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Trabalho: categoria fundante e plataforma possibilitadora de toda a produção e

2 A categoria trabalho na ontologia do ser social de György Lukács

2.3 Trabalho: categoria fundante e plataforma possibilitadora de toda a produção e

A partir do procedimento de leitura e análise imanente elaborado por Karl Marx e por nós utilizado como forma de alcançar a gênese e o telos do objeto por ora estudado, as categorias Trabalho e Formação Humana, nos capítulos “O Trabalho” e “A Reprodução”, na obra Para uma ontologia do ser social, procuramos ser fieis às elaborações de György Lukács. Mesmo sabendo de seu descontentamento com os resultados do texto, que não foi revisado para publicação, e algumas hipóteses sobre a forma como foi redigido, entendemos ser de extrema importância a manutenção desses traços em nossas elaborações. Somente dessa forma é possível apreendê-lo, com a maior precisão possível, e assim permitir ao autor expor toda a sua potência (tanto no aspecto assertivo quanto nos limites de sua obra). Contudo, na tese que apresentamos, para melhor alcançar tais objetivos, avaliamos por bem extrair essa passagem significativa de sua ordem original e oferecer tal destaque a este momento ontológico que constitui o papel do trabalho no desenvolvimento científico, no processo histórico humano. Por isso, promovemos de forma consciente essa separação no interior da construção original lukácsiana, por acreditarmos que tal interferência não traz para os resultados qualquer prejuízo, pelo contrário, agrega, no sentindo de apreendermos de forma exata as contribuições do filósofo húngaro.

Ao pensar o processo de desenvolvimento científico, vale pontuar que, para Lukács, no interior do complexo originário ontológico está contida toda a potência

humana, em termos de desenvolvimento social. Ou seja, no trabalho estão postas todas as possibilidades de desenvolvimento material/social humano. Nesse sentido, o trabalho é a mediação ontológica primária que funda o homem e sua relação com a natureza, e potencializa o surgimento e o prosseguimento de todos os complexos categoriais de cunho social.

Em outras palavras, cabe demonstrar que os elementos e categorias que nas fases superiores aparecem sob a forma de uma primazia no processo de desenvolvimento do complexo do ser social tem por raiz um conjunto de princípios, tendências e categorias presentes na forma originária do trabalho. A ciência enquanto expoente importante das práticas sociais superiores não foge a esta regra, tendo também a sua origem compreendida como um desenvolvimento de tendências inerentes ao complexo trabalho em sua forma originária (FORTES, 2001, p. 86).

Conforme o trabalho se consolida como resultado e os acúmulos de conhecimentos adquiridos no metabolismo com a natureza, algumas práticas vão sendo aplicadas a outras transformações, para as quais essas técnicas não foram originalmente elaboradas. Com isso, vai se consolidando, gradativamente, de maneira relativa, uma autonomia, que vai se generalizando e fixando sob “observações que já não se referem de modo exclusivo e direto a um único procedimento” (LUKÁCS, 2013, p. 86), ao contrário disso, vão acumulando elementos que permitem promover determinada generalização a partir de fenômenos que ocorrem na natureza em geral. “Essa consciência se torna certamente sempre mais difusa, sempre mais autônoma, e, no entanto, continua ineliminavelmente, embora através de muitas mediações, em última análise, um instrumento de reprodução do próprio homem” (LUKÁCS, 2013, p. 87). Nesse sentido, vale ressaltar que:

Esta generalização do conhecimento, embora ainda limitada às atividades diretamente voltadas ao processo laborativo, são, nesses termos, a gênese do pensamento científico, enquanto aponta para a existência da tendência à generalização do conhecimento no interior da prática laborativa humana, que constitui, segundo Lukács, um aspecto decisivo da cientificidade (FORTES, 2001, p. 87).

Lukács avalia ser mais pertinente deixar para mais adiante a questão referente à falsa consciência do homem e sua possibilidade de correção, a qual ele julga ser fecunda. Nesse aspecto, ele prioriza extrair das considerações por ora apresentadas a situação paradoxal que, “tendo se originado no trabalho, para o trabalho e mediante o trabalho – a consciência do homem intervém em sua atividade de autorreprodução” (LUKÁCS, 2013, p. 87). Neste sentido:

As generalizações e fixações primárias advindas no decorrer do processo de trabalho constituem os gérmens daquilo que mais tarde, com seu ulterior desenvolvimento e aprimoramento, formaram os princípios mais gerais e decisivos da constituição do pensamento científico. Todo esse processo se inicia a partir da atividade laborativa humana, onde podemos verificar o crescente distanciamento dos espelhamentos daqueles “procedimentos singulares” intrínsecos ao processo de trabalho; os espelhamentos que daí decorrem passam a assumir uma relativa autonomia frente à prática imediata, adquirindo “um caráter de generalidade”, na medida em que descobrem e desvelam leis gerais do movimento natural e desenvolvem procedimentos válidos a diversos tipos de atividade (FORTES, 2001, p. 87).

Lukács compreende e apresenta essa situação da seguinte forma: “a independência do espelhamento do mundo externo e interno na consciência humana é um pressuposto indispensável para o nascimento e desenvolvimento ascendente do trabalho” (LUKÁCS, 2013, p. 87). E Fortes auxilia com a seguinte apreensão:

A unidade entre momento ideal e material que se estabelece, conforme vimos, no interior do pôr teleológico aparece deste modo definida como uma determinação geral válida para toda e qualquer forma da prática social humana. Em termos mais específicos, toda prática humana é uma forma específica de um pôr teleológico. Estes traços delineiam a característica mais geral de toda e qualquer atividade do homem, isto é, toda prática efetiva do ser social é um ato de decisão entre alternativas que levam à realização das finalidades (FORTES, 2001, p. 77).

Contudo, não se deve elevar, por isso, a ciência e a teoria como elementos que gozem de autonomia em relação aos pores teleológicos-causais provindos do trabalho. Mesmo que ciência e teoria alcancem graus próximos ou totais, em seu processo de desenvolvimento, elas jamais alcançarão a condição de romper por completo “essa relação em última instância com sua própria origem”. No que concerne à questão ligada ao vínculo e à independência externa, “um problema importante que a reflexão humana, a consciência e a autoconsciência da humanidade” tiveram que, a todo momento, se debruçar em compreender, para então poder pensar alternativas e resoluções sobre a questão que envolve “o problema da teoria e da práxis”. Todavia, Lukács entende que é necessário, antes de adentrar essa questão, voltar a um problema frequentemente tratado: “o da teleologia e da causalidade” (LUKÁCS, 2013, p. 87). Sobre essa relação ressaltada por Lukács, outro ponto de importância no movimento lukacsiano desponta. Fortes pontua, com razão, que “Nessas generalizações, que são para Lukács os ‘gérmens das futuras ciências’, podemos encontrar outra característica que constitui um princípio fundamental da ciência: a desantropomorfização” (FORTES, 2001, p. 88). Isso quer dizer que, na atividade de trabalho humano, é fundamental a apreensão, o mais exato e concreto que se consiga alcançar, em relação aos nexos causais imprescindíveis para a

efetivação do fim, eliminando ao máximo os prejuízos de ordem subjetiva, na reprodução desta subjetividade, nos entes postos na realidade.

Poder-se-ia dizer, portanto, que no trabalho o homem se apropria, conhece o mundo, na medida em que o transforma, ou como variante da mesma assertiva, ele transforma o mundo na medida em que o conhece. [...] Ou seja, afirmar a existência de um processo de auto-reprodução do conhecimento não significa, na perspectiva da ontologia lukacsiana, incorrer em uma contradição ou uma radical diferenciação com o que analisamos acerca do trabalho, onde encontramos um claro vínculo entre a formação do conhecimento e a prática, mas de um processo que instaura uma forma qualitativamente distinta dessa relação” (FORTES, 2001, p. 88-89).

Em outros momentos, quando a teleologia assumia o fio condutor do processo do ser com a natureza e com a história, a casualidade assumia um papel menos importante nesse complexo, desempenhando o “papel de órgão executivo do ‘fim último’”, o que paralisava a compreensão do comportamento humano, a elaboração de teoria ou contemplação (LUKÁCS, 2013, p. 87). “Podemos dizer que a ciência torna-se independente das ‘posições teleológico-causais do trabalho’, mas mantém com elas um vínculo ineliminável particularmente no que diz respeito à estrutura mais geral da relação do conhecimento com a prática” (FORTES, 2001, p. 89). Ao constatar que “o fundamento inabalável da essência da realidade objetiva era seu caráter teleológico” (LUKÁCS, 2013, p. 88), a única relação daí possível, em último caso, é uma relação de caráter contemplativo, para se apreender e compreender as questões e problemas da vida dos homens, “tanto no sentido imediato como mediato, até o máximo nível de sutileza” (LUKÁCS, 2013, p. 88), só era possível nesse grau de relação estabelecida com a realidade.

Reconhece-se, sem dúvida, relativamente cedo o caráter teleologicamente posto da práxis humana. No entanto, uma vez que as atividades concretas que daí se originam sempre acabam numa totalidade teleológica de natureza e sociedade, permanece de pé essa supremacia filosófica, ética, religiosa etc. da compreensão contemplativa da teleologia cósmica (LUKÁCS, 2013, p. 88).

Na passagem, o autor retoma o problema aqui posto em outro aspecto. A generalização do por teleológico como norteador da existência da natureza e da história, que em seu curso produz a contemplação (teoria) que é, de maneira contundente, reafirmada e mantida

por aquelas filosofias que já contestam o domínio da teleologia no campo cosmológico. A primeira vista, o motivo parece paradoxal: a completa dessacralização do mundo externo ao homem se realiza de forma mais lenta do que o processo que o leva à liberação das constituições teleológicas que lhe foram atribuídas nas teodiceias. Observa-se, além disso, que a paixão intelectual com a qual se procura intensamente desmascarar a teleologia objetiva por meio de um sujeito religioso fictício leva, muitas vezes, a

eliminar inteiramente a teleologia, e isso impede uma compreensão concreta da práxis (trabalho) (LUKÁCS, 2013, p. 88).

Somente na filosofia clássica alemã a práxis começa a ser identificada e reconhecida, a partir de sua real importância. Lukács demonstra como Marx refuta o velho materialismo em suas Teses Ad Feurbach, ao afirmar: “Daí o lado ativo, em oposição ao materialismo, ter sido abstratamente desenvolvido pelo idealismo” (MARX; ENGELS, 1932, p. 533s14 apud LIKÁCS, 2013, p. 88). Lukács chama atenção

ao fato de Marx utilizar o advérbio “abstratamente” como forma de criticar e demarcar a presença do idealismo, que não reconhece a atividade sensível presente na realidade concreta, na formulação desse materialismo. “O ponto de partida para a análise dessa questão é, portanto, o trabalho. Nele a teoria e a prática se apresentam como momentos diretamente interligados como elementos de um único processo” (FORTES, 2001, p. 90). Essa posição fica evidenciada quando o filósofo alemão afirma “que, naturalmente, não se conhece a atividade real, sensível, como tal” (MARX; ENGELS, 1932, p. 533s15 apud LUKÁCS, 2013, p. 88).

Sobre essa base, Lukács demarca a posição marxiana, no que concerne ao velho materialismo e, ao mesmo tempo, o idealismo. O que leva a crer que os problemas envolvendo “teoria e práxis” só podem ser resolvidos ao realizar o retorno “à práxis, ao seu modo real e material de manifestação” (LUKÁCS, 2013, p. 88-89), local onde é cabível localizar corretamente “as determinações ontológicas fundamentais. Assim, o aspecto ontologicamente decisivo é a relação entre teleologia e causalidade” (LUKÁCS, 2013, p. 89). Trata-se de um importante momento em torno do desenvolvimento cuja apreensão e visão do mundo localizam no trabalho o centro desse certame. “Ou seja, aqui devemos atentar para o fato de que, pela própria essência ontológica do trabalho, a relação entre prática e a teoria está posta sob a forma de uma determinação recíproca imediata entre o espelhamento e o pôr dos nexos causais” (FORTES, 2001, p. 90). Lukács acrescenta que este momento

constitui um ato pioneiro no desenvolvimento do pensamento humano e da imagem humana do mundo equacionar o problema pondo o trabalho no centro dessa disputa, e isso não só porque desse modo é afastada criticamente do desdobramento do ser na sua totalidade qualquer projeção, não só porque o trabalho (a práxis social) é entendido como o único complexo do ser no qual o pôr teleológico tem um papel autenticamente real e transformador da realidade, mas também porque sobre essa base – e, ademais, generalizando-a e ultrapassando, com essa generalização, a mera constatação de um fato

14Edição Brasileira: Marx, 2007, p. 533. 15Edição Brasileira: Marx, 2007, p. 533.

ontológico fundamental – é evidenciada a única relação filosoficamente correta entre teleologia e causalidade (LUKÁCS, 2013, p. 89).

Com isso, o autor ressalta que teleologia e causalidade não são princípios que se excluem no interior do processo “do ser-aí e do ser-assim das coisas”, como postularam as análises de cunho gnosiológico e lógico. Ao contrário, como se verifica, a partir das elaborações e descobertas da ontologia do ser social, trata-se de “princípios mutuamente heterogêneos” (LUKÁCS, 2013, p. 89), que, apesar de apresentar

sua contraditoriedade, somente em comum, numa coexistência dinâmica indissociável, podem constituir o fundamento ontológico de determinados complexos dinâmicos, complexos que só no campo do ser social são ontologicamente possíveis, cuja ação nessa coexistência dinâmica constitui a característica principal desse grau de ser (LUKÁCS, 2013, p. 89).

Nesse sentido, sendo mais uma vez dito, o momento da teleologia, do por teleológico, só pode existir e ter efeito concreto enquanto uma teleologia posta. O que, para confirmar seu por em termos ontológicos, é necessário quando se intenciona caracterizar que se trata de um processo teleológico, ser fundamental caracterizar, igualmente em termos ontológicos, para eliminar qualquer possibilidade de dúvida, o ser que realiza o ato de por. “Ao contrário, a causalidade pode operar como posta ou não posta. Desse modo, uma análise correta exige não só que se distinga com precisão entre dois modos de ser, mas também que a determinação de ser-posto esteja livre de toda ambiguidade filosófica”. É relevante demarcar que, em várias filosofias anteriores, sobretudo a de Hegel, esse problema não recebe o devido tratamento, o que faz com que não se verifique “a diferença entre os pores da causalidade puramente cognitivos e aqueles materialmente reais, ontológicos” (LUKÁCS, 2013, p. 89). Como já demonstrado, Lukács afirma que, para se efetivar adequadamente o por ontológico das cadeias de causalidade concretas, é necessário conhecer, ter o conhecimento sobre tais causalidades, por isso, é preciso que sejam postas no plano cognitivo. “No trabalho, o pôr em movimento das séries causais fornece o critério para avaliar se os espelhamentos dos nexos próprios aos objetos são corretos ou errados” (FORTES, 2001, p. 90). Por isso:

Não se deve, porém, esquecer jamais que, com essa posição, se chega apenas a uma possibilidade, no sentido da dýnamis aristotélica, e que a transformação do potencial em realização é um ato particular que, embora pressupondo aquela possibilidade, tem com ela uma relação de alternativa heterogênea; esse ato é exatamente a decisão que surge a partir da alternativa (LUKÁCS, 2013, p. 90).

Com isso, Lukács entende que teleologia e causalidade existem no interior da atividade de trabalho do homem, e somente podem existir no interior desse complexo. “Ou seja, aqui devemos atentar para o fato de que, pela própria essência ontológica do trabalho, a relação entre a prática e a teoria está posta sob a forma de uma determinação recíproca imediata entre espelhamento e o pôr dos nexos causais” (FORTES, 2001, p. 90). Essa situação apresenta como consequência, na totalidade do ser, que teoria e práxis são resultados que se desdobram no interior de sua essência social. Por essa razão, “devem ser momentos de um único e idêntico complexo do ser, o ser social”. Portanto, somente podem ser compreendidas de maneira correta quando se toma como ponto inicial a inter-relação aqui posta. “E exatamente aqui o trabalho pode servir como modelo plenamente esclarecedor”. Levando-se em consideração que o trabalho é orientado em sentido teleológico, ou seja, tem por finalidade a concretização de um fim posto, pode parecer estranho essa inter-relação entre teleologia e causalidade. “Todavia, é no trabalho, nos seus atos que transformam a causalidade espontânea em causalidade posta, justamente por que nele ainda temos exclusivamente uma inter-relação entre homem e a natureza e não entre o homem e o homem ou entre o homem e a sociedade” (LUKÁCS, 2013, p. 90). Esse momento é quando se verifica a preservação do puro caráter cognitivo, em suas formas menos alteradas, daquilo que ocorre nos níveis superiores, pois, nesse momento, não há como evitar a interferência dos interesses sociais no espelhamento dos fatos.

Os atos de pôr da causalidade no trabalho estão orientados, na sua forma mais pura, para contraposição de valor entre falso e verdadeiro, uma vez que, como já observamos anteriormente, qualquer desconhecimento da causalidade existente em si no processo do seu pôr leva inevitavelmente ao fracasso de todo o processo de trabalho (LUKÁCS, 2013, p. 90).

Como contrapartida, é claro que a realização de qualquer por da causalidade que, em seu fim imediatamente posto, promova ou tenha como finalidade a “transformação da consciência ponente dos homens”, existe aí a influência do interesse social, que está presente mesmo no mais simples trabalho, em todo o processo de por das cadeias causais que se fazem necessárias à realização do por.

E isso tanto mais, considerando que no próprio trabalho o pôr das cadeias causais se refere a objetos e processos que, relativamente ao seu ser posto, se comportam com total indiferença em relação ao fim teleológico, ao passo que os pores que têm por objetivo suscitar nos homens determinadas decisões entre alternativas trabalham sobre um material que por si mesmo, espontaneamente, já é levado a decidir entre as alternativas (LUKÁCS, 2013, p. 91).

Já nos pores de causalidade, em estágios superiores, não há como evitar a influência exercida pelo por do “fim teleológico sobre as suas reproduções espirituais”. Nesse caso, o trabalho não pode, em nenhuma circunstância, deixar de ser considerado em sua prioridade ontológica no metabolismo do homem com a natureza. Isso porque, nem quando se alcança o estágio mais desenvolvido de conhecimento das causalidades naturais e se realiza, com segurança, os pores da causalidade em tal nível que essa já se torna ciência, ou seja, que em sua forma já tenha acumulado uma relativa autonomia na vida social, é, do ponto de vista ontológico, “uma ilusão pensar que se possa obter uma cópia inteiramente imparcial, do ponto de vista da sociedade, das cadeias causais aqui dominantes e, por esse meio, também das causalidades naturais”, que possibilite alcançar “uma forma de confrontação imediata e excludente entre natureza e homem mais pura do que no próprio trabalho”. Contudo, é preciso demarcar que o processo que promove o progresso do conhecimento, por um lado, provoca a “perda de contraposição excludente entre homem e natureza”, por outro, é importante ressaltar “que também essa perda se move, em sua essência, em direção ao progresso” (LUKÁCS, 2013, p. 91).

Lukács ressalta que, ao trabalhar, o homem está em confrontação com o ser-em- si do objeto da natureza sobre o qual ele atua e que, necessariamente, está relacionado ao fim pretendido pelo trabalho. Quando os conhecimentos que são obtidos e permeiam essa ação se consolidam e, consequentemente, são generalizados em um grau mais elevado, “o que já acontece nos começos da ciência em direção à sua autonomia”, isso somente é possível de ocorrer quando se admite que, através do espelhamento da natureza, atuam categorias ontologicamente intencionadas que constituem a totalidade do transcurso da condição social humana (LUKÁCS, 2013, p. 91-92).

Em primeiro lugar, qualquer pôr teleológico é, em última análise, socialmente determinado, e a posição do trabalho é determinada de modo muito claro pela necessidade, de cuja influência causadora nenhuma ciência pode livrar-se completamente. Isso, contudo, não constitui uma diferença decisiva. Porém, em segundo lugar, a ciência põe no centro do próprio espelhamento desantropomorfizador da realidade a generalização das conexões (LUKÁCS, 2013, p. 92).

Admitindo os pressupostos apresentados por Lukács, é apreensível que:

Portanto, em conformidade com os termos aqui expostos, podemos afirmar que a teleologia não apenas influi de forma decisiva no ato de pôr, mas também no próprio espelhamento da realidade, desempenhando desta maneira um papel preponderante no processo de formação do conhecimento durante o trabalho (FORTES, 2001, p. 91).

Lukács já demonstrou que isso não faz parte, de forma direta, da essência ontológica do trabalho, tampouco de sua gênese. Trata-se aqui apenas de apreender, de maneira assertiva, um fenômeno natural concreto, a partir do momento em que “sua constituição se encontra em uma vinculação necessária com o fim do trabalho teleologicamente posto”. No que se refere às conexões mediadas, o homem que trabalha, no desenvolvimento de sua atividade laboral, pode criar ou ter representações incorretas em relação ao seu fazer, mas Lukács ressalta que o fundamental nesse processo “é que haja um espelhamento correto dos nexos mais imediatos” (LUKÁCS,