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Utilização do resistógrafo para avaliação da extensão de defeitos internos

CONSEQUÊNCIAS DA RUTURA

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.2. Análise Visual de Risco

3.2.2. Utilização do resistógrafo para avaliação da extensão de defeitos internos

Caso-de-estudo na Rua da Artilharia 1

O lódão-bastardo deste caso de estudo foi abatido em fevereiro de 2015. Esta árvore apresentava diversos defeitos ao nível da copa e extensa podridão do lenho causada por I. rickii (Figs. 16a, 16b). Tendo-se efetuado leituras com o resistógrafo a várias alturas do tronco (51 cm, 130 cm e 200 cm, acima do colo, em várias direções), nas quatro combinações possíveis de P e V, a comparação do traçado dos resistogramas com o estado do lenho na zona das leituras permitiu determinar a combinação que melhor se adequa à análise de lódãos em pé afetados por I. rickii, complementando os estudos de Martinho (2006). O trabalho desenvolvido por este autor pretendia calibrar o resistógrafo para diferentes espécies arbóreas. Porém, para o caso de C. australis apenas houve hipótese de realizar leituras em provetes e não em árvores em pé. Para Martinho (2006) a combinação ideal para realizar as leituras seria P1V2, ainda que a combinação P2V2 tenha sido igualmente conclusiva. Segundo o mesmo trabalho, as combinações referidas como ótimas para esta espécie podem ser diferentes caso se esteja a analisar uma árvore viva. Com efeito, no decurso de leituras realizadas em lódãos afetados por I. rickii na Alameda dos Pinheiros (38°42'24.57"N, 9°11'52.87"O) já se havia observado que as combinações com P2 (hardwood) nem sempre pareciam mostrar o estado interno do lenho quando era evidente a presença de podridão avançada (dados não mostrados). Da mesma forma, a velocidade V1, quando comparada com a velocidade máxima (V2), parecia ilustrar melhor o estado do lenho.

Durante o ano de 2014 esta árvore (DAP de 48,5 cm) foi objeto de avaliação visual de risco pelo LPVVA tendo sido assinalada a presença de uma extensa lesão com lenho exposto no tronco; ao nível da copa existiam diversos ramos secos e parte da copa morreu durante o verão de 2014 (Figs 9b, 9c). Em fevereiro de 2015 a árvore exibia uma lesão com lenho exposto e apodrecido no tronco, desde o colo até 260 cm de altura, com 40 cm de largura máxima. O teste realizado com o martelo de silvicultor deu positivo desde o colo até 250 cm de altura. Ao nível do tronco, acima dos 200 cm de altura, diferenciaram-se diversas frutificações de I. rickii (Figs. 16c, 16d) e ainda uma frutificação da fase assexuada do mesmo fungo a cerca de 280 cm de altura, numa pernada no lado Sul.

Comparando os resistogramas obtidos com os correspondentes cortes do tronco (Fig. 17) foi possível confirmar que quando se realizam leituras com a posição P1, a escolha da velocidade de avanço da broca é determinante para avaliar a extensão da degradação do lenho por I. rickii. Assim, quando se utiliza a velocidade V2 (Fig. 17a) o resistograma indica degradação a partir dos 13 cm, correspondendo a uma percentagem de lenho são de cerca de 46%. Porém, quando a velocidade utilizada foi V1, o traçado do resistograma mostra degradação incipiente do lenho já antes dos 13 cm, com presença de barreiras de compartimentação, evidenciadas pelos picos no traçado entre os 9 cm e os 13 cm e observáveis na rodela obtida para esta zona (Fig. 17d). No caso da leitura com P1V1 a estimativa de lenho são é de apenas 28%, o que parece ilustrar melhor o estado de degradação do lenho. Quando se utiliza V1 em vez de V2 são mais claramente mostradas as zonas onde já ocorre degradação do lenho, com formação de paredes de compartimentação por parte do hospedeiro. No

caso de I. ricki em C. australis sabe-se que a podridão originada é do tipo deslenhificação seletiva pelo que é frequente observar-se a formação de inúmeras barreiras de compartimentação, que aparentemente impedem que ocorra um avanço mais rápido do fungo (Ramos et al., 2008). Com efeito, a formação de cavidades internas em troncos afetados por I. rickii não é frequente, ainda que possa ocorrer na sequência de lesões não compartimentadas quer no tronco quer em pernadas (Ramos et al., 2008; Annesi et al., 2010).

Figura 16 – Celtis australis abatido em fevereiro de 2015, em Campolide. A árvore

localizava-se num cruzamento com muito movimento automóvel, junto a um quiosque e (a) em maio de 2014 exibia inúmeros ramos mortos e parte da copa secou; (b) ao nível do tronco era já visível uma grande lesão com lenho exposto e apodrecido [as fotos (a) e (b) foram retiradas de www.google.pt/maps/]. Em janeiro de 2015, ao nível do tronco e na base de uma das pernadas diferenciaram-se várias frutificações de Inonotus rickii (c) e (d).

c d

b a

Figura 17 – Resistogramas obtidos em Celtis australis sito na R. Artilharia 1 (a, b e c) e sobreposição

dos resistogramas (a) e (b) na zona de leitura, respetivamente, sobre rodela obtida após abate da árvore (d). Em cada resistograma indicam-se os seguintes parâmetros: altura a que foi realizado, diâmetro do tronco no local de leitura, direção da leitura, combinação PV e localização aproximada do centro geométrico do tronco (assinalado com circulo azul). As bandas a cor dizem respeito, respetivamente a: verde – lenho não degradado; laranja – lenho exibindo algum grau de degradação; vermelho – lenho com podridão ou cavidade.

A realização de novas leituras nas rodelas mantidas em laboratório permitiu chegar a conclusões idênticas (Fig. 18). Nas rodelas mantidas em condições de humidade elevada e temperatura ambiente (durante 10 meses) assistiu-se a uma progressão da podridão e formação de inúmeras massas de clamidósporos de I. rickii (forma assexuada). Mais uma vez, os resistogramas obtidos mostram que a utilização de P1 é preferível à P2 por ilustrar melhor a resistência da madeira. Da mesma forma, para a mesma Posição, a velocidade V1 permite visualizar com maior precisão a existência de degradação incipiente e a presença de barreiras de compartimentação (visíveis no resistograma P1V1 através dos picos aos 9,5 cm, 15 cm e 30 cm, por exemplo). No conjunto de leituras, e tendo em conta a presença de I. rickii no arvoredo que viria a ser analisado na zona de Alcântara, concluiu-se pela utilização da combinação P1V1 para realizar leituras com o resistógrafo IML F-400S.

A discrepância em relação à recomendação de Martinho (2006) para que as leituras em C. australis sejam feitas com a combinação P1V2, poderá estar relacionada com o teor em água da madeira. Com efeito segundo Rinn et al. (1996) e Lin et al. (2003) em algumas madeiras o teor em humidade pode afetar as leituras com resistógrafo, dando origem a leituras em que a estimativa de lenho apodrecido é superior à situação real, no caso de madeiras com elevado teor em humidade.

Figura 18 – Secção de rodela onde se realizaram as quatro leituras com o resistógrafo (a) e

respetivos resistogramas, nas várias combinações de PV (dezembro de 2015).

Lódãos de Alcântara

Depois de efetuar a análise visual de risco (método VTA) de todos os exemplares em estudo na zona de Alcântara, fez-se uma análise dos defeitos encontrados e a sua gravidade, com o objetivo de eleger as árvores onde seriam feitas leituras com o resistógrafo. Assim, para avaliar a eventual presença de podridões ao nível do tronco bem como a sua extensão, elegeram-se 21 indivíduos (5,6% das árvores estudadas) que apresentavam defeitos ao nível do tronco, como lesões ou cavidades com lenho apodrecido exposto, ou quando o teste do martelo era positivo, aos quais se atribuiu uma probabilidade de rutura elevada ou muito elevada, de acordo com Matheny & Clark (1994) (capítulo 2.6.). Foram ainda critérios de seleção o DAP do indivíduo e a existência ao nível da copa de defeitos como ramos excessivamente compridos e pesados, associados ou não à presença

Leitura 1, P1V1

Leitura 2, P1V2

Leitura 3, P2V1

Leitura 4, P2V2

de I. rickii. Todas as árvores selecionadas encontravam-se em zonas onde o trânsito de automóveis ou de pessoas era intenso, ou ainda em locais em que o passeio era utilizado para estacionamento automóvel. As leituras foram realizadas com a combinação P1V1 e os resistogramas obtidos encontram-se no Anexo 3 (árvores #11, 21, 27, 67, 69, 92, 121, 128, 131, 133, 165, 171, 197, 234, 249, 263, 270 e 277). Do conjunto de resistogramas obtidos são de destacar os referentes às árvores #9, 233 e 273 (Fig. 19).

No caso da árvore #9 (DAP 43 cm) a leitura foi realizada a cerca de 90 cm acima do colo, na direção SE-NO, do lado oposto a uma lesão com lenho exposto apodrecido, com 83 cm de altura por 15 cm de largura (Fig. 19a). Pela leitura do resistograma foi possível concluir que a lesão se encontrava devidamente compartimentada e que a degradação do lenho do lado da lesão não ultrapassaria os 2 cm iniciais.

No exemplar #233 detetou-se a presença de um formigueiro no tronco e ainda uma cavidade com lenho apodrecido, a cerca de 110 cm de altura, com dimensões 30 cm X 20 cm. Tendo-se realizado uma leitura com resistógrafo a cerca de 105 cm de altura (Anexo 3) conclui-se que a cavidade estava compartimentada. Realizou-se uma segunda leitura a 33 cm acima do colo (Fig. 19b) tendo sido possível confirmar a presença de uma cavidade entre os 15 cm e os 21 cm de profundidade, sem barreiras de compartimentação. Este perfil é característico de bolsas de podridão ou cavidades associadas à presença de formigas arborícolas ou ainda de térmitas.

A existência de uma fissura longitudinal no tronco, a presença de cavidades com podridões na base das pernadas de grande diâmetro da árvore #273, e teste do martelo positivo na zona do colo foram motivo para efetuar duas leituras a cerca de 25 cm (Fig. 19c) e 50 cm (Anexo 3) acima do solo. Os resistogramas permitiram concluir que a podridão aparentemente tinha uma evolução descendente, a partir da inserção das pernadas, e que cerca de 31% do diâmetro do tronco ao nível do colo apresentava podridão incipiente. De referir uma das pernadas desta árvore já tinha quebrado na Primavera de 2014 e que após a presente avaliação a Junta de Freguesia decidiu pelo seu abate.

O conjunto de leituras realizadas permitiram confirmar a análise visual que havia sido feita para cada uma das árvores em causa, corroborando a atribuição do risco em cada situação. A utilização do resistógrafo, com a consequente obtenção de uma prova física que ilustre o estado do lenho, é por vezes indispensável para complementar relatórios técnicos de análise de risco de rutura. Apesar de, segundo Mattheck & Breloer (1994b) existirem situações em que pela presença de diversos defeitos na árvore e sua gravidade, não ser necessário recorrer à utilização de instrumentos como o resistógrafo para atribuir um grau de risco à árvore, a apresentação dos resistogramas torna de alguma forma mais percetível as conclusões apresentadas e, sobretudo, suportam a tomada de decisão quanto às medidas a tomar para eliminar ou reduzir o risco de rutura.

Figura 19 – Resistogramas obtidos nas leituras realizadas nas árvores #9 (a), #233 (b) e #273 (c). Em cada resistograma indica-se a altura a que foi realizado, diâmetro do tronco no local de leitura, direção da leitura, combinação P1V1 e localização aproximada do centro geométrico do tronco (assinalado com circulo azul). As bandas a cor dizem respeito a: verde – lenho não degradado; laranja – lenho exibindo algum grau de degradação; vermelho – lenho com podridão ou cavidade.