• Nenhum resultado encontrado

3 SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO, INTERNET E REVOLUÇÃO NA ÁREA DA

3.2 Internet

3.2.3 Web 2.0: novas iniciativas

Como dito, são inúteis as tentativas das grandes produtoras e associações de gravadoras de acabar com as Redes P2P, ou mais, com a transferência livre de informações, recorrendo ao Judiciário e valendo-se de recrudescimentos da legislação autoral. Isto iria de encontro ao próprio progresso científico e cultural, o qual já internalizou os novos hábitos sociais trazidos pela Internet e as tecnologias digitais.

Ora, a Era Digital já plantou no seio da sociedade a semente da transferência livre de informações pela Rede. Esta semente tem se desenvolvido e crescido na Sociedade da Informação de tal forma que adquiriu uma dimensão por demais grande para poder ser

36 O Kazaa, assim como o Napster, foi processado pela RIAA (Associação Americana da Indústria de Discos) e,

após acordo, ficou obrigado a pagar multa de 100 milhões de dólares e a modificar o software de forma a prevenir atos futuros de pirataria. As modificações incluem um sistema de filtragem de palavras para impedir que usuários encontrem material protegido. Assim, o Kazaa se tornou um serviço legal de comercialização de músicas na Internet (BBC NEWS, 2006).

37 A justiça sueca condenou os quatro criadores do site The Pirate Bay a um ano de prisão, mais o pagamento de 3,5 milhões de dólares, por violações aos direitos autorais (F. M. MENDONÇA, 2009).

limitada pela sistemática legal vigente, baseada numa visão muito mais editorial do que propriamente autoral.

Decerto, para além da questão legal da contrafação (reprodução não autorizada), enfatizada pelas grandes produtoras, outras ainda não receberam a devida atenção, mas já se fazem sentir: os grandes benefícios sociais advindos do compartilhamento de dados e informações. Nesse sentido, defende Túlio Vianna (2005) que:

As redes “peer-to-peer” possibilitaram uma diversidade de acesso à produção cultural nunca antes imaginada. Por meio delas, qualquer pessoa conectada à Internet pode ter acesso a músicas árabes, filmes iranianos, literatura africana, dentre uma inesgotável fonte de recursos culturais jamais acessíveis pelos meios tradicionais. Difícil imaginar um estímulo maior à criatividade intelectual.

A idéia que fundamentou a criação da tecnologia peer-to-peer, qual seja a descentralização da Internet (mais precisamente dos provedores) para uma troca de dados mais livre, não parou por aí. Avançou ensejando a criação de diversas outras tecnologias do mundo virtual.

Mesmo com encerramento de alguns programas ou sites P2P, além de existirem outros cada vez melhores (como os que usam a tecnologia torrent38) que não foram ainda proibidos, outras iniciativas estão sendo implementadas não só com o fim de permitir a livre troca de arquivos, mas também a geração de conteúdo pelos próprios usuários.

Destaca-se, primeiramente, como uma dessas iniciativas, o serviço de File-

Hosting (do inglês, “hospedagem de arquivos”), disponibilizado por diversos sites, sendo os

mais conhecidos o 4shared e o Rapidshare. Ele funciona permitindo que os usuários enviem seus arquivos para serem hospedados em um endereço eletrônico do sítio, através do qual outros usuários (cadastrados ou não, a depender da política da empresa responsável) poderão baixá-los.

Para os navegadores da Rede, esse sistema, embora bastante semelhante aos programas P2P, acaba por ser mais prático, pois não há necessidade do uso de uma rede peer-

to-peer. Os arquivos ficam hospedados nos sítios eletrônicos, dispensando o uso de outros

computadores quando da transmissão do arquivo para suas máquinas.

Outro bom exemplo de iniciativas desse tipo, que contribuem para uma Internet mais democrática e para a formação colaborativa de seu conteúdo, são as comunidades de compartilhamento das redes sociais. A estrutura das Redes Sociais (Facebook, Orkut, v.g.)

38 Trata-se de um protocolo P2P que funciona dividindo os arquivos compartilhados em diversas partes para que possam ser recebidos de fontes diferentes, por usuários diferentes, ao mesmo tempo. Daí o seu extensivo uso para a disseminação de arquivos grandes (ALECRIM, 2011).

não permite a hospedagem de arquivos para download, no entanto os seus usuários podem criar comunidades para intercambiar informações sobre aquisição na Rede de músicas, vídeos, livros etc..

Como exemplo, pode-se citar a comunidade brasileira “Discografias”, criada no famoso site de relacionamentos Orkut, para compartilhar links (endereços eletrônicos) de músicas disponíveis para download.

Por pressões da APCM (Associação Antipirataria Cinema e Música) e outras associações de defesa dos direitos autorais, os responsáveis pela comunidade tiveram que fechá-la, o que foi vão. Muitas outras comunidades ou mesmo sites inteiros são construídos como o mesmo propósito, inclusive a comunidade “Discografias - O Retorno”, criada também no Orkut como reação ao fechamento da anterior (FOLHA ONLINE, 2009).

Ainda sobre os sites de relacionamento, ressalte-se a criação de redes sociais voltadas, principalmente, para o compartilhamento de produções culturais (músicas, curtas, filmes, fotos etc.). Para a música, a mais relevante, não obstante a recente queda de usuários, continua sendo o MySpace (já foi a rede social mais popular do mundo), que possibilita aos músicos a exibição de suas obras musicais em perfis diferenciados, por meio da tecnologia

streaming39.

Outro fenômeno mundial que se valeu da tecnologia streaming e precisa ser aqui destacado, em razão da importância que possui para o mercado cultural como um todo, mormente da música, é o Youtube. Trata-se de um site que permite que seus usuários postem, carreguem e compartilhem vídeos em formato digital por meio do streaming. Pessoas de todo o mundo podem acessar ou disponibilizar vídeos caseiros, curtas ou trechos de filmes, performances musicais ao vivo e videoclipes.

É site mais popular do tipo, tendo alcançado 50% do mercado de sites de compartilhamento de vídeos já em 2006 (REUTERS, 2006). Foi criado com o fim de hospedar vídeos pessoais, mas é comum encontrar material protegido por direito de autor no sistema. Por isso uma ferramenta foi criada para permitir que os titulares dos direitos autorais controlem o acesso aos vídeos já postados, ou tirem-nos do ar, impedindo a postagens de novos.

Apesar disso, o Youtube permite e recomenda a criação de espécies de canais de TV online com vídeos pessoais, que tem sido de grande utilidade para artistas diversos

39 Streaming é uma forma de acessar um arquivo multimídia pela Internet em tempo real, na qual a transferência do conteúdo é concomitante à sua execução. Em outras palavras, a execução prescinde da reprodução e o arquivo não precisa ser transferido, definitivamente, de um computador para outro. (GPOPAI, 2010, p. 30)

(amadores ou já consagrados) publicarem seus trabalhos. Isto acabou gerando, também, a febre dos videologs, ou simplesmente vlogs, que nada mais são do que diários de vídeos

online sobre os mais diversos assuntos (cotidiano, humor, cultura etc.).

Todas as ferramentas de rede aqui citadas despontam no século XXI (juntamente com outras, v.g., blogs, microblogs, sites wiki40, rádios e locadoras online com conteúdos dos

próprios usuários41 etc.), como símbolos de uma nova fase da Internet que tem sido intitulada de Web 2.0, na qual a participação dos usuários tem um importante papel na criação do conteúdo da Rede.

Preconiza-se que Web 2.0 é termo mais difundido dentro da indústria de tecnologia e refere-se a uma série de características ou conceitos que diferenciam novos sites ou softwares daqueles que naufragaram com o estouro da Bolha da Internet, na virada do século XX para o XXI (SPYER, 2009, p. 28).

Essas características ou conceitos são justamente a colaboração dos usuários e a

interatividade com os clientes, idéias que se desenvolveram da axiologia de liberdade da

Internet, ou melhor, da Sociedade da Informação, e tem marcado as mais diversas áreas de mercado, tornando-se, hoje, imperativos no mundo corporativo.

O filósofo Pierre Lévy bem observou tais características em sua obra “Cibercultura” (1999 apud ARAÚJO, 2008, p. 25) afirmando que são a possibilidade de atuação e intervenção do receptor da mensagem na relação de comunicação à qual ele está submetido, a possibilidade de reapropriação e recombinação material da mensagem por seu receptor.

Para ele o ciberespaço constitui um dispositivo de comunicação “todos-todos”, a informação pode ser construída coletivamente e colaborativamente pelos participantes da comunicação, diferentemente de dispositivos de comunicação “um-todos”, como a televisão e o rádio, onde a interatividade é pequena, e há um pólo da comunicação ativo, escolhendo o conteúdo da informação, e outro pólo da comunicação passivo, que apenas recebe o conteúdo da comunicação.

Não há, portanto, motivos para defender a contensão desses avanços com base apenas nos interesses das grandes empresas do entretenimento, ainda organizadas na lógica de

40 O termo Wiki é utilizado para identificar um tipo específico de coleção de documentos em hipertexto, ou softwares, ou sites de conteúdo colaborativos; ou seja, que permitem a interferência dos próprios clientes, ou usuários, para contribuir na sua criação e desenvolvimento. De conteúdo musical, tem-se o Wikimedia Commons, repositório de mídias eletrônicas de licença livre; o International Music Score Library Project, de partituras em domínio público; o LyricWiki, uma relação de letras por álbum; e o Whole Wheat Radio, Uma estação de rádio on-line comunitária apresentando música independente (WIKIPÉDIA).

41 Além da Whole Wheat Radio já citada na nota de rodapé anterior, há outras que não se limitam a música independente: Pandora, Grooveshark, Deezer, Jiwa e Goear (TECMUNDO, 2010).

mercado do século anterior; tampouco para reivindicar uma adaptação das novas realidades às legislações vigentes. Ao contrário, são as mudanças fáticas, sociais, que reclamam adaptações do mercado e da Lei.