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2 FORMAÇÃO DOCENTE: UM APRENDIZADO NA RELAÇÃO TEORIA E

2.1 A formação e o desenvolvimento de habilidades na escola: uma perspectiva com

2.1.1 Um processo formativo teórico

Sabemos o quanto é importante encontrar professores que queiram aprender e tentar melhorar sua atividade docente. Contando com essa realidade, no dia 23 de março de 2011, iniciamos os Ciclos de Estudo Reflexivo, buscando compreender as necessidades formativas de natureza teórica e prática apresentada pela professora de História.

Antes de iniciarmos os ciclos, nesse mesmo dia, fizemos a nossa primeira reunião onde apresentamos à docente o projeto de pesquisa do doutorado e tivemos uma discussão acerca do cronograma (APÊNDICE B) ao lado de sua assinatura do termo de adesão (Apêndice A) à pesquisa.

Ao falarmos do nosso propósito investigativo, Dulce disse:

Nós vamos trabalhando e perguntando será que está se desenvolvendo no aluno essa capacidade de interpretar? Frente a essa questão da investigação, estou preocupada quanto à escolha da turma. Penso que esse trabalho requer uma turma que tenha um maior nível de ensino e que seja silenciosa. Então, para fazer esse trabalho, pensei na turma do 9o11 ano porque os alunos já estão terminando o Ensino Fundamental para entrar num nível mais elevado. É, também, uma turma mais calma, silenciosa...

Da Paz: – Em termos desse último aspecto, de fato, para a realização da interpretação de textos, não somente de historia, é preciso concentração cujo silêncio é indispensável. Só que eu tinha pensado no 8o ano, porque foi nesse ano de ensino que trabalhamos na pesquisa anterior. Mas, tudo bem, concordo com a sua sugestão.

Nesse diálogo, não aproveitamos a oportunidade do que foi dito pela docente – quanto a considerar que o desenvolvimento desse trabalho, envolvendo a interpretação de textos de história, requeria uma turma silenciosa – para promover uma negociação de sentidos, sua expansão e o desenvolvimento de uma postura crítica. Assim, atuamos com a reflexão técnica.

A professora se encontrava atenta, interessada em aprender e participar de mais uma experiência de investigação. E isso é demonstrado na fala a seguir:

11 Ocorreu uma diminuição de alunos nessa turma os quais foram para outra escola que se não se encontrava em greve. Devido a essa redução desenvolvemos a pesquisa no 8o ano. Daremos mais detalhes adiante.

Dulce: – Eu vou aprender. A gente vai trabalhar diretamente nessa turma só que eu vou utilizar esse método, se for bom que eu creio que é, e tentar trabalhar com outras turmas. Isso aqui veio bem na hora certa! Se é uma atividade para ensinar esses alunos! Tentar levar o aluno a interpretar, aprender a estudar história, aprender a interpretar texto...

É relevante, para os que se dedicam à pesquisa de campo, contar com colaboradores que querem aprender, tentar melhorar sua prática de trabalho e que dá credibilidade ao trabalho do investigador. Ficamos felizes (pesquisadora) nessa ocasião, mas, sobretudo, atenta ao atendimento das expectativas.

Adentrando na discussão do cronograma, expomos:

Dulce: – Com relação ao nosso cronograma, pensei de colocarmos momentos de estudos de fundamentação teórica, planejamentos das aulas e, também discussões analíticas sobre as aulas que serão ministradas por você. O que me diz sobre isso?

Dulce: – Está bom!

Com a aceitação, passamos a registrar alguns dias que iríamos dedicar à realização desses procedimentos deixando o referido cronograma, com flexibilidade, para irmos fazendo alteração, inserindo temáticas para estudos, conforme houvesse necessidade da docente. Concluído esse momento, passamos a realizar os Ciclos de Estudos Reflexivos.

Iniciamos os ciclos com a sondagem inicial das necessidades formativas (de âmbito teórico) da professora partícipe. Para isso, estabelecemos o seguinte diálogo:

Da Paz: – Dos estudos que desenvolvemos sobre a Teoria da Atividade de A. N. Leontiev, na pesquisa do mestrado, há algo que você gostaria que aprofundássemos? Nós estudamos, por exemplo, sobre o enfoque histórico- cultural da aprendizagem, os princípios do desenvolvimento mental... Dulce: – No momento não me lembro... Assim, de algo mais específico. Da Paz: – E sobre a consciência? Nós estudamos um pouco sobre essa temática...

Dulce: – Sobre a consciência?!... Não estou lembrando...

Da Paz: – Como precisaremos estudar sobre consciência histórica, fiquei pensando: Será que ficou alguma coisa que precisaríamos aprofundar sobre consciência, do que estudamos durante a investigação no período do mestrado?!

Da Paz: – No percurso, das discussões nos ciclos, veremos a necessidade ou não de retomar algum ponto sobre esse assunto.

Dulce: – Está certo!

Da Paz: – Você já ouviu falar sobre a Teoria da Assimilação de Ações Mentais por Etapas de P. Ya. Galperin?

Dulce: – Não.

Da Paz: – Nós vamos, precisar, estudar sobre essa teoria de Galperin, porque será com ela que fundamentaremos o processo metodológico que desenvolveremos em sala de aula.

Nesse diálogo, Dulce não externalizou alguma necessidade formativa e não lhe oferecemos elementos, sobre consciência, que a possibilitasse fazer alguma discussão. Como disse não lembrar algo sobre consciência, não inserimos essa temática no cronograma, nesse dia. Outros dois pontos que não marcamos, nesse encontro, foi quando iniciaríamos o planejamento das aulas e a realização dessas aulas, com os alunos, porque não dava para prevermos quanto tempo a professora precisaria para se apropriar da Teoria da Assimilação de Ações Mentais por Etapas de P. Ya. Galperin que ela disse desconhecer.

Após esse instante, prosseguimos no encaminhamento referente ao estudo sobre habilidades.

Da Paz: – Dulce, pensei o nosso estudo de hoje com o seguinte encaminhamento: começaríamos com você nos dizendo o que entende por habilidade. Em seguida, faríamos uma leitura silenciosa de um texto sobre esse assunto para depois o discutirmos. Você concorda ou quer sugerir algo? Dulce: – Pode ser. Concordo!

Havendo concordância da professora, prosseguimos:

Da Paz: – Assim, vamos estudar um texto sobre habilidades com o objetivo de refletirmos sobre a formação e o desenvolvimento de habilidades na escola, na perspectiva da Teoria da Atividade... Então, o que você entende por habilidade!

Dulce: – Habilidade é saber-fazer. Quando você tem um dom para aquilo ali, quando você faz algo com facilidade.

Após a escuta dessa fala, apresentamos, de forma sintética, o texto de nossa autoria (pesquisadora), que iríamos estudar, denominado: A formação e o desenvolvimento de habilidades na escola: uma perspectiva com base na Teoria da Atividade e, em seguida, convidamos a professora à fazer uma leitura silenciosa, marcando alguns pontos que gostaria que discutíssemos após a feitura dessa modalidade de leitura.

Terminada a leitura silenciosa, começamos a discussão com base nos pontos destacados pela docente.

Da Paz: – Gostaria de começar a discussão a partir do que você destacou? Dulce: – Eu vou começar me referindo a este parágrafo que diz: “No ensino de História, as habilidades colaboram, na medida em que contribuem, dentre outros aspectos, para a apropriação do conhecimento sobre a transformação do homem e da natureza no percurso histórico... Eu entendo que as habilidades vão contribuir, colaborar no desenvolvimento da consciência crítica do aluno.

Da Paz: – Concordo! E, assim, podermos usá-la em qualquer situação que dela precisemos.

Nesse diálogo, Dulce expõe que as habilidades contribuem para nos apropriarmos do conhecimento, referente à transformação do homem e da natureza no percurso histórico e entende que, nesse sentido, elas colaboram no desenvolvimento da consciência crítica do educando.

Na tentativa de que essa professora trouxesse, para o diálogo, o que havia exposto sobre habilidade, antes da leitura do texto, destacamos dois pontos de sua fala anterior: o saber-fazer e o dom para realizar algo com facilidade. Assim, dissemos-lhe:

Da Paz: – Dulce, você se lembra de que falou da habilidade como um saber- fazer, como um dom?!

Dulce: Sim! Cada pessoa nasce com um determinado dom. Só que se ela não praticar, não explorar aquilo ali, não vai adquirir habilidade. Precisa se explorar, se esforçar... Explorar aquele dom que recebeu.

Ao relacionarmos a primeira fala da partícipe, com essa, apreendemos que, ainda se referindo à habilidade como um dom, ela amplia seu entendimento apresentando algo indispensável ao desenvolvimento de uma habilidade, que é exercitá-la.

Na tentativa de que a partícipe refletisse, sobre esse seu entendimento de habilidade como um dom, reportamo-nos a um trecho, que nós duas havíamos grifado,

concernente ao pensamento de Petrovsky (1985 apud REBUSTILLO; SARGUERA, 1993) e lhe falamos:

Da Paz: – Observemos o que nos diz Petrovsky... Nessa parte, que nós duas grifamos. Ele explicita que a habilidade diz respeito ao “domínio de um complexo sistema de ações psíquicas e práticas necessárias para uma regulação racional da atividade, com ajuda dos conhecimentos e hábitos que a pessoa possui”.

Dulce: – Complementando esse pensamento, também marquei que as habilidades cognoscitivas podem ser ensinadas pelo professor, servindo de procedimentos e estratégias ao discente, para uma aproximação mais real do conhecimento do mundo.

Da Paz: – É! Mesmo as habilidades práticas, segundo Rebustillo e Sarguera, requerem a utilização de conhecimentos. A escola, então, tem um papel fundamental no seu ensino.

Dulce: – É! É muito importante o aluno aprender habilidades na escola.

Como constatamos, a docente destacou, reportando-se ao texto, que a habilidade diz respeito ao domínio de um complexo sistema de ações psíquicas e práticas; citou que as habilidades cognoscitivas podem ser ensinadas pelo professor e que é muito importante o aluno aprendê-las na escola, mas não retomou o seu entendimento, atinente à habilidade como um dom, para questionamento.

Nesse diálogo na perspectiva da reflexão crítica, buscamos proporcionar à professora avançar os sentidos por ela enunciados ao trazermos para a discussão o seu entendimento sobre o que é habilidade e lhe pedir para que observasse o que nós duas havíamos grifado sobre o que é habilidade na visão de Petrovsky. Isso, como uma tentativa de que ela refletisse sobre o que nos dissera ser a habilidade.

Expressando-se, complementando a visão desse autor, a partícipe chegou a destacar (do texto), que as habilidades podem ser ensinadas pelo professor. Ideia que se contrapõe à habilidade como um dom. Nessa ocasião, teria sido procedente aproveitarmos (pesquisadora) a oportunidade para promover a negociação de sentidos e lhe proporcionar avançar nos sentidos enunciados. Ou seja, questionar acerca de que se as habilidades podem ser ensinadas pelo professor, como a docente justificaria a sua afirmação da habilidade como um dom! O que não ocorreu. Assim, atuamos com a reflexão técnica.

Dando continuidade à discussão, procuramos saber como Dulce vinha trabalhando a leitura na interpretação de textos de história, no 8º ano do Ensino Fundamental. E eis o que nos disse:

Dulce: – Por exemplo, a gente vai trabalhar esse conteúdo aqui [reportando- se a um conteúdo do livro didático]. Faço a abertura... Eu gosto de incentivar à leitura. Depois peço: Fulano, leia aí o primeiro parágrafo! – Não! Não vou ler não! Vamos lendo, ora um, ora outro... Os demais acompanham, fazendo a leitura silenciosa. Após a leitura pergunto: O que vocês entenderam? A gente vai debater cada ponto. Mas é difícil. Têm alunos que você não consegue fazer ler.

Após alguns instantes, reforçando a sua colocação, voltou a nos falar:

Dulce: – Mesmo os alunos que fazem a leitura, apresentam dificuldades na interpretação. O aluno que não gosta de ler está perdido, no mundo de hoje... Eu digo para eles: Olhe, se vocês aprenderem a interpretar textos de história, vocês vão interpretar textos de disciplinas, como a Língua Portuguesa, por exemplo, com certa facilidade.

Nessas falas de Dulce, compreendemos como ela trabalha a leitura na interpretação de textos de história, ou seja: fazendo uma abertura, incentivando o aluno a ler, solicitando que ele leia (em voz alta), parte do texto, enquanto os outros vão acompanhando (silenciosamente) e, ao terminarem, procura saber o que eles entenderam, promovendo debates. Esse modo de trabalhar com a leitura favorece o procedimento da interpretação.

Ler constitui uma habilidade imprescindível para o discente trabalhar o processo interpretativo. Todavia, vimos as dificuldades com que a docente se defronta com discentes resistindo à leitura. E, mesmo os que a fazem, apresentam dificuldades para interpretar o texto.

Finalizando a discussão inicial, a partícipe voltou a se pronunciar dizendo:

Dulce: – Espero que essa pesquisa ajude primeiro a mim, para eu poder ajudar o aluno a melhorar na interpretação de textos de história.

Da Paz: – Eu também desejo que isso aconteça.

O exposto nos permite dizer que, antes da leitura do texto, para a professora Dulce, a habilidade dizia respeito: a saber-fazer; a um dom para realizar algo e o realizá-lo com facilidade. Depois da leitura silenciosa, a docente destacou a contribuição das habilidades no desenvolvimento da consciência crítica do educando, mas permaneceu no entendimento da habilidade como um dom; sendo que o fazer com facilidade (que apareceu

na sua primeira colocação) dependia agora do esforço do indivíduo, da exploração do dom recebido.

Naquela ocasião, quando trouxemos para o debate a habilidade como um domínio de um complexo sistema de ações psíquicas e práticas, vimos que Dulce complementou essa ideia destacando que as habilidades cognoscitivas podem ser ensinadas pelo docente, sendo importante o aluno aprender sobre elas. Algo que se contrapõe à habilidade como um dom, uma vez que todos podem aprendê-las, desenvolvê-las.

Quando algumas reflexões trazem elementos que se contrapõem ao anteriormente anunciado, são propiciadores de aprendizagem e desenvolvimento. Sabemos que alguns entendimentos que construímos necessitam de mais estudos e aprofundamentos para ser mudados.

Segundo Forquin (1993), muitas vezes, o professor não muda, porque suas estruturas de plausibilidade estão enraizadas do ponto de vista epistemológico. Isso requer um processo contínuo de reflexão crítica, de modo que a ideia de mudança lhe faça sentido. Pode convergir para ajudar nessa mudança a constituição de processos cognitivos que envolvam ideias interconectadas na busca de dar conta de crenças e conhecimentos subjacentes às ações. Mesmo mantendo uma visão de habilidade como dom, a professora deu passos na perspectiva de mudança dessa visão quando trouxe para a discussão elementos teóricos que apresentavam uma compreensão diferente da sua, quando realizou a interpretação de um trecho (do texto) e nos disse que a habilidade contribui para o desenvolvimento da consciência crítica do aluno e quando ampliou seu entendimento, ressaltando a importância de exercitarmos as habilidades.

A partir dessas constatações, destacamos a relevância de momentos formativos, como o vivido com Dulce, da reflexão crítica sobre o seu saber e o seu fazer, para o aprimoramento no seu aprendizado e no desenvolvimento do processo de ensino e de aprendizagem da História. Nessa direção, estudamos com essa partícipe mais um texto de nossa autoria que se segue.