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1 INTRODUÇÃO

2.4 TRABALHO, EDUCAÇÃO E EMANCIPAÇÃO HUMANA

O princípio do trabalho na escola se reflete, em primeiro lugar, na formação em que se separa o intelectual do manual, este processo foi há muito concebido e aconteceu nos primórdios de nossa civilização, mais precisamente quando o homem cravou a primeira estaca no chão determinando a sua propriedade sobre aquele espaço, criando a propriedade privada da terra. Ao fazê-lo, os homens se dividiram em classes sociais; esta divisão em classes foi determinada pela separação dos homens em proprietários e não proprietários e pela separação do próprio trabalho, pois aqueles que possuem os meios de produção se tornam os exploradores e, para explorar, o homem criou os meios de desenvolver as ciências. Na outra ponta ficaram aqueles desprovidos de posses que se restringem a possuir apenas a sua própria força de trabalho.

Este momento da história se repetiu em vários lugares no mundo, pois a necessidade humana de se fixar na terra e produzir seus próprios alimentos foi o fato gerador da propriedade privada.

A propriedade privada da terra e os meios de produção levaram os homens a produzirem excedentes; e a escola capitalista nasce da necessidade do homem tratar deste excedente de produção. Para tratar deste excedente, o homem precisou aprender a ler, escrever e a contar para poder administrar a produção e para compreender a questão do direito, entender as normas e as leis que acompanharam a evolução das regras de convivência social.

É, pois, necessário sofisticar a formação do operário, e a escola trabalha com um princípio de trabalho neutro, como um trabalho morto, ele não é um trabalho ativo, não é trabalho da vida diária que produz o conhecimento e que permite apreender o conhecimento. Portanto nós temos de entrar na escola com a forma verdadeira, importante e necessária de tratar o trabalho. A atividade prática do homem que permite que transforme a natureza, se transforme a si mesmo e possa viver.

Frigotto (1995) nos chama a atenção para o caráter ambíguo das análises sobre a questão do trabalho e da relação entre o trabalho, conhecimento, consciência e educação do trabalhador. Esta ambiguidade está posta, por um lado, pelo reconhecimento do trabalho enquanto relação social fundamental, manifestação da vida, isto é, atividade do homem na apropriação e transformação do mundo e, por outro, pelo trabalho como alienação da vida, trabalho assalariado, mercadoria, força de trabalho. (FRIGOTTO, 1995, p. 9)

O autor analisa que esta ambiguidade no sistema educacional e nas instituições de formação profissional perpassa também a educação na organização sindical e dos movimentos sociais e a assinala como “uma crise de aprofundamento teórico”. Ou seja, a compreensão concreta da prática educacional na sociedade de classes, como uma prática contraditória e, que se inscreve na luta hegemônica entre as classes fundamentais, a fábrica, a escola e outras instituições educativas sendo aparelhos de hegemonia, está longe de ser assimilada ao nível da teoria e das transformações históricas. Está, portanto, longe da prática, pelo menos no que se refere à relação trabalho e educação. (FRIGOTTO, 1995, p. 13)

Assim, a concepção que se apresenta é a que materializa a interiorização da concepção burguesa de trabalho, de educação, em suma de formação ou fabricação do trabalhador, que refletem a interiorização das concepções e categorias do humanismo, do positivismo e do funcionalismo e ainda determina as perspectivas, valores e concepções da sociedade das mercadorias pondo-se como limite da análise e da ação. (FRIGOTTO, 1995, p. 14)

Esta concepção de trabalho burguesa constitui-se, historicamente, por um processo de reificação, ou seja, que transforma e reduz o trabalho num processo de coisificação, há um objeto, uma mercadoria, materializando-se como trabalho abstrato ou força de trabalho.

Segundo Frigotto (1995, p. 14):

Esta interiorização vai estruturando uma percepção ou representação de trabalho que se iguala à ocupação, emprego, função, tarefa, dentro de um mercado (de trabalho). Dessa forma, perde-se a compreensão, de um lado, de que o trabalho é uma relação social e que esta relação, na sociedade capitalista, é uma relação de força, de poder e de violência; e, de outro, de que o trabalho é uma relação social fundamental que define o modo de existência, e que, enquanto tal, não se reduz a atividade de produção material para responder à reprodução físico-biológica (mundo da necessidade), mas envolve as dimensões sociais, estéticas, culturais, artísticas, de lazer etc (mundo da liberdade).

Aos poucos, as atividades relacionadas ao lazer, ao ócio, e à própria atividade física e esportiva (por esporte) vai se tornando algo pernicioso à sociedade que dessa forma constrói um conceito ideológico de trabalho que torna normais as relações de trabalho da sociedade capitalista.

Este processo, no longo prazo, não apenas elimina esta dimensão mais abrangente, mas a torna “algo negativo e que é necessário combater”. (FRIGOTTO, 1995, p. 14)

É dentro dessa delimitação que a burguesia constrói as propostas de educação para o trabalho nos vários âmbitos da sociedade capitalista, ao longo da história, e busca transformá-las em senso comum. (FRIGOTTO, 1995, p. 15)

A divisão de classes, aí estabelecida, e a defesa do capitalismo determinam uma nova concepção para a relação trabalho e educação. A formação dos sujeitos vai aos poucos assumindo os contornos necessários à reprodução desta concepção e determinam o tipo de conhecimento necessário a cada uma das classes.

A escola, destinada aos filhos da classe dominante e, às crianças, filhos dos operários, eram destinados, invariavelmente, ao conhecimento e ao hábito do trabalho penoso.

Para Frigotto, vai-se, dessa forma, construindo um conceito ideológico numa perspectiva “[...] moralizante e utilitarista tornando a interiorização destas relações de trabalho da sociedade capitalista como relações naturais, desejáveis e, portanto, necessárias”. (FRIGOTTO, 1995, p. 15)

Na atualidade, esta concepção da relação trabalho e educação, já concebida como necessária, aparece “[...] como direito no processo de produção do valor e que permitem, nas relações de produção capitalistas, a expropriação, a mais-valia” (FRIGOTTO, 1995, p. 16), sendo entendida como uma atividade que cria riquezas para todos os homens, justificam e legitimam a acumulação, e, reproduzem a lógica de que é pelo trabalho, que os homens, trabalhadores em geral, são capazes de, pela sua própria capacidade de trabalho, pelos seus esforços, pela sua aptidão, dom, habilidades, “ascender socialmente, tornar-se patrões”. (FRIGOTTO, 1995, p. 16)

Frigotto (1995, p. 16) classifica o modo dominante de aprender e de orientar na prática esta relação trabalho educação pelas seguintes dimensões:

a) Dimensão moralizante que torna os trabalhos manual e intelectual igualmente dignos, formadores do caráter e da cidadania.

b) Dimensão pedagógica onde o trabalho aparece como uma espécie de laboratório de experimentação, o aprender fazendo.

c) Dimensão social e econômica onde os filhos dos trabalhadores podem autofinanciar sua educação.

Como vemos em Manacorda (1986), a luta da classe trabalhadora para um acesso ao ensino escolar é uma constante na história da educação, mas esta luta passa também pela compreensão de que o saber acumulado sob a hegemonia burguesa não é o saber que interessa à classe operária.

Aprofundar a compreensão sobre as formas que vão assumindo historicamente as relações de trabalho e suas contradições é, para Frigotto (1995, p. 18), “[...] o caminho para repensar a relação trabalho-educação”.

A especificidade da escola deve ser pensada a partir das relações sociais de trabalho e das relações sociais de produção nestas se localizam a formação da consciência crítica que devem balizar a produção de conhecimento e a própria educação do trabalhador. O aprofundamento teórico desse horizonte talvez possa avançar na compreensão do significado deste saber acumulado para a classe trabalhadora “[...] e ainda entender como este saber se produz dentro de relações sociais determinadas e, portanto assume a marca dos interesses dominantes”. (FRIGOTTO, 1995, p. 18)

Para Frigotto, sem um aprofundamento teórico na discussão da relação trabalho, educação, conhecimento e formação de consciência, é difícil compreender e apreender as novas formas de “sociabilidade que a relação capital-trabalho vai assumindo no capitalismo dos oligopólios” e entender ainda a natureza do “Estado intervencionista cujo principal objetivo é salvaguardar os interesses do capital no processo produtivo”. Compreender a violência instalada nas relações de produção acrescido agora de uma “violência e exploração política”. (FRIGOTTO, 1995, p. 21) Por este motivo é necessário instaurar processos educativos que deem conta da compreensão das especificidades das crises e a natureza das contradições da luta de classes.

Assistimos hoje é que, por um lado, à centralização do capital, que faz desaparecer a figura do capitalista individual, do patrão, e surgem grandes organizações anônimas; de outro, as transformações que ocorrem na produção, no processo de trabalho, vão borrando as fronteiras entre trabalho produtivo e improdutivo. Amplia-se o setor terciário com consequente aumento do subemprego e do número de desempregados do setor tecnológico. Estas transformações encontradas hoje em todas as instituições, inclusive nas instituições educacionais, (escolas e universidades) desvirtuam:

a) O aprofundamento teórico da relação capital-trabalho confunde as novas formas de sociabilidade do capital e a necessidade de retomar, nesse contexto, a teoria valor trabalho, com o abandono ou superação da própria teoria.

b) Uma leitura do processo histórico que não capta a natureza das contradições fundamentais e as estratégias de luta que, dentro da relação capitalista, na sua forma “moderna”, encaminham a possibilidade de dissolução do caráter de mercadoria da força de trabalho. (FRIGOTTO, 1995, p. 22)

É possível perceber que a emancipação dos sujeitos só será possível com a “[...] dissolução do caráter de mercadoria que assume a força de trabalho e o conjunto das relações sociais no interior do capitalismo e, conseqüentemente, na abolição das fronteiras entre o trabalho manual e intelectual”. (FRIGOTTO, 1995, p. 23)

Estes são conceitos básicos que devem perpassar a formação de professores, superando esta visão da ideologia capitalista, entendendo que existe sim a possibilidade de um ensino que identifique o que é o trabalho, como o trabalho forma o homem e, como veremos a seguir, como este trabalho influencia e determina a formação da cultura e o desenvolvimento humano.