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CAPÍTULO 4 Apresentação e discussão dos resultados

4.1. Análise exploratório descritiva

4.1.5. Variação interindividual do desenvolvimento gestual

Para ir ao encontro da questão de investigação: Regista-se variação interindividual no desenvolvimento gestual?, optou-se por tratar graficamente, de forma isolada, a distribuição trimestral dos tipos constantes da dimensão gesto por participante.

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Verifica-se que o comportamento e a evolução trimestral referente à dimensão gesto do participante 1 se revelam bastante irregulares já que a onda de distribuição não é ascendente, mas oscilante entre trimestres.

Em conformidade com o exposto na representação gráfica de dados globais, no gráfico 8, o tipo aponta é o gesto mais expressivo em termos do número de frequências absolutas, por trimestre, da criança. De registar um acréscimo acentuado deste deítico nos 3.º e 5.º trimestres. Também os gestos ostensivos mostra e dá se apresentam em todos os trimestres, à exceção do 1.º, de forma expressiva, seguidos dos tipos convencional, pede, recusa e gesto icónico. O 5.º trimestre revela-se o período mais produtivo em termos de número de ocorrências por tipo (token) e também na ocorrência de todos os tipos considerados (type).

Uma análise mais minuciosa permite perceber que os gestos convencionais emergem desde o 1.º trimestre, prolongando-se por todo o período aferido.

Apresenta-se, de seguida, a distribuição de frequências relativas ao participante 2, para os tipos da dimensão gesto.

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Quando se observa o gráfico 9, verifica-se que o gesto aponta se destaca, claramente, dos restantes tipos em termos do número de frequências absolutas na evolução trimestral do participante 2. Dos gestos considerados, há a sublinhar ainda os tipos convencional, pede e dá que apresentam valores expressivos face à globalidade dos dados. De referir a pouca expressividade do gesto icónico face aos demais tipos, revelando-se o menos produzido pelo participante 2.

Comparativamente ao participante 1, nota-se que o 2 apresenta um número de frequências absolutas de produção de gestos bastante acentuado, quando se atenta na escala de magnitude dos dois gráficos. Já anteriormente (cf. gráfico 5) se tinha feito referência ao participante 2 pela demonstração largamente superior em termos de número de gestos produzidos no primeiro e segundo anos de vida. Deste modo, embora se registem valores absolutos mais expressivos de gesto, ou seja, maior quantidade de produção de gestos (token), a execução dos tipos (type) da dimensão gesto é similar ao observado na evolução trimestral do participante 1. Tanto o participante 1 como o 2, ainda que apresentem valores globais distintos, executam todos os tipos. De salientar ainda a ocorrência dos gestos convencionais desde o 1.º ao último trimestre, tal como observado e descrito na análise global referente ao gráfico 8.

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Contrariamente ao que se reconheceu no gráfico 8, a onda de distribuição do comportamento trimestral do participante 2 é ascendente, registando-se, porém, um ligeiro retrocesso no 5.º trimestre ao nível da produção dos tipos de gesto.

Seguidamente, apreciam-se os resultados referentes ao participante 3.

Gráfico 10 - Distribuição trimestral dos tipos na dimensão gesto para o participante 3

O comportamento evolutivo do participante 3 mostra-se similar ao observado nos dados do gráfico 9, relativos ao participante 2, fundamentalmente, a nível da distribuição ascendente da produção do gesto e ocorrência dos tipos gestuais. De destacar, também neste gráfico, a ocorrência dos gestos convencionais desde o 1.º trimestre. A progressão global é, contudo, menos acentuada no comportamento do participante 3 quando se dá atenção às escalas de magnitude presentes nos dois gráficos.

Conforme analisado nos gráficos de dados parciais (gráficos 8 e 9), também neste diagrama o tipo mais expressivo da dimensão gesto é o aponta, seguido do gesto convencional, dá, mostra e pede. Do mesmo modo, o gesto icónico é o tipo menos

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produzido pelo participante 3. O gesto recusa surge também apresentando valores pouco assinaláveis.

Em termos do número de frequências absolutas dos vários tipos, verifica-se que segue um padrão gradualmente ascendente, não se registando retrocessos a sinalizar.

Apresenta-se, por último, a distribuição, por trimestre, das frequências absolutas dos tipos da dimensão gesto para o participante 4.

Gráfico 11 - Distribuição trimestral dos tipos na dimensão gesto para o participante 4

Os dados estatísticos patentes no gráfico 11 revelam que o tipo mais produzido é também o aponta. No entanto, os gestos pede e convencional ganham maior expressão comparativamente aos outros gestos no comportamento deste participante.

Verifica-se ainda que até ao 4.º trimestre a dimensão gesto evolui ao nível do número de frequências. Todavia, entre o 4.º e o 6.º trimestre, assiste-se a um comportamento de estagnação justificado pelos valores semelhantes de um trimestre para o outro.

Se compararmos o perfil evolutivo dos participantes 1, 2, 3 e 4, percebemos pelas escalas de magnitude configuradas nos respetivos gráficos que o primeiro

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participante apresenta um valor global de gestos bastante inferior aos dos restantes participantes.

Em síntese, se se proceder a uma análise transversal, regista-se uma ligeira variação interindividual a nível do desenvolvimento gestual no percurso comunicativo dos quatro participantes. Porém, o facto de todas as crianças produzirem os gestos considerados neste estudo (aponta, pede, mostra, dá, recusa e gestos icónicos), entre os 0;7 e os 0;24 meses, é evidente.

Conforme ficou patente nas análises anteriores, o tipo aponta revela-se o gesto mais produzido pelos participantes, seguido, em percentagens menores, dos gestos convencional e dá.

Os gráficos parciais, por criança, deram a saber que os gestos dá e mostra (ou gestos ostensivos, para Rodriguez, Moreno-Nunez, Basilio e Sosa, no prelo) emergiram precocemente e revelaram alguma estabilidade, trimestralmente.

A categoria de gestos convencionais merece igualmente especial atenção pelo facto de se apresentar transversalmente na distribuição dos quatro participantes desde o 1.º ao 6.º trimestre, com valores de frequência de razoável significância. Não será alheio o facto de o output gestual dos cuidadores comportar bastantes gestos convencionais, como, por exemplo, acenar adeus, mandar beijinhos, bater palmas, chamar alguém gestualmente, e indicar não está, não há por gestos.

Os dados aqui apresentados corroboram o exposto por Capirci e Volterra (2008) sobre a primeira fase do continuum de desenvolvimento gestual, na medida em que referem a emergência destes gestos nas primeiras produções intencionais dos participantes.

Se perspetivarmos os gestos convencionais como emblemas (cf. os continua de Kendon, no ponto 1.1.3.), compreendemos que o caráter sintético destes gestos, ou o facto de uma unidade de gesto concentrar uma forma simbólica, promove uma apropriação mais facilitada por parte da criança, na medida em que, nos primeiros anos, a perceção e categorização do mundo é realizada de forma holística e indiferenciada.

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Os gestos convencionais são percebidos e produzidos pelos membros de uma comunidade e decorrem da imitação dos gestos do adulto, sendo aprendidos a partir das primeiras rotinas interativas sociais. Estes gestos refletem hábitos sociais e tradições culturais. Para Guidetti (2002), os gestos convencionais emergem precocemente e são permanentes nos repertórios gestuais dos indivíduos. São gestos dependentes do contexto, cujo referente está ausente ou distante, podendo ser produzidos sem acompanhar a fala.

Esta sucinta reflexão sobre os gestos convencionais tem na base a importância do papel das relações interpessoais no desenvolvimento linguístico dos sujeitos. Retomando a perspetiva interacionista, a linguagem é adquirida naturalmente em situações interativas entre crianças e progenitores. Os adultos revelam-se atores determinantes nos contextos interativos sincronizados, já que organizam experiências de modo a que a criança possa participar, providenciando gradualmente a sua autonomia. Não obstante a variação individual, cada criança percorre um trajeto de desenvolvimento linguístico mediado por outrem, dado a linguagem ser um fenómeno de natureza social que se constrói a partir de práticas partilhadas pelos falantes de uma comunidade linguística.