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A violência no namoro e a influência dos pares, pais e normas sociais influência dos pares

ENQUADRAMENTO TEÓRICO

2.3. A violência no namoro e a influência dos pares, pais e normas sociais influência dos pares

Segundo Giordano et al. (2010), os estudos que se têm focado na violência no namoro focam-se com mais ênfase na família e nos colegas, mas pouco se referem aos locais/contextos em que a violência ocorre.

A violência entre os pares acontece com mais frequência na adolescência do que nas restantes etapas de vida de um individuo (UNICEF, 2011). Segundo Connolly et al. (2004), os/as adolescentes unem-se a grupos de sexo misto, criando grupos de pares que namoram, fazendo o namoro parte das atividades de grupo. Ao juntarem-se a esses grupos, a hipótese de haver relacionamentos amorosos é aumentada pela exposição e observação desses relacionamentos. Assim, além de observarem o contexto, o grupo de pares também pode ter influência na sucessão das primeiras fases românticas. Neste seguimento, as atividades românticas no início da adolescência são integradas nas atividades do grupo, podendo o grupo de pares influenciar o tempo da relação. Além dos pares, também as relações de namoro precoces podem ser influenciadas pelo contexto sociocultural das famílias dos/as adolescentes (Connolly et al., 2004).

No estudo de Connolly et al. (2004), participaram alunos/as com idade média de 12.28 anos (9-14 anos). Neste estudo, os relacionamentos amorosos no grupo de pares no início da

adolescência foram evidentes no surgimento de relacionamentos amorosos. Além disso, tiveram influência na estimulação do interesse romântico nos/as adolescentes bem como no envolvimento em relacionamentos amorosos. Os resultados revelam que a participação em atividades românticas aumenta o interesse em ter também um relacionamento.

As influências dos pares na adolescência são contrastadas pelas influências parentais, sendo a influência dos pares um fator de risco (Leen et al., 2013). As experiências no grupo de pares também são influenciadas pelos fatores da família de origem (Olsen et al., 2010). Quanto ao comportamento dos pares face aos seus/suas amigos/as vítimas ou agressores/as, o estudo de Leen et al. (2013) mostrou que as raparigas têm mais comportamentos violentos nas relações de namoro quando têm amigos/as que são vítimas ou autores/as de agressão nas relações de namoro. No entanto, embora as raparigas sejam mais capazes de ser influenciadas pelos/as amigos/as, no geral, tanto os rapazes como as raparigas são influenciados/as pelos grupos de pares no que diz respeito aos comportamentos agressivos no namoro.

Além disso, possivelmente os/as adolescentes tendem a escolher grupos de pares com origens idênticas às suas, podendo escolher grupos de pares violentos e posteriormente podem ter mais tendência para ser violentos nos seus relacionamentos amorosos (Olsen et al., 2010).

Segundo Connolly et al. (2004), as escolas que restringem o acesso de pares de outro sexo pode adiar a sua relação em atividades românticas no começo da adolescência.

Influência dos pais. A família e os pares são influências relevantes na violência no namoro entre os/as adolescentes (Giordano et al., 2010). Segundo Malik et al. (1997) além da violência a que estão sujeitos na comunidade, os/as jovens, também se confrontam com a violência em casa e nas relações íntimas. Assim, para diminuir a violência entre os/as adolescentes é necessário identificar os fatores de risco nos diversos contextos (Malik et al., 1997). Contudo, nem todas as crianças ou adolescentes que são expostos/as à violência (Malik et al., 1997; Franklin & Kercher, 2012) e que são fisicamente castigados/as (Franklin & Kercher, 2012) são posteriormente violentos/as ou vítimas.

Segundo a OMS (1997), a violência cometida nas mulheres pode ter consequências de geração em geração. Os rapazes que observam as mães a ser vítimas de violência pelo seu parceiro têm maior probabilidade de na sua vida adulta também serem violentos. Já as raparigas que testemunham essa violência têm maior probabilidade que os seus parceiros abusem delas nos seus relacionamentos. Assim, a violência tende a passar de geração em geração.

Também para Oliveira e Sani (2009), a observação de comportamentos violentos está relacionada com a transmissão desses comportamentos, havendo uma herança de violência. Logo, os indivíduos que experienciam comportamentos violentos podem vir a ser indivíduos violentos. Por exemplo, na família, local onde as crianças aprendem os papéis dos pais, se viverem num ambiente violento as crianças vão assimilar esses comportamentos, havendo uma modelação de comportamentos. Segundo estas autoras, a forma como vão expressar os comportamentos observados não é necessariamente tal como foram observados, isto é, podem usar os mesmos comportamentos, modificá-los, usar diferentes modelos ou até replicar. Assim, os comportamentos violentos aprendidos no seio familiar são reproduzidos pelos/as adolescentes nas suas relações de intimidade. Segundo as mesmas autoras, “Os adolescentes tornam-se, assim, transmissores culturais dessa conduta, que gera para si mesmos, conflitos interpessoais e risco de se tornarem tanto agressores quanto vítimas, com a possibilidade de perpetuar a violência intergeracional” (Oliveira & Sani, 2009, p. 164).

O estudo de Malik et al. (1997) baseia-se na teoria de aprendizagem social, onde se explica que os comportamentos são vistos como uma aprendizagem feita através do comportamento das outras pessoas, através das pessoas mais próximas, podendo ser a família, o grupo de pares ou gangues. Assim, segundo os autores, a exposição à violência familiar, o abuso a crianças e a violência entre os pais propícia aos/às adolescentes comportamentos que podem imitar. Da mesma forma, os autores explicam que a exposição à violência na comunidade também lhes dá a entender que são formas legítimas para solucionar conflitos. Assim, a exposição à violência pode originar vários resultados podendo tornar os/as adolescentes em vítimas ou agressores, dependendo dos mediadores que os/as encaminham para uma destas vertentes. As características sociodemográficas também são identificadas neste estudo como fatores que influenciam a exposição à violência.

Neste mesmo estudo, mais de metade da amostra revelou ter observado violência entre os pais, sendo que a exposição à violência na comunidade é superior. Assim, a exposição a diversas formas de violência é um grande fator de risco para os adolescentes quer na comunidade quer nas relações de namoro, tanto como vítimas como agressores. Também se verificou neste estudo que estar exposto à violência familiar está ligada à violência na comunidade e no namoro. Pelo que, o estar exposto a um contexto de violência parece influenciar outros contextos, quer seja para as vítimas quer para os agressores. Neste estudo, também a exposição a armas e os ferimentos na comunidade são os principais fatores comuns

na violência quer para a vítima quer para o/a agressor/a. Segundo os autores deste estudo, os rapazes adolescentes tendiam a ser os agressores e vítimas de violência na comunidade e, por outro lado, as raparigas adolescentes tendiam a cometer mais violência no namoro do que os rapazes adolescentes. No que diz respeito à exposição à violência familiar, os rapazes eram mais afetados do que as raparigas e estas, eram mais afetadas pelo próprio abuso.

Olsen et al. (2010) também fazem referência à Teoria de Aprendizagem Social de Bandura, para explicar que a aprendizagem das crianças pode acontecer devido às observações que fazem dos seus pais, como é que eles se tratam e como tratam as crianças. Nesta perspetiva defende que os relacionamentos amorosos podem derivar do resultado do comportamento antissocial que é adquirido no início da vida através dos pais, sendo provável que alguns fatores dos ambientes familiares possam ter maior ou menor influência, enquanto outros podem ter uma influência mais estável ao longo do tempo.

Mpiana (2011) verificou que a forma como as adolescentes veem a violência é influenciada pela família, amigos, comunidade, escola e media. Se estes grupos incutirem na rapariga a ideia de que a violência praticada contra as raparigas é normal, então ela é aceite pelas raparigas. Portanto, é necessário capacitar as adolescentes e educá-las para os seus direitos, revelando relacionamentos violentos e denunciando-os (Mpiana, 2011).

No estudo de Franklin e Kercher (2012), verificou-se que presenciar a violência entre os pais na infância tem maior probabilidade de em adulto exercer violência psicológica e ser vítima de castigos físicos na infância aumenta a probabilidade de contar que sofre de abuso psicológico.

Segundo estes mesmos autores, “(…) as crianças que experimentam formas de castigo físico podem ser especialmente vulneráveis a internalizar a eficácia da violência como meio de influência e gestão de conflitos nos relacionamentos íntimos” (Franklin & Kercher, 2012, p. 197).

Influência das normais sociais. As normas sociais também influenciam os comportamentos nas relações de namoro, havendo situações de violência que são aceites e justificadas, sendo também consideradas um fator de risco (Leen et al., 2013).

De acordo com Malik et al. (1997) as normas pessoais de cada um também têm um papel muito importante quando se fala em violência pois, se a violência for aceite como uma norma pessoal que é aceitável, então a violência é tida como normal, podendo os/as

adolescentes ser agressivos/as. Por outro lado, uma pessoa ao aceitar a violência no seu relacionamento pode levar essa pessoa a aceitar um relacionamento abusivo, correndo o risco de se tornar vítima.

O estudo de Machado (2010) mostrou que muitos dos atos violentos que são legitimados são provenientes de questões sociais, culturais, individuais e da educação. Neste estudo (N=522) foram caracterizadas as crenças que os/as jovens de Escolas Secundárias e Profissionais do Porto com idades entre os 15 e os 19 anos, têm acerca da violência. Os/as alunos/as referiram que a violência acontece quando há razão para que tal aconteça e por que a vítima fez algo de errado (64.9%). Não defenderam que quem se droga tem motivo para ser violento, mas 81.2% considerou que o álcool é o responsável pela violência das pessoas e que a violência tem a ver com o poder de exercer o controlo.

A escola como potencial contexto de risco. O bullying, o cyber-bullying, o lutar, o desrespeito a professores, o abuso verbal, o chamar nomes, os insultos raciais, entre outros são de longe os tipos de violência mais predominantes nas escolas, havendo outros tais como, o uso de armas, tentativa de violação ou violação, roubos, uso de álcool ou drogas, assédio sexual, uso de explosivos entre outros (Dinkes, Kemp, & Baum, 2009).

Segundo Mirsky (2003) as escolas também podem ser locais de risco para os/as jovens no que diz respeito às relações de namoro violentas pois, se a própria escola ou universidade permitir a violência, o assédio sexual ou qualquer outra forma de coerção, esta pode ser uma forma de aprendizagem que os/as jovens adquirem e que se reflete em casa ou no trabalho. Assim, segundo o autor, as escolas que permitem a violência sexual ensinam aos/às adolescentes que a violência é admissível. Na sua perspetiva quando o assédio sexual ou a violência é desconsiderada nas escolas, os/as jovens como não foram educados/as a identificar a violência nos seus relacionamentos, estes/as podem estar em maior risco de ter problemas de saúde sexual e contrair o HIV. Assim, um ambiente escolar que permite a violência sexual nas escolas pode originar efeitos graves nas relações dos/as jovens na vida adulta.

Segundo o Human Rights Watch (2001) o abuso sexual e o assédio a raparigas por parte dos professores e outros alunos são muito frequentes na África do Sul. As raparigas, no geral, são atingidas pela violência sexual na escola. As escolas têm sido locais violentos para as crianças estando mal equipadas para combater a violência, e não têm um papel eficaz no combate à violência contra as mulheres devido ao fracasso do Governo em proteger as raparigas

e em responder à violência tendo efeitos no seu desempenho escolar (Human Rights Watch, 2001). Em estudos realizados em África, a agressão sexual passa impune e os constantes comportamentos masculinos por parte dos alunos e professores não são contestados, dando, a conhecer aos alunos que os comportamentos violentos são tolerados e vistos assim como “normais” (Leach, Fiscian, Kadzamira, Lemani, & Machakanja, 2003).

Também no estudo de Mpiana (2011), as raparigas adolescentes aparentam ser física e sexualmente vítimas dentro e fora da escola. Embora este estudo não se foque só na violência na escola, para as raparigas envolvidas a escola não é um local seguro, pelo contrário, é considerado um local privilegiado para a violência sexual. Neste estudo, constata-se que as meninas do Sul de África são expostas a comentários degradantes, ao toque indesejado, sujeitas a ameaças de violência e também à violência real. Por outro lado, os meninos através da violência intimidam e controlam as atividades das meninas, deixando-as com uma autoestima baixa, com medo e impotentes devido à imagem que transmitem acerca das raparigas.

Neste estudo é referido que 80% das raparigas, do 12º ano, estavam envolvidas em relacionamentos abusivos, 8 em cada 10 meninas, do 11º ano, foram abusadas no relacionamento, e muitas jovens, do 12º ano, tentavam encobrir que foram abusadas nos relacionamentos pois têm consciência de que se o fizerem são outra vez abusadas. As meninas quando tentavam explicar a violência no seu relacionamento as suas respostas variavam pois tanto se sentiam responsáveis como não assumiam a culpa. Muitas delas assumem os comportamentos abusivos como reflexo do amor, como comportamentos normais não refletindo o quanto perigoso é, enquanto outras meninas o tentam esconder. Para elas a única forma de acabar com a violência exercida pelos rapazes é ser também violentos com eles.