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Vara Única da Justiça Federal em Santarém – TRF 1º Região

Conflito Tradicional – Caso da Terra Indígena Maró – Gleba Nova Olinda I,

4. Instituições Públicas envolvidas

4.8. Vara Única da Justiça Federal em Santarém – TRF 1º Região

Duas ações judiciais transitam na Justiça Federal com o pano de fundo a Ti Maró desde 2010. Na primeira, já citada, o MPF visava compelir a Funai a prosseguir com o processo de demarcação da Ti Maró. a segunda, por sua vez, visava exa- tamente o contrário. sete associações de moradores – das comunidades de Prainha, vista alegre, são Luiz, são Francisco, são Raimundo, Novo Paraíso, Fé em Deus, sempre serve, Repartimento, vista alegre Parintins e dos Parentes –, contrárias à demarcação da Ti Maró, interpuseram a ação de anulação de Processo adminis- trativo cumulada com ação Declaratória de inexistência de etnia e posse indígena em desfavor da Funai e do cacique da aldeia Novo Lugar (processo nº 2091- 80.200.4.01.3902). a ação judicial visava

declarar a nulidade do processo de demarcação da Ti Maró pela Funai, fun- dada em razão de “falsos índios”, requeria que o juízo declarasse pela inexistência da etnia Borari-arapiun, bem como a posse do seu território, além da declaração de resguardo de todos os direitos patrimo- niais das comunidades sobre os recursos naturais de seus territórios. as alegações jurídicas, novamente, se fundaram em argumentos discriminatórios e difamató- rios contra o movimento indígena Maró; alertam para o perigo caso tais movimen- tos continuem a por em risco a ordem pública, a enganar instituições como a Funai e ressaltam os prejuízos econômi- cos e sociais causados pela paralisação/ encerramento da exploração madeireira na região.

o juízo federal, observando a trami- tação da ação Civil Pública do MPF em face da Funai na mesma vara, acabou por não conceder a liminar, decidindo aguar- dar a apresentação do Relatório de iden- tificação e demarcação da Ti Maró. Em setembro último, as autoras da ação pro- tocolaram petição de desistência da ação. a Justiça Federal, assim como a Estadual, acabou por não se posicionar em definitivo nas ações judiciais movidas pelos interessados em torno do conflito na Nova olinda i.

5.

Agentes privados

No desenrolar do conflito, observa-se a presença de diferentes agentes violado- res de direitos agindo de maneira articu- lada durante o processo de demarcação da Ti Maró. Com o vazio institucional característico da amazônia, o despreparo dos agentes do Estado, contando com a morosidade da demarcação da Terra indígena e do ordenamento fundiário da

Nova olinda i, a condição de pobreza das comunidades tradicionais locais, a falta de comunicação entre os órgãos responsá- veis e até a conivência destes – como demonstrado nos itens anteriores –, os agentes privados encontraram poucos obstáculos que pudessem impedi-los de operar seus interesses e violações naquele território.

Já em 2003, a Cooperativa do oeste do Pará (CooEPa), formada por, pelo menos, 50 madeireiros, já tencionava os trabalhos de ordenamento fundiário para a regularização de suas posses recentes. oferecendo empregos temporários aos comunitários da região, distribuindo benesses às comunidades em troca da exploração madeireira e da construção de portos e estradas em suas áreas, a CooEPa ainda deu todo o apoio à cria- ção da associação das Comunidades dos Trabalhadores Rurais do Maró (aCo- TaRM), formada por comunitários que defendiam essa visão de desenvolvimento para a região, além de combater a demar- cação coletiva dos assentamentos a serem criados, inclusive judicialmente.

Em 2006, com a legalização de suas áreas pelo iTERPa, os permutados se organizaram e criam a associação dos Proprietários de Terra do Projeto integra- do Trairão (asPiT), atuando juntamente com a CooEPa na defesa de suas pro- priedades e contra a presença dos indíge- nas naquela região. Para isso, reforçou nas comunidades a ideia já diluída no senso comum regional de que os índios foram “criados por oNg’s internacionais que querem internacionalizar a amazô- nia”. Todos os não-índios perderiam suas terras. os conflitos sociais denunciados eram sumariamente desconsiderados pelo órgão fundiário.

a partir do manifesto no rio ara-

piuns e do acirramento do conflito no Maró, políticos da região e setores empre- sariais ligados à exploração madeireira manifestaram seu apoio em notas, ofícios, cartas e reivindicações aos órgãos res- ponsáveis. o discurso do deputado fede- ral Lira Maia apresentando uma pesquisa científica realizado por seu assessor, inácio Régis, que comprovou uma “muta- ção genética induzida” aos comunitários do Maró, “transformados” em indígenas pelas “oNgs”, reverberou em quase todos os meios de comunicação da cidade e da região amazônica, chegando até a ser publicada na Revista veja.

Tal argumento também aportou na esfera judicial, gerando uma nova forma de criminalização. Neste sentido, as em- presas Rondobel ind. e Com. de Madeiras LTDa, hP do Mojú indústria, Comércio e Exportação de Madeiras LTDa, M2000 Madeiras Ltda, detentores de Planos de Manejo na Nova olinda, moveram diver- sas ações judiciais, fundamentadas em argumentos discriminatórios e difama- tórios apoiados pela mídia, aparente- mente com o intuito de intimidar as lideranças do movimento indígena. a Polícia Civil do Pará chegou a incriminar a liderança indígena, cacique do Novo Lugar, pela prática de falsidade ideoló- gica, pelo simples fato de se afirmar como indígena.

Mais emblemática ainda foi a ação Declaratória de inexistência de etnia e posse indígena proposta pelas comunida- des contrárias a demarcação da Ti Maró e com o apoio de empresas madeireiras, que ofereceram seus advogados para atuar na demanda.

Por fim, e a partir deste estudo de caso, verifica-se que um dos principais agentes violadores dos direitos indígenas é o Estado Brasileiro, que, por meio de suas

instituições, deveria garantir a consolidação dos direitos humanos dos grupos indíge- nas, mas, por atender a interesses econô- micos e políticos, acaba por postergar e violar estes direitos. Como dito acima, o iTERPa não levou em consideração as pre- tensões indígenas sob a área de sua juris- dição, muito menos realizou consultas prévias sobre a legalização de proprieda- des estranhas às comunidades locais. a sEMa legalizou planos de manejo sobre- postos a áreas de interesse indígena, sem realizar consultar prévias e sem capacidade de realizar operações de fiscalizações isen- tas. o Programa Estadual de Defensores de Direitos humanos, onde o cacique está inserido desde 2007, funciona de forma deficiente e precária. a Funai viola os direi- tos devido à morosidade do processo demarcatório do território indígena Maró e à omissão durante o aprofundamento do conflito. a omissão também atinge em parte o Ministério Público do Estado do Pará, que só viria a realizar medidas consis- tentes após o manifesto no rio arapiuns, e ainda propôs a ação penal contra lideran- ças indígenas por falsidade ideológica.

6.

Quadro de agentes e

instituições envolvidas

no conflito

o Quadro 9 é ilustrativo da complexi- dade social e institucional que envolve o conflito fundiário na Terra indígena Maró, revelando uma teia de agentes e instituições que sugere, também, o sentido e o caráter da complexidade que uma adequada solu- ção do referido conflito reivindica.

7.

Quadro da Judicialização do

Conflito

Como foi possível observar, à com- plexidade social e institucional corres-

ponde, também, uma intensa prática liti- gante envolvendo os respectivos sujeitos, agentes e instituições, conforme o Qua- dro 10 demonstra.

8.

Panorama Atual do Conflito