• Nenhum resultado encontrado

Capítulo 1 – Revisão da Literatura

1.1 Evolução histórica do fenómeno do empreendedorismo

1.1.5 Uma sistematização

No decorrer da história da teoria do empreendedorismo, o empreendedor desempenhou vários papéis, de acordo com as perspetivas dos investigadores em empreendedorismo. Hébert e Link (1989) cit. por Ripsas (1998) e Wennekers e Thurik (1999) apresentaram uma revisão aos diferentes papéis do indivíduo empreendedor, nos últimos 200 anos. A partir dos principais contributos teóricos, Hébert e Link (1989) cit. por Monteiro (2009) identificaram 13 funções principais do empreendedor, que podem ser divididas em abordagens estáticas ou dinâmicas (ver Tabela 1).

Tabela 1 – Funções desempenhadas pelo empreendedor na literatura económica

(1) O empreendedor é a pessoa que assume o risco associado à incerteza (Exemplos: Cantillon, Thünen, Mill, Hawley, Knight, Mises, Cole, Shakle)

(2) O empreendedor é a pessoa que fornece capital financeiro (Exemplos: Smith, Turgot, Bohm-Bawerk, Pigou, Mises)

(3) O empreendedor é o inovador (Exemplos: Baudeau, Bentham, Thünen, Schmoller, Sombart, Weber, Schumpeter)

(4) O empreendedor é o decisor (Exemplos: Cantillon, Menger, Marshall, Wieser, Amasa Walker, Keynes, Mises, Shakle, Cole, Schultz)

(5) O empreendedor é um líder industrial (Exemplos: Say, Saint-Simon, Amasa Walker, Francis Walker, Marshall, Wieser, Sombart, Weber, Schumpeter)

(6) O empreendedor é o gestor ou o superintendente (Exemplos: Say, Mill, Marshall, Menger)

(7) O empreendedor é o organizador e o coordenador dos recursos económicos (Exemplos: Say, Walras, Wieser, Schmoller, Sombart, Weber, Clark, Davenport, Schumpeter, Coase)

(8) O empreendedor é o proprietário da empresa (Exemplos: Quesnay, Wieser, Pigou, Hawley)

(9) O empreendedor é um empregado dos fatores de produção (Exemplos: Amasa Walker, Francis Walker, Wiser, Keynes)

(10) O empreendedor é um contratante (Exemplo: Bentham)

(11) O empreendedor é um árbitro (Exemplos: Cantillon, Walras, Kirzner)

(12) O empreendedor é um alocador de recursos entre usos alternativos (Exemplos: Cantillon, Kirzner, Schultz) Fonte: Hérbert e Link (1989, p. 31) cit. por Ripsas (1998), Wennekers e Thurik, (1999) e Monteiro (2009)

Além de apresentarem de forma sucinta, uma perspetiva alargada das diferentes visões do conceito de empreendedor na história económica, Wennekers e Thurik (1999) estabeleceram a ligação entre empreendedorismo e crescimento económico, conforme se pode visualizar nas Tabelas 2 e 3.

32

Tabela 2 – Perspetivas históricas dos economistas sobre o empreendedorismo e o crescimento económico Itens da estrutura Variáveis relevantes Disciplinas relevantes Foco de observação Condições

Empreendedorismo - Traços (vigilância, perceção) - Papéis do empreendedor

- Psicologia - Economia

- Indivíduos - Indivíduos Ligações intermédias - Novidades através de start-ups e

inovação - Mercados e competição - Equilíbrio vs. Desequilíbrio - Economia industrial - Economia industrial - Economia - Empresas - Empresas e indústrias - Níveis agregados Crescimento económico

- Apenas ligações indiretas

Fonte: Wennekers e Thurik (1999)

Tabela 3 – Aspetos relevantes da história económica

Itens da estrutura Variáveis Disciplinas

relevantes Foco de observação Condições - Cultura (mente aberta, assunção

do risco, orientação de longo prazo, etc.)

- Instituições (incentivos, regras da concorrência) - Psicologia social, antropologia e sociologia - Legislação e economia - Grupos e sociedades - Quadro macro a influenciar o comportamento micro Empreendedorismo - Ameaças e comportamento - Psicologia e

economia de gestão

- Pessoas individuais Ligações

intermédias

- Conquista de novos mercados - Invenção e inovação

- Formação de novos negócios - Concorrência

- Economia industrial - Empresas e indústrias

Crescimento económico

- Ascensão e declínio das nações - Economia - Economia nacional

Fonte: Wennekers e Thurik (1999)

Praag (1999) também contribuiu para a sistematização dos determinantes do empreendedorismo bem-sucedido, ao incluir numa tabela, as ideias apresentadas pelos principais autores (Tabela 4).

Tabela 4 – Determinantes do empreendedorismo bem-sucedido introduzidas pelos autores clássicos

Autores Começo como empresário Sucesso como empresário

Começo e transformação num empresário de sucesso Cantillon Vigilância e capacidade de previsão Portador de riscos

Say Reputação suficiente para obter capital Capacidade de julgamento, perseverança,

conhecimento do mundo, dos negócios e da ocupação

Portador de riscos

Marshall Jovens amantes de riscos Inteligência, capacidade geral (dependente do contexto familiar e educação) Conhecimento do mercado Portador de riscos Liderança Capital próprio Boa sorte Pai empresário

Schumpeter Disponibilidade para começar (maior se existirem menos alternativas para a distinção social, mais ambição, energia e criatividade)

Liderança

Knight Capacidade para obter capital Disponibilidade/motivação

Capacidade para lidar com a incerteza; autoconfiança, capacidade de previsão, capacidade intelectual

Boa sorte

Kirzner Vigilância Criatividade e liderança para explorar as oportunidades de lucro Fonte: Praag (1999) cit. por Monteiro (2009)

Murphy, Liao e Welsch (2006) cit. por Monteiro (2009) apresentaram uma breve interpretação da evolução histórica das teorias do empreendedorismo, na qual defenderam que a história do empreendedorismo foi sendo construída ao longo do tempo, como consequência do desenvolvimento dos conceitos e do conhecimento em geral (ver Figura 1). Estes elementos conceptuais, refletem orientações gerais ou paradigmas, primeiramente de ordem pré-histórica, seguida de ordem económica e, por último, de ordem multidisciplinar (Murphy, Liao e Welsch, 2006 cit. por Monteiro, 2009).

34

Figura 1 – História conceptual do pensamento empreendedor

Fonte: Murphy, Liao e Welsch (2006)

Conforme foi possível depreender dos subcapítulos anteriores, o fenómeno do empreendedorismo, processo pelo qual novas empresas são criadas, tem captado a atenção de inúmeras pessoas e sido alvo de inúmeros debates, nos domínios público e académico (Lee e Venkataraman, 2006; Shane e Venkataraman, 2000; Venkataraman, 1997 cit. por Monteiro, 2009).

Este é um tema que deu origem a várias teorias e abordagens, sendo estudado principalmente nos campos das Ciências Sociais e Empresariais, com propósitos muito distintos. Além de ser considerado um assunto de natureza complexa, interdisciplinar e/ou multidisciplinar e de ter recebido inúmeros contributos de diferentes autores, o campo de investigação encontra-se ainda numa fase muito embrionária (Gartner, 1985; Shane e Venkatamaran, 2000; Venkatamaran, 1997 cit. por Monteiro, 2009).

Hébert e Link (1989) cit. por Wennekers e Thurik (1999) propõem a seguinte definição para o empreendedor e as funções que este desempenha: ““the entrepreneur is someone who specializes in taking responsibility for and making judgmental decisions that affect the location, form, and the use of goods, resources, or institutions”. Embora existam divergências em relação ao tema, parece consensual que o empreendedorismo

como campo de investigação seja “recente e multidimensional, alicerçado em diferentes disciplinas e marcado na sua abordagem por vários referenciais políticos e económicos” (Gedeon, 2010 cit. por Graça, 2015).

As teorias e os métodos utilizados para estudar o empreendedorismo variam consoante o domínio de investigação em que o investigador se insere e o seu propósito. Segundo Monteiro (2009), a natureza da análise, mais ou menos abrangente (ao nível do indivíduo, da empresa, da indústria ou da sociedade), influencia o próprio conceito de empreendedorismo e o grau de importância que tem enquanto variável dependente ou independente. Contudo, Praag (1999, p. 334) refere que o conhecimento científico existente sobre empreendedorismo é atualmente válido e aplicável, principalmente o que foi produzido pelos autores Say, Marshall e Knight.

1.2 O Ecossistema Empreendedor