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2.3 As Contribuições da Pedagogia do Multiletramentos

2.3.2 Elementos do Design – Modos de Significação

No processo de design, os autores destacam a importância dos Elementos de Design como fundamentais na noção de multiletramentos e na complexidade dos diferentes modos de significado. Os seis modos de significados, além do linguístico, incluem: significados visuais (imagens, páginas, layouts, formatos de tela); significados de áudio (música, efeitos de som);

significados gestuais (linguagem corporal); significados espaciais (os significados de espaços ambienteis, ou arquitetônicos). Dos modos de significado, o Multimodal é o mais significante,

pois se refere a todos os outros modos em relações dinâmicas de produção de sentido. Por exemplo, a imagem de mídia de massa (anúncios, propagandas, notícias, reportagens, etc) relaciona o modo linguístico ao visual e ao gestual, e, juntos, tornam-se elementos intrínsecos, apresentam uma coesão multimodal que produz significados de acordo com a situação comunicativa, público-alvo, contexto de circulação, objetivo, conteúdo social e cultural.

De acordo com os autores, os modos de significados são essenciais para ler designs disponíveis (projetados) para projetar futuros sociais. O conceito de design enfatiza as relações entre modos de significado (designs disponíveis), a transformação desses modos de significado no seu uso híbrido (designing), e seu resultado(redesigned). A metalinguagem de criar significado se aplica a todos aspectos desse processo: como as pessoas reconhecem os elementos dos modos disponíveis de significado (designs disponíveis); como os autores de significados carregam a responsabilidade de serem conscientes em controlar suas transformações de significados (designing), e como os efeitos de significado se tornam uma parte do processo social (redesigned).

A transformação de designs disponíveis para redesigned como um resultado de design (criar significado e se apropriar deles) pode variar muito. Às vezes, os designers de significado reproduzirão os designs disponíveis na forma de redesigned mais próximo do que em outras vezes. Dependerá do gênero, do contexto social e da esfera em que o gênero circulará. Para Rojo (2015, p. 28):

o funcionamento das esferas também define ‘maneiras específicas de dizer/enunciar’, de discursar, cristalizadas e típicas desse campo social - os gêneros de discurso (para o Grupo de Nova Londres, available designs). Esses modos de dizer cristalizados também são apenas relativamente estáveis, e não padrões imutáveis a serem seguidos modelarmente: eles variam de acordo com os tempos, as culturas e lugares enunciativos e as situações específicas de enunciação. Se assim não fosse, não poderíamos estar discorrendo sobre os ‘textos contemporâneos’. No entanto, eles formatam os modos de enunciar.

Ao inserir esse processo de design na produção de enunciados na escola para chegar ao redesigned, haverá gêneros que serão mais sistematizados e se aproximarão com mais facilidade do design disponível (por exemplo, uma carta de reclamação) e outros que serão menos sistematizados (por exemplo,vídeo-clipe). Percebe-se que, quanto maiores as possibilidades de tornar o gênero (design disponível) híbrido, maiores serão as margens de manobra criativas para a elaboração do redesigned.

No design, o hibridismo é presente, caracteriza-se pelo uso de mecanismos de criatividade e de cultura como processo de produção de sentido na sociedade contemporânea.

As pessoas criam e inovam cruzando, articulando novos jeitos, novas práticas estabilizadas e convenções com diferentes modos de significado (de discursos, gêneros, elementos semióticos), e variadas combinações de modos de significado cortando laços de convenção e criando novas convenções.

Para Cope e Kalantzis (2009), compreender as noções de design (available designs, designing e the redesigned) torna-se fundamental para compreender a teoria de aprendizagem dos multiletramentos, que tem como foco a transformação, a apropriação (redesign) na produção de significados. As noções de design, de acordo com os autores, transformam-se na pedagogia dos multiletramentos, focada no ensino de línguas, em quatro dimensões pedagógicas: prática situada, instrução aberta, enquadramento crítico e prática transformada, conforme veremos na seção seguinte.

2.3.3 “Learning by Design” - o Novo Design dos Estudos dos Multiletramentos

A partir das propostas do GNL, Cope e Kalantzis (2009, 2015) dão continuidade aos estudos pedagógicos dos multiletramentos e desenvolvem novas pesquisas por meio do projeto

“Learning by design”, retomando e reformulando alguns conceitos já propostos pelo GNL (Prática situada, Instrução aberta, Enquadramento crítico, Prática transformada), desenvolvendo um novo diagrama. O foco de “Learning by design” está na ação e não na cognição, pois o projeto visa a compreender como o aprendiz desenvolve novos conhecimentos, não naquilo que ele já conhece, mas na construção do velho para o novo conhecimento.

Os multiletramentos tem três componentes básicos (Por quê? O quê? e Como?) que norteiam essa teoria. O primeiro (“Por quê?”) está vinculado às mudanças tecnológicas que atingem a esfera do trabalho, da cidadania e identidade das pessoas, conforme já dito antes. As mudanças tecnológicas fazem com que o papel dos letramentos também se transforme, pois considerar apenas o verbal e o impresso se torna insuficiente na sociedade contemporânea. Os novos modos de significado requerem que o sujeito/aprendiz seja capaz de negociar diferenças de significado de um contexto para outro (cultura, gênero, experiência de vida, temática, social).

Toda a troca de significado é, de alguma forma, intercultural.

O segundo (O quê?) esclarece que a palavra Multiletramentos tem dois significados para o “Multi”: as grandes diferenças em contextos sociais e culturais, e os padrões de comunicação com seus diferentes modos de significado (a multimodalidade – a fusão entre os elementos linguísticos escritos com padrões orais, visuais, gestuais, áudio, sonoro e espacial de significados). Ou seja, toda a influência das novas mídias multimodais exige novos

conhecimentos, uma nova pedagogia para o trabalho com gêneros multimodais no currículo de ensino e na prática da sala de aula, fazendo a escola desenvolver conexões atuais com os meios de comunicação e a prática social dos aprendizes. E essas novas conexões exigem que o aluno realize um movimento que não é linear, nem unilateral, ao contrário, no processo de produção e leitura em textos multimodais em contextos da mídia digital, a constituição do significado é ampla e complexa, exigindo do produtor ou leitor do gênero compreender, desenvolver e criar novos significados com recursos multimodais. Na contemporaneidade, o enunciado é tecido pela multimodalidade na sua composição. É crescente o estudo sobre a multimodalidade realizado por Gunther Kress (KRESS 2009; KRESS; VAN LEEUWEN 1996), Theo Van Leeuwen (VAN LEEUWEN 2008) entre outros pesquisadores. Esses autores trabalham na perspectiva de uma gramática visual. Nosso foco são os novos e os multiletramentos que se valem também da multimodalidade para construir significados na produção de gêneros que circulam na rede digital.

E o terceiro componente, o mais complexo, diz respeito a Como desenvolver uma Pedagogia de Multiletramentos. Cope e Kalantzis (2009:2015) propõem um diagrama reformulado, a partir do que o GNL, em 1996, já havia apresentado. A nosso ver, o novo diagrama proposto por Cope e Kalantzis evidencia um recuo da proposta da Pedagogia dos Multiletramentos ao apresentar os novos conceitos: Prática situada/Experienciar, Instrução aberta/Conceituar, Enquadramento crítico/Analisar, Prática transformada/Aplicar. Não concordamos que a prática transformada seja uma aplicação de conteúdo.

Figura 2 - Diagrama de Cope e Kalantzis

Fonte: Cope e Kalantzis (2015).

Esses conceitos foram desenvolvidos baseados em pesquisas realizadas na Austrália (desde 2000) a partir da proposta do GNL e o aprofundamento da pesquisa no projeto Learning by Design, que conta com a participação colaborativa de docentes que desenvolvem suas experiências nessa perspectiva pedagógica. Os quatro componentes caracterizam-se da seguinte maneira:

a)prática situada/experimentar: a cognição humana está situada socialmente, ela é contextual e os significados são produzidos em padrões do mundo real, de interesses, de experiências, de ações e assuntos. A prática situada “Remete a um projeto didático de imersão em práticas que fazem parte da cultura do alunado e nos gêneros e designs disponíveis para essas práticas” (ROJO, 2012, p. 30), buscando uma conexão entre a aprendizagem escolar e as experiências práticas fora da escola dos aprendizes que precisam ser conectadas para que a aprendizagem também seja situada;

b)instrução aberta/conceituar: envolve conhecimentos teóricos desenvolvidos por comunidades experts de prática. Conceituar é um processo de conhecimento. No caso do ensino e da aprendizagem dos multiletramentos, envolve o desenvolvimento de uma metalinguagem para compreender os ‘elementos de design’, assim como a sua coesão multimodal entre os diferentes modos de significado;

c) enquadramento crítico/ analisar: envolve desenvolver atividades que conduzam o aprendiz a mobilizar sua capacidade de interpretar os contextos sociais, a analisar criticamente textos, imagens, vídeos, gráficos, sons, gestos em um gênero. Ao compreender a relevância desses significados, o aprendiz desenvolve seu senso crítico tanto no processo de produção quanto no processo de leitura de um gênero multimodal, analisa criticamente, faz escolhas, de acordo com os seus conhecimentos, e sua bagagem cultural somada aos conhecimentos produzidos ao longo do projeto;

d)prática transformada/aplicar: a prática transformada é a aplicação do conhecimento e do entendimento do aprendiz em relação à complexa diversidade das situações do mundo real. Ou seja, leitura, escrita e multimodalidade são usadas

como prática social para agir no mundo, criar enunciados multimodais e colocá- los em uso em reais situações comunicativas, transformando-se por meio do redesign e usando o conhecimento construído para interagir em outros contextos.

Tais conceitos caracterizam-se por compreender que o trabalho pedagógico do docente, na perspectiva dos multiletramentos, requer que a aprendizagem promova experiências, seja social, ubíqua, multimodal, contextualizada, cultural, reflexiva, composta por diferentes movimentos pedagógicos realizados pelo aprendiz e docente. Nessa mesma direção, Cope e Kalantzis (2015), afirmam que a teoria do multiletramento promove uma pedagogia reflexiva.

Para Cope e Kalantzis (2015), um dos aspectos da reflexividade é mover-se entre diferentes Processos de Conhecimento, em que a força do aprendizado é a “superposição de saberes, relacionando o conceitual ao experiencial, a aplicação baseada em análise fundamentada, ou conexão de experiências anteriores com novas aplicações, e assim por diante”. Outro significado para reflexivo é a conexão recíproca dos processos de aprendizagem (esquemas conceituais, análise crítica, etc.) entre experiências e aplicações práticas baseadas no mundo real, ou em simulações. A Pedagogia Reflexiva procura enfatizar também a atenção que os professores devem dar aos processos avaliativos durante o movimento pedagógico, que sejam apropriados em diferentes momentos da aprendizagem para diferentes alunos e para diferentes matérias.

Para Cope e Kalantzis (2015), não há uma hierarquia no processo de ensino, nem uma sistematização rígida das atividades, mas um planejamento, uma organização flexível e viva às reações e descobertas dos alunos, o desenvolvimento do domínio do assunto para o encadeamento do processo de aprendizagem. Para os autores, a experiência produz significado e aprendizado para o sujeito. Já na prática pedagógica ela ocorre de forma consciente, planejada, explícita e estruturada, pois o professor desenvolverá uma sequência de movimentos epistemológicos subjacentes ao ensino para promover espaços de aprendizagens ao aluno.

A concepção da pedagogia dos multiletramentos nos impulsiona a pensar em novas práticas. Como apresentamos anteriormente, a Pedagogia dos Multiletramentos passou por uma reformulação teórico-metodológica. Entendemos que nossa pesquisa dialoga com o primeiro conceito de design apresentada por Cope e Kalantzis (2000), em que eles defendem o conceito de design (available designs, designing e the redesigned). Essa concepção teórica embasa a nossa compreensão na formação de alunos designers na escola a partir do desenvolvimento de projetos, numa perspectiva de aprendizagem interativa (LEMKE, 2010). Para Kalantzis e Cope (2000), é fundamental criar relações sociais de aprendizagem e relações colaborativas de design

pedagógico explorando as mídias digitais. Assim, as pessoas determinam o que elas precisam saber baseando-se em suas participações em atividades de acordo com as necessidades que surgem no projeto, de forma que tenham protagonismo e façam uso do que aprenderam em práticas sociais situadas. Seguindo essa compreensão de design, não concordamos totalmente com a proposta reformulada na obra de (2009), com a ressignificação do quadro e renomeação das práticas pedagógicas do“Learning by Design”: Prática situada/Experimentar, Instrução aberta/conceituar, Enquadramento crítico/analisar, Prática transformada/aplicar. Parece-nos que há uma recuada dos autores em relação à primeira orientação pedagógica apresentada na primeira obra. Entendemos que não se trata de experimentar as TDs e somente aplicá-las, mas sim ressignificá-las no contexto social e de aprendizagem do aluno, possibilitando-lhe novos espaços para aprender, criar e se apropriar de designs e explorando-os em novas interações na rede digital, agindo como um designer de significados na sociedade. Nesse processo de criação para agir no mundo, o aprendizado passa a ser uma consequência de uma série de ações de conhecimento, usando meios multimodais para externalizar o pensamento e concretizá-lo.

Aprender consiste em maneiras de agir em, com e por esses meios. Assim, nossas maneiras de pensar desenvolvem-se numa perspectiva de aprendizagem social.

Na seção seguinte, nosso foco encontra-se no letramento digital, nos novos letramentos e na cultura participativa na Educação e nos papéis sociais que professor e aluno assumem no contexto da comunidade escolar.

2.4 Delineando Conceitos: letramento digital, novos letramentos e letramento midiático