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DOCENTE

No documento PDF CAPA - nwk.edu.br (páginas 108-121)

Jaqueline Santiago16 Luis Carlos Gonçalves17

RESUMO

Partindo das concepções de Paulo Freire a respeito da metodologia e dos conteúdos a serem trabalhados na Educação de Jovens e Adultos (EJA), este artigo propõe fazer uma análise das condições metodológicas e formativas dos professores e professoras que atuam nesta modalidade de ensino, tendo como enfoque central a infantilização de conteúdos. A pesquisa de campo foi desenvolvida em uma escola da rede municipal de Sumaré/SP que atendem a Educação de Jovens e Adultos, além de pesquisas bibliográficas e documentais. No processo de observação, coube analisar as metodologias desenvolvidas em sala de aula e seus instrumentos para verificar se são pertinentes à idade dos educandos.

Palavras-chave: Paulo Freire; Cartilha; Educando.

ABSTRACT

Building on the ideas of Paulo Freire regarding the methodology and the contents to be worked on Youth and Adult Education (EJA), this article proposes an analysis of methodological and training conditions for teachers who work in this type of education, with the central focus infantilization content. The field research was developed at a school municipal Sumaré/SP that cater to youth and adult education, as well as bibliographic and documentary research. In the process of observation, it fell analyze the methodologies developed in the classroom and their instruments to verify that pertain to the age of the students.

Keywords: Paulo Freire; Primer; Educating.

1 Introdução

A Educação de Jovens e Adultos (EJA) é uma modalidade de ensino prevista na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) com contornos específicos e características próprias.

Desta feita, faz-se necessário uma formação de docentes coerente em virtude dos desafios para o devido atendimento qualificado a estes discentes, que por vários motivos, não completaram sua escolaridade no que poderíamos chamar de tempo adequado.

16 Graduanda em Pedagogia das Faculdades Network – Av. Ampélio Gazzetta, 2445, 13460-000, Nova Odessa, SP, Brasil. (e-mail: jack_santiago@msn.com.br)

17 Professor Orientador do Trabalho de Conclusão de Curso de Pedagogia das Faculdades Network – Av.

Ampélio Gazzetta, 2445, 13460-000, Nova Odessa, SP, Brasil. (e-mail: lu1313@bol.com.br)

Contudo, vale lembrar que, além da necessidade de qualificação do ensino, por mais que muito tenha sido feito para a ampliação de vagas, ainda é preciso muito mais.

Em Bandoni (2014, p. 74):

Em termos de alfabetização, o país ainda precisa abrir espaço para que cerca de 13,3 milhões de brasileiros acima de 15 anos aprendam a ler e escrever, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2013, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Para ter uma ideia do tamanho do problema, segundo o Censo Escolar 2013, há apenas cerca de 3,8 milhões de alunos matriculados na EJA. Isso significa que, para dar conta da população não alfabetizada, a oferta de cursos precisaria mais do que triplicar. Um desafio e tanto!

Como se percebe, há um espaço enorme para crescimento de oportunidades de atuação para os docentes. Porém, é preciso que desde já se discuta a qualidade desta educação, entendida como adequação à realidade dos atuais ou potenciais discentes que buscam a EJA para continuidade e aprofundamento de sua aprendizagem escolar como superação das dificuldades encontradas em seus respectivos cotidianos.

2 Revisão bibliográfica

Acredita-se que a busca dessa modalidade de ensino se dá em virtude da expectativa de uma melhoria de vida dos alunos que o procuram. Uns para arrumar um emprego “melhor”, outros para continuar seus estudos visando à faculdade e, ainda, para aqueles de mais idades, pelo simples prazer de poder escrever uma carta ou seus próprios nomes.

“Estudar é, realmente, um trabalho difícil. Exige de quem o faz uma postura crítica e sistemática. Exige uma disciplina intelectual que não se ganha a não ser praticando-a” (FREIRE, 1981, p. 07). Assim, para que o ambiente escolar da EJA propicie o estudo, é necessário que seja favorável para a construção dessas críticas para prática intelectual.

Contudo, é possível afirmar que muitos abandonam as salas de aula por diversos motivos. Poder-se-ía dizer que, dentre estes motivos, encontram-se o fato de estarem cansados por passarem o dia todo trabalhando, por causa das diferentes faixas etárias de alunos nas salas, o que ocasiona em muitas vezes conflitos de ideias e, também, devido aos conteúdos trabalhados em sala, que não correspondem aos contextos sociais dos alunos e suas respectivas idades.

Para Oliveira (2009, p. 91):

A lógica que preside a organização da escola e as propostas de trabalho que ela busca pôr em prática trazem embutidos valores, ideias e concepções de mundo bastante diferentes do público que a frequenta, o que dificulta imensamente ao educando realizar o enredamento daquilo que se diz e se propõe na escola com os saberes que traz de sua vivência. Com isso, os processos de aprendizagem não se efetivam de acordo com as expectativas, nem de uns, nem de outros.

Esta afirmação vale tanto para caracterizar a motivação da evasão escolar enquanto ainda crianças, como apontar para a descontextualização das práticas, métodos e conteúdos trabalhados na própria EJA.

À época de seu trabalho junto às comunidades mais carentes, Paulo Freire desmistificou o uso das cartilhas. Para ele, tal material didático de nada apoiava o

trabalho pedagógico. A maior questão era a desvalorização que essas cartilhas proporcionavam, uma vez descoladas da vida e do cotidiano dos alunos.

Dizia: “Jamais doar-lhe conteúdos que pouco ou nada tenham a ver com seus anseios, com suas dúvidas, com suas esperanças, com seus temores. Conteúdos que às vezes, aumentam estes temores. Temores de consciência oprimida.” (FREIRE, 1977, p.

101-102). Estas cartilhas não traziam palavras e frases condizentes com os vocabulários dos alunos, e que pudessem se identificar.

Esses conteúdos prontos, infantilizados e sem nexos com a realidade dos educandos foi substituído por Freire por um material de apoio, que consistia em trocar, segundo suas próprias palavras, o “ensinar alguma coisa para alguém” por “conhecer alguma coisa com alguém”, uma vez que, de acordo com suas concepções: “Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar possibilidades para sua própria produção ou sua construção” (FREIRE, 2013, p. 48).

Daí, alfabetizar jovens e adultos passou a ser ensinar o uso das palavras. E decodificando as palavras o alfabetizando descrito por Freire vai se descobrindo como homem e sujeito de todo um processo histórico no qual está inserido.

Nesta perspectiva, o saber escrever só o nome não basta, deve-se saber ler, escrever, entender, refletir e compreender aspectos do cotidiano e o que passa em nossa vida política e social. O cotidiano dos alunos da EJA se torna fonte de estudos e atrativos de aulas. Este conteúdo é analisado, estudado, refletido e ressignificado.

Trabalhar conteúdos que favoreçam o contexto social no qual os alunos da EJA estão inseridos é de grande valia para uma aprendizagem significativa. Oliveira (2009) acredita que conteúdos os quais o educando possam usar em sua vida cotidiana são fundamentais para o desenvolvimento da autonomia do sujeito.

Tal desenvolvimento será mais qualificativamente desenvolvido se os conteúdos não forem trabalhados de forma infantilizada. A infantilização de conteúdos também é um contributo à evasão escolar na EJA.

Segundo Diniz e Oliveira (2009, p. 74):

O processo de alfabetização das turmas da Educação de Jovens e Adultos (EJA) está ancorado em práticas indispensáveis de leitura e escrita que também são desenvolvidas com as crianças das séries iniciais do Ensino Fundamental. Isso não quer dizer que o professor vá trabalhar lançando mão dos mesmos materiais e estratégias com públicos tão distintos. Não faz sentido. Esse é, inclusive, um dos motivos que levam os mais velhos a fracassar e abandonar a escola, embora exista uma variedade considerável de bons materiais organizados pelo Ministério da Educação (MEC) e pelas secretarias estaduais e municipais do país, muitos educadores ainda recorrem aos livros usados pela criançada.

Essas práticas de infantilização, tanto de conteúdo, como a forma de tratar os próprios educandos, não pode ser admissível na EJA. Para se desenvolver práticas adequadas de aprendizagem e para que ocorra uma aquisição de leitura e escrita é necessário respeitar seus ritmos e ideias. E para que essa construção ou produção aconteça é preciso que os profissionais envolvidos nesse contexto estejam engajados na identificação dessa modalidade de ensino, entendendo que os conteúdos trabalhados diferem dos conteúdos das salas de educação infantil e do ensino fundamental I, bem como a metodologia.

Oliveira (2009) faz algumas críticas sobre a questão da infantilização dos conteúdos, a partir das “famosas” lições de casa. Para ela, os objetivos das lições de

casa são para criar hábitos e disciplina, reforçando as responsabilidades dos alunos menores com os estudos. Quanto aos adultos, ainda em Oliveira (2009, p. 89):

Qual é a possibilidade real que tem um adulto, sem hábitos de lidar com atividades organizadas do modo como o são as escolares e que, na maior parte das vezes, trabalha o dia inteiro, de fazer sozinho o dever de casa. Mais ainda, pergunto-me qual é a função do dever de casa nessas circunstâncias, considerando o fato de que a criação da disciplina no estudo, importante como formação geral das crianças, não se aplica a este público e que a própria ideia de fixação de conteúdos pressupõe uma concepção de aprendizagem inadequada aos objetivos da escolarização de jovens e adultos?

O professor deve apreender as reais necessidades de seus alunos em sala e seus erros ainda nas atividades realizadas na própria sala. A partir desse olhar, direciona a sua atuação, criando situações que levem o aluno a reelaborar seus problemas em questão, sem que haja a necessidades de “folhinhas” e atividades para casa, que terão dificuldade de resolverem sozinhos.

Voltando à questão do estudo, é imprescindível compreender as etapas do desenvolvimento cognitivo para não trabalhar de uma forma que possa ser vista como infantilizada com os alunos da EJA. Para tanto, de acordo com Piaget citado por Davis e Oliveira (1980, p. 46):

As diferentes etapas cognitivas apresentam, portanto, características próprias e cada uma delas constitui um determinado tipo de equilíbrio. Ao longo do desenvolvimento mental, passa-se de uma para outra etapa, buscando um novo e mais completo equilíbrio que depende, entretanto, das condições passadas.

As etapas distintas do desenvolvimento do raciocínio foram denominadas e caracterizadas por Piaget em Sensório-Motora, Pensamento Pré-Operatório, Pensamento Operatório-Concreto e Pensamento Operatório-Formal. As etapas estão relacionadas dentro de um mesmo processo e não há como pular uma etapa para passar à outra.

Na etapa Sensório-Motora, que vai do nascimento até aproximadamente os dois anos, a criança, embora possua uma conduta inteligente, ela não possui pensamento.

Esses esquemas sensórios motores são construídos a partir dos reflexos inatos. Reflexos esses utilizados ainda nos primeiros meses para lidar com ambiente. Aos pouco essa etapa começa a se modificar a nível que a criança começa a descobrir o objeto e agir sobre o mesmo experimentando grande satisfação sobre estas ações. A experiência que a criança vai adquirindo ao longo desta etapa faz com que se dê início aos esquemas conceituais, que é um modo de internalizar as ações e conhecer e, assim, pressupõe um pensamento. Aos poucos essa etapa vai se modificando e com aparecimento das funções simbólicas altera a forma como a criança lida com o ambiente, dando início a uma nova etapa subsequente.

Na etapa do Pensamento Pré-Operatório o aparecimento da linguagem já é um fato. A criança também substitui algumas ações, objetos e pessoas, dando origem às palavras. Aqui o pensamento se desenvolveu, o que indica que a inteligência são ações interiorizadas. Esse pensamento nesta etapa recebe o nome de pensamento egocêntrico devido estar centrado apenas no ego da criança. O animismo também é uma característica desse pensamento, pois dá vida a objeto e animais.

“As ações no período pré-operatório, embora internalizadas, não são ainda reversíveis. Nele, a criança ainda não é capaz de perceber que é possível retornar,

mentalmente, aum ponto de partida” (PIAGET citado por DAVIS; OLIVEIRA, 2008, p.

43).

Na etapa do Pensamento Operatório-Concreto o egocentrismo dá lugar ao pensamento lógico e objetivo e o pensamento egocêntrico vai perdendo força. Assim, a criança vai criando um olhar diferenciado do mundo que a rodeia. A criança dessa fase só consegue pensar com bases em enunciados e proposições, assim ela não tem capacidade de pensar abstratamente.

Em Piaget citado por Davis e Oliveira (2008, p. 43-44):

Ao se comparar com as aquisições deste período com aqueles que o procedeu, grandes modificações ocorreram: o real e fantástico não mais se misturarão em suas percepções e o pensamento é denominado operatório porque é reversível: o sujeito pode retornar, mentalmente ao ponto de partida [...] O pensamento agora se baseia mais no raciocínio do que na percepção, neste período de desenvolvimento o pensamento operatório é denominado concreto porque a criança só consegue pensar corretamente nesta etapa se os exemplos ou materiais que ela utiliza para apoiar seus pensamentos existem mesmo e podem ser apoiados.

Na última etapa, a do Pensamento Operatório-Formal, a criança/adolescente começa a ter o pensamento livre de limitações. O pensamento concreto começa a ser substituído pelo pensamento lógico real. Assim ela começa a trabalhar com uma realidade possível e consegue ver as consequências lógicas cabíveis.

“Ao atingir o operatório-formal, o adolescente atinge o grau mais complexo de seu desenvolvimento cognitivo. Deste ponto em diante ele só terá que ajustar, solidificar e estofar suas estruturas cognitivas” (DAVIS; OLIVEIRA, 2008, p. 48).

Nessas duas últimas etapas, Operatório-Concreta e Operatório-Formal, encaixam-se as dificuldades cognitivas de muitos alunos das salas de EJA. Segundo Mendes (2007), passa-se a impressão de que, nas turmas de EJA, alguns dos adultos funcionam cognitivamente como as crianças, pois muitos deles não conseguem ultrapassar as operações concretas, dependendo sempre de recursos concretos para que seu raciocínio lógico seja desencadeado.

Ainda que as experiências dos adultos sejam muito mais avançadas do que as das crianças, muitos adultos que procuram a EJA possuem uma defasagem cognitiva.

Portanto, em muitas dessas vezes, cabe refazer o trabalho cognitivo para contribuir com seus alunos no processo de construção do conhecimento, visando o desenvolvimento do pensamento crítico.

“É essencial a abordagem de como as defasagens cognitivas do adulto situam-se em relação ao contexto de interações educativas, e como essas interações podem auxiliá-los na superação das mesmas” (MENDES, 2007, p. 127).

Essas interações educativas baseiam-se em atividades de trocas de experiências entre os educando de forma que aprendam a respeitar as ideias dos colegas, fortalecendo a necessidade de se ouvir o outro e aprenderem juntos. A maior parte da construção de conhecimento desses educandos advém do convívio humano e também cultural no qual se vivem.

Segundo o proferido no Parecer 009/2001, do Conselho Nacional de Educação, citado por Mendes (2007, p. 140):

O professor dedicado a essa modalidade educativa desenvolvam condições didáticas significativas aos adultos, o que requer compreensão desse universo, das causas e dos contextos sociais e institucionais que configuram as situações de aprendizagem desses alunos, o que, como reiteramos neste

excerto, podem evidenciar a necessidade de superação de defasagens cognitivas.

As atividades com situações-problemas, as que exigem do educando ação e reflexão, ajudam no processo de fortalecimento da sua aprendizagem significativa. E quando um educando se sentir recuado diante de tais, cabe ao professor motivar pedagogicamente esse educando, necessitando, para isto, de uma formação de qualidade.

Para trabalhar com jovens e adultos, por esse raciocínio, deveria ser exigido do professor uma formação própria ou ser ofertada a profissionais do magistério para esta modalidade.

Em Miguel (2006, p. 267):

O curso de formação para educadores para a EJA deve propiciar aos futuros profissionais elementos concretos para a caracterização da clientela que deverá abordar. O ensino não pode depender apenas de conteúdos a serem ensinados, mas, antes de tudo, o indivíduo a quem se pretende ensinar, deve preparar o professor para o exercício da descentração.

Essa descentração é a retirada dos conteúdos didáticos do centro da formação desses alunos. E, assim, passa a inserir o aluno como o principal protagonista das aulas.

Mas vale lembrar que os conteúdos didáticos também possuem sua relevância no processo educacional, cabendo ao professor reavaliar tais conteúdos e inseri-los nos contextos a serem trabalhados.

Contudo, o educador que se submete a assumir uma sala de EJA deve ter a plena consciência de que ele dará bases para o processo de transformação de seus educandos.

Transformação essa, que dará ao educando autonomia para questionar, de querer aprender sempre mais para refletir para duvidar do já aprendido. Portanto não se valoriza o ensinar bem.

O professor competente vai se utilizar de metodologias apropriadas que envolvam, para Miguel (2006), os três saberes integrados: o saber escolar, o saber aplicado e o saber do cotidiano.

Nos dias atuais, não basta só ensinar a ler e escrever em salas de EJA, os educandos devem ser sujeitos que interpretem, questionem, reflitam e sejam democráticos nas suas ações.

A necessidade de professores capacitados para essa modalidade de ensino se faz necessário, pela complexidade desta tarefa, onde alunos e professores troquem experiências e deslumbrem, juntos, a alegria do despertar; um despertar para o novo.

Quando um professor assume a sala de EJA e, nessa mesma sala, enxerga adultos como crianças, desvaloriza todo um querer, uma vontade de aprender do educando que na maioria das vezes acaba com a evasão de alunos. Nesta realidade, onde o educando se reprime diante de uma má orientação pedagógica, a EJA se torna um caminho incerto e “desnecessário” para muitos.

Para Miguel (2006, p. 256):

As pesquisas sobre EJA demonstram com clareza que o fazer pedagógico significativo, a prática de um bom professor, é caracterizado pela formação entre as dimensões política, técnica e humana e não deve se restringir à adoção incondicional de uma teoria.

Quando se investe em formação docente para a EJA, o professor vai reconhecer que todo conhecimento de seu aluno é de um sujeito pensante e por isso deverá utilizar

de seus conhecimentos teóricos para encontrar maneiras adequadas a fim de aplicar as metodologias de ensino.

Numa visão freireana, o processo de formação dos docentes deve refletir sobre os valores universais da educação, onde a concepção de ser humano é como um ser

"histórico e inacabado" e, assim, consequentemente sempre pronto a aprender o novo e de novo. Essa ideia engloba também os docentes, pois neles se reflete a necessidade de formação rigorosa e permanente.

Freire (1977) dizia que o mundo não é algo estático, pois a cada momento está sendo. E nesse processo de transformação, que a cada segundo surge uma novidade, cabe aos educadores refletirem e reavaliarem as ações educacionais e também fazer parte desse processo, descobrindo um novo mundo de conhecimentos e trabalhando de forma que o outro também faça parte dessa boa transformação.

3 Metodologia

A pesquisa de campo foi desenvolvida na escola da rede municipal de Sumaré/SP que atende a Educação de Jovens e Adultos, denominada EM José de Anchieta. Também foram realizadas pesquisas bibliográficas e documentais.

Na pesquisa de campo, além da observação como coleta de dados, foram realizadas entrevistas com a professora da sala observada, bem como, com 4 alunos.

Neste processo de observação, coube analisar as metodologias desenvolvidas em sala de aula e seus instrumentos, como as frequências com que se é usado os livros didáticos, folhas de fotocópias, atividades de escrita, tanto coletiva como individuais, rodas de conversas. E se isso é pertinente à idade dos educandos.

4 Resultados e discussões

A sala de aula da EJA da Escola Municipal José de Anchieta, possui 36 alunos matriculados e separados por fileiras. Da primeira até a terceira fileira, correspondem aos alunos do 1° ano. A quarta corresponde ao 2° ano, a quinta corresponde ao 3° ano, a sexta e a sétima fileiras correspondem aos 4° e 5° anos.

Foram entrevistados 4 alunos, que para efeito deste artigo, serão denominados de alunos A, B, C e D, respectivamente. As perguntas foram essas:

1. Qual sua idade?

2. Você chegou a frequentar o Ensino Fundamental quando criança? Até que série?

Por que voltou a estudar?

3. Os materiais didáticos trabalhados em sala pelo professor são infantilizados ou de difícil entendimento?

4. Você pretende dar continuidade nos estudos? Se sim, até que nível?

5. Você acredita que a EJA vai te ajudar até que ponto aqui no Brasil? Visto que você já era professor de ensino básico em Porto Príncipe no Haiti? (pergunta feita apenas para o aluno D).

Seguem as repostas obtidas de cada aluno:

Aluno A: Tenho 49 anos e frequentei até a primeira série. Fui matriculado aos 12 anos. Fiquei 2 anos na primeira série, quando meus pais morreram em um acidente de ônibus. Parei e ajudei minha irmã mais velha a criar as outras duas

menores. Em 2012, iniciei na EJA porque estou trabalhando na lavoura e quero sair de lá. Moro sozinho, casei minhas irmãs e fiquei só. Talvez se eu souber ler eu consiga me ocupar melhor e achar um bom emprego. Gosto de trabalhar na lavoura, mas trabalhar lá me causou muitas doenças já. Eu acho que o material que a professora utiliza com a gente dá para aprender um pouco, mas eu sou muito preguiçoso. Há 3 anos estou no primeiro ano. Só sei escrever meu nome.

Não é porque a professora não explica. Ela tenta, mas tenho dificuldades em reconhecer essas pequenas letrinhas (alfabeto móvel). A “pro” até traz umas folinhas assim “óh...” (um texto fotocopiado da extinta cartilha Caminho Suave), mas mesmo assim, para mim, é difícil. Pretendo continuar aqui na EJA até aprender ler e entender muita coisa que vejo pelas ruas. Já não tenho idade e nem saúde para supletivo e nem curso técnico, muito menos faculdades (risos). (Ele fecha dizendo) Estou indo pro forró nas sextas e perdendo

“muitas” namoradas por não conseguir escrever o nome das mesmas no celular.

O aluno A está há alguns anos ainda na fileira denominada de primeiro ano. Ele realmente tem uma dificuldade muito grande em aprender, porém a EJA é o único lugar onde ele não se sente só e por algumas horas o conhecimento adquirido nas socializações na sala o faz compreender e entender muitas coisas “burocráticas” fora da sala de aula. Para ele, as aulas deveriam ser mais dinâmicas e com conteúdos que realmente fizessem uma “mágica de aprendizagem”, mas seu problema vai além, há bloqueios psicológicos e também déficit de aprendizagem.

Aluno B: Tenho 39 anos e frequentei só a primeira série, depois não fui mais.

Parei porque no interior da Bahia ou você trabalha ou morre de fome. Eu senti a necessidade de voltar a estudar porque minha filha hoje tem 14 anos e já está no nono ano e é excelente aluna e me incentiva a estudar. Ela está morando na Bahia com meus pais e lá para falar com ela tem ser por carta. Minha esposa é quem as escreve e eu quero poder criar uma sozinho (todo orgulhoso, tira da carteira uma foto da menina que está na Bahia com os avós e me mostra). As atividades que as professoras passam para gente são diferentes dos outros colegas da sala, até mesmo pela divisão de série. Para nós todos, ela lê textos e faz perguntas (uma forma de reflexão), e depois ela passa esse texto pra gente copiar e responder as perguntas que estão na lousa. E quando a gente vê, a hora já foi embora. Esses dias ela ditou um texto que eu não consegui acompanhar. “Não estou maduro” para essa fase, mas preciso aprender.

Algumas coisas são difíceis. Eu acho as aulas de informática mais fáceis. Lá a gente consegue se “ajeitar” melhor, guarda onde tem que apertar e pronto. Eu ganhei bastante gibis e estou lendo no meu horário de almoço. Acho que é uma maneira de começar. Não gosto de jornais; muitas tragédias. Não falto um dia.

Mas todo dia é a mesma coisa: texto, pergunta e continhas. Minha cabeça e meus neurônios estão “cansados” demais para essas coisas.

O aluno B tem como problema maior o cansaço mental, causado sempre pela mesma metodologia de ensino, textos infantilizados e também as continhas. Para ele, a importância de voltar à EJA e continuar, mesmo que cansado fisicamente e mentalmente por ser pedreiro, é por se ver como exemplo para a filha que, apesar de tudo, incentiva-o a estudar e, por isso, segue firme todos os dias nas aulas. Para este

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