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3. EPISTEMOLOGIAS FEMINISTAS E MÉTODOS

3.8 ENTREVISTAS

106 os atendimentos estão sendo feitos e os casos julgados, tendo como foco o gênero (ou mesmo a raça, etnia, sexo, sexualidade). Estas questões emergiram quando as acadêmicas feministas começaram a pesquisar e a se deter, também, sobre os aparatos criminais e tentar entender como estes respondem aos anseios das mulheres em situação de violência.

Cabe ressaltar também que Levy (2007) analisa que, além de evidenciarmos os estereótipos preconceituosos contra as mulheres que permanecem enraizados nas culturas e nas instituições – como é o caso aqui do Poder Judiciário –, as análises de conteúdo feministas são importantes por apresentarem também uma forma de resistência e de evidenciar que estes embates e tensões existem, e, com eles, almejar novas formas de democracias, mais igualitárias, mais justas e despatriarcalizadas (LEVY, 2007, p. 246).

Apresentaremos, por fim, nossa última técnica de pesquisa utilizada para a coleta de informações acerca do julgamento dos casos de violência contra as mulheres pelos desembargadores do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Esta fonte de dados também se apresenta importante, como veremos, para estudos de casos e também para que possamos entender de uma forma mais abrangente, desta vez pelos próprios desembargadores, como este julgamento ocorre e sob quais premissas estão ancorados ao realizarem os julgamentos e proferirem as sentenças.

107 Desembargadora 1 Mulher TJMG 28/01/2013 1ª Câmara Criminal 10/06/2016 Desembargador 2 Homem TJMG 26/04/2010 1ª Câmara Criminal 10/06/2016 Desembargador 3 Homem TJMG 31/10/2013 1ª Câmara Criminal 15/06/2016 Desembargador 4 Homem TJMG 12/12/2014 18ª Câmara Cível 17/06/2016 Desembargadora 5 Mulher TJMG 18/03/2005 14ª Câmara Cível 01/11/2016 Desembargador 6 Homem TJMG 19/12/2008 4ª Câmara Criminal 01/11/2016

Entrevistada 7 Mulher COMSIV-TJMG 2014 25/10/2016

Entrevistada 8 Mulher SPM-MG 2015 27/10/2016

Fonte: Elaboração própria

Este material é importante pelo fato de podermos confrontar o posicionamento público dos magistrados com o que é expresso nos acórdãos judiciais, como também para que possamos entender melhor de que forma as decisões são proferidas – por exemplo, qual o entendimento dos(as) desembargadores(as) sobre as situações de violências contra as mulheres e as provas necessárias para que seja feita a condenação do agressor. Portanto, o roteiro das entrevistas foi adaptado para enfatizar o enfrentamento à violência contra a mulher, com questões abordando desde a estrutura física do local, funcionários, formação e capacitação dos mesmos, como também sobre a opinião dos entrevistados acerca da situação de violência vivenciada pelas mulheres no município de Belo Horizonte e em Minas Gerais de forma geral.

As entrevistas foram realizadas e transcritas pela própria pesquisadora, desta forma, temos uniformidade em todo esse processo. Esta etapa teve início no dia 2 de junho de 2016, no momento do Curso de Diretrizes Nacionais para Investigar, Processar e Julgar, com Perspectiva de Gênero as Mortes Violentas de Mulheres - Feminicídio, organizado pela COMSIV e realizado no TJMG, onde o primeiro contato com os desembargadores foi realizado.

A partir daí, a primeira entrevista foi agendada e, posteriormente, as entrevistas com os desembargadores foram sendo realizadas de acordo com a disponibilidade e receptividade dos mesmos no próprio TJMG, tendo em vista que o agendamento via telefone não estava sendo bem sucedido. Cabe ressaltar que, todos os desembargadores que participaram das entrevistas se dispuseram, gentilmente, mesmo sem agendamento prévio, a me receber e fornecer informações valiosas para a realização desta pesquisa.

O uso da técnica de entrevistas é uma das fontes de informação mais importantes e essenciais para a realização de um estudo de caso. Ela pode ser realizada com atores-chave

108 envolvidos no fenômeno de análise, que fornecem não apenas suas percepções e interpretações sobre o assunto, mas também podem informar sobre novas fontes que podem ser pesquisadas para que evidências empíricas sejam elucidadas (YIN, 2001, p. 112).

Com esta técnica, é possível à pesquisadora estabelecer contato direto com o(a) entrevistado(a), para quem realiza perguntas com objetivo de que sejam coletadas informações que contribuam para a pesquisa. As entrevistas podem ser estruturadas – que seguem um rígido roteiro de pesquisa e sem possibilidade de abertura para outras questões - ou semiestruturadas – que possibilitam à pesquisadora utilizar o roteiro de forma flexível, tendo como base o diálogo estabelecido entre pesquisadora-pesquisado(a) de forma que novas questões ou temas que vierem a surgir neste momento também possam ser abordados para maior compreensão sobre o fenômeno (VEIGA e GONDIM, 2001, p. 5). Utilizamos nesta pesquisa o modelo de entrevista semiestruturada para que, ao longo do diálogo, novas questões colocadas pelos(as) desembargadores(as) pudessem ser melhor exploradas bem como a elucidação de diferentes perspectivas e pontos de vistas sobre as situações de violência vivenciadas pelas mulheres em Minas Gerais.

Apesar de muito importante, Yin (2001, p. 14) ressalta que o uso exclusivo desta técnica apresenta problemas como, por exemplo, visões preconceituosas e distorcidas sobre os fatos que ocorreram, e, por isso, devem ser utilizadas como forma de corroborar outras fontes de dados. Assim, como já informamos, utilizamos as entrevistas realizadas como forma não de análise exclusiva sobre a atuação dos desembargadores do Tribunal de Justiça de Minas Gerais com relação aos casos de violência contra as mulheres que chegam à segunda instância, mas como mais uma fonte de evidência, que, em conjunto com as análises dos acórdãos, possam nos apresentar um panorama mais aprofundado sobre o fenômeno.

Por fim, assim como as demais técnicas já apresentadas, a entrevista com a perspectiva feminista se interessa em buscar pela diversidade acerca da realidade das mulheres, que muitas vezes, ficam invisibilizadas e não são articuladas. São realizados questionamentos que estão preocupados com a vida das mulheres, em questões que possam auxiliar a mudança social, a justiça e maior igualdade para as mulheres e também outros grupos marginalizados.

Pesquisadoras feministas que realizam entrevistas estão preocupadas, por exemplo, em entender como outros públicos lidam com a questão da violência contra as mulheres e, no nosso caso, como respondem às demandas feitas nesses casos pelas mulheres em situação de violência e quais as respostas são dadas (HESSE-BIBER, 2007, p. 114).

109 Um exemplo de entrevistas feministas pode ser observado em Pasinato (2012), onde a autora realiza entrevistas com as mulheres que buscaram atendimento na Delegacia Especializada em Belo Horizonte, como forma de evidenciar experiências que estão, por vezes, escondidas e visibilizar a voz das mulheres sobre o serviço prestado. Da mesma forma, a pesquisadora reflete sobre o lugar que ocupa e quais foram os motivadores políticos e sociais que a levaram a realizar sua pesquisa, como vimos no início deste capítulo com as epistemologias feministas, há um engajamento político substancial para a realização das entrevistas (HESSE-BIBER, 2007, p. 118).

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Como informamos, queríamos com este capítulo apresentar nossas principais bases epistemológicas e metodológicas da pesquisa. Queremos, com isso, demarcar sobre quais lentes epistemológicas estamos percorrendo todo este caminho, quais sejam, as epistemologias feministas. Apresentamos também a metodologia e as técnicas de pesquisa utilizadas para a coleta e análise dos dados. Analisamos brevemente o estado de Minas Gerais (nosso caso de estudo) e apresentamos um panorama geral de como as políticas públicas de enfrentamento à violência contra as mulheres estão sendo desenvolvidas e quais entraves ainda apresentados.

Iniciamos também a apresentação de algumas entrevistas de forma a ilustrar as informações provenientes dos diagnósticos já realizados no estado. Estas serão desenvolvidas com mais ênfase e de forma analítica no próximo capítulo, onde apresentamos nossos resultados de pesquisa já enunciados aqui: análise descritiva dos acórdãos judiciais e análise qualitativa do conteúdo destes acórdãos.

4. OS ACÓRDÃOS JUDICIAIS DE VIOLÊNCIA CONTRA AS MULHERES DO

No documento universidade federal de minas gerais (páginas 119-122)