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A sociedade pós-moderna é uma sociedade de consumo. Isto não implica apenas em dizer que na sociedade atual os homens consomem. Significa dizer que o consumo está na base da estrutura social e persiste de forma tão fundamental a ponto de caracterizá-la de forma diferente das sociedades dos antepassados.

Ao fazer um recorte da sociedade atual e exercer uma análise comparativa com a sociedade moderna, é possível perceber que na modernidade a estrutura social baseava-se em homens-produtores e homens-soldados. 212

Esta observação é conseqüência do fato de que a modernidade operava com o conceito de produção como aquele que definia a riqueza, e o conceito de força militar como aquele que definia poder político.

O homem moderno é produtor na medida em que qualquer atividade dominada pelo capitalista necessitava majoritariamente da força de produção para

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BAUMAN, Zigmunt. Globalização: as conseqüências humanas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1999, p. 16.

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BAUMAN, Zigmunt. Globalização: as conseqüências humanas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1999, p. 88.

subsistir, fazendo com que o homem-produtor, ainda que não possuísse poder, estivesse incluído na estrutura de sustentação desta mesma sociedade.

A sociedade vivia desde a necessidade de produzir, e para tal necessitava da força dos indivíduos que eram produtores por excelência.

Por outro lado, o soldado era o incluído na outra ponta de bifrontismo social, por quer o poder político ainda estava atrelado ao espaço e havia necessidade de utilização da força física, empregada através de homens-soldados para controle do espaço territorial.

Na pós-modernidade, estas prioridades vão se esvaziar, pois o poder militar deixa de ter a utilidade de antanho, na medida em que a conquista do espaço físico sede terreno em importância para a conquista do espaço virtual. Os grandes exércitos que ocupam papel primordial na obtenção de poder na modernidade deixam de ter a mesma importância na pós-modernidade.

De igual modo, existem mais pessoas no globo do que o necessário para produzir. As revoluções científicas, principalmente as que minimizaram a participação da mão de obra humana na produção tiveram por conseqüência a redução da importância do homem-trabalhador - do homem-produtor – na acumulação de riqueza. As máquinas passaram a exercer este papel na produção, criando a categoria do excedente de “mão de obra”.

Na pós-modernidade, os produtores e os militares são substituídos pelos consumidores, pois o espaço agora é virtual e a produção é robotizada, fazendo com que a estrutura de poder e riqueza migre para outro lócus social.

Obviamente, isto não significa a absoluta ausência de importância dos exércitos e dos produtores. Significa apenas que não fazem mais parte da base

sobre a qual as estruturas da sociedade se constroem. A sociedade pós-moderna é diferente da sociedade da modernidade.

Em passagem, Bauman afirma que:

As diferenças são tão profundas e multiformes que justificam plenamente falar da nossa sociedade como sendo de um tipo distinto e separado – uma sociedade de consumo. O consumidor em uma sociedade de consumo é uma criatura acentuadamente diferente dos consumidores de quaisquer outras sociedades até aqui.213

Basta uma breve olhada na sociedade ocidental para se perceber que ela se instrumentaliza como um espaço – real e virtual – de consumo, onde o dilema deixa de ser sobreviver ou não sobreviver, trabalhar ou não trabalhar, e passa a ser “[...] se é necessário consumir para viver ou se o homem vive para poder consumir.”214

O consumo deixa de ser um elemento da vida das pessoas e passa a ser a razão de seu próprio dia a dia. A velocidade, a virtualidade, a redução das distâncias e o aumento das possibilidades de comunicação fazem do ato de consumir um ato cada vez mais fácil e dependente apenas das potencialidades do indivíduo enquanto consumidor.

Evidentemente que há um condicionante subjetivo que é criado pela mídia e que já representa uma forma de viver da pós-modernidade. Isto aponta para conjecturas como a que diz que “para bons consumidores não é a satisfação das

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BAUMAN, Zigmunt. Globalização: as conseqüências humanas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1999, p. 88.

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BAUMAN, Zigmunt. Globalização: as conseqüências humanas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1999, p. 89.

necessidades que atormenta a pessoa, mas os tormentos dos desejos ainda não percebidos nem suspeitados que fazem a promessa ser tão tentadora.215

Há uma necessidade de consumir, uma obrigação de fazer parte de um mundo inserindo-se nele não como trabalhador ou soldado, mas como consumidor. Aquele que pode comprar está incluído, e aquele que nada pode comprar está excluído do modelo social pós-moderno.

Esta sensação de necessidade de consumir gera inquietude, gera mal- estar, gera depressão e condiciona a estrutura de valores do próprio indivíduo. A cartografia da sociedade indica que quanto mais consumidor, mais importante, mais incluído e mais admirado. O anseio por consumir pode levar a uma série de conseqüências, desde a insônia à compulsão e ao nervosismo. Poder consumir significa poder existir, poder estar incluído, poder ser valorizado.

Esta característica do mundo atual conecta-se com as demais características e delas é tributária, na medida em que a redução dos espaços favorece o consumo, que se torna mais efusivo e potente graças à virtualidade das relações desta natureza.

De igual modo, é através do consumo de bens e serviços que o neoliberalismo se fortalece. Só é possível pensar uma economia de mercado, uma economia neoliberal com o enorme fluxo de objetos de consumo que se sustenta na redução de distâncias e no abandono do espaço físico como referência do comércio. Necessário perceber também que, se a produção de tudo o que é consumido, utiliza-se uma parcela muito menor dos homens que existem no globo; e se parte destes homens não podem consumir, tais pessoas estão radicalmente fadadas a estarem de fora da estrutura social, e, portanto, completamente excluídos.

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BAUMAN, Zigmunt. Globalização: as conseqüências humanas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1999, p. 90.

Não podem consumir e o mundo não precisa mais delas para produzir. Mais ainda: o Estado que as protegeria deixa de ser tutor do excluídos e passa a ser apenas um regulador de questões de mercado, nada podendo fazer.

Não é possível a todos consumir tudo. Embora o desejo de consumir – o elemento subjetivo - possa estar presente em todos, nem todos podem consumir.

Todo mundo pode ser lançado na moda do consumo; todo mundo pode desejar ser um consumidor e aproveitar as oportunidades que esse modo de vida oferece. Mas nem todo mundo pode ser um consumidor.216

Consumir passa a ser uma característica da sociedade pós-moderna porque é mais do que algo que ocorre nos tempos atuais. Viver consumindo passou a ser, na pós-modernidade, um modo de vida ocidental.