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2.1. Entre as teorias e as características do trabalho no setor do comércio.

2.1.1. Trabalho & Comércio em Belém.

Em meio à crise do escravismo no Brasil surgem duas classes principais com interesses antagônicos, a burguesia e o proletariado, novas indústrias empregando operários/as e a formação de um insipiente mercado interno para circulação de mercadorias. Na venda do produto entram em cena os proprietários dos estabelecimentos comerciais e donos das mercadorias para a venda - a burguesia comercial, e os trabalhadores e as trabalhadoras no comércio prestando serviço atendendo às pessoas que se dirigem ao mercado consumidor.

Na divisão social do trabalho distingue-se atividades econômicas com dupla dimensão do trabalho produtivo no capitalismo, o trabalho responsável pela produção direta de mais valia desenvolvida por operários fabris; e, o trabalho que colabora para a valorização do capital, este último produzido por comerciários, bancários e outros prestadores de serviços. O foco desta dissertação é a participação política da empregada no comércio de Belém na direção do sindicato da categoria, para representar a entidade é preciso pertencer à categoria.

A atividade de vendedor/a é uma prestação de serviço (trabalho) que existe há séculos através da exploração de intensa jornada de trabalho, no qual as mulheres que trabalham no setor terciário no comércio de mercadorias acumulam as funções profissionais e a rotina diária do lar e o cuidado com os/as filhos/as numa situação diferenciada em relação aos homens.

Desde a fundação de Belém o comércio se instalou à beira do Porto da Doca e principais ruas ao entorno expandindo na segunda metade do século XIX numa fartura nunca vista. Para CRUZ83 (1992) a principal Rua do Bairro do Comércio teve, inicialmente, a denominação de Mercadores, devido à localização dos principais comerciantes, hoje, denominada Rua Conselheiro João Alfredo84. De acordo com informações do IBGE, o bairro é formado por um grande quadrilátero, envolvido pela Avenida Assis de Vasconcelos, Baia de Guajará, Avenida Portugal, Avenida 16 de Novembro e Avenida Almirante Tamandaré (CRUZ, 1992, p. 28). À época da extração de látex, quando se inicia a organização como classe da categoria em apreço (conforme informes nesta dissertação), CRUZ (1964) indica referências do historiador Manuel Barata85 sobre a movimentação econômica que monopolizava as energias dos paraenses e das paraenses:

83 Cf. CRUZ, Ernesto. “A antiga produção e exportação do Pará – estudo histórico econômico”, História da Associação Comercial do Pará, Centenário de sua fundação 1864, Imprensa Universitária, Belém, 1964.

84 João Alfredo Corrêa de Oliveira foi presidente da então Província do Pará de 2 de dezembro de 1869 a 17 de abril de 1870, nomeado por Carta Imperial datada de 20 de outubro de 1869 (CRUZ, 1992: 41).

85 Manuel de Mello Cardoso Barata (1841 -1916), formado em Direito, historiador, com importantes obras: “Formação histórica do Pará : obras reunidas”. Belém : Universidade Federal do Pará, 1973; “Fundação de Belém : estudo da história paraense com documentos inéditos”. Rio de Janeiro : Companhia Tipográfica do Brasil, 1904; “A jornada de Francisco Caldeira de Castello Branco”. Rio de Janeiro : Companhia Tipográfica do Brasil, 1904.

73 Nunca se viu o Pará tanta moeda de ouro em

circulação, o dólar americano nadava em todas as mãos... O povo chamava-lhe pichilinga (Idem, ibidem: 81).

Para Santos (1978) o valor corrente das exportações paraenses, entre 1849 e 1899, aumentara de 1.157% demonstra o desenvolvimento da cidade numa época de grandes transformações e surgimento de uma elite culta e refinada formada por comerciantes, seringalistas, financistas e profissionais liberais. Esta elite importava padrões europeus e comodidades modernas, o que exigiu a implantação de serviços urbanos, dando à cidade uma nova estrutura geral, conforme a historiadora 86 Maria de Nazaré Sarges.

Nos anos que se seguiram desta fase áurea da borracha há um declínio econômico, contudo, Roberto Santos aponta entre as causas dessa decadência aos usos pouco racionais dos excedentes, certamente pela falta de perspectiva da própria elite paraense e das camadas populares evidenciando a ausência de um plano de desenvolvimento para o Estado. O autor elenca distintos fatores de debilidade da economia vinculada ao extrativismo de baixa produtividade, atividade econômica vulnerável à dependência do exterior, e devido à concorrência com outras praças o produto brasileiro caiu para o quarto posto em comparação aos produtos internacionais87. Acrescenta ainda, a prática de uma severa captação da renda estadual pela União, dificultando o desenvolvimento local. Afirma que, esses motivos levaram a uma fase de declínio e certa estagnação no período que abrange de 1920 a 1950 (Idem, ibidem: 17) com a cidade e seus moradores em uma difícil situação econômica.

Constata que, em outro momento, entre 1950 e 1960 ocorrem mudanças importantes na região em diversos setores, tais como: a agricultura tradicional diversifica-se com o plantio da pimenta do reino (contribuição de imigrantes japoneses); instala-se uma nova usina geradora de energia elétrica na capital; a construção civil se aperfeiçoa e se expande88. Destaca a construção da fábrica de cimento em Capanema; o papel e a importância da Universidade Federal do Pará nos idos 1957; ilustra o surgimento de novos estabelecimentos comerciais: de refrigerantes, de confecções de roupa, de mobiliários e outros; anota a 86 Cf. SARGES, Maria de Nazaré (2000). Trata sobre mudanças de hábitos, novos confortos e prazeres num refinamento cultural, complementa que, os coronéis da borracha, embora dependentes financeiramente de Londres e Estados Unidos, estavam culturalmente ligados à Paris, uma das cidades-pólos da Belle Époque, cidade símbolo da fase áurea da modernidade (idem: 55).

87 Cf. Idem nota 86. A autora expõe sobre o colapso da economia com a queda da exportação do látex: em 1910 a exportação da borracha atingia uma soma de 134.958 contos de réis (34.248 toneladas), três anos após não atinge 70.000 contos de réis, queda de mais de 2.000 toneladas, face aos baixos preços do mercado internacional (idem, ibidem: 59).

74 ampliação das rodovias e da frota pública de transportes fluviais; esclarece sobre o aceleramento da urbanização (Belém, Castanhal, Santarém, etc.) e comenta sobre a modernização do comércio varejista (Idem: 20).

O autor admite que, as perspectivas melhoraram e uma discreta aspiração ao bem- estar, que antes fora confinada às camadas melhor situadas na pirâmide das rendas indicavam mudanças e, continua:

(...) alguma melhoria no nível de renda das classes trabalhadoras urbanas. Um indício disso residiria no crescimento do salário mínimo real em Belém, no período considerado: do índice 86,3 em 1950, o salário mínimo urbano passou ao de 246,2 em 1960 (Idem, ibidem: 22).

No presente estudo interessa ressaltar o Setor Terciário (e neste, o Subsetor de Comércio de Mercadorias), no qual Santos indica percentual significativo nesse setor de 63,8% do total entre a Renda Interna, em relação aos dois outros setores da economia paraense nos períodos 1965-1970 e 1973, conforme Tabela 02, reproduzida a seguir:

Tabela 02 - Média da distribuição anual da Renda Interna por

Setores no Pará 1965-1970 e 1973.

Setores Renda Interna (1) %

Primário 1.579.168 21,5

Secundário 1.082.128 14,7

Terciário 4.699.599 63,8

TOTAL 7.360.895 100,0

Fonte: Elaborado por Roberto Santos com base no índice de preços do DIEESE.

(1) Média anual das estimativas nos anos indicados. Valores expressos em Cr$ 1.000 de 1976. (SANTOS, 1978: 26).

Ainda sobre o comércio de mercadorias, Roberto Santos constata o grau de dependência deste no Estado do Pará em relação ao volume de negócios em outras áreas, e a transação de mercadorias importadas das demais Unidades da Federação ou do Exterior. Afirma que isto seja devido à pequena variedade dos bens de consumo fabricados pela indústria paraense, além da própria fraqueza do setor primário. As diversas mercadorias consumidas pela população no Estado do Pará provinham de fornecedores externos e argumenta que, uma das causas do enfraquecimento dos negócios foi o baixo poder aquisitivo

75 da população do Estado. Afirma que a posição geográfica do porto de Belém e a tradição histórica conferem ao Estado uma função de entreposto comercial.

O fato é que a maioria da classe trabalhadora de Belém vive em precárias condições de moradia e de trabalho, em situações de extremas desigualdades. A divisão social do trabalho não corresponde ao desenvolvimento harmonioso no sentido de promover o progresso para todas as pessoas da sociedade belenense. De um lado se encontram a burguesia industrial, a burguesia comerciária e os proprietários de terra e de outro os trabalhadores e trabalhadoras em situações desiguais, o que suscita a organização e atuação dos sindicatos, local onde as queixas e as demandas por direitos têm tido expressão.