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A leitura e a escrita têm passado pelas transformações da própria sociedade da era digital. Na sociedade contemporânea, o conceito de letramento é ampliado e passa a representar o ponto de partida (não só da escola, mas da sociedade) para o desenvolvimento de cidadãos críticos e imersos em uma cultural digital. Como apontamos, “Trabalhar no campo do letramento adiciona a perspectiva de práticas para estudar o texto, abrangendo o que as pessoas fazem com o texto e o que essas atividades significam para elas [...]” (BARTON; HAMILTON, 1998, p. 6), entretanto, a era tecnológica tornou a leitura, a escrita e a comunicação mais digitais, mais ubíquas, mais híbridas e mais multimodais, exigindo, inevitavelmente, novos letramentos da sociedade para (inter)agir no mundo. As tecnologias estão imersas na vida da sociedade, são inseparáveis do contexto de cada indivíduo, cobrando novos conhecimentos dos usuários para participarem ativamente de práticas sociais letradas e digitais em diferentes contextos sociais.

Quando falamos de letramentos, falamos de práticas sociais que são necessárias (e usadas), tanto no impresso quanto no digital. (KERSCH; MARQUES, 2016).

Com a internet e a pluralidade dos meios de comunicação digital, o letramento passou a ser digital, ampliando os modos de se comunicar através da linguagem escrita e multimodal (KRESS; VAN LEEUWEN, 2001), exigindo dos sujeitos, consequentemente, novas capacidades de leitura, compreensão e de produção de gêneros discursivos (cada vez mais digitais e multissemióticos). Nesse contexto, o conceito tradicional de letramento não dá conta da pluralidade dos canais de comunicação da era digital e as interações culturais e sociais no mundo global, o que exige um novo conceito, os multiletramentos (GRUPO DE NOVA

LONDRES, 1996; COPE; KALANTZIS, 2000, 2009, 2010, 2015; ROJO, 2009,2012,2013,2015). Os multiletramentos vão além do texto verbal, mostram as diferenças em contextos culturais, sociais e comunicacionais imersos na multimodalidade. Evidenciam a variabilidade de criação de significado em diferentes contextos culturais, sociais ou específicos.

Nos multiletramentos, a comunicação e a representação de significado hoje requer que os aprendizes se tornem capazes de negociar diferenças em padrões de significado de um contexto para outro. Essas diferenças são as consequências de muitos fatores, incluindo cultura, gênero, experiência de vida, assunto, conhecimento e as mídias de informação e comunicação. Ou seja, os multiletramentos nos conduzem a compreender que a significação não está apenas no texto, no nível linguístico, mas em diferentes modos de representação da comunicação situadas em diferentes práticas sociais.

Como dissemos, os multiletramentos são constituídos pela multimodalidade (visual, sonora, espacial, corporal, etc) e representam nossa posição em relação ao mundo nas diferentes redes das quais participamos, seja social, acadêmica, profissional. Para Barton e Lee (2015, p.

33) “construir sentido por meios multimodais é uma maneira de posicionar a si mesmo e aos outros”, ou seja, por meio da linguagem, o sujeito se posiciona em relação ao mundo e na era digital e midiática; compreender o efeito da multimodalidade presente na linguagem midiática (impressa e digital) requer obrigatoriamente desenvolver competências e letramentos digitais dos sujeitos para agir socialmente no mundo.

Em nossa pesquisa, nosso olhar para o contexto escolar, mais especificamente para o trabalho didático com a linguagem, a leitura e a escrita do século XXI. Vemos, nos estudos dos multiletramentos e dos novos letramentos, possibilidades para refletir sobre novas estratégias pedagógicas para trabalhar com gêneros menos tradicionais na e fora da sala de aula, de forma que eles ultrapassem os muros da escola e conectem-se a outras redes por meio da linguagem.

A Educação da era digital, como já dissemos, requer que os alunos desenvolvam novas habilidades de leitura e de escrita na esfera midiática, construindo sentido na produção de gêneros discursivos digitais para agir criticamente no mundo que o cerca e participar dele.

Para Lemke (2010, p.455), “letramentos são legiões. Cada um deles consiste em um conjunto de práticas sociais interdependentes que interligam pessoas, objetos midiáticos e estratégias de construção de significado”. Ou seja, os letramentos devem ser compreendidos como uma rede que “parte de sistemas mais amplos de práticas que dão coesão à sociedade, que fazem dela uma unidade de organização própria e dinâmica muito mais ampla do que o indivíduo”. (LEMKE, 2010, p. 459).

Portanto, repensar os processos de leitura e de escrita no século XXI, enquanto práticas sociais situadas no contexto escolar e na vida do aluno, implica mudanças na forma como trabalhamos didaticamente as dimensões da linguagem na sala de aula e como oportunizamos espaços de aprendizagens, de diálogo e de comunicação para a formação cidadã do aprendiz numa sociedade em que o acesso à tecnologia está cada vez mais presente, ubíquo, híbrido, (inter)ativo e participativo em nossas vidas. A escola é uma agência de (multi)letramentos e tem (ou melhor, sempre teve) o poder de (trans)formar a identidade de seus sujeitos (professores, alunos e comunidade escolar).

Para o Grupo de Nova Londres, (2000, p. 09), “Se fosse possível definir geralmente a missão da educação, poder-se-ia dizer que o seu propósito fundamental é garantir que todos os alunos beneficiem da aprendizagem de uma forma que lhes permita participar plenamente na vida pública, comunitária, criativa e econômica”, ou seja, o papel da escola é promover uma aprendizagem participativa do aluno na sociedade, inseparável de seu contexto, e as TDs, presentes na cotidiano de nossa sociedade tecnológica, também passam a ser indissociáveis do processo de aprendizagem.

Na era digital, as conexões na comunicação são dinâmicas, quase instantâneas e multidirecionais no tempo, no espaço e na sua relação com o(s) interlocutor(es), produzindo diferentes sentidos nos mais variados contextos sociais e digitais alcançados. Assim, falar em Educação do século XXI no que tange ao trabalho com a linguagem, o conceito de letramento é base para pensar a leitura e a escrita como práticas sociais letradas, mas não o suficiente, pois ele abrange apenas o papel das mídias impressas na linguagem, o seu alcance não está na mídia digital. Na era digital, exige-se novas formas de comunicação, e elas exercem efeitos na vida das pessoas para a constituição de uma rede de comunicação não linear, que interage continuamente com diferentes sujeitos sociais, exigindo letramentos digitais dos usuários. De acordo com Di Felice (2012, p.13), “Uma nova cultura tecnológica e comunicativa marca o cotidiano e a existência das novas gerações que vivem em contextos sociais e midiáticos digitais, e que produzem alterações qualitativas na política, na democracia e na forma de pensar a sociedade”. A comunicação é constituída pela linguagem e, neste contexto social, midiático, cultural e digital, precisamos compreendê-la para explorá-la no campo educacional, ampliando o trabalho com gêneros discursivos que circulam nas mídias digitais. (ROJO, 2012).

Embasamo-nos nos estudos dos multiletramentos (COPE; KALANTZIS, 2000; COPE;

KALANTZIS, 2015, ROJO, 2009, 2012; GNL, 1996) e dos novos letramentos (HOBBS, 2010;

JENKINS, 2006; LANKSHEAR; KNOBEL, 2003, 2007; LEMKE, 2010), conceitos

norteadores nesta pesquisa para repensar o trabalho com a linguagem e as ações que elas requerem em novas práticas docentes, conforme veremos nas seções que seguem.