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C ONTROLE SOCIAL DIFUSO

No documento OS PROCESSOS DE CRIMINALIZAÇÃO - Univali (páginas 56-60)

2.1 INTERPRETAÇÃO ESTRUTURAL

2.1.1 C ONTROLE SOCIAL DIFUSO

A religião faz parte do controle social difuso, pois sempre exerceu o controle dos comportamentos dos indivíduos, seja através de coerção moral ou física, ou seja, por meio de códigos morais de conduta que usam como sanção para o caso de sua violação a ideia de pecado e penas sobrenaturais ou penas físicas aflitivas aplicadas, nesse caso, pelos próprios membros da organização religiosa. Assim, para as pessoas que são adeptas de alguma religião - que possua código moral de condutas e suas respectivas sanções -, ela exerce forte controle social de suas condutas e ideias, impondo determinados interesses (dos grupos dominantes), e dessa forma, legitimando-os e reproduzindo-os.

73 ANGOTTI, Bruna. Breves notas sobre o abolicionismo penal. Revista brasileira de ciências criminais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. ano 17. nº 80. set.- out. p. 257.

74 Neste subtítulo serão expostas apenas algumas formas de controle social difuso e não todas as possíveis que existem na sociedade contemporânea.

Assim, para as pessoas que são adeptas de alguma religião - que possua código moral de condutas e suas respectivas sanções -, ela exerce forte controle social de suas condutas e ideias, impondo determinados interesses (dos grupos dominantes), e dessa forma, legitimando-os e reproduzindo-os. Para Bourdieu, citado por Camila Caldeira Nunes75:

(...) a função política cumprida pelos sistemas religiosos consiste exatamente em conservar a ordem social – isto é, poder dos dominantes e a domesticação dos dominados – a partir de uma alquimia ideológica pela qual se opera a transfiguração das relações sociais em relações sobrenaturais, inscritas na natureza das coisas e portanto justificadas.

Os interesses das classes dominantes sempre foram protegidos, de qualquer ameaça provinda do restante da população, pela religião através dos seus poderes coercitivos, que, além disso, conseguia que tais interesses fossem seguidos e defendidos pelos dominados de forma inconsciente ou despercebida.

A função da religião no controle social tem se modificado com o tempo. Com o processo de secularização, onde o estado assume uma série de papéis que antes eram pertencentes à religião. Ele passa agora a ser fator de agregação social e a religião deixa de ser a responsável pela melhoria das condições de vida, mas sim o Estado. Do mesmo modo, muitos serviços antes prestados pela religião, agora são prestados pelo Estado. A sociedade ocidental partiu de um modelo de cristandade, onde todas as instituições sociais eram cristãs, para um modelo laical, onde o estado se professa laico e a religião deixa de ser um fundamento das instituições sociais. Nesse sentido José Jesus Filho76:

Até o final do século XIX o uso da religião teve forte influência punitiva. No mundo anglo-saxônico, apostava-se na tese de que o tempo despendido no exercício laboral e na meditação religiosa equiparia o infrator com a armadura espiritual, capaz de refletir a mais virulenta das doenças morais. Na virada do século XX, o conhecimento científico deslocou a religião da condição de paradigma explicador do fenômeno criminoso bem

75 NUNES, Camila Caldeira. Religião e castigo na prisão. Revista de ciências criminais. São Paulo:

Editora Revista dos Tribunais, 2008. ano 16. nº 73. jul.- ago. p. 282.

76 JESUS FILHO, José. Liberdade religiosa e prisão. Revista brasileira de ciências criminais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. ano 18, nº 82. jan.- fev. p. 365-366.

como fundamento de seu controle. Conseqüente, durante o século XX, a religião foi vista principalmente como um direito constitucional a ser protegido em vez de uma estratégia formal de controle punitivo.

A religião no mundo ocidental, após o Iluminismo, deixou de exercer o controle social por meio da ameaça por coerção física, exercendo-a por coerção moral até o presente. No mundo ocidental ficou reservada ao Estado, por meio do sistema penal, a ameaça de coerção física no controle social.

2.1.1.2 Mídia

A utilização dos meios de comunicação para a formação da opinião pública não é uma prática recente. Bem pelo contrário, desde a institucionalização da imprensa moderna no século XVII, os seus proprietários perceberam que esta poderia ter um importante papel social como formadora de opinião pública. Ao longo da segunda metade do século XX, houve um aumento do número de países que adotaram o regime de democracia formal. Este fato veio ratificar a importância do papel da mídia e da indústria de entretenimento como instrumentos de formação de opinião pública e de controle social.

Conforme Zaffaroni e Pierangeli77:

(...) os meios de comunicação social de massa induzem padrões de conduta sem que a população, em geral, perceba isso como “controle social”, e sim como formas de recreação.

Ao contrário do que ocorre em regimes autoritários, onde a classe dominante exerce o controle social através da força, em regimes de democracia formal, este controle é exercido de forma sutil. Hoje, mais que nunca, a mídia possui um vigoroso impacto sobre o grande público.

Niklas Luhmann78 comentando sobre a seleção que orienta o sistema dos meios de comunicação, em específico sobre os seletores que atuam nas notícias, explica que:

77 ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro. 6 ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006. v. I. p. 57.

Também transgressões à norma justificam uma atenção especial. Isso vale tanto para transgressões do direito, mas acima de tudo para transgressões morais e, ultimamente, transgressões contra o “politicamente correto”. Nas exposições mediáticas delas, as transgressões das normas assumem com freqüência o caráter de escândalos. Isso reforça a ressonância, reaviva acena política e evita as manifestações de compreensão e de desculpa que podem ocorrer em transgressões das normas. No caso de escândalos, a maneira como o próprio escândalo é comentado pode-se tornar ainda um outro escândalo.

Assim, a mídia, ao transmitir transgressões à norma e escândalos, produz – mais do que qualquer outro meio – um sentimento geral de que todos foram atingidos e estão indignados. Isso ocorre devido ao fato de que a população em geral não possuí conhecimento acerca da normalidade do desvio, assim quando se noticiam transgressões (transgressões selecionadas como casos isolados), reforça-se a indignação e por consequencia a própria norma. Conforme explica Niklas Luhmann79:

(...) isso não ocorre nas formas ostensivas de sermões ou das tentativas de doutrinamento, que hoje despertam antes tendências contrárias à socialização, mas nas inofensivas do puro noticiário que dá a todos a oportunidade de chegar à conclusão: “Isso não!”

Ainda, as transgressões são selecionadas para o noticiário se nelas puderem ser misturados julgamentos morais, ou seja, se elas propiciarem que pessoas sejam valorizadas ou desvalorizadas. Assim, os meios de comunicação têm importante função na manutenção e reprodução da moral, mas isso não significa que eles criam bases éticas ou direcionam a moral social no sentido de uma boa ação, ou seja, apenas o código moral é reproduzido, isto é, a distinção entre a boa e a má ação. Nesse sentido Niklas Luhmann80:

Os meios de comunicação realizam apenas uma contínua auto- irritação da sociedade, uma reprodução da sensibilidade moral, tanto no plano individual como no comunicativo. Isso leva, contudo, a um tipo de disembedding da moral, a uma conversa moralizante que não é preenchida por nenhuma obrigação

78 LUHMANN, Niklas. A realidade dos meios de comunicação. São Paulo: Paulus, 2005. p. 60.

79 LUHMANN, Niklas. A realidade dos meios de comunicação. São Paulo: Paulus, 2005. p. 61.

80 LUHMANN, Niklas. A realidade dos meios de comunicação. São Paulo: Paulus, 2005. p. 63.

controlável. A ideia da moral e de sua renovação contínua ocorre com o apoio de casos espetaculares – na apresentação dos patifes, vítimas e heróis que realizaram aquilo que estava além do exigível. O receptor não irá se enquadrar tipicamente em nenhum desses grupos. Ele permanece... observador.

Ao contrário do que ocorre em regimes autoritários, onde a classe dominante exerce o controle social através da força, em regimes de democracia formal, este controle é exercido de forma sutil. Hoje, mais que nunca, a mídia possui um vigoroso impacto sobre o grande público. Nos regimes democráticos, é fundamental que as pessoas “pensem corretamente” e escolham os líderes que foram pré-selecionados pelas elites. E para que as pessoas pensem o que as elites querem, é necessário um sistema de doutrinação sofisticado, que inclui a mídia e a indústria de entretenimento.

2.1.2 Controle social institucionalizado

No documento OS PROCESSOS DE CRIMINALIZAÇÃO - Univali (páginas 56-60)

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