisa e que diz respeito ao direito dos trabalhadores refere-se à greve. Embora o direito trabalhista, garantido pela Constituição Federal de 1988 (art. 9º.), fosse sinalizado por apenas 15% dos pesquisados como um dos fatores que influenciam o abandono escolar (tabela 16) percebe-se nos relatos a relação que a greve tem sobre o abandono escolar.

A5 – Realmente: Foi a greve, ficamos alguns dias sem aulas e isto foi determinante para que eu desistisse. [...] Na federal talvez eu não volte mais, porque algumas greves que aconteceram nesta instituição foram preponderante para que eu desistisse do curso, sei e entendo que só através de manifestações que se consegue algo neste pais.

A25 – Greve e problemas pessoais no trabalho. (Motivos da desistência).

P244 - Problemas são as greves que prejudicam os alunos.

Salienta-se que durante o período pesquisado (2011 a 2013) houve momentos de greve na instituição, porém ressalta-se que essa não é uma questão do cotidiano escolar. Observa-se que no semestre letivo em que houve greve e no que não houve, os índices de abandono não se diferenciam por esse motivador.

Sintetizando os resultados obtidos na análise desse item, foi possível verificar que a visão meritocrática e de escola pública forte se faz presente e é fortalecida nos campi e cursos pesquisados, apresentada como justificativa para muitas das ações e resultados escolares.

Verificou-se também que a maioria dos casos de abandono escolar ocorre no primeiro módulo dos cursos, justificado pelos estudantes, entre os principais motivos as questões de dificuldade de conciliar trabalho, escola e família; a relação professor e aluno; e os processos de ensino-aprendizagem.

A relação entre a teoria e a prática foi também fortalecida nos estudantes a visão do mercado de trabalho em que o curso técnico é para saber fazer, apontando a necessidade de incluir no cotidiano escolar o diálogo sobre a formação para o mundo do trabalho, em busca

de uma formação mais ampla e que não fortaleça as divisões entre o trabalho intelectual do trabalho manual impostas pelo mercado.

Foi verificado também a necessidade de maiores ações de comunicação e envolvimento da equipe de apoio psicológica, social e pedagógica e também a coordenação dos cursos com os alunos, haja vista o desconhecimento desse trabalho por parte de diversos alunos que deixaram de frequentar os cursos técnicos.

Finalmente, a formação profissional dos docentes apenas evidenciou um problema já constatado: a ausência de políticas públicas e institucionais de formação inicial e continuada para esses sujeitos, para que possam entender seu papel como trabalhadores da educação e sujeitos ativos do processo escolar que almeja uma educação emancipatória, integral e, principalmente, que assegure o direito à permanência escolar.