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2.7 Fatores que influenciam a tolerância ao Risco

2.7.3 Vieses Comportamentais

2.7.3.1. Viés do Autocontrole e a tolerância ao risco

Kocher, Lucks e Schindler (2016, p. 2) definem o autocontrole da seguinte forma: “o autocontrole é a capacidade individual de anular ou inibir tendências comportamentais indesejadas, como impulsos, e de não agir de acordo com elas”.

De acordo com Pompian (2015, p. 211) o viés de autocontrole é uma tendência comportamental humana que faz com que as pessoas deixem de agir em busca de seus objetivos mais abrangentes e de longo prazo devido à falta de autodisciplina. O autor pontua ainda que “o dinheiro é uma área em que as pessoas são notórias por exibir falta de autocontrole”.

De acordo com Kocher et al. (2016), o autocontrole é necessário para proteger o indivíduo contra o otimismo excessivo, contra ações motivadas por respostas emocionais e decisões impulsivas. Além disso, o autocontrole é necessário para se ater aos planos feitos no passado.

Na psicologia, as habilidades de autocontrole e a força de vontade são definidas como a capacidade para anular ou inibir tendências comportamentais indesejadas, como impulsos, e para não agir de acordo com elas (Tangney, Baumeister & Boone, 2004).

Nunes et al. (2015) ressaltam:

O autocontrole é uma importante capacidade humana. Por impedir as pessoas agirem impulsivamente, constitui um fator crítico tanto na em Economia como em Psicologia. Enquanto na Economia ele é definido como a capacidade de executar planos anteriormente definidos e, portanto, realizar escolhas intertemporais consistentes, na Psicologia o autocontrole é definido como a capacidade de regular os próprios comportamentos, emoções e pensamentos. (p. 190)

Thaler e Sheffrin (1981) consideram que as pessoas vivem constantemente como participantes de processo dual, num conflito entre o curto e o longo prazo. Nesse sentido, o indivíduo atuaria como o planejador e o realizador (planner x doer). O planejador se preocupa com o futuro, enquanto que o “realizador” se preocupa com o período presente e é completamente míope e egoísta. Os autores comparam esse dilema com o existente entre acionistas e executivos de uma empresa, em outras palavras, o caracterizam como conflito de agência.

Os autores tratam o autocontrole em um modelo formal de escolha intertemporal, modelando o homem como um planejador e muitos executores, sendo

que os últimos são míopes – no sentido de enxergarem apenas o curto-prazo – e egoístas, pois buscam o prazer imediato de forma inconsequente. Os indivíduos fariam uso então de várias das estratégias, as quais são também utilizadas pelas empresas para reduzirem esses conflitos de interesse. Essas estratégias podem envolver algum incentivo ou a implementação de um pré-compromisso ou regras que consigam evitar que o processo de decisão fique completamente nas mãos do empregado ou, no caso do conflito interno do indivíduo, para evitar que a decisão fique inteiramente nas mãos do “realizador” (Thaler & Sheffrin, 1981).

Thaler e Sheffrin (1981) afirmam ainda que os indivíduos costumam usar algumas técnicas básicas para alterar os incentivos do “realizador”. Uma delas é o monitoramento frequente das ações, por exemplo, por meio de orçamentos semanais para o caso de gastos e de contagem de calorias no caso de dietas. O fato de acompanhar o que está acontecendo parece contribuir para que as atitudes do “fazedor” não destoem tanto do que foi proposto pelo planejador. Outras técnicas podem ser utilizadas, como por exemplo, a permissão para que o “realizador” poupe por meio da aquisição de um determinado bem. Neste caso, a miopia do realizador não inibiria a poupança. Outros utilizam ainda uma espécie de incentivo reverso, como os alcóolatras que tomam medicamentos que farão com que passem mal se beberem.

Fudenberg e Levine (2006) também defendem que os de problemas de decisão que envolvem autocontrole podem ser vistos como um jogo entre uma sequência de “eus” impulsivos de curto prazo e um “eu” paciente de longo prazo. Segundo esses autores, essas conclusões são consistentes com as evidências recentes de estudos de ressonância magnética que sugerem que o comportamento impulsivo de curto prazo está associado a diferentes áreas do cérebro a que estaria o comportamento planejado a longo prazo.

Também para Lucks (2016), o autocontrole pode estar diretamente relacionado às perspectivas de sistemas duais de tomada de decisão. Como é destacado por Kahneman (2012), há sistemas estruturalmente diferentes no processamento de informações: um deles induz à produção de formas de comportamento impulsivas e amplamente automáticas (sistema 1), enquanto o outro leva a formas de comportamento deliberadas e amplamente controladas (sistema 2). O sistema 2 é trabalhoso e requer recursos de autocontrole. Assim, se esses recursos são baixos, as operações reflexivas podem ser prejudicadas, levando a um predomínio de reações impulsivas que poderiam estar em conflito com o raciocínio objetivo. Nessa

perspectiva, a redução das habilidades de autocontrole pode ser interpretada como o aumento do papel do sistema 1 (impulsivo) na tomada de decisão (Hofmann, Friese & Strack, 2009).

O autocontrole é considerado um fator de sucesso em investimentos por investidores conhecidos como Warren Buffet, por exemplo. Buffet diz que o sucesso em investir não é relacionado à inteligência e sim ao controle dos próprios impulsos (Kocher et al. 2016). Além do senso comum, o autocontrole também é destaque nos trabalhos de vários estudiosos que encontraram evidências da existência de relação entre o autocontrole e o sucesso dos investidores (Lucks, 2016).

Lo, Repin e Steenbarger (2005) aplicaram uma survey sobre emoções e personalidade com operadores participantes de um programa de treinamento on-line e encontraram que aqueles com reações mais intensas a ganhos e perdas tiveram perfomances significativamente piores. As auto-avaliações dos pontos fortes e fracos desses participantes sugeriram que o autocontrole seria um fator altamente relevante para o sucesso nos investimentos.

De acordo com Lucks (2016), nos últimos anos, o autocontrole tem recebido atenção considerável na economia comportamental, na maioria das vezes, como uma explicação para a tomada de decisão inconsistente no tempo. Esse autor prossegue dizendo que a teoria econômica modelou o autocontrole de várias maneiras, a fim de explicar observações difíceis de conciliar com o modelo racional de maximização da utilidade esperada. Nesses modelos, a falta de autocontrole pode causar decisões contrárias aos interesses de longo prazo de um indivíduo, tais como comportamento relacionado a vícios, falta de poupança e procrastinação (Bucciol, Houser & Piovesan, 2010).

Lucks (2016) se apoia na suposição de que o autocontrole é um recurso limitado e que é variável ao longo do tempo no nível individual. De acordo com esse autor, baseado em autores da psicologia, exercer autocontrole consome energia e consequentemente diminui os recursos disponíveis para outros atos que exigem autocontrole. As habilidades de autocontrole se regeneram através do repouso, podem ser treinadas e diferem entre as pessoas (Muraven & Baumeister, 2000; Tangney et al., 2004; Muraven, 2010, Lucks, 2016). Bucciol, Houser e Piovesan (2011, 2013) mostram em experimentos de campo com crianças e adultos, que o esgotamento do autocontrole leva à redução da produtividade em tarefas subsequentes.

Alguns autores, como Kostek e Ashrafioun (2014) e Unger e Stahlberg (2011), estudaram as consequências das variações do autocontrole na tomada de decisão sob risco e relataram aumento da aversão ao risco após o esgotamento do autocontrole. No entanto, outros estudos também revelam um aumento na tolerância ao risco após manipulações semelhantes no autocontrole do grupo estudado (Bruyneel, Dewitte, Franses & Dekimpe, 2009; Friehe & Schildberg-Hõorisch, 2014). Já Gerhardt, Schildberg-Hörisch & Willrodt, (2017) não encontraram efeito significativo de manipulações de autocontrole nas preferências de risco dos indivíduos estudados.

Pompian (2015) observa que alguns vieses emocionais se relacionam mais ao medo, ou seja, ao desejo de proteção (aversão ao risco) e outros se relacionam mais à “ganância”, ou ao desejo por riqueza, juntamente com a maior disposição em correr riscos para obtê-la. De acordo com esse mesmo autor, os vieses de aversão à perda, status quo e medo de arrependimento se relacionam mais fortemente ao medo, portanto, indivíduos com esses vieses tendem a ser mais avessos ao risco.

De acordo Pompian (2015), o autocontrole, por sua vez, está mais relacionado à ganância, ou ao desejo de riqueza. Aqueles com maior autocontrole têm menor influência do medo, portanto, essas pessoas tenderiam a aceitar maior risco para terem a possibilidade de atingir maior riqueza.