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Consideramos que o processo de verticalização e ex- pansão da cidade de Vitória teve início em meados do século XX. Os primeiros indícios ocorreram em 1926, com a autorização da construção (figura 36) do Teatro Glória (figura 35) com cinco pavimentos, no centro da cidade.

O prédio foi o primeiro a destoar da paisagem urbana do período e seria o ponto de partida de um processo intenso de verticalização, precedido por uma série de aterros que deram início ao processo de horizontali- zação que se extendeu até o final da década de 1970. Em meados do século XX, a população da capital continuou se expandindo em todas as direções: Novo Arrabalde, área central, oeste (Vila Rubim) e para o noroeste da ilha (destaque para a construção da ro-

dovia Serafim Derenzi). Foi na década de 1940 que fo- ram aprovados projetos de grandes edifícios na região do Parque Moscoso e nas imediações. Essas construções geraram grande impacto visual:

A construção desses edifícios vai desencadear o início do processo de verticalização que vi- ria a causar uma severa ruptura visual na pai- sagem da cidade através das alturas, da massa, da escala e da forma das edificações no contex- to da paisagem natural (KLUG, 2009, p. 45).

Fig. 36 – Inicio das obras do Teatro Glória (à esquerda da foto), 1927. Fonte: Biblioteca Central da Ufes.

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Em 1954, com a promulgação da Lei nº 351, cujo con- teúdo delimitava a altura máxima dos edifícios em doze andares para os edifícios construídos na região do Parque Moscoso e arredores, vemos de forma oficial e legalizada o processo de verticalização do centro de Vitória. Até mesmo na região da Cidade Alta, nos arredores do Palácio Anchieta, os grandes edifícios foram autorizados.

A altura já era equivalente a prédios de seis ou sete pavi- mentos, podendo chegar a doze.

Por ter ocorrido em sua maioria sem planejamento e atendendo interesses particulares e econômicos, des- considerando assim a estética, o patrimônio histórico e

Fig. 37 – Vista aérea do centro de Vitória, região do porto, em 1961. Fonte: Instituto Jones do Santos Neves.

Fig. 38 – Vista do Porto, 1900. Fonte: Biblioteca Central da Ufes.

fatores ambientais, por exemplo, o processo verticali- zação trouxe significativas perdas para a paisagem da capital, em especial para a área central.

Podemos observar na figura 37 o aumento na quanti- dade de prédios na área central no início da década de 60 e como essa nova paisagem rompe com o panora- ma histórico da cidade de Vitória (figura 38). Nesta época a legislação aumentou o limite de altura dos prédios de 12 para até 25 andares criando imen- sos paredões frente à baía.

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Patrícia Guimarães Pinto | Priscila de Souza Chisté Leite Fig. 39 – Bairro Jesus de Nazareth, dias atuais. Fonte: Izabella Santiago.

O processo de expansão tem continuidade na década de 70 e com a promulgação da Lei nº 1994, o limite para construção é flexibiliza- do reforçando o aspecto desordenado das edificações. Alguns anos mais tarde, em 1973, o PDI (Plano de Desenvolvimento Integrado de Vitória) identifica a necessidade de se preservar elementos naturais da paisagem como a vista da baía e limita as construções em seis pa- vimentos. No entanto, a identidade histórica do centro de Vitória já estava comprometida de forma definitiva.

Dentro do processo de crescimento populacional da capital, verifica- mos uma falta de política habitacional por parte do governo. Nesta dinâmica, os pobres foram expulsos das regiões remodeladas no cen- tro, instalando-se nas periferias como a região oeste e noroeste.

A segregação do espaço é visível na nova composição da cidade. Bairros foram se formando sem receber infraestrutura ade- quada. Os maciços e encostas foram ocu- pados por trabalhadores que chegavam à cidade em busca de melhores condições de vida.

Na figura 39 vemos o bairro Jesus de Naza- reth que começou o processo de ocupação na década de 50, se consolidando duas dé- cadas depois. Além da proximidade com a região central, possuía na pesca abundante, fonte de renda e sobrevivência das famílias. Para Harvey (1980) e para Lefebvre (2008), a diferenciação residencial deve ser inter- pretada em termos de reprodução das rela- ções sociais dentro da sociedade capitalista:

[...] a alienação urbana envolve e perpetua todas as alienações. Nela, por ela, a segregação generaliza-se: por classe, bairro, profissão, idade, et- nia, sexo (LEFEBVRE, 2008, p. 89).

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Em meados de 1970 começou a construção da Ponte Darcy Castelo de Mendonça, mais conhecida como Terceira Pon- te (figura 40), ação que impulsionou e valorizou ainda mais a expansão para a região do Novo Arrabalde e adjacências.

Fig. 40 – Início da construção da Ponte Darcy Castelo de Mendonça (Terceira Ponte), 1980. Fonte: Biblioteca Central da Ufes.

A ponte Darcy Castelo de Mendonça foi a terceira ponte interligando Vitória à Vila Velha e teve imensa importância por dar à cidade uma nova perspectiva de vê-la além de fornecer novo acesso ao continente. Passando por ela, sentido Vila Velha/Vitória vemos elementos fortes da paisagem como as Ilhas do Boi e do Frade, a Pedra dos Olhos, o porto, além dos morros, áreas que haviam sido escondidos pela nova configuração imobiliária do centro da cidade.

O processo de verticalização da cidade é resultado da população crescente, da instalação de grandes empresas e desen- volvimento da economia local, sentido intrínseco à expansão do capitalismo e processo de modernização mundial.

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Patrícia Guimarães Pinto | Priscila de Souza Chisté Leite Fig. 41 – Vista de Vitória a partir de Vila Velha – Região da Enseada do Suá e bairros vi- zinhos com grandes edificações. Ao fundo os maciços rochosos. Fonte: Arquivo pessoal.

[...] com as transformações no Centro, a eli- te – no final da década de 1960 e durante a década de 1970 – começa a deixar de for- ma mais intensa essa área, procurando um bairro mais aprazível, no que diz respeito à moradia. E a Praia do Canto torna-se o bair- ro onde essa classe passa a residir, não mais nas mansões de décadas anteriores, mas sim, nos apartamentos dos edifícios, que aos poucos vão subindo em altura, caracte- rizando o desenvolvimento da verticalização nessa década (1970) (GOMES, 2009, p. 96).

Esse crescimento abriu espaço para uma forte especulação imobiliária onde algu- mas áreas da cidade receberam estímulo para o crescimento. Determinados perfis de moradores eram atraídos para áreas es- pecíficas e essa prática se multiplicou por vários lugares da ilha, sempre atendendo ao perfil desejado para o local.

Assim, alguns loteamentos como a Praia do Canto tiveram a venda facilitada para funcionários públicos e pessoas com maior poder aquisitivo, enquanto outros bairros como Santo Antônio foi loteado e

vendido para a população de baixa renda. Os espaços de convivência antes utilizados pela população, trans- formaram-se em meras vias de acesso onde as pessoas apenas tran- sitavam apressadas, priorizando o convívio privado em detrimento do público, tendo como prioridade o “ter” em detrimento do “ser”, representação máxima da sociedade capitalista e vida moderna. Com base no percurso histórico contextualizado no presente capí- tulo, abordando o processo de modernização da cidade de Vitória, foram pensados dois roteiros que serão apresentados no próximo capítulo. O objetivo das propostas foi proporcionar ao leitor per- cursos que possibilitassem a prática e a discussão in loco dos espaços da cidade e os seus aspectos contraditórios envolvidos no processo de modernização abordado neste livro como um todo.

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O recorte mais exato não é forçosamente o que faz uso da menor unidade de tem- po – se assim fosse, seria preciso então preferir não apenas o ano à década, mas também o segundo ao dia. A verdadeira exatidão consiste em se adequar, a cada vez, à natureza do fenômeno considera- do. [...] as transformações da estrutura social, da economia, das crenças, do comportamento mental não seriam ca- pazes, sem um desagradável artifício, de se dobrar a uma cronometragem muita rígida.

Marc Bloch, 2002

Fonte: Instituto Jones dos Santos Neves. Bonde elétrico, Praça Costa Pereira, 1930.

60 Educação na cidade: o processo de modernização da cidade de Vitória em debate Fig. 42 – Centro histórico de Vitória, anos 20. Fonte: Biblioteca Central da Ufes.

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Patrícia Guimarães Pinto | Priscila de Souza Chisté Leite

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