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2 O ESTADO DO CONHECIMENTO E AS ESCOLHAS METODOLÓGICAS DA

4.4 Principais características

4.4.1 As Orquestras de Metais e suas atividades

4.4.1.3 Vibração Labial

Pensando em uma sequência para a iniciação dos alunos a essas técnicas, o próximo passo seria orientar sobre a vibração labial sem bocal, levando os alunos a tentarem reproduzir o som do motor de um carro, por ser uma analogia de fácil compreensão e que faz parte do cotidiano das crianças. A partir da vibração dos lábios, esse era o momento para o posicionamento do bocal. O professor Adalto (2018a) afirma que:

[...] o primeiro contato do bocal contra o lábio dos alunos era eu que colocava. Então ele já criava uma memória física de posicionamento, a partir de mim. Então eu fazia essa interferência. Você primeiro mostra. Algumas pessoas falam: embocadura natural. Bom, embocadura natural a partir do momento que você dá uma orientação. Se uma pessoa vai fazer uma embocadura e está colocada de qualquer jeito, não é assim! Então eu fazia essa orientação. Depois eu deixava com ele [o aluno] [...].

A partir dessa orientação do posicionamento do bocal nos lábios e para a formação da embocadura, os alunos já tinham a possiblidade da emissão dos primeiros sons nos seus respectivos instrumentos. Para esse processo, o professor Adalto (SOARES, 2018b, p. 107) apresenta em sua tese um passo a passo dessas etapas para a emissão do som, que são: 1 - Postura; 2 - Posicionamento da embocadura; 3 - Posicionamento do bocal; 4 - Inspiração; e 5 - Expiração de forma contínua, permitindo a vibração labial e, consequentemente, a produção do som.

A vibração labial que era realizada inicialmente somente com notas longas passou a ser trabalhada como flexibilidade, através de glissandos com intervalos de quintas descendentes. Cada nota era realizada duas vezes, descendo de meio em meio tom.

Figura 14: Exercício de vibração labial com glissando

Fonte: SOARES, 2018b, p. 124.

Outro exercício de vibração labial com glissando16 (figura 14) também foi apresentado pelo professor Will Sanders. Descendo em semitom, o exercício tenta evitar qualquer movimento dos músculos da embocadura, o que se tornava um desafio a mais para os alunos da Lyra.

Figura 15: Exercício de vibração labial com glissando

Fonte: SOARES, 2018b, p. 134.

4.4.1.4 Aula Teórica

Na Lyra Tatuí o processo inicial da rotina de estudos era composto por alongamento, exercícios de respiração e vibração labial (sem e com bocal). Antes de irem para a prática com os instrumentos, os alunos recebiam orientações teóricas sobre leitura musical e seus diversos conteúdos como pentagrama, clave de sol e de fá, figuras e valores musicais, fórmula de compasso, barras de compasso e de repetição. Essa etapa de aquecimento e teoria que antecedia o contato com o instrumento durava em torno de vinte minutos (SOARES, 2018b).

Além das atividades técnicas durante os ensaios, uma vez por mês era realizado uma avalição para verificar o desenvolvimento dos alunos e possíveis aspectos a serem melhorados. Essa avaliação ocorria de forma oral, onde os alunos respondiam sobre conteúdos abordados como teoria musical, história da música e do Brasil, dentre outras questões, através de discussões com todos; e de forma prática, onde após orientações sobre a exposição ao público cada aluno apresentava exercícios trabalhados nas aulas perante os demais, simulando uma

16 O glissando é um elemento de técnicas estendidas muito comum na música popular e contemporânea a partir do século XX. É basicamente uma técnica para chegar de uma nota a outra com o efeito de “deslizar” (SILVA, 2016b, p. 27).

apresentação. Posteriormente havia discussões sobre o que foi apresentado buscando aprimoramentos.

Na Lyra Bragança são realizadas aulas teóricas distribuídas entre dois professores, abordando o aprendizado da teoria musical, solfejo e percepção. A professor Kathia Bonna trabalha com os alunos mais antigos e o Leandro Ramazzini fica com os iniciantes.

Figura 16: Aula de teoria musical na MB Cases com Kathia Bonna

Fonte: http://mbcases.com.br/pt/projeto-lyra-braganca/

Tendo sido aluna de Osvaldo Lacerda, Kathia ressalta utilizar nas aulas teóricas os livros e a metodologia de seu professor, além do livro de teoria do Bohumil Med17 e do Pozzoli18 rítmico e melódico. Kathia destaca também que devido às faixas etárias e níveis de aprendizado diferentes na mesma sala, é necessário utilizar diversas estratégias para que os alunos absorvam o conteúdo musical, recorrendo muitas vezes a desenhos e linguagem corporal.

Considerando a importância da compreensão e leitura musical para o desenvolvimento do músico, esse trabalho é realizado progressivamente, motivando os alunos conforme a evolução dos grupos. À medida que determinadas dificuldades sejam superadas, novos elementos são inseridos através do repertório, proporcionando um constante processo de aprendizagem.

17 MED, Bohumil. Teoria da Música 4. ed. ver. e ampl – Brasilia, DF: Musimed, 1996.

4.4.1.5 Prática Instrumental

O primeiro contato com o instrumento escolhido por cada aluno19 na Orquestra e Metais Lyra Tatuí foi um momento de ansiedade. Para esse momento com os instrumentos foram utilizados e distribuídos para cada naipe o método de ensino coletivo americano Belwin 21st

Century Band Method de Jack Bullock e Anthony Maiello, que contém exercícios e músicas

folclóricas americanas. Foram dadas orientações em relação a como utilizar a respiração para a emissão do som, postura, forma de segurar os instrumentos, pronúncia da sílaba “tá” para o início da nota, dentre outras questões.

Caso algum aluno apresentasse dificuldade em emitir o som, uma orientação específica era dirigida de forma individual para que o mesmo pudesse superá- la. Ao mesmo tempo em que era passada a orientação, pedia-se para que todos prestassem atenção para que, no futuro, também pudessem auxiliar outros a solucionar questões referentes às técnicas de emissão sonora (SOARES, 2018b, p. 112).

Dessa forma, o processo com o instrumento ocorreu de forma similar sempre que uma nova nota era apresentada, sendo que a partir da quinta nota, exercícios para o desenvolvimento da embocadura e para articulação foram apresentados.

Quadro 5: Processo de iniciação aos instrumentos de metal na OMLT.

Fonte: Elaborado pelo autor.

Um fator importante de estímulo para os grupos destacado pelos idealizadores dos projetos é manter a motivação dos envolvidos. Adalto e Marcus relataram sempre estar inserindo novos desafios técnicos e musicais no repertório estudado. Uma questão positiva desse procedimento é a prática dos professores em escreverem os arranjos direcionados ao nível técnico dos músicos.

19 É importante salientar que essas escolhas se deram pela disponibilidade dos exemplares, de acordo com a ordem de inscrição (SOARES, 2018b, p. 112).

Alongamento Respiração

Vibração Labial

sem e com bocal

Aula Teórica

Prática com Instrumento

4.4.1.6 Notas longas

Exercícios de notas longas são tradicionalmente desenvolvidos por vários instrumentos. Em algumas escolas ou grupos esse trabalho se expande a toda a banda ou orquestra, tendo materiais próprios para esse tipo de exercício. Consideradas como uma espécie de aquecimento ou estímulo ao início da prática com o instrumento, as notas longas geralmente estão entre os primeiros capítulos dos principais métodos para os instrumentos de metal.

Na Lyra Tatuí alguns exercícios eram realizados utilizando escalas ascendentes e descendentes em uníssono, cada nota com duração de oito tempos em uma pulsação lenta e com foco na sonoridade, afinação e músculos envolvidos na respiração. Outra abordagem utilizada, nesse estudo, consistia em tocar notas longas em falsetto. No estudo, tocava-se Dó3 e depois Ré3 usado normalmente os pistons ou a vara do instrumento, e depois tocava-se a última das notas sem a utilização dos pistons ou vara (instrumentos de pistons e rotores ficavam sem acionamento e os trombones com a vara fechada na primeira posição). O Ré3 era soado somente com a vibração labial. Dessa forma, seguia o estudo acrescentando novas notas até se completar a escala. Ou seja, Dó3, Ré3, Mi3 e depois somente o Mi3 era tocado sem a utilização das posições, e assim por diante, como mostrado na figura abaixo. As notas a serem tocadas em falsetto estão representadas com o sinal de +.

Figura 17: Notas longas com falsetto.

Fonte: SOARES, 2018b, p. 135.

Adalto enfatiza que esse estudo se mostrou “muito eficiente para a formação da embocadura, equilíbrio da sonoridade entre as regiões grave e médio, bem como para o controle da afinação” (SOARES, 2018b, p. 136). Nesse sentido, um exercício também realizado era o de notas longas com frullato20, que se mostrou eficiente para a melhoria da qualidade sonora e

segurança nas articulações. Buscar novas formas de realizar os estudos possibilita aos alunos outras formas de aprendizado e desenvolvimento.

20 Segundo Silva (2016b, p. 23) a produção do frullato se dá por “[...] um rápido movimento da ponta da língua, da mesma maneira da pronúncia dos “R’s” em muitos idiomas” (CHERRY, 2009, p. 56, tradução nossa), ou pela garganta, como uma alternativa ao performer que, por possíveis limitações físicas, não consiga executar com a língua. O resultado sonoro é como de um rufo ou rulo, técnica desenvolvida para sustentação do som em alguns instrumentos de percussão.

4.4.1.7 Estudos de articulação

A articulação é a maneira como utilizamos para “tocar” os sons. O professor Nailson apresenta que “articular é conectar e/ou pronunciar um ou vários sons” e que o resultado disso pode ser resumido em dois elementos básicos: sons ligados e sons separados ou destacados (SIMÕES, 2001, p. 34). Dissenha21 esclarece que “[...] o início das notas não é uma função da língua, mas do ar. Nesse processo [de articulação], a língua deve funcionar como uma válvula reguladora que define a duração das notas” (DISSENHA, 2009).

Para uma uniformidade nos ataques e finalizações das notas se torna importante pensar e definir como se pretende usar as articulações. Pensando-se nisso, foi trabalhado com o grupo: [...] articular a nota somente com o ar, sem o auxílio do movimento da língua. Isso exigia um maior fluxo de ar no início da articulação. Dessa forma melhorava o início da vibração labial, aumentando, significativamente, a sonoridade e uma resposta imediata na articulação. Esse exercício aprimorava a precisão e sincronismo entre os naipes (SOARES, 2018b, p. 125).

Com esse objetivo, foram realizados exercícios a partir do Sol3 descendo, cromaticamente, até o Dó3 com divisões rítmicas de semínimas, colcheias, tercinas de colcheias e semicolcheias como mostrado na figura abaixo.

Figura 18: Exercício de articulação

Fonte: SOARES, 2018b, p. 125.

Os exercícios da figura 13 eram realizados de diversas maneiras, com o intuito de diversificar os estudos e manter os alunos estimulados à prática diária. A partir de uma

21Fernando Dissenha é trompete solo da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo, professor de trompete na Faculdade Cantareira e EMESP e clinician da Yamaha Musical do Brasil.

tonalidade escolhida pelo professor, o exercício seguia um processo evolutivo: (1) iniciava com os alunos solfejando o ritmo com sílabas que podiam variar entre tá-té-ti-tó-tu ou dá-dé-dí-dó- du; (2) posteriormente com vibração labial e fazendo a digitação das notas no instrumento; (3) soprado no instrumento sem sonoridade, mantendo o fluxo do ar constante; (4) depois tocando com frullato; (5) e tocando nos instrumentos sem frulatto. O processo era realizado em outras articulações como stacatto, tenuto, marcatto e nota acentuada (SOARES, 2018b, p. 136).

4.4.1.8 Estudos de intervalos

Estudos de intervalos também foram inseridos na rotina, considerando a necessidade constante da realização de saltos entre notas diferentes. Os exercícios eram propostos a partir de escalas do conhecimento dos alunos com figuras de semínimas, subindo de grau em grau até chegar na oitava, uma vez com ligadura e em seguida articulado. Veja o exemplo a seguir:

Figura 19: Exercício de intervalos

Fonte: SOARES, 2018b, p. 127.