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O Planalto da Serra da Estrela, alvo de diversos estudos sobre a sua vegetação, quer ao nível dos seus elementos florísticos, quer ao nível da sua evolução ao longo do tempo, conta agora com o mapeamento das comunidades com mais expressão nesta área, com um valor de certeza de 93,7% para a classificação supervisionada da imagem WorldView 2.

Um território marcado pela existência de vegetação de ambientes de montanha, nitidamente influenciada pela altitude, em andares de vegetação. Para além desta distribuição zonal, é possível estabelecer também relações entre a morfologia desta área e a vegetação, sendo que algumas das comunidades estudadas apresentam preferências na localização em áreas de vale, como é o caso das Giestas, Piorno, Urzes e Fetos; ou pelas áreas de vertente, caso das Florestas; e ainda pelas partes mais altas e expostas, como é o caso do Zimbro. O relevo, e a sua diversidade, acaba assim por determinar diferenças ao nível da vegetação, por originar dissimetrias no que toca à distribuição da precipitação, diferenças na temperatura do ar e do solo e na influência dos ventos.

Também a exposição apresenta um papel determinante na localização das comunidades na serra, devido às diferenças originadas pela mesma no que diz respeito ao número de horas e ângulo de incidência solar, exposição aos ventos dominantes e precipitação.

Influenciadas pelas diferenças relativas às características bioclimáticas do Planalto e intervenção antrópica secular na área, o andar superior, sensivelmente acima dos 1600m é o que demonstra maior interesse conservacionista pela especificidade e raridade da vegetação aí presentes, adaptadas a condições climáticas heterogéneas, geológicas e orográficas distintas. A criação de cartografia de pormenor para esta área possibilita uma melhor compreensão da sua distribuição, fornecendo informação detalhada para as áreas de interesse de forma a assegurar uma melhor gestão e proteção dos habitats onde se incluem.

As duas áreas de pormenor apresentadas (Nave de Santo António e Covão do Boi) revelam as diferenças existentes ao nível da vegetação do andar superior e de uma área que se encontra numa zona de transição entre o andar intermédio e o superior. São testemunho da alteração quase completa da paisagem entre dois locais geograficamente próximos, e da influência exercida pelas características bioclimáticas e do terreno. Assim, na Nave de Santo António existe um extenso Cervunal (cerca de 51% de cobertura do

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total classificado) que inclui uma forte presença de Torga (cerca de 13%) e de outras comunidades, rodeado por matos densos, representados por comunidades como as Urzes (19%) e Piornos (2%). Em oposição, o Covão do Boi caracteriza-se por uma área de Cervunal, muito menos rica ao nível das comunidades que o acompanham, mas que apresenta, ao longo dos afloramentos rochosos, testemunhos de comunidades características deste andar, capazes de suportar as condições extremas de vento/insolação/neve e gelo, como é o caso do Zimbro (cerca de 10% do total classificado) e da Caldoneira (cerca de 8%). A comunidade de Piornos neste local apresenta muito maior expressão face à NSA (cerca de 12%).

A vegetação nestes ambientes extremos, serve de indicador para mudanças que ocorrem ao nível do ecossistema onde estas se inserem, podendo ser vulneráveis a alterações e perturbações no mesmo. A análise revela que no período de estudo, relativamente curto (1995-2020) existiram alterações nestas comunidades da Serra da Estrela. Esta alteração da vegetação caracteriza-se por uma diminuição das áreas de floresta, aumento das áreas ocupadas por matos e consequente diminuição das áreas de Cervunal que contém espécies de elevado interesse científico que importa preservar.

Existe um aumento da biomassa vegetal detetada a partir dos valores do NDVI, que parece estar relacionada com o aumento das áreas ocupadas por arbustos e que acompanha o aumento da temperatura registada. No entanto, não é possível considerar que o aumento da temperatura seja causa única para as alterações detetadas, estando estas ligadas também ao aumento dos grandes incêndios e a alterações ao nível do uso do solo. Em especial, ao desuso de práticas de pastorícia, à diminuição do número de cabeças de gado e à redução do uso do fogo para manutenção das áreas de pastagem, que leva a uma consequente invasão das comunidades arbustivas nas áreas de Cervunal.

Ao nível das metodologias utilizadas é necessário destacar o uso de imagens de muito alta resolução para a elaboração da cartografia, que proporcionou um elevado nível de qualidade e pormenor na caracterização do planalto. O elevado número de bandas utilizadas para a classificação supervisionada de vegetação demonstrou ser uma mais valia para a distinção de comunidades de vegetação, em especial para a imagem de UAS da NSA (micasense) que possui 10 bandas espectrais e 8cm de resolução, capaz de detetar as comunidades com um grande pormenor, muitas das vezes ao nível do indivíduo arbustivo, mas também as diferenças existentes no mesmo quanto à sua vitalidade e

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condição. Revela-se assim como uma ferramenta essencial para a monitorização da vegetação e da sua evolução futura nesta área, face às alterações esperadas no clima.

As limitações existentes na classificação do Planalto prendem-se ao nível da dificuldade em separar espectralmente certas comunidades, e a exclusão de algumas pela relativa fraca representatividade no terreno atendendo aos 2m de pixel utilizado. De modo a melhorar a classificação realizada seria interessante a utilização de imagens de muito alta resolução de diferentes épocas do ano, podendo assim detetar alterações na vegetação de forma mais eficiente, podendo chegar a uma classificação mais pormenorizada, ao nível da distinção das espécies com maior expressão geográfica no terreno. A impossibilidade de separar Giestas, Piornos e Urzes pode também conduzir a imprecisões na análise dos fatores explicativos da distribuição destas comunidades. Assim, os dados de campo e a classificação de habitats indicam que as Urzes aparecem ligadas à Torga e ao Sargaço (Habitat 4030), e, portanto, teria sentido que a sua distribuição fosse explicada pelas mesmas variáveis. De maneira semelhante, Piornos e Giestas, embora fisionomicamente parecidos, formam comunidades de caraterísticas diferentes e separadas no território com uma dominância do piorno em altitudes superiores, e portanto, devem ser caraterizadas por variáveis distintas. A análise de fatores explicativos, demonstrou que os andares altitudinais são a variável com maior correlação com as comunidades, sendo a que mais contribui para a distribuição das comunidades na área de estudo, existindo também outros fatores explicativos, como: a exposição predominante das comunidades; relação com as áreas de insolação; a sua localização em relação às características topográficas e a sua presença ou ausência na área glaciada ou em áreas recentemente ardidas. Os resultados desta análise não se mostraram muito satisfatórios devido às limitações das variáveis consideradas e fraca variância total explicada da análise. Esta análise da distribuição da vegetação poderia ser realizada futuramente utilizando mais e melhores variáveis, nomeadamente, o impacte antrópico, precipitação e temperatura com base em várias estações de recolha de dados (considerando a grande complexidade das áreas de montanha e permitindo uma maior precisão nos valores), áreas ardidas com mais pormenor contemplando as queimadas no andar superior, ou a frequência e a severidade dos incêndios, que poderiam ajudar na criação de modelos preditivos da distribuição das distintas comunidades face a mudanças nas variáveis consideradas.

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