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CAPÍTULO 1 AÇÃO POLÍTICA COLETIVA TRANSNACIONAL EM PROCESSOS DE

1.2 A dinâmica da ação política coletiva transnacional

1.2.4 Trajetória e aprendizado

A trajetória são os caminhos diversos adotados pelas OSCs durante o seu tempo de vida, com ênfase no porquê elas escolhem caminho diferente ou similar do que percorreram no passado. Para Pierson (2004), na presença de feedback positivo, a probabilidade de novos passos na mesma trajetória aumenta a cada passo dado nessa trajetória. Isso porque os benefícios relativos da atividade atual comparados às opções anteriormente possíveis aumentam com o tempo. Para colocar de uma maneira diferente, os custos de transição para uma alternativa previamente plausível aumentam a cada nova escolha estratégica. Assim, a dependência de trajetória (path dependence) reconhece que as consequências das ações dos atores são altamente dependentes das decisões e ações de outros atores. No âmbito de atuação

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de grupos, as ideias são compartilhadas entre seus membros, de modo a criar externalidades de rede (efeitos de coordenação) e expectativas adaptativas (PIERSON, 2004).

O aprendizado que é o resultado da experiência, do “aprender fazendo”, possui uma relação com a trajetória na medida em que ideias, arranjos e agendas das OSCs vão se adaptando ao longo de sua trajetória, levando em consideração que decisões tomadas antes facilitaram as decisões posteriores, facilitaram um curso de ação em detrimento de outro, que é a ideia de dependência de trajetória. O intuito de apresentar essas duas categorias analíticas – “trajetória” e “aprendizado” – conjuntamente é para demonstrar que os dois conceitos não são estáticos, mecânicos ou artificiais.

O mecanismo de aprendizado descreve a mudança nos valores ou comportamento que resultam da exposição a novas evidências, teorias ou repertórios, como orientam Simmons, Dobbin e Garrett (2006). A relevância está em ressaltar o que tem a ver com normas compartilhadas, crenças e o próprio papel dos atores. Outra visão mais econômica desse mecanismo de difusão é considerar o aprendizado como resultado da exposição a novos dados e informações de que os atores fazem uso.

Este mecanismo engloba o que é chamado de “aprendizagem simples” (simple learning), em que há uma mudança nos meios, mas que não torna a aprendizagem um processo mais estratégico versus “aprendizagem mais profunda” (deeper learning), não sendo afetada pelos ganhos, mas por uma mudança real nas crenças. Simmons, Dobbin e Garrett (2006) apontam para a relevância da aprendizagem social na ciência política, em que as normas compartilhadas, valores e crenças, assim como o papel das comunidades epistêmicas, afetam o processo de aprendizagem.

A difusão, de acordo com Tarrow (1998), é uma consequência da tomada de decisão racional ao tirar vantagem das ações demonstradas por outro grupo. Como a maioria dos teóricos de movimentos sociais, Tarrow (1998) equipara difusão com aprendizado. Embora Simmons, Dobbin e Garrett. (2006) considerem que os mecanismos de difusão variam, o aprendizado é talvez o mecanismo mais comum pelos quais os movimentos sociais adotam novos frames. Essencialmente, o aprendizado ocorre quando novas informações adquiridas, ao olhar para a experiência dos outros, levam a uma mudança ou atualização das crenças existentes (BRAUN; GILARDI, 2006).

A literatura sobre aprendizado organizacional é grande e não se encaixa bem em qualquer esquema de classificação único, como esclarecem Haunschild e Chandler (2008). Em termos de definições específicas, Huber (1991) analisa a revisão do aprendizado organizacional por meio de quatro construções: aquisição de conhecimento; distribuição de

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informação; interpretação de informação; e memória organizacional. Define, assim, o aprendizado em seu sentido mais amplo: “as entidades podem aprender incorretamente e podem aprender corretamente o que está incorreto” (HUBER, 1991, p. 89). O aprendizado “não precisa resultar em mudanças observáveis no comportamento. [...] Uma entidade aprende se, através do seu processo de informação, a gama de seus comportamentos potenciais é alterada” (HUBER, 1991, p. 89).

Outra definição clássica de aprendizado vem de Levitt e March (1988, p. 320), que observam que as organizações são “vistas como aprendendo, codificando inferências da história em rotinas que orientam o comportamento”. De acordo com Hauschild e Chandler (2008), as características importantes são as seguintes: (1) as rotinas são independentes de atores individuais e são dependentes da história; mas (2) mudam com base nas interpretações da experiência passada (interpretações que não são necessariamente coerentes); e (3) mudam à medida que novas experiências se acumulam. Tais experiências podem ser a própria experiência do ator individual ou as experiências de outros que o ator tem observado. Assim, aprendizado e mudança, deliberada ou não intencional, são inevitavelmente entrelaçados.

Grande parte do trabalho empírico sobre o aprendizado centra-se na análise do impacto desses vários tipos de experiências sobre os resultados organizacionais, geralmente sob a forma de melhorias (HAUSCHILD; CHANDLER, 2008). Lieberman (1984) considera o aprendizado pela perspectiva de curva de aprendizagem. Já para Dutton, Thomas e Butler (1984) o objetivo do aprendizado é prever e encontrar retornos positivos para ganhar experiência. Trabalhos recentes passaram a contextos empíricos mais complexos, como decisões estratégicas (BECKMAN; HAUNSCHILD, 2002; HAYWARD, 2002). A pesquisa empírica na literatura de aprendizado também se afastou de um foco na quantidade de experiência para uma visão mais abrangente de diferentes tipos de experiências.

Por exemplo, experiências adquiridas em contextos heterogêneos em oposição a configurações homogêneas (MINER; HAUNSCHILD; SCHWAB, 2003). Há também um crescente corpo de trabalho empírico sobre as condições que estimulam o aprendizado e a mudança. Nesta vertente, a teoria comportamental de Cyert e March (1963) fornece a base para a compreensão dos níveis de aspiração (tanto individuais como sociais) como determinantes da mudança (GREVE, 1998).

Miner e Haunschild (1995) fizeram outra contribuição para entender o conceito de aprendizado em um nível mais macro, que explicitamente transferiu a definição de aprendizado para o nível de análise da população (ou campo). Eles conseguiram isso definindo o aprendizado a esse nível como ocorrendo por meio de mudanças nas rotinas de

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nível populacional baseadas nas experiências dessa população ou de outra população cujas experiências possam ser observadas. Essa visão de nível superior do aprendizado torna o conceito muito mais acessível aos teóricos institucionais em termos de definição, nível de análise e contabilização de como a mudança ocorre no nível de campo.

Haunschild e Chandler (2008) identificam áreas nas quais os processos e mecanismos de aprendizado podem trabalhar em conjunto com o conhecimento existente de instituições para informar a compreensão da mudança no nível de campo. Esses processos e mecanismos incluem a ideia de que processos organizacionais comuns podem levar a resultados não intencionais, o que pode acarretar a ruptura das instituições existentes. Os processos também incluem o efeito de laços de rede, localização geográfica e fluxos de informação como fontes de reprodução institucional (e não reprodução).

Nesta tese, o processo de aprendizado tem a ver com a adoção de determinadas estratégias, lições que foram aprendidas durante as múltiplas trajetórias, a maneira de enxergar determinados problemas e propostas, e a própria agenda de mobilização das OSCs da MESA.