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CAPÍTULO 1. BIBLIOTECAS PÚBLICAS

1.1 UMA VIAGEM NO TEMPO

A tradição da subsistência do conhecimento como algo sagrado, tem sido conservada por séculos até chegar às sociedades ocidentais. A curadoria do conhecimento é mantida como se fosse um sacerdócio; também em busca da conquista pelo conhecimento “sagrado” e “laico” consagrando a separação da Igreja e do Estado (GALINDO, in FERREIRA, 2012, p. 16).

A palavra “biblioteca” surgiu da junção de duas palavras gregas: biblio e têke, que teriam o significado conjunto de ‘prateleira ou depósito para guardar livros, escritos, rolos de papiros e de pergaminho arrumados em estantes. Hoje em dia, uma biblioteca é essencialmente uma coleção de livros, em geral, aberta ao público, mas seu sentido nem sempre foi esse. As bibliotecas mais antigas nasceram no Oriente, e abrigaram basicamente documentos gravados em pedra. No entanto, com o surgimento do pergaminho e a maior disseminação da escrita, fundamenta-se os primeiros estabelecimentos de formato semelhante ao que hoje conhecemos (SCHWARCZ, 2017, p. 123).

É importante salientar que nem sempre foi assim, as bibliotecas eram usadas pelos estudiosos que, no íntimo era um grupo muito elitista e restrito, no qual, absorviam e geravam sapiência, e esse processo se materializou nas variadas estratégias de conquista

do acesso ao produto do saber, por exemplo, os papiros e pergaminhos mantidos em Alexandria na Europa medieval.

Se fizermos uma viagem no tempo, podemos imaginar como, ao longo da história da humanidade, o conhecimento se propagava, entre as diversas linguagens que, de certa forma, se tornam um

fato social porque classifica de maneira ou de outra ou sujeito que fala. Sem dúvida, ela o classifica individualmente antes de classificá-lo socialmente; além disso, quando o classifica num grupo, esse grupo é uma realidade mal definida, não possui a rigidez de uma classe social no sentido estrito da palavra: é apenas um meio... o meio em que vive ou de onde provém o indivíduo com exclusão de outros [...] (MARTINS, 2001, p. 25)

Visto que o homem somente percebe os objetos exteriores através dos sentidos, mesmo que as suas manifestações materiais e mecânicas, sejam consideradas psicológicas segundo Saussure (MARTINS, 2001, p. 25); a linguagem promove a prática de desenvolver conhecimentos, e de acordo com os estudos de Joseph Vendryès (1968, p.19), ela é um instrumento de análise do pensamento, é assim do ponto de vista psicológico (a atribuição de um valor simbólico ao sinal)8, e também nos remete aos homens das cavernas,

utilizando as mãos nas primeiras tentativas de talhar a pedra, exercia na realidade um prodigioso esforço de abstração [...]o nome ou o grito, a frase ou a palavra que tenham aparecido inicialmente, a linguagem representava o princípio de grande dominação do homem sobre as coisas. O que os filósofos chamaram de razão não é senão o conjunto da capacidade abstrativa do homem: e se ele pode definir com o um “animal social” é que a definição essencial está em ser um animal abstrativo (MARTINS, 2001, p. 19).

A escrita é apenas um, entre inúmeros outros sistemas de linguagem visual, mas

sabemos que a maior parte das linguagens visuais de que hoje dispomos, deriva-se da linguagem auditiva (MARTINS, 2001, p.33).

O “homem” percorreu um longo caminho para estabelecer, o que encontramos hoje, a “comunicação tecnológica”; enxergamos que a história da escrita não se cristalizou, em uma única vez.

o homem primitivo dispõe de uma multiplicidade de meios de expressão, que vão da linguagem oral ao desenho, passando pelos gestos, pelos nós, pelos entalhes sobre a matéria dura etc. desses meios de expressão, uns transitórios, outros são duráveis [...] entre os primeiros sobre a linguagem articulada; entre os segundos, a escrita propriamente dita [...].Os esboços dessa espécie de escrita podem ser qualificados de sintéticos. Os alemães chamam-nos de

Ideenschrift, “escrita de ideias” [...]:o sinal não evoca mais uma frase, mas

8 O suíço, Ferdinand de Saussure (1857-1913), um dos fundadores da Semiótica, defende a ideia de que

o homem aprende sobre a existência dos signos, constituídos pelos seus significados e significantes (SAUSSURE, 2002). A “guerra” semiótica da contemporaneidade, traz uma avalanche de códigos subliminares, sendo muitos deles tóxicos para a humanidade.

anota uma palavra [...]; a escrita de torna analítica ou ideográfica. Os alemães dizem, nesse caso, Wortschrift, “escrita de palavras” [...]. Enfim, uma nova simplificação aparece. Da mesma maneira que há menos frases, o número de sons ou de elementos fonéticos contidos nas palavras é muito menor que os das próprias palavras. [...] A escrita será dita, então, fonética, porque ela não registra senão os sons (FEVRIÈR, 1948, p. 10 apud MARTINS, 2002, p. 34)

Próximo das espécies pictográficas da escrita, encontramos os chamados sistemas mnemônicos diversificados; mas, quando o homem busca manter e transmitir o pensamento, surge a escrita fonética, sendo possível transformar a imagem visual pela sonora.

A ideográfica inicia-se a partir da ideia de representar os objetos por um sinal que se faz ser compreendido graficamente; e esta viagem ainda não se conclui, encontrando ainda outros tipos de escrita: a cuneiforme, que aparece na Mesopotâmia, e que coincide com a introdução do selo real e com as novas formas arquitetônicas; os hieróglifos, considerada grandiosa, ela “se prolonga até ao terceiro século da nossa era, tendo sofrido poucas modificações em sua longa existência, superior a três milênios”.

Portanto, podemos refletir que um desenvolvimento natural guia a escrita para o fonetismo, um sistema singular, que se harmoniza de uma função natural que é interpretar a língua falada (a oral), considerada como som; surgindo o alfabetismo como o último aperfeiçoamento da escrita; segundo Vendryès, já se atribui a invenção do alfabeto à civilização egeia, seria então dos egeus que, tanto os gregos, quanto os fenícios, teriam recebido o alfabeto (apud MARTINS, 2001, p. 49).

Pela importância histórica em si mesmo, e pelos textos que o papiro9 conteve, historiadores afirmam que, se tornou o mais memorável de todos os produtos vegetais empregados na escrita.

Com o nome de chartœ, e já pronto para ser usado, o papiro servia para a escrita, sendo o texto executado em colunas; os umbilicus, eram bastonetes que armazenavam os papiros, constituíam os primeiros rolos, antepassados dos de pergaminho, por seguimento, o próprio livro.

O pergaminho, com a proibição da exportação do papiro (ano de 301), os

habitantes de Pérgamo10, foram obrigados a inventarem um novo material de escrita. Eles

9 O Museu do Louvre, conserva um papiro de 273 anos a.C., escrito em hieróglifos demóticos, que são a

última transformação da escrita egípcia (MARTINS, 2001, p. 61).

10 130 a.C., possuía a segunda maior biblioteca do Mundo Antigo; mesmo Marco Antônio tendo dado a

eram rivais de Alexandria e, por isso, extraíram peles de animais (nome de membrana

pergamena, pergamum, pergaminho; material do reino animal).

Também é um dos protagonistas da história da escrita, foi sempre um material de valor exorbitante; o fabricado na Idade Média diferenciava-se da era na Antiguidade por qualidades e defeitos.

“Foi inventado por volta de 175 a.C., feito de pele de carneiro, de cabra ou de bezerro; possibilitando a escrita em ambos os lados, e a costura de suas folhas juntas. Ele abriu caminho para o códice, o precursor do livro” (FLOWER, 2002, p. 130).

A Biblioteca de Pérgamo, da cidade do mesmo nome, capital do reino dos atálidas, que ficava a atual província de Izmir, Turquia Asiática, foi um adas mais importantes do mundo helenístico, depois da biblioteca de Alexandria. [...] também a Biblioteca de Pérgamo desempenhou importante papel na recuperação e reprodução de muitas obras trazidas de todos as partes do mundo helenístico. Mas, ao contrário de seus colegas do Egito, os mestres e bibliotecários de Pérgamo não tinham como preocupação fundamental a fixação dos textos sobre os quais trabalhavam, mas sim a fidelidade às nuanças e singularidades das línguas em que as obras haviam sido escritas. Homero e Hesíodo merecem deles especial atenção (CAMPOS, 1994, p. 108; 109).

Por mais incoerente que se pareça, as bibliotecas, são anteriores aos livros, e até mesmo aos manuscritos; esclarecendo que as bibliotecas medievais são consideradas simplesmente a continuação, ou seja, um prolongamento das bibliotecas antigas, “tanto na composição, quanto na organização, na natureza, no funcionamento: não se trata de dois ‘tipos” de bibliotecas, mas de um mesmo tipo que sofreu modificações insignificantes decorrentes de pequenas divergências de organização social” (MARTINS, 2001, p. 71).

A origem de Alexandria data de 331 a.C., fundada por Alexandre Magno, conhecida como a “cidade nova”; era um centro urbano Grego, de cultura helênica entre terras egípcias, que pretendiam criar a sua própria memória.

Segundo Schwarcz (2017, p. 123),a Biblioteca de Alexandria11 “nascia em meio a imagens distintas, que guardava o conhecimento laico, com uma memória sagrada e uma noção pouco terrena do tempo”.

Sua biblioteca, que se unia a um museu e ao túmulo do imperador [...] com uma memória sagrada e uma noção pouca terrena do tempo. Com efeito, boa parte das bibliotecas da Antiguidade situa-se em templos, sem ter, contudo, função eminentemente religiosa.

11 Seus 700 mil volumes sumiram com parte do conhecimento da Grécia, perda devida ao incêndio que

acabou com toda a coleção e inúmeros documentos, além de livros e muita história (SCHWARCZ, 2017, p. 418).

Segundo os especialistas, só com Aristóteles (384-322 a. C.) é que se alteraria a definição dos livros, reconhecendo-se como fonte de informação e de ensino. O temor da perda não se limitou, porém, apenas ao fogo; ele incentivou a busca de textos ameaçados, a cópia de livros considerados preciosos, a impressão de manuscritos e a construção de grandes edifícios capazes de armazenar impressos, originais, mas também mapas e estampas (SCHWARCZ, 2017, p. 121-123).

Mais que isso, resultante de um esforço coletivo, ela emerge como protótipo e modelo de todas as suas sucessoras. Isto é, estabelece em torno de si e em função das necessidades de seus leitores e usuários, um anova relação com o tempo e com o espaço: tempo de proliferação do saber e espaço de produção de conhecimento; tempo de desejo, de posse e de conservação e espaço de experiências individuais e coletivas que nos relembra, com certa existenciais (SILVEIRA, 2012, p. 202).

Sem a presença do público, e com a ilusão de poder acumular o conhecimento de todas as ciências do mundo, a Biblioteca de Alexandria (Figura 5) durou apenas um século; e foi um local em que os sábios da Antiguidade podiam se reunir para discutir sobre filosofias e outras ciências, e tradicionalmente dominada por homens.

Figura 5_ Biblioteca de Alexandria

(Pintura hipotética, antes de ser destruída pelo fogo em 48 a. C.)

O livro, a palavra escrita, eram o mistério, o elemento carregado de poderes maléficos para os não-iniciados: cumpria manuseá-los com conhecimentos exorcismatórios indispensáveis. [...] a biblioteca foi assim, desde os seus primeiros dias até aos fins da Idade Média, o que o seu nome etimologicamente, isto é, um depósito de livros, e mais o lugar onde se esconde o livro do eu o ligar onde se procura fazê-lo circular ou perpetuá-lo (MARTINS, 2001, p. 71).

Assim, o que evidencia as bibliotecas da Antiguidade é a sua constituição com barras de argila ou, depois, com rolos de papiros e pergaminhos.

Entre 1300 a 1650 (Renascimento), o relevante movimento cultural e científico, proporcionou um grande desenvolvimento para o campo das artes e da literatura; trazendo as perspectivas artificiais, criando uma ilusão de profundidade. Dessa maneira, os humanistas buscam a fidelidade à natureza e o conceito de gênio são usados por Leonardo da Vinci, Rafael Sanzio e Michelangelo.

o manuscrito enrolado se mantém até ao ano de 300, mais ou menos, aparecendo o códex por volta do século IV. A partir de 1470, isto é, já no século XV, começam a aparecer o que chamaríamos de formatos modernos, isto é, livros menores, com a folha dobrada, da mesma forma porque aparecem as primeiras margens. Essas datas todas já nos colocam em plena Idade Média [...] (MARTINS, 2001, p. 80).

Já no século XVII, os monges copistas possuíam várias funções: “além de compilarem documentos, no campo do conhecimento, esses mesmos monges zelavam pelo bom estado da biblioteca” (TEODORO, 2012, p. 43).

Cada mosteiro possuía uma pequena biblioteca, sempre enriquecida pelo trabalho dos escribas, que atuavam por fé, por obrigação, ou ainda, para evitar o tédio. As cópias eram vendidas ou mantidas no acervo; o resultado é que cada mosteiro era quase uma editora, garantida pelo trabalho cativo dos monges, por suas obrigações, que, de uma maneira ou de outra, permitiram a sobrevivência e a difusão dos livros. No mosteiro o livro não era copiado para ser lido; o saber permanecia entesourado, tal qual um bem patrimonial, e revestido de usado religioso. [...] no século XII, a escrita deixa de cumprir apenas função de memorização e conservação e passa a ser entendida como trabalho intelectual (SCHWARCZ, 2017, p. 127).

Com a dissolução da existência do feudalismo, o comportamento e atitudes com relação ao seu destino à sociedade, à natureza e à religião, trouxe a preocupação para empenharem-se nas questões humanistas para criarem uma reforma educacional, que era um desafio para que pudessem elaborar uma nova cultura, já que a dominante existia por predominância de textos da Antiguidade clássica (SEVCENKO, p. 11-14).

Os monges (Figura 6) estiveram de alguma forma, no decorrer de grande parte da Idade Média, associados às bibliotecas que praticamente passaram a se tornar sinônimos entre si. Da mesma maneira que se dizia na época, Clastrum sine biblioteca quase castrum

sine armamentaria: “Um mosteiro sem livros é uma praça de guerra sem provisões”.

Figura 6_ Jean Miélot, escriba europeu em seu escritório.

Fonte: Wikipedia (2020)

Esses religiosos praticavam a leitura coletiva, como a individual; era muito intensiva, e se realizava com poucos livros, que eram absorvidos de maneira respeitosa; os monges liam os mesmos livros diversas vezes, quase sempre em voz alta, e em grupos; pois, só tinham acesso a poucos livros, a Bíblia e uma ou outra obra religiosa; promovendo novas interpretações das leituras; quando muitas delas também ocorriam na clausura, em profunda e íntima solidão.

Nos scriptoria medievais, o espaço onde os livros manuscritos eram produzidos na Europa durante a Idade Média (Figura 7); trabalhavam monges e freiras copistas, alguns dos quais ficaram conhecidos por conta de seus trabalhos, e são estudados e recuperados nos dias de hoje (SCHWARCZ, 2017, p. 126).

Figura 7_ Scriptorium do Mosteiro São Salvador de Tábara (Espanha) Iluminura do século XII representando a torre e o scriptorium.

Fonte:Wikipedia (2020)

A tradição do copista manteve para as futuras gerações os textos antigos, as Sagradas Escrituras, sendo um local apropriado para propagar os ensinamentos éticos e morais12, preservados nas orações ou no registro de tarefas humanas do dia a dia e suas atividades na ciência, no lar e no trabalho em geral.

Na Idade Medieval, os livros eram objetos raríssimos, nos quais recebiam belíssimas ilustrações pintadas com cores fortes, feitas com detalhes delicadíssimos em razão do tamanho dessas; se referiam aos mais diferentes temas, indo das passagens bíblicas às cenas do cotidiano.

12 Ética vem do grego ethiké [epistéme], “a Ciência relativa aos costumes”, pelo latim ethica-, de igual

significado. Moral: Etimologia- lat. moraālis, e ' relativo aos costumes'. Relativo às regras de conduta e

Os irmãos holandeses Johan, Paul e Herman Limbourg se destacam como os ilustradores que produziam exaustivamente, a alcançaram uma fama que vem se estendendo ao longo dos séculos.

Existia também os Livros de horas, manuscritos medievais utilizados para a

oração na vida cotidiana, feitos de pergaminho e geralmente envoltos em veludo carmesim ou chapeados de metais preciosos(Figura 8), cujo talento dos ilustradores se tornava evidente e satisfaziam mais livremente seus talentos.

Por gerar uma reação instantânea do leitor ao ler os livros de horas, promovendo uma intimidade entre ele e a própria obra; consequentemente, promoveu uma reação oficial que criou um maior controle das imagens, dos textos e também um modo que alcançaria com a Reforma Católica, e sua vontade de censurar os artefatos da tipografia. Em meio às suas famosas obras encontra-se um “livro de horas” que à época era uma espécie de livro de orações, muito apreciado pelos ricos; além das preces relacionadas às horas litúrgicas, havia um calendário referente às estações do ano.

As Mui Ricas Horas do Duque de Berry, ricamente decorado e iluminado pelos

irmãos Limbourg, tendo sido pintadas no início do século XV (1410); as pinturas fazem parte de um manuscrito de fino pergaminho de pelica, aludem aos meses do ano, começando pelo mês de janeiro (primeira gravura à esquerda).

As diferenças sociais ficam bem visíveis no conjunto da obra, pois enquanto os camponeses trabalham, os nobres divertem-se (Figura 8)

Figura 8_ As Mui Ricas Horas do Duque de Berry (1410).

Na Roma Imperial, chegavam a 28 as bibliotecas públicas (SCHWARCZ, 2017, p. 125); o Império Romano iniciou com a nomeação de Otávio Augusto no ano 27 a.C. e termina com o fim do Império Romano do Ocidente em 475 d.C., que registra o fim da Idade Antiga e o início o da Idade Média.

No século XV, Gutemberg13 inventa a prensa de tipos móveis, uma revolução para o registro da escrita, promovendo o alastramento de conhecimento escrito; publicação da Bíblia, tornando-se o maior impacto social e cultural um século depois; permitindo a divulgação consistente dos ensinamentos de Lutero sobre o Livro Sagrado. Do humanismo, para o iluminismo, das bases teológicas para a racionalidade, trazendo o espírito científico.

Com as criações das universidades medievais, quase no final do século XI, todo o modo de produzir e armazenar o conhecimento se transforma.; mas, Ciência consumiu

séculos para se diferenciar da magia, enquanto o astrônomo do mágico, o médico do feiticeiro, o químico do alquimista, nada mais natural do que o texto fosse igualmente o Texto, o Livro, como ainda em nossos dias na língua inglesa quando se fala absolutamente

The Book, todos compreendem A Bíblia (Figura 9).

Além disso, a própria literatura não tinha, na verdade, um sentido profano: mágicos ou não, é notável o teor utilitário da maior parte dos livros antigos e medievais (MARTINS, 2001, p. 73)

Aproximadamente na década de 1450, era apenas praticável a reprodução de textos, produzindo as suas cópias à mão. Com a nova invenção, que criam os tipos móveis e na prensa, modificou a relação com a cultura escrita. O custo do livro e o tempo de produção, na oficina tipográfica, diminuíram14 (CHARTIER, 1999, p.7; 9).

O estudo dos incunábulo é hoje, um capítulo da maior importância na história do livro, não apenas pelo que nos revela sobre a técnica de produção livreira nos primeiros cinquenta anos da tipografia, como também pelo alto teor artístico da confecção.[...] O mais conhecido e um dos primeiros e mais belos incunábulos é a Bíblia de Gutemberg [...] O suporte de escrita usado na confecção dos incunábulos era o papel feito de trapos, mas o refinado pergaminho dos manuscritos, o velino, persistiu em esparsas publicações (CAMPOS, 1994, p. 182; 183).

13 Para os textos proibidos, cuja existência devia permanecer secreta, a cópia manuscrita continuava sendo

a regra (CHARTIER, 1999, p.7; 9).

14 Apesar dessa descoberta, a cultura do manuscrito se manteve por um longo período, até aproximadamente

Figura 9_ Exemplar da Bíblia de Gutemberg.

Fonte: Wikipedia (2020)

Entre os séculos XV e XVII, o número de livros amplificou de forma considerável, o papel15 não sofreu qualquer tipo de mudanças, criando um combinado de agitação e angústia, que não estava, de foram alguma, restrita ao Vaticano.

A fascinação humanista com a Antiguidade, que antes era apenas uma fantasia subversiva de acadêmicos, transformou-se num instrumento efetivo de autoridade. Com a Ciência ameaçando a supremacia da teologia e a sua influência legitimadora na esfera política, os governantes foram buscar a preservação e seu poder em ideais clássicos. A biblioteca, que sentia as dores da mudança à medida que os livros multiplicavam-se em número e em espécie, tronou-se um campo de batalha para ideologias opostas (BATTLES, 2003, p. 86).

A partir do fim do século XVI e início do XVII, as imagens utilizadas nos livros16, estavam diretamente relacionadas à técnica da gravura em cobre17, cuja produção era

15 Somente nos anos cinquenta do século XVIII, o papel recebeu um notável aperfeiçoamento graças ao

engenho e a arte de Baskerville, ex-mestre da escrita e ex-gravador de pedras de túmulos[...] O calígrafo Birmingham imprimiu pouco mais de uma centena de livros, entre os quais sua obra-prima, um a Bíblia

in-folio, publicada em Cambrigde, em 1763. Quarenta e cinco anos depois, introduziu-se a tipografia de

prensa manual a ferro, equipada com mármore. Em 1970, surge a máquina de produção contínua, inventada pelo guarda-livros, Louis Essone (CAMPOS, 1994, p. 200; 201).

16 Os livros protegem as memórias, e nos envolvem com seus encantamentos; se remodelam; trazem

informações, e resguardam a história da cultura e suas diversidades, dentro e fora, do mundo acadêmico.

17 A gravura em metal, ou calcogravura, geralmente utiliza o cobre para gravar uma imagem, mas também

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