LARISSA ZEGGIO PEREZ FIGUEREDO
MEMÓRIA EMOCIONAL DE RATOS SELECIONADOS NO CAMPO
ABERTO EM ALTO E BAIXO
REARING
:
aquisição, consolidação e extinção no condicionamento de medo
Tese apresentada à Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina como parte dos requisitos para obtenção do Título de Doutor em Ciências.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO
SÃO PAULO
LARISSA ZEGGIO PEREZ FIGUEREDO
MEMÓRIA EMOCIONAL DE RATOS SELECIONADOS NO CAMPO
ABERTO EM ALTO E BAIXO
REARING
:
aquisição, consolidação e extinção no condicionamento de medo
Tese apresentada à Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina como parte dos requisitos para obtenção do Título de Doutor em Ciências.
Orientador: Prof. Dr. Marco Antonio Campana Venditti
Co- Orientadora: Profa. Dra. Maria Gabriela Menezes de Oliveira
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO
SÃO PAULO
LARISSA ZEGGIO PEREZ FIGUEREDO
MEMÓRIA EMOCIONAL DE RATOS SELECIONADOS NO CAMPO
ABERTO EM ALTO E BAIXO
REARING
:
aquisição, consolidação e extinção no condicionamento de medo
Presidente da banca: Prof. Dr. Marco Antonio Campana Venditti (orientador)
Banca Examinadora: ____________________________________ Prof. Dr. Orlando Amodeu Bueno
____________________________________ Prof. Dr. Gilberto Fernando Xavier
____________________________________ Prof. Dr. Jorge Quillfeldt
____________________________________ Prof. Dra. Tatiana Lima Ferreira
____________________________________
Prof. Dra. Maria Gabriela Menezes de Oliveira (co-orientadora)
____________________________________ Profa. Dra. Deborah Suchecki (suplente) ____________________________________ Profa. Dr. Mario Pedrazzoli (suplente)
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO
ESCOLA PAULISTA DE MEDICINA DEPARTAMENTO DE PSICOBIOLOGIA
Chefe do departamento: Profa. Dra. Maria Lucia Oliveira de Souza Formigoni
Coordenadora do curso de pós-graduação: Profa. Dra. Maria Gabriela Menezes
Esta tese de doutoramento foi realizada no Departamento de
Psicobiologia da Universidade Federal de São Paulo
–
Escola
Paulista de Medicina, com o apoio financeiro da AFIP
–
Associação
Dedico este trabalho à minha
querida e amada mãe, Maria Tereza
Zeggio. Aquela que soube me ensinar
com graça e força a beleza de viver, e
de quem me orgulharei todos os dias
Ao meu inestimável marido
Francisco Paulino Dubiela. Sem a sua
força, seu amor e sua inesgotável
paciência, eu nunca teria chegado até
aqui. Obrigada por trazer novamente
AGRADECIMENTOS
Devo confessar que onze anos de Psicobio (alcunha essa que nos
impregna até a alma) foram suficientes apenas para me iniciar na vida. Na vida
como cientista, como docente, como eterna curiosa e questionadora e, porque
não, na própria vida adulta.
Assim, os agradecimentos dessa tese são àqueles que me
acompanharam durante os melhores e os piores momentos da minha história.
Àqueles que me ensinaram, apoiaram, questionaram, puniram, elogiaram e,
sobretudo, estiveram lá durante todos esses momentos, bons e ruins,
profissionais e pessoais, me fazendo me tornar sempre alguém melhor.
Ao meu orientador Prof. Marco Antonio Campana Venditti, pela confiança
e cuidado durante a orientação. Agradeço pela oportunidade de desenvolver
esse trabalho ao seu lado.
A Profa. Maria Gabriela Menezes de Oliveira que, como sempre, continua
sendo minha segunda mãe e grande mestra de minha formação.
Ao “meu Fran” por ter devolvido luz e alegria a minha vida. Agradeço por
você ser aquele que irá compartilhar todos os dias da minha existência e por
fazer isso parecer tão fácil!
Aos amigos do coração: Karin, Tati, Paulinha, Raquel, Fran Godoy e Jú,
pela compreensão, companhia e apoio inesgotáveis ao longo do meu
Aos queridos membros do inestimável grupo de memória e aos agregados
desse, que sempre contribuíram de alguma forma para o meu
desenvolvimento.
A todos os amigos e companheiros do Departamento e, em especial:
Marcos, Rosana, Adriana, Bruna e Gilbertinho.
A todos os técnicos, pelo valioso apoio: Marilde, Ricardo, Zé e Gilbertinho;
e aos meninos do biotério, nada seria possível sem vocês!
Agradeço em especial ao Zé e ao Ricardo pela dedicação, paciência e por
toda força na realização dos experimentos. Agradeço ainda a querida Rosana
pela aprendizagem e auxílio ao longo de todo esse trabalho.
Aos funcionários da Psicobio: Cris, Nereide, Julinho, Mara, Val e tantos
outros que sempre estiveram por perto para ajudar.
Aos meus eternos amigos, por me apoiarem e incentivarem durante cada
passo da trajetória de conquista dos meus sonhos: um brinde as Sex and City
versão para oito® (Pri, Adri, Cami, Dani, Paulinha, Gi Anselmo e Gi Mendonça). Aos amigos de labuta que entendem muito bem a angústia e a delícia de
ser professor: Fê, Izildinha,Carol, Maroca, Ivan, João, Agnaldo, e Marcelo.
À minha família. Meu querido irmão que, apesar da distância, sempre me
aquece o coração; ao querido Fran, pelas conversas e reflexões carinhosas; e
à minha mãe pela incansável sabedoria, amor e desejo de me fazer feliz.
A todos aqueles que, de alguma forma, fizeram parte desta longa jornada.
Aos animais, meus eternos bebês.
“Minha vida sempre foi permeada por palavras fortes. „inda que elas pouco traduzam aos olhos de outrens
seu verdadeiro significado... Amor vincit ominia‟ ”
RESUMO
O comportamento de rearing apresenta papel fundamental na exploração,
sendo considerado mais eficiente na busca e introjeção de informações do ambiente do que outros comportamentos exploratórios. A formação hipocampal parece ser a estrutura neural envolvida na inter-relação entre rearing, formação
de mapas cognitivos e emocionalidade. Além disso, a utilização de subgrupos de animais que apresentam alta (HR) ou baixa (LR) expressão de rearing pode
amplificar a observação de potenciais diferenças neurobiológicas correlatas. No presente projeto, foram investigados os processos de aprendizagem, consolidação, esquecimento e extinção da memória nas tarefas de condicionamento de medo ao contexto (CCONT) e ao som (CSOM) de animais selecionados como HR e LR frente à novidade inerente ao campo aberto.
A primeira etapa mostrou que os animais diferem no desempenho de alguns aspectos do CCONT, mas não do CSOM. Animais dos subgrupos HR e LR aprendem igualmente as tarefas de CCONT e CSOM quando testados 24 horas após o treino. Quando o teste das tarefas é realizado 30 dias após o treino, o subgrupo LR apresenta hiperconsolidação em comparação ao subgrupo HR apenas na tarefa contextual. Os animais LR também déficit na extinção da tarefa de CCONT comparados ao subgrupo HR, mas a extinção é similar entre os subgrupos no CSOM. O padrão comportamental apresentado pelos animais do subgrupo LR parece análogo à hiperconsolidação e déficit de extinção da memória traumática, sintoma comportamental predominante do transtorno de estresse pós-traumático (TEPT).
Para explorar essa hipótese, a segunda etapa desse trabalho avaliou a influência do antidepressivo tricíclico imipramina (20 mg/kg) e do benzodiazepínico diazepam (10 mg/kg) (drogas usadas na terapêutica do TEPT) na extinção da memória emocional condicionada ao contexto dos animais dos subgrupos HR e LR, no intuito de reduzir o déficit de extinção dos animais do subgrupo LR. Os resultados mostraram que os animais selecionados em HR e LR que receberam tanto imipramina quanto diazepam na extinção do CCONT não apresentam diferenças quando comparados aos respectivos subgrupos que receberam salina.
ABSTRACT
Rearing behavior displays a fundamental role in exploration, being considered more efficient in search and input of enviroment information than other exploratory behaviors. The hippocampal formation is the main neural structure involved in the interplay of rearing, cognitive map formation and emotion. Furthermore, selection of subgroups of animals displaying high or low rearing expression can enlarge the evaluation of potential correlated neurobiological differences. In the present work, the memory acquisition, consolidation, forgetting and extinction in the context and tone fear conditioning tasks (CFC and TFC, respectively) were investigated in animals displaying high and low rearing towards open field novelty exposure.
The firts part shows that animals performance differs in some aspects of CFC, but not TFC. Animals from both HR and LR subgroups learn equally CFC and TFC tasks, when evaluated 24 hours after training. When the test session of the tasks is done 30 days after training, LR subgroup displays hyperconsolidation in comparison to HR subgroup only in CFC task. LR animals also take more time to extinguish CFC task than HR animals, while extinction is similar between groups in TFC. The behavioral pattern shown by LR animals seems analogous to traumatic memory hyperconsolidation, a behavioral symptom of post traumatic stress disorder (PTSD).
To investigate this hypothesis, the second part of the present work evaluated the influence of the tricyclic antidepressant imipramine (20 mg/kg) and of the benzodiazepine diazepam (10 mg/kg), which are used in PTSD therapeutics, in the emotional memory extinction of CFC of animals from HR and LR subgroups, in the sense to diminish hyperconsolidation of LR animals. Results show that HR and LR animals which received imipramine or diazepam after session of extinction of CFC task did not show any significant difference when compared to their respective saline treated counterpart.
______________________________________________________________Índice
INTRODUÇÃO ... 1
O COMPORTAMENTO FRENTE À NOVIDADE ... 3
VARIABILIDADE INDIVIDUAL E COMPORTAMENTO DE EMPINAR ... 12
OBJETIVO ... 21
MATERIAIS E MÉTODO... 23
ANIMAIS ... 24
APARELHOS ... 24
ESTÍMULO CONDICIONADO E INCONDICIONADO... 28
DROGAS ... 29
TAREFAS COMPORTAMENTAIS ... 29
ANÁLISE ESTATÍSITICA ... 35
PRIMEIRA ETAPA: CARACTERIZAÇÃO DA MEMÓRIA EMOCIONAL DOS ANIMAIS SELECIONADOS EM SUBGRUPOS HR E LR ... 37
INTRODUÇÃO: MEMÓRIA EMOCIONAL CONDICIONADA ... 38
OBJETIVO DA ETAPA 1 ... 43
EXPERIMENTOS ... 44
Experimento 1 – Aquisição e consolidação no medo condicionado ao contexto ... 44
Experimento 2 – Aquisição e consolidação no medo condicionado ao som ... 445
Experimento 3 – Esquecimento no medo condicionado ao contexto ... 50
Experimento 4 – Esquecimento no medo condicionado ao som ... 51
Experimento 5 – Extinção no medo condicionado ao contexto ... 62
Experimento 6 – Extinção no medo condicionado ao som ... 63
DISCUSSÃO PARCIAL ... 68
______________________________________________________________Índice
INTRODUÇÃO: MEMÓRIA EMOCIONAL CONDICIONADA E
TRATAMENTO FARMACOLÓGICO DO TRANSTORNO DE ESTRESSE
PÓS- TRAUMÁTICO ... 82
OBJETIVO DA ETAPA 2 ... 89
EXPERIMENTOS ... 90
Experimento 1 – Manipulação do sistema catecolaminérgico na extinção do medo condicionado ao contexto ... 90
Experimento 2 – Manipulação do sistema gabaérgico-BDZ na extinção do medo condicionado ao contexto ... 95
DISCUSSÃO PARCIAL ... 100
CONCLUSÃO ... 116
__________________________________________________________Introdução 2
A compreensão dos mecanismos neurais subjacentes aos
comportamentos observáveis, tanto em animais de laboratório quanto em
humanos, tem sido um dos alvos principais das pesquisas em neurociências.
Isso se deve ao fato de que tal compreensão é necessária para se pensar em
formas posteriores de manipulação do comportamento e aplicação desse
conhecimento na sociedade. Essas manipulações podem ser divididas
basicamente em duas aplicações: a) a modificação do comportamento
disfuncional, ou seja, o tratamento do comportamento considerado não
adaptativo (como ocorre nas doenças mentais, por exemplo); ou b) a
manipulação do próprio comportamento normal, visando o aperfeiçoamento do
comportamento, mesmo que esse seja a priori considerado adaptativoi.
Neste sentido, o estudo da variabilidade individual parece ser uma das
estratégias metodológicas neurocientíficas destinadas a esse propósito.
Considera-se variabilidade individual as diferenças individuais apresentadas
em uma mesma população que gera subgrupos de indivíduos com,
marcadamente, alta e baixa expressão de um determinado comportamento
frente a um mesmo estímulo apresentado; apesar da equidade de outras
características entre seus membros como sexo, idade, parentesco, etc. A
observação dessa diversidade tem sido empregada como relevante ferramenta
i
Grande discussão existe sobre os estudos que objetivam o melhoramento cognitivo. O improvement ou cognitive enhancement têm sido foco de atenção dos pesquisadores em geral (pela possibilidade intrínseca
que os resultados permitem como a “construção de um homem melhor” que dorme menos, se recorda
__________________________________________________________Introdução 3
da pesquisa básica, pois facilita a análise de possíveis correlações entre a
expressão de um dado comportamento e estruturas neurais e/ou padrões de
mecanismos fisiológicos intrínsecos relacionados (Baker, 2004). Grosso modo,
qualquer comportamento pode ser avaliado segundo as diferenças individuais
de sua expressão entre os membros de uma mesma população. Em vista da
obtenção e manutenção de linhagens geneticamente distintas demandarem
alto custo e longo tempo, animais podem ser comportamentalmente
selecionados para esse fim, reduzindo custos e tempo envolvidos nos
experimentos (Masur & Benedito, 1974). A presente tese versa sobre a
variabilidade individual do comportamento frente à novidade, selecionando
comportamentalmente os membros com baixa e alta exploração (mensurada
pelo comportamento de rearing) de uma mesma população de ratos, a partir da
exposição desses à novidade inerente ao campo aberto, e algumas de suas
possíveis correlações funcionais e neurobiológicas.
O COMPORTAMENTO FRENTE À NOVIDADE
Etologicamente, o campo abertoii é um aparelho que tem sido largamente utilizado pelos pesquisadores a fim de avaliar os comportamentos de roedores
e hipotetizar possíveis correlações anátomo-fisiológicas entre esses. De forma
ii
__________________________________________________________Introdução 4
geral, esse aparelho elicia comportamentos classicamente relacionados à
exploração do ambiente (Prut & Belzung, 2003) e emocionalidade (Ramos,
2008), como ambulação e defecação, entre outros. Esses comportamentos
podem ser mensurados em diversas situações experimentais e são suscetíveis
a manipulações cirúrgicas, farmacológicas e ambientais (Leppanen et al.,
2006).
Frente a um novo ambiente, animais de laboratório tendem a reagir com
aumento da atividade exploratória (Ramos & Mormede, 1998). O significado
biológico da exploração de novos ambientes consiste na dispersão e aumento
da probabilidade de encontrar objetos que satisfaçam as necessidades vitais
do indivíduo: alimento, água, abrigo e rotas de fuga, entre outros. Por outro
lado, animais são inatamente avessos à novidade, o que altera sua
emocionalidade, pois o mesmo comportamento de exploração leva o animal à
auto-exposição a riscos, como a predação (Crusio, 2001). Nesse sentido, é
possível dizer, sinteticamente, que o comportamento inato de roedores no
campo aberto pode ser compreendido como motivado pela competição entre
tendências exploratórias e de medo frente à novidade.
Inúmeros autores concordam em afirmar que o campo aberto é um
ambiente que evoca exploração (Prut & Belzung, 2003; Ramos, 2008; Ramos &
Mormede, 1998; Crusio, 2001; Van Lier et al., 2003)e é o principal paradigma
para investigar esse processo. A exposição a esse ambiente novo pode ser
forçada ou livre; e, geralmente, apenas poucas medidas comportamentais são
mensuradas, como atividade e defecação; embora um etograma mais
__________________________________________________________Introdução 5
detalhado tenha sido recomendado por outros autores (ver revisão Crusio,
2001).
Dentre os comportamentos mensurados no campo aberto, a ambulação
tem sido o parâmetro mais registrado, sendo relacionada como índice tanto de
exploração do ambiente quanto de emocionalidade (Archer, 1973, Gray, 1979).
Especificamente, altos níveis de ambulação têm sido associados a uma
reatividade emocional baixa (Van Der Staay et al., 1990) e alto nível de
exploração (Roy et al., 2001); muito embora outros autores acreditem que a
ambulação não é um índice fidedigno de avaliação de ansiedade, em vista dos
resultados serem inconsistentes na literatura (Ramos & Mormede, 1998).
Crusio (2001), em sua revisão sobre comportamento exploratório, aponta
que ainda há certa confusão na definição precisa do que se denomina
“comportamento exploratório”. Grande parte dos pesquisadores meramente
determina essa expressão comportamental como “atividade” ou “comportamento no campo aberto” ou, ainda, o tratam como oposição ao
conceito de emocionalidade; mesmo que a atividade locomotora em um campo
aberto contenha um componente não exploratório. Assim, o autor sugere que
seria mais adequado que as atividades dos animais fossem distinguidas entre
“atividade geral” (como ambulação) e “atividade exploratória” (como rearing,
sniffing, risk assessment, etc.). Além disso, essas duas categorias deveriam ser
analisadas mais detalhadamente em seu significado dependendo dos
procedimentos realizados no campo aberto (a primeira exposição ao ambiente
está relacionada com exploração inicial; a re-exposição ao ambiente está
__________________________________________________________Introdução 6
do ambiente, e assim por diante). Infelizmente, exploração e ambulação
continuam frequentemente sendo usados como sinônimos em estudos que
utilizam o campo aberto, ainda que pesquisas já tenham mostrado diferentes
efeitos de manipulações farmacológicas sobre a ambulação e exploração
(Choleris et al., 2001), o que corrobora com a idéia de que estes parâmetros de
atividade podem ter distintos mecanismos subjacentes.
Além da medida clássica de ambulação, outro comportamento de
roedores, o rearing, tem sido extensivamente mensurado e considerado uma
atividade exploratória potencializada pela novidade inerente ao campo aberto
(Plyusina & Oskina, 1997; Thiel et al., 1998; Pawlak et al., 2002; Lever et al.,
2006). O rearing é caracterizado tipicamente por uma ativação vertical do
animal que, ao explorar o ambiente, levanta as patas dianteiras e cabeça
apoiando-se em suas patas traseiras, não, necessariamente, andando mais
pelo ambiente. Esse comportamento difere da medida de ambulação que é
uma ativação horizontal do comportamento do animal. Este é um
comportamento adjunto à ambulação e, em muitas circunstâncias, como a
formação de mapas espaciais, mais eficiente que esta (Lever et al., 2006). O
comportamento de rearing será doravante denominado de “empinar”, tradução
que parece pertinente para abarcar o fenômeno.
Os comportamentos de empinar e ambulação são parcialmente mediados
pelos mesmos mecanismos neurais, como reatividade da via dopaminérgica
estriatal envolvida com atividade motora na resposta emocional (Feenstra et
al., 1995); embora esses comportamentos não sejam estritamente
__________________________________________________________Introdução 7
por fármacos, indicando que são também controlados por vias diferentes
(Cartmell et al., 1999; Balcells-Olivero, 1997; Scorza et al. 2008).
Sabe-se que a exploração é evocada frente a um novo estímulo e perfaz
uma série de alterações comportamentais e posturais que permitem ao
indivíduo a coleta e introjeção de informações sobre novos objetos e partes não
familiares de um ambiente (Crusio et al., 1989). Nesse sentido, esse processo
está intimamente ligado à formação de mapas cognitivos descrita, inicialmente,
por O’Keefe & Nadel (1978).
Segundo revisão realizada por Lever et al. (2006), a função do empinar é
primordialmente ampliar (quando da primeira exposição a um ambiente novo)
ou atualizar (quando da re-exposição ao mesmo ambiente) a coleta de
informações sobre o ambiente durante a exploração – comportamento fortemente associado com a formação de um mapa cognitivo espacial. Por
isso, essas informações podem, secundariamente, prover subsídios para a
decisão de defesa do animal de se aproximar ou afastar de um ponto
específico do ambiente, a partir das informações que possuem do mapa
cognitivo do mesmo. O comportamento de empinar parece aumentar a
eficiência nesses dois processos: a formação de mapa cognitivo e a defesa
espacial. Nesse sentido ainda, os autores apontam que o empinar pode facilitar
diretamente a aprendizagem e memória espacial.
Analisando outras interfaces do rearing, Gray & McNaugton (2000)
sugerem a idéia de que o empinar, em seu envolvimento com o medo e com a
ansiedade, apresenta o seguinte padrão de expressão: a) o comportamento de
__________________________________________________________Introdução 8
medo; e b) o comportamento de empinar ocorre POUCO em baixos níveis de
ansiedade e MUITO em altos níveis de ansiedade. Esses dados parecem
sugerir que a ansiedade – compreendida biologicamente como preparação do organismo para enfrentar futuros estímulos do ambiente relevantes à
sobrevivência – elicia o comportamento de empinar, talvez no sentido de aumentar a introjeção de informações do ambiente para prever respostas frente
a potenciais ameaças do mesmo; enquanto que o medo – que poderia ser descrito como a resposta biológica frente a um estímulo aversivo real e
presente diretamente no ambiente – diminui o comportamento de empinar, talvez por eliciar mais fortemente comportamentos como fuga, luta ou
congelamento, que seriam potencialmente competitivos ao comportamento de
empinar.
Sabe-se que o comportamento de empinar pode ser eliciado por
estimulação elétrica dos centros de defesa classicamente associados à fuga,
como a substância cinzenta periaquedutal e o hipotálamo medial (Carrive,
2000; Sandner et al., 1979, 1982, 1985; Silveira & Graeff, 1992). Após a
estimulação elétrica dessas estruturas, o empinar aparece como um dos
primeiros comportamentos apresentados pelo animal, e desaparece a medida
que a intensidade da estimulação é aumentada, o que provoca outros
comportamentos como trote e salto. Esses dados reforçam a idéia de que o
comportamento de empinar também está envolvido com emocionalidade.
Em suma, a expressão do comportamento de empinar parece estar ligada
__________________________________________________________Introdução 9
mesmo, e ser influenciada por aspectos relacionados a emocionalidade, como
a ansiedade e o medo.
Mudanças no comportamento de empinar podem, ainda, ser observadas
com manipulações farmacológicas ou genéticas de diferentes
neurotransmissores [como acetilcolina, GABA, glutamato e dopamina] e
eliciadas pela estimulação elétrica de diferentes estruturas cerebrais como
estriado e hipocampo (Thiel et al., 1998; Lever et al., 2006; Miyakawa et al.,
2001; Sierra-Paredes & Sierra-Marcuño, 1996; Rudolph et al., 1999; van Lier et
al., 2004; Agmo & Belzung, 1998; Thiel et al., 1999; Ma et al., 1996; Cartmell,
1999).
No que tange a relação entre o comportamento de empinar e o sistema
colinérgico, sabe-se que animais knock-out do receptor muscarínico M1
apresentam um padrão comportamental de hiperatividade geral e, em
específico, aumento do número de empinares quando submetidos ao campo
aberto (Miyakawa et al., 2001). Além disso, Thiel et al., 1998 mostraram que a
exposição de animais ingênuos ao campo aberto aumenta os níveis de
acetilcolina extra-celular no hipocampo e esses animais expressam, ao mesmo
tempo, aumento de atividade locomotora e número de empinares.
Também já foi descrito que o sistema gabaérgico é capaz de modular o
comportamento de empinar. Drogas que aumentam a neurotransmissão
gabaérgica, via receptores GABAa, como o muscimol, injetado no núcleo pálido
ventral, diminuem o número de empinares eliciados pela estimulação elétrica
do hipocampo (Ma et al., 1996). Além disso, a administração de agonistas
__________________________________________________________Introdução 10
(Van Lier et al., 2004), também diminuem o número de empinares expresso
pelos animais. Quando expostos a um ambiente novo (situação na qual é
esperado alto número de empinares e atividade locomotora aumentada pela
exploração inata) a administração de GAG, gaba gamma-acetileno, inibidor da
enzima GABA transaminase, ou de progabide, agonista misto de receptores
GABAa e GABAb, reduz a ambulação e o comportamento de empinar dos
animais, pelo aumento da transmissão gabaérgica (Agmo & Belzung, 1998).
Neuroanatomicamente, sabe-se que há relação entre hipocampo e o
comportamento de empinar e pesquisas sugerem que a estrutura hipocampal é
crítica para a expressão desse comportamento. Estudos mostram que
estimulação elétrica direta do hipocampo induz a expressão do comportamento
de empinar (Ma et al., 1996), bem como a administração intrahipocampal de
picrotoxina, um bloqueador do canal de cloreto do receptor GABAa, elicia esse
tipo de comportamento exploratório (Sierra-Paredes & Sierra-Marcuño, 1996).
Em contraste, lesões hipocampais em camundongos produzem a diminuição
do número de empinares (Deacon et al., 2002). Foi mostrado ainda que há
relação entre a atividade elétrica hipocampal e movimentos motores voluntários
medidos no campo aberto, dentre eles, o comportamento de empinar (Van Lier
et al., 2003). Analisados conjuntamente, esses dados corroboram a hipótese de
que é necessária a integridade do hipocampo para a expressão do
comportamento de empinar, ainda que diversos neurotransmissores possam
estar envolvidos fisiologicamente nesse processo.
O hipocampo tem sido classicamente relacionado com o processo de
__________________________________________________________Introdução 11
alteram seletivamente o desempenho de animais em tarefas
contexto/espaço-dependentes. É bem estabelecido que lesão de hipocampo prejudica o
desempenho de animais em tarefas espaciais como o condicionamento de
medo ao contexto e a versão espacial do labirinto aquático radial, mas não
interfere em tarefas não espaciais como o condicionamento de medo ao som e
a versão de pistas do labirinto aquático (Phillips & LeDoux, 1992; Wiltgen et al.,
2006; Richmond et al., 1999; Maren et al., 1997; Jarrard, 1993, 1995). Nesse
tipo de tarefa denominada espacial e prejudicada por lesão de hipocampo, a
utilização de mapas cognitivos do ambiente pelo animal é essencial para o
desempenho comportamental nas tarefas. O hipocampo é a estrutura central
necessária para a formação dos mapas cognitivos, como proposto por O’Keefe
& Nadel, 1978.
Esses dados tomados em conjunto apontam para a inter-relação do
comportamento frente à novidade com, ao menos, três pontos: 1) a exploração
comportamental per se; 2) a formação/atualização de mapas cognitivos do
ambiente; 3) e a resposta de medo/ansiedade. Nesse sentido, o
comportamento de empinar parece ter papel fundamental na exploração, sendo
considerado mais eficiente na busca e introjeção de informações do ambiente
do que outros comportamentos exploratórios. A estrutura neurobiológica que
parece estar sobrepostamente envolvida nessa inter-relação (comportamento
de novidade versus exploração-empinar versus formação de mapas cognitivos
versus emocionalidade) é o hipocampo, cuja participação na expressão do
__________________________________________________________Introdução 12
VARIABILIDADE INDIVIDUAL E COMPORTAMENTO DE EMPINAR
Como diversos outros comportamentos, a expressão do comportamento
de empinar por ratos possui grande variabilidade individual (Thiel et al., 1998,
1999; Pawlak et al., 2002), apesar dos animais apresentarem igualdade em
outras características como sexo, idade e linhagem, por exemplo.
Trabalhos clássicos das décadas de 1970 e 1980, mostraram que o
comportamento de empinar apresenta fator de hereditariedade de cerca de
25% em ratos (Sandner et al., 1981) e porcentagem ainda maior em
camundongos (van Abeelen, 1970). Esses subgrupos selecionados
apresentam diferenças apenas no comportamento exploratório frente à
novidade, e não em outros tipos de comportamento exploratório.
Crusio et al. (1989 a, 1989b) mostraram em dois trabalhos que a
arquitetura genética da exploração em roedores apresenta dominância
ambidirecional, com a presença de indivíduos pouco exploradores e muito
exploradores. Relacionando seus resultados com o processo de seleção
natural, os autores discutem que a expressão intermediária do fenótipo
exploração seria mais favorável do que aquela que se encontra nos extremos,
seja esse baixo ou alto, pois garantiria ao indivíduo uma “exploração cautelosa”. Isto é, sem exposição demasiada aos riscos ambientais, mas
garantindo a exploração necessária para encontrar elementos que satisfaçam
__________________________________________________________Introdução 13
Conforme afirmado anteriormente, o estudo das diferenças individuais
pode ser utilizado como estratégia para pesquisar possíveis correlações entre
um determinado comportamento e as estruturas neurais e mecanismos
fisiológicos associados a este. Em vista da obtenção e manutenção de
linhagens geneticamente distintas demandarem alto custo e longo tempo
(Masur & Benedito, 1974), animais podem ser comportamentalmente
selecionados para esse fim. Em relação ao comportamento de empinar,
animais podem ser selecionados em grupos de alta ou baixa expressão de
empinar de acordo com o número de empinares expressos em uma sessão no
campo aberto, por exemplo (Thiel et al., 1998, 1999; Pawlak et al., 2002).
Esses grupos são denominados na literatura de HR (High Rearings – muito
empinadores) e LR (Low Rearings – pouco empinadores) nomeando as
subpopulações que fazem, respectivamente, um alto número de empinares e
um baixo número de empinares quando expostos a novidade inerente do teste.
A nomenclatura HR e LR será utilizada doravante para denominar os
subbgrupos de animais selecionados pelo número de empinares após a
exposição ao campo aberto.
A literatura apresenta que a separação dos animais em subgrupos HR e
LR tem sido feita da seguinte forma: quando expostos ao campo aberto, a
freqüência do comportamento de empinar é mensurada ao longo de três
minutos e o resultado é organizado em uma tabela crescente, em números
absolutos. Após essa organização, é feita a média do número de empinares e
os animais são então classificados em: animais que fazem alto número de
__________________________________________________________Introdução 14
de empinares, LR (abaixo da média). Foi mostrado ainda que essa
classificação em HR e LR não é teste-dependente, visto que os animais
permanecem nos mesmos subgrupos quando são avaliados em outros
ambientes ou aparelhos (Borta et al., 2005; Alves, 2009).
Embora essa seja uma discussão relativamente recente, estudos têm
tentado caracterizar os animais que fazem poucos e muitos empinares em
relação a muitos aspectos, como suas diferenças em estruturas neurais,
respostas à administração de fármacos, alterações neurofisiológicas e
características comportamentais.
Utilizando-se esse tipo de metodologia, que separa animais em subgrupos
LR e HR, foi visto que animais de subgrupos LR possuem susceptibilidade
maior a convulsão induzida pela administração de DMCM (um agonista inverso
dos receptores benzodiazepínicos que funciona como agente ansiogênico e
convulsivante) do que animais provenientes de subgrupos HR. Por outro lado,
esses mesmos subgrupos de animais não apresentam diferenças quando
submetidos ao tratamento farmacológico com 3-MP, PTZ, picrotoxina ou
bicuculina. O conjunto desses resultados indica que os subgrupos de animais
HR e LR parecem diferir apenas nos receptores GABAa que contêm a
sub-unidade alfa 1 (Alves, 2005; Alves et al., 2005).
No teste de ingestão forçada de nicotinaiii (agonista colinérgico nicotínico),
os animais de subgrupos HR e LR não apresentam diferenças estatisticamente
significativas, nem quando a escolha pela água ou nicotina é apresentada
__________________________________________________________Introdução 15
subgrupo HR apresentem sensibilizaçãoiv mais rápida à nicotina que o subgrupo LR (Pawlak & Shwarting, 2005). Por outro lado, a administração
pós-treino de uma dose alta de metanicotina (agonista nicotínico) prejudica, e não
facilita como seria esperado, a consolidação da memória dos animais do
subgrupo LR na tarefa de esquiva inibitóriav; esse resultado é encontrado apenas quando os animais do subgrupo LR que receberam metanicotina são
comparados aos animais LR que receberam salina, e não quando comparados
ao subgrupo HR. A administração de doses baixas foi inefetiva para ambos os
subgrupos (HR e LR) no desempenho da tarefa (Borta & Schwarting, 2005).
Esses dados indicam que os animais selecionados em subgrupos HR e LR
apresentam respostas diferentes a drogas que envolvem o sistema colinérgico
nicotínico em tarefas de memória, embora mais estudos sejam necessários
para elucidar os desempenhos comportamentais encontrados.
Em relação aos receptores colinérgicos muscarínicos, a administração de
escopolamina (antagonista colinérgico muscarínico inespecífico) em ratos não
selecionados em subgrupos (animais gerais da população) impede a
habituaçãovi do comportamento de empinar durante a exposição em uma mesma sessão no campo aberto, indicando um efeito estimulante da
iii
O teste de ingestão forçada de nicotina consiste em apresentar ao animal apenas uma solução de água com nicotina (situação de ingestão forçada) ou ambas garrafas com água e solução de água e nicotina (situação de ingestão livre) e medir o volume ingerido das soluções por dia.
iv
A tarefa de sensibilização refere-se ao decaimento das respostas motoras (ambulação e rearing) produzidas pela nicotina, avaliadas por observação em uma arena, frente à ingestão crônica dessa substância, via i.p..
v
__________________________________________________________Introdução 16
escopolamina sobre esse comportamento (Thiel et al., 1998, 1999). Além disso,
esses animais apresentam maior atividade colinérgica no hipocampo e no
córtex frontal (Thiel et al., 1998), estruturas que sugerem possível correlação
do comportamento de empinar com processos de memória.
O hipocampo parece funcionar de forma diferente em animais
selecionados como HR e LR no que tange a atividade da enzima
Na+,K+/ATPase: animais que expressam baixo número de empinares (LR)
possuem menor atividade dessa enzima no hipocampo; e apenas nessa
estrutura, visto terem sido avaliadas diversas regiões cerebrais (Alves, 2009;
Alves et al., 2005). Já foi discutido que o hipocampo é crítico para o processo
de aprendizagem e memória espacial, e que o comportamento de empinar está
associado a esse por facilitar a formação de mapas cognitivos espaciais. De
fato, em tarefas como a de reconhecimento de objetovii, animais provenientes
de subgrupo HR mostram mais exploração do objeto quando comparados aos
de subgrupo LR; e no teste de reconhecimento do objeto familiar versus não
familiar, exploram mais o objeto novo do que os LR (Pawlak & Schwarting,
2002). Além disso, em uma tarefa tipicamente espacial, como o labirinto radial,
animais do subgrupo HR apresentam melhor memória espacial (de referência)
do que os LR [Gorish & Schwarting, 2006]. Esses dados parecem corroborar
com a hipótese de que o hipocampo é essencial para a expressão do
comportamento de empinar.
vi
A habituação se refere a um processo mnemônico não associativo no qual o animal, quando exposto ao mesmo estímulo repetidas vezes, diminui a intensidade da sua resposta original.
vii
__________________________________________________________Introdução 17
Além de relacionado com a estrutura hipocampal e com os processos de
aprendizagem e memória, discutiu-se ao longo dessa introdução que o
comportamento de empinar também está relacionado com emocionalidade. A
teoria de Gray & McNaughton (2000) propunha que a ansiedade eliciaria o
comportamento de empinar, enquanto que o medo diminuiria esse
comportamento. Trabalhos que utilizaram a metodologia de seleção de animais
em subgrupos HR e LR corroboram em parte essa hipótese. Borta &
Schwarting (2005)indicam que, por meio da análise dos comportamentos dos
animais no labirinto em cruz elevado (LCE)viii, os animais do subgrupo HR podem ser mais ansiosos que os do subgrupo LR, pois gastam menos tempo
nos braços abertos e entram um maior número de vezes nos braços fechados
do aparelho, embora estudos de nosso laboratório não tenham observado
nenhuma diferença entre os subgrupos no LCE (Alves, 2009). Trabalhos que
avaliaram diferenças nas respostas comportamentais dos animais selecionados
em subgrupos HR e LR relacionadas com aprendizagem e emocionalidade
mostraram que, embora esses animais possuam níveis basais iguais no treino
da tarefa de esquiva inibitória (Borta & Schwarting, 2005), quando a esquiva é
realizada com choques mais altos do que o habitual, os animais do subgrupo
LR apresentam escores mais altos na retenção da tarefa; sugerindo melhor
consolidação da memória, visto não diferirem na responsividade à dor frente ao
choque utilizado (Borta & Schwarting, 2005a). Os animais do subgrupo LR
exibem latências maiores no teste e retestes da esquiva inibitória mesmo
quando o treino é realizado com choque de intensidade extremamente baixa
viii
__________________________________________________________Introdução 18
(0.15mA) (Borta & Schwarting, 2005b). Esses dados sugerem que os animais
do subgrupo LR apresentam melhor consolidação e déficit de extinção frente a
tarefas aversivamente motivadas.
Como visto, o comportamento de empinar parece facilitar a aprendizagem
e memória, em especial, a memória emocional. O envolvimento da
emocionalidade nesse processo pode se dar por ao menos dois fatores: a
motivação pela busca de objetos que satisfaçam as necessidades vitais; e o
medo relacionado à necessidade de evitação de objetos/estímulos aversivos,
que demandariam a formação de um mapa cognitivo do ambiente.
O estudo das características de animais HR e LR pode auxiliar na
compreensão anátomo-fisiológica do processo de exploração e sua interface
com a aprendizagem e emocionalidade. Apesar dos diversos estudos
apontando correlações entre comportamento de empinar, novidade e
mecanismos fisiológicos pontuais, não existem estudos específicos que
avaliem o processo de aprendizagem e memória emocional desses animais,
sobretudo em tarefas que sejam dependentes de hipocampo, estrutura que
parece ser critica para a expressão do comportamento de empinar e para a
formação de mapas cognitivos. O estudo prévio da literatura que utilizou a
tarefa de esquiva inibitória sugere que os animais LR apresentem
hiperconsolidação e déficit de extinção da memória aversiva, mas sabe-se que
essa tarefa não é indicada para avaliar seletivamente o papel do hipocampo na
aprendizagem e memória emocional (Xavier, 1981).
__________________________________________________________Introdução 19
Nesse sentido, o objetivo da primeira etapa deste trabalho foi realizar a
caracterização do medo aversivamente condicionado de animais selecionados
por sua inata variabilidade em subgrupos HR e LR após exposição à novidade
no campo aberto. Duas tarefas que avaliam a aprendizagem emocional –
condicionamento de medo ao contexto e condicionamento de medo ao som –
foram utilizadas para acessar o desempenho comportamental dos animais na
aquisição, consolidação, esquecimento e extinção do medo condicionado dos
animais. Essas tarefas foram selecionadas exatamente porque são passíveis
de avaliar a aprendizagem e memória aversivamente condicionada dependente
(condicionamento de medo ao contexto) e independente (condicionamento de
medo ao som) do hipocampo (LeDoux, 2000; Philips & Ledoux, 1992).
Como discutido, a caracterização de um determinado comportamento, por
meio da seleção dos indivíduos que inatamente apresentam seus extremos na
população, pode contribuir para a compreensão dos mecanismos
neurobiológicos subjacentes a esses. Uma etapa posterior da investigação
neurocientífica seria promover manipulações, geralmente farmacológicas, no
sentido de tentar alterar comportamentos não adaptativos. Assim, os dados
sobre aprendizagem e memória obtidos na primeira etapa com a
caracterização do medo condicionado dos animais selecionados em subgrupos
HR e LR foram utilizados, na segunda etapa, para desenvolver manipulações
farmacológicas que melhorassem o desempenho dos animais na extinção da
tarefa de condicionamento de medo ao contexto: visto que a retenção
exagerada de uma memória de medo pode estar associada a distúrbios
__________________________________________________________Introdução 20
Cada etapa desse trabalho retomará sucintamente os subsídios teóricos já
discutidos e apresentará outras informações necessárias para a compreensão
___________________________________________________________Objetivos 22
A partir do panorama da literatura apresentado, o objetivo desse trabalho
é avaliar o processo de aprendizagem e memória emocional aversivamente
condicionada de animais selecionados em subgrupos HR e LR por sua inata
variabilidade em resposta a novidade da exposição ao campo aberto.
Objetivos específicos:
Etapa 1 – Realizar a caracterização da memória emocional condicionada dos animais HR e LR.
a) Avaliar o processo de aprendizagem e consolidação da memória
dos animais selecionados em subgrupos HR e LR no
condicionamento de medo ao contexto e no condicionamento de
medo ao som;
b) Avaliar o processo de esquecimento do medo condicionado ao
contexto e ao som dos animais selecionados em subgrupos HR e
LR; e
c) Avaliar o processo de extinção do medo condicionado ao contexto
e ao som dos animais selecionados em subgrupos HR e LR.
Etapa 2 – Avaliar a influência da imipramina e do diazepam no desempenho comportamental frente à extinção da memória emocional
______________________________________________ Materiais e método 23
MATERIAIS
E
______________________________________________ Materiais e método 24
ANIMAIS
Foram utilizados ratos Wistar machos, com 3 a 4 meses de idade no início
dos experimentos (250-350g de peso corporal), provenientes do biotério do
Departamento de Psicobiologia da Universidade Federal de São Paulo –
Escola Paulista de Medicina.
Os animais foram criados em gaiolas de plástico, em grupos de seis, e
mantidos em condições controladas de temperatura (22 ± 2°C) e ciclo
claro-escuro 12:12h (sendo o período claro das 7:00 as 19:00h). Água e alimento
foram oferecidos ad libitun durante todo o experimento.
Cada tarefa comportamental descrita nesse trabalho foi conduzida em um
grupo separado de animais.
APARELHOS
Foram utilizados quatro aparelhos para o desenvolvimento dos
experimentos: a) campo aberto, para a avaliação do número de empinares
expressos pelos animais frente à novidade; b) caixa de treino: compartimento
escuro do aparelho de esquiva, utilizada em todos os treinos (condicionamento
contextual de medo [CCONT] e condicionamento de medo ao som [CSOM]); c)
câmara de teste: utilizada somente para o teste e retestes do CSOM; e d)
câmara novo ambiente, utilizada no experimento suplementar de avaliação do
______________________________________________ Materiais e método 25
A) CAMPO ABERTO
O campo aberto utilizado nesse estudo consiste em uma arena circular de
madeira com 80 cm de diâmetro e circundada por uma parede de 60 cm de
altura. O assoalho do aparelho é dividido em três círculos concêntricos, os
quais são subdivididos em dezoito setores. A iluminação do aparelho foi feita
utilizando cinco lâmpadas, de 60 W cada, fixadas a 85 cm acima da base. O
teste de campo aberto não apresentou estímulo sonoro.
Fig.1: Fotos ilustrativas do campo aberto.
B) CAIXA DE TREINO
O aparelho do treino consiste em um compartimento medindo 22 cm de
comprimento x 21 cm de largura x 22 cm de altura. As paredes da caixa são
pretas com padrões visuais brancos (dois quadrados medindo 5,5 x 5,5 cm e
três quadrados medindo 4,0 x 4,0 cm feitos de cartolina branca plastificada). O
teto da caixa era coberto por uma tampa transparente de acrílico para que se
______________________________________________ Materiais e método 26
grade de metal (0.4cm de diâmetro cada barra colocadas 1,2 cm de distância
entre elas) conectada a uma fonte geradora de choque (AVS projetos
especiais) pela qual os choques nas patas de 1,0 mA por 1 segundo de
duração são administrados. Como dito anteriormente, o treinamento para
ambas as tarefas (CCONT E CSOM) foi realizado nesta caixa.
Além disso, o teste do condicionamento clássico de medo ao contexto –
que acontecia 24h depois do treino – e os retestes dessa tarefa também foram conduzidos no mesmo aparelho.
Fig.2: Foto ilustrativa da caixa de treino.
C) CÂMARA DE TESTE
Para o teste e restestes do condicionamento clássico de medo ao som,
______________________________________________ Materiais e método 27
foi utilizada. O teto da câmara consiste em uma tampa transparente de acrílico
para que se pudesse observar o comportamento dos animais.
Fig. 3: Foto ilustrativa da câmara de teste.
Uma campainha colocada ao lado (cerca de 15 cm de distância da caixa)
da caixa de treino ou da câmara de teste produz um som de 90 dB que foi
utilizado como Estímulo Condicionado – CS.
D) CÂMARA NOVO AMBIENTE
Para a avaliação do reteste tardio no experimento suplementar de
condicionamento clássico de medo ao som, uma câmara de metal, medindo 36
cm de altura, 23 cm de largura e 23 cm de comprimento, foi utilizada. O teto da
câmara consiste em uma tampa transparente de acrílico para que se pudesse
______________________________________________ Materiais e método 28
Fig. 4: Foto ilustrativa da câmara novo ambiente.
A mesma campainha utilizada para o teste da tarefa de CSOM foi
utilizada. Essa foi colocada ao lado (cerca de 15 cm de distância da caixa) da
câmara novo ambiente e produzia um som de 90 dB que foi utilizado como
Estímulo Condicionado – CS.
Cada aparelho era mantido em salas diferentes.
ESTÍMULO CONDICIONADO E INCONDICIONADO
Para a tarefa de condicionamento clássico de medo ao contexto o
estímulo condicionado (CS) era o ambiente e o estímulo incondicionado (US)
era o choque nas patas (1 mA/1s).
Já para a tarefa de condicionamento clássico de medo ao som, o estímulo
condicionado (CS) era o som (90 dB/5s) e o estímulo incondicionado (US) era o
______________________________________________ Materiais e método 29
DROGAS
A) IMIPRAMINA
O cloridrato de imipramina foi dissolvido em água bi-destilada e injetado
intra-peritoneialmente (i.p.), em volume de 1,0 mg/kg. A dose utilizada foi de 20
mg/kg de peso do animal.
B) DIAZEPAM
O diazepam (Valium, Roche Co®) foi diluído em água bi-destilada e
injetado intra-peritoneialmente (i.p.), em volume de 1,0 mg/kg. A dose utilizada
foi de 10 mg/kg de peso do animal.
TAREFAS COMPORTAMENTAIS
A) SELEÇAO DOS ANIMAIS EM POUCO E MUITO EMPINADORES
Dois dias antes do procedimento de seleção, os ratos eram removidos do
biotério e alocados em uma sala próxima a sala do campo aberto. Esse
procedimento era realizado para evitar que o transporte dos animais pudesse
produzir estresse e, conseqüentemente, alterasse o comportamento inato
frente ao aparelho.
No dia do experimento, cada animal era conduzido separadamente até a
sala de campo aberto e exposto a esse aparelho por um período de três
______________________________________________ Materiais e método 30
animais. Após o término dos três minutos, cada animal era recolocado em sua
gaiola de moradia e o campo aberto era limpo com etanol 5%.
Cada um dos experimentos foi conduzido com um grupo separado de
animais. De 60 a 100 animais, dependendo do experimento, eram submetidos
ao teste para selecionar os subgrupos HR e LR com número suficiente de
animais para cada experimento.
A literatura apresenta que a separação dos animais em subgrupos HR e
LR tem sido feita mediante a média: na média e acima da média são alocados
no subgrupo HR; e abaixo da média são alocados no subgrupo LR (Pawlak &
Schwarting, 2005a, 2005b). Todavia, nosso laboratório utiliza critérios mais
restritos para otimizar possíveis diferenças entre os grupos: aqueles ratos que
apresentam número de empinares <19 são selecionados e alocados no
subgrupo LR; aqueles que apresentam número de empinares >28 são
selecionados e alocados no subgrupo HR; os animais intermediários não são
utilizados nesses experimentos. Esses valores foram obtidos e escolhidos após
dezenas de experimentos conduzidos em nosso laboratório ao longo de sete
anos (Alves, 2009), e baseiam-se na seleção dos animais a partir de um desvio
padrão acima da média do número de empinares (para o subgrupo HR) e um
desvio padrão abaixo (para o subgrupo LR) da média do número de empinares.
Esse critério foi utilizado para otimizar a seleção dos animais, desprezando os
animais intermediários, ao contrário da literatura que os inclui em um dos
subgrupos, HR ou LR, na análise da variabilidade do comportamento.
Todos os testes no campo aberto foram realizados no período da tarde,
______________________________________________ Materiais e método 31
et al., 1990). Após a seleção dos subgrupos, todos os animais eram
transportados novamente ao biotério onde permaneciam por cerca de quinze
dias antes do início dos testes de memória.
B) CONDICIONAMENTO DE MEDO AO CONTEXTO (CCONT)
APRENDIZAGEM E CONSOLIDAÇÃO
Essa tarefa comportamental era conduzida ao longo de dois dias
(sessões) consecutivos.
No primeiro dia, denominado TREINO, os animais selecionados eram
colocados individualmente na caixa de treino. Após dois minutos era
apresentada uma série de cinco choques nas patas (US – Estímulo Incondicionado de 1s/1,0 mA) com intervalo entre eles de trinta segundos.
Trinta segundos após a apresentação do último pareamento, o animal era
removido do aparelho e levado para sua gaiola de moradia.
O segundo dia do experimento foi denominado de TESTE. Assim, vinte e
quatro horas após o treino, cada animal era recolocado na caixa de treino sem
a presença do estímulo incondicionado (choque nas patas – US). O tempo de congelamento, em segundos, (congelamento– completa imobilidade do animal,
incluindo ausência de movimento de vibrissas e mudança postural) era anotado
ininterruptamente por cinco minutos. Posteriormente, a análise desse tempo de
congelamento foi realizada separadamente em cinco blocos de um minuto (0’
-1’; 1’-β’; β’-γ’; γ’-4’; e 4’-5’), e pelo tempo total de congelamento dos animais ao
______________________________________________ Materiais e método 32
ESQUECIMENTO
A tarefa comportamental era conduzida ao longo de três dias não
consecutivos.
Após o treino e teste descrito no item “Aprendizagem e consolidação”, os
animais eram re-expostos ao mesmo ambiente (caixa de treino) trinta dias após
o teste (sessão denominada RETESTE TARDIO), sem a presença do estímulo
incondicionado (choque nas patas – US). O tempo de congelamento, em segundos, era anotado ininterruptamente por cinco minutos. Posteriormente, a
análise desse tempo de congelamento foi realizada separadamente em cinco
blocos de um minuto (0’-1’; 1’-β’; β’-γ’; γ’-4’; e 4’-5’), e pelo tempo total de
congelamento dos animais ao longo dos cinco minutos.
EXTINÇÃO
A tarefa comportamental era conduzida ao longo de seis dias
consecutivos.
Após o treino e teste descrito no item “Aprendizagem e consolidação”, os
animais eram re-expostos por mais quatro dias consecutivos ao mesmo
ambiente, sem a presença do estímulo incondicionado (choque nas patas –
US). Em todas as re-exposições, denominadas RETESTES, o tempo de
congelamento, em segundos, era anotado ininterruptamente por cinco minutos.
Posteriormente, a análise desse tempo de congelamento foi realizada
separadamente em cinco blocos de um minuto (0’-1’; 1’-β’; β’-γ’; γ’-4’; e 4’-5’), e
______________________________________________ Materiais e método 33
Para os experimentos com administração de drogas na extinção
(experimentos 1 e 2 da segunda etapa desse trabalho), os procedimentos para
a tarefa foram idênticos aos apresentados. A administração das drogas ou
veículo foi realizada imediatamente após a retirada dos animais do aparelho
nas sessões de TESTE e RETESTES; com exceção da última sessão de
reteste, na qual não foi administrado nem droga nem veículo, visto que os
animais não retornariam mais ao ambiente 24 horas depois.
C) CONDICIONAMENTO DE MEDO AO SOM (CSOM)
APRENDIZAGEM E CONSOLIDAÇÃO
A tarefa de CSOM era conduzida ao longo de dois dias consecutivos.
No primeiro dia do experimento, denominado TREINO, cada animal era
colocado individualmente na caixa de treino onde permanecia por dois minutos
para explorar o ambiente. Após esse período, eram apresentados cinco
pareamentos som (CS – 90 dB/5s) e choque (US – 1 mA/1s) com intervalo entre eles de trinta segundos. O choque nas patas (US) iniciava-se no quarto
segundo do som (CS) e terminava conjuntamente com este. Trinta segundos
após o término do último pareamento o animal era retirado do aparelho e
recolocado em sua gaiola-moradia.
No segundo dia, denominado TESTE – vinte e quatro horas após o treino
______________________________________________ Materiais e método 34
animal havia sido treinado no dia anterior), na qual permanecia por seis
minutos. A partir do quarto minuto de exposição ao aparelho (ao final do
terceiro minuto), iniciava-se a apresentação do CS (som 90 dB/5s) por cinco
vezes, com intervalo entre eles de 30 segundos. O tempo de congelamento dos
animais era anotado continuamente durante os três minutos iniciais (período
denominado ANTES DO SOM) e durante os três minutos finais (período
denominado DEPOIS DO SOM). Ao final do sexto minuto, o animal era retirado
do aparelho e levado para sua gaiola de moradia.
ESQUECIMENTO
A tarefa comportamental era conduzida ao longo de três dias não
consecutivos.
Após o treino e teste descrito no item “aquisição e consolidação”, os
animais eram re-expostos ao mesmo ambiente (câmara de teste) trinta dias
após o teste (sessão denominada RETESTE TARDIO), sem a presença do
estímulo incondicionado (choque nas patas – US) por seis minutos. A partir do quarto minuto de exposição ao aparelho (no final do terceiro minuto),
iniciava-se a apreiniciava-sentação do CS (som 5s/90 dB) por cinco vezes, com intervalo entre
eles de 30 segundos. Ao final do sexto minuto, o animal era retirado do
aparelho e levado para sua gaiola de moradia.
O tempo de congelamento era anotado continuamente durante os três
minutos iniciais (período denominado ANTES DO SOM) e durante os três
______________________________________________ Materiais e método 35
análise do tempo de congelamento foi realizada separadamente em dois blocos
de três minutos (antes e depois do som).
EXTINÇÃO
A tarefa comportamental de extinção era conduzida ao longo de seis dias
consecutivos.
Após o treino e teste descrito no item “aquisição e consolidação”, os
animais eram re-expostos por mais quatro dias consecutivos ao mesmo
ambiente do teste (câmara de teste), sem a presença do estímulo
incondicionado (choque nas patas – US). A partir do quarto minuto de exposição ao aparelho (no final do terceiro minuto), iniciava-se a apresentação
do CS (som 5s/90dB) por cinco vezes, com intervalo entre eles de 30
segundos. Essas sessões foram denominadas RETESTES. Em todas as
re-exposições, o comportamento de congelamento era anotado continuamente
durante os três minutos iniciais (período denominado ANTES DO SOM) e
durante os três minutos finais (período denominado DEPOIS DO SOM).
Posteriormente, a análise do tempo de congelamento foi realizada
separadamente em dois blocos de três minutos (antes e depois do som).
ANÁLISE ESTATÍSITICA
Etapa 1 - Os dados de ambas as tarefas (CCONT e CSOM) foram
______________________________________________ Materiais e método 36
(seleção em HR, muito empinadores e LR, pouco empinadores) e Sessões
(tempo de congelamento por minuto) como fatores. Quando necessário, foi
realizado o teste a posteriori de Tukey para detectar a diferença entre os
grupos ou minutos.
Etapa 2 - Os dados obtidos nos experimentos de extinção do CCONT
foram analisados pela ANOVA de três vias para medidas repetidas, utilizando
como fatores: Seleção HR e LR (seleção dos animais em HR, muito
empinadores ou LR, pouco empinadores), Tratamento (administração de salina
ou fármaco) e Sessões (tempo de congelamento por minuto em cada uma das
sessões de reteste (1 a 4)). Quando necessário, foi realizado o teste a
PRIMEIRA ETAPA:
CARACTERIZAÇÃO DA MEMÓRIA
EMOCIONAL DOS ANIMAIS
_________________________________________ Primeira etapa: introdução 38
INTRODUÇÃO: MEMÓRIA EMOCIONAL CONDICIONADA
Segundo revisão realizada por Maren (2005), o condicionamento de medo
tem recebido extensiva análise neurobiológica nos últimos anos. Esse interesse
se dá porque o condicionamento de medo apresenta uma importante interface
entre os fenômenos de memória e emoção: ele capacita os organismos para a
formação de representações mentais de seus mundos. O cerne desse
processo é a representação das relações entre eventos aversivos e/ou
traumáticos e o estímulo que os prediz. Assim, a compreensão do
funcionamento normal e disfuncional desse condicionamento pode contribuir
também para o entendimento dos transtornos mentais ansiosos em humanos,
tais quais os transtornos de estresse pós-traumático e fobias específicas, entre
outros. Complementarmente, essa análise tem revelado componentes
anatômicos críticos na circuitaria subjacente ao condicionamento de medo,
apontando, sobretudo, o envolvimento de estruturas como amígdala e
hipocampo.
A memória emocional condicionada é basicamente dependente da
amígdala (Goosens & Maren, 2001; Fendt & Fanselow, 1999; LeDoux, 2000;
Philips & LeDoux, 1992), mas outras regiões cerebrais participam desse
processo. As circuitarias neurais envolvidas na formação de memória
emocional podem ser avaliadas por paradigmas comportamentais refinados. O
_________________________________________ Primeira etapa: introdução 39
com um estímulo aversivo e, após algum tempo, o estímulo neutro assume as
propriedades do estímulo aversivo, desencadeando as mesmas respostas e
sendo, então, denominado de estímulo condicionado (Philips & LeDoux, 1992;
Maren & Aharonov, 1996; Goosens & Maren, 2001). Dependendo da natureza
do estímulo pareado ao estímulo aversivo, outras estruturas, além da amígdala,
compõem a circuitaria responsável pela aprendizagem da tarefa (Fendt &
Fanselow, 1999).
Quando o pareamento é feito entre um estímulo complexo e espacial
(como o ambiente) e o estímulo aversivo (como um choque) a tarefa é
denominada de condicionamento de medo ao contexto e é dependente do
hipocampo (Philips & LeDoux, 1992). Essa estrutura está classicamente
envolvida nos processos de aprendizagem e memória espacial (Jarrard, 1993,
1995), pois é o substrato neuroanatômico necessário para a formação de
mapas cognitivos do ambiente (O’Keefe & Nadel, 1978).
Por outro lado, quando o pareamento é feito entre um estímulo discreto
(como um som ou uma luz) e o mesmo tipo de estímulo aversivo (choque), a
tarefa é nomeada como condicionamento de medo ao som. Para esse tipo de
aprendizagem, a lesão do hipocampo não provoca prejuízo no desempenho
dos animais (Philips & LeDoux, 1992); por isso, diz-se que a tarefa de
condicionamento ao som é hipocampo independente. Alguns autores têm
indicado que essa tarefa parece ser mediada por outra estrutura além da
amígdala, o estriado (Ferreira et al., 2003).
Além disso, o processo de aprendizagem e memória pode ser entendido