FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS
ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DE EMPRESAS
MELINA DE SOUZA-BANDEIRA FERREIRA
O PAPEL DAS RELAÇÕES INTERPESSOAIS NA CONDUÇÃO DO PROSAVANA-JBM (JAPÃO-BRASIL-MOÇAMBIQUE): UM ESTUDO DE CASO
Programa de Cooperação Triangular para o Desenvolvimento Agrícola da Savana Tropical de Moçambique
MELINA DE SOUZA-BANDEIRA FERREIRA
O PAPEL DAS RELAÇÕES INTERPESSOAIS NA CONDUÇÃO DO PROSAVANA-JBM (JAPÃO-BRASIL-MOÇAMBIQUE): UM ESTUDO DE CASO
Programa de Cooperação Triangular para o Desenvolvimento Agrícola da Savana Tropical de Moçambique
Dissertação apresentada, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre, ao programa do Curso de Mestrado Executivo em Gestão Empresarial, da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getulio Vargas (EBAPE/FGV)
Área de concentração: Gestão empresarial
Orientador: Hermano Roberto Thiry-Cherques
Ferreira, Melina de Souza-Bandeira
O papel das relações interpessoais na condução do ProSavana-JBM (Japão- Brasil-Moçambique) : um estudo de caso : programa de Cooperação Triangular para o Desenvolvimento Agrícola da Savana Tropical de Moçambique / Melina de Souza-Bandeira Ferreira. - 2012.
94 f.
Dissertação (mestrado) - Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas, Centro de Formação Acadêmica e Pesquisa.
Orientador: Hermano Roberto Thiry-Cherques. Inclui bibliografia.
1. Relações humanas – Estudo de casos. 2. Alianças estratégicas (Negócios) – Estudo de casos. 3. Redes de negócios – Estudo de casos. 4. Tranferência de tecnologia – Estudo de casos. 5. Cooperação agrícola internacional – Estudo de casos. I. Thiry-Cherques, Hermano R. II. Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas. Centro de Formação Acadêmica e Pesquisa. III. Título.
AGRADECIMENTOS
Àqueles que me inspiraram e contribuíram para minha formação acadêmica, profissional e pessoal:
Ao Prof. Hermano Roberto Thiry-Cherques Aos meus pais, Sylvia e Carlos Eduardo. A Robert Falkenburg, Gabriel Ferreira e a todos familiares. Aos meus amigos, professores e colegas de trabalho, especialmente a Sidnei Gonzalez, Cesar Cunha Campos, Profa. Déborah Zouain, Prof. Flávio Vasconcellos, Prof. Rogerio Sobreira, Mônica Balanda,
Cecília Fagan, Cleber Guarany, Giuliano Senatore, Prof. Stuart Hart, Prof. Ian Suwinski e Prof. Wesley Sine ,
Karin Merz, Janaina Fernandes, Irineu Frare, Gabriela Costa, Juliana Gagliarid, Alexandra Hensens, Bianca Borguetti, Atalanta Hicks Beach, Rafael Freire, Maria João Pessoa, Patrícia Werner,
Manuela Fantinato. Àqueles que colaboraram com este estudo, Prof. Roberto Rodrigues, Ministro Marco Farani, Ministro José Pacheco, Alberto Santana, Eliane Valéria, Paulo Nogueira, Nobuyuki Kmura,
RESUMO
O objetivo deste estudo de caso foi o de identificar o papel das relações interpessoais na
condução do ProSAVANA-JBM (JAPÃO-BRASIL-MOÇAMBIQUE), Programa de
Cooperação Triangular para o Desenvolvimento Agrícola da Savana Tropical de
Moçambique. Os objetivos intermediários permitem também investigar quais outros fatores
podem ter sido determinantes na condução do ProSAVANA. Este programa além de
representar uma parceria internacional entre organizações de três países Brasil, Japão e
Moçambique, possui impactos de ordem social, econômica e ambiental.
A análise dos dados demonstra que as relações interpessoais exerceram a maior centralidade
entre os demais fatores determinantes à condução do Programa, e também corrobora para o
desenho de um modelo de rede de relações interpessoais relacionada ao ProSAVANA. As
limitações do estudo referem-se à dificuldade deste estudo ser replicado ou generalizado
cientificamente, considerando que não seria possível emitir avaliações sobre determinado
comportamento, a partir de um estudo de caso único. Finalmente, o propósito deste estudo é
oferecer instrumentos teóricos e empíricos que permitam aprofundar a reflexão sobre o papel
das relações interpessoais, além de contribuir para as lacunas existentes no campo da gestão
empresarial e pública.
ABSTRACT
This case study intends to report how interpersonal relationships might have played an
important role on making ProSAVANA-JBM work. (Triangular Cooperation Program for
Agricultural Development of the African Tropical Savannah in
Mozambique-Japan-Brazil-Mozambique). The intermediary objectives contribute to for one to look into which other
factors might have been determinant for realization of ProSAVANA. This program not only
represents an international partnership between organizations of three countries: Brazil, Japan
and Mozambique, but also has impacts of a social, economic and environmental nature.
The data analysis shows that interpersonal relationships outstands among the other
determining factors on the Programa realization, and corroborates for the design of an
interpersonal relationship network’s model related to ProSAVANA. This study’s limitation
refere to the difficulty on replicating or generalizing this study on a scientific basis,
considering the fact that it wouldn’t be possible to imply on evaluations on a certain behavior
exclusively based on a single case study. Finally, the purpose of this study is to offer
theoretical and empirical tools that enable an in-depth assessment on the role played by
interpersonal relationships, and also to contribute to bridging the gaps in the field of business
and public administration.
APRESENTAÇÃO
Em minha vivência profissional, principalmente como Relações Públicas para organizações
nacionais e internacionais, venho observando o papel proeminente das relações interpessoais
em diversas atividades do meu campo de trabalho. Motivada a conhecer melhor este
fenômeno no campo organizacional, tenho buscado em meus estudos acadêmicos referências
de literatura com foco na gestão empresarial. Escolhi, portanto, como objeto de estudo desta
dissertação as relações interpessoais sob o enfoque de um estudo de caso, cujo objeto
empírico é o ProSAVANA: Programa de Cooperação Triangular para o Desenvolvimento
Agrícola da Savana Tropical de Moçambique.
O campo de estudo é o ProSAVANA, programa formalizado por meio de uma parceria de
cooperação internacional constituída entre a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
(EMBRAPA) e a Agência Brasileira de Cooperação (ABC), o Ministério da Agricultura de
Moçambique (MINAG), o Instituto de Investigação Agrária de Moçambique (IIAM) e a
Agência de Cooperação Internacional do Japão (JICA). O ProSAVANA destina-se
principalmente a transferir o conhecimento do agronegócio brasileiro para o Corredor de
Nacala (Anexos M e N), região localizada ao norte de Moçambique (Anexo L), e, assim,
contribuir para a competitividade do setor rural da região, segurança alimentar, por meio do
apoio técnico à produtividade agrícola.
A metodologia de coleta de dados e de análise dos elementos segue a taxonomia proposta por
Yin (2010) para a elaboração de estudos de caso. Os dados coletados são de ordem teórica,
documental e de campo. O referencial teórico contempla o conceito de redes, relações
interpessoais, capital social e descreve principalmente parte do modelo teórico proposto por
Burt (1993). Neste capítulo, são conceituados os temas relacionados a alianças estratégicas
(LYNCH,1993) e transferência de conhecimento com a base da pirâmide (HART; LONDON,
2011). Os dados documentais referem-se à análise de contexto, trazendo informações
selecionadas sobre a EMBRAPA, o ProSAVANA e o contexto político no qual o Programa
está inserido. Finalizando a coleta de dados, as entrevistas revelam elementos que contribuem
para o objetivo do estudo, informando o papel de relações interpessoais estabelecidas entre
PRESENTATION
In my professional career, predominantly as a Public Relations employee in national and
international organizations, I have become aware of the prominent role interpersonal
relationships have played in various areas of my professional activities. In order to understand
this phenomenon better in the organizational field, I have sought for references in the
literature focused on business management in my academic studies. I therefore selected
interpersonal relationships as the scope of study of this paper, from the standpoint of a case
study, the empirical scope of which is ProSAVANA; the Triangular Cooperation Program for
the Agricultural and Rural Development of the Nacala Corridor in Mozambique.
The field of research is ProSAVANA. This Programme was signed in 2011 through a
partnership between Brazilian Agricultural Research Corporation (EMBRAPA), Brazilian
Cooperation Agency (ABC), Ministry of Agriculture of Mozambique (MINAG), Agricultural
Research Institute of Mozambique (IIAM) and The Japan International Cooperation Agency
(JICA). ProSAVANA aims to transfer Brazilian know-how on agribusiness to the Nacala
Corridor, located on the North of Mozambique, and therefore contribute the competitiveness
improvement of this rural sector, food security by technically supporting the agricultural
productivity.
The methodology for data collection and analysis follows the taxonomy proposed by Yin
(2010) for case study development. The study displays theoretical data, documental evidence
and field data. The concept of networks, interpersonal relationships and social capital is based
on the theoretical approach developed by Burt (1993), and is highlighted in the theoretical
reference of this subject. In this chapter, the concepts of strategic alliances (LYNCH, 1993)
and knowledge transfer (HART; LONDON, 2011) are also presented. The documental
evidence refer to the context analysis, bringing selected information about EMBRAPA, the
ProSAVANA and the political context in which the Program takes place. Concluding the data
collection, the interviews reveal elements that contribute to the study’s objective, by revealing
the role of the interpersonal relationships established between key-players in a complex
1. PROBLEMÁTICA ... 9
1.1. Introdução ... 9
1.2. Formulação do problema ... 10
1.3. Objetivos ... 10
1.3.1. Objetivo Primário ... 10
1.3.2. Objetivos Intermediários ... 10
1.4. Proposições Teóricas ... 11
1.5. Unidade de análise e delimitação do estudo ... 11
1.6. Relevância do estudo ... 12
2. METODOLOGIA ... 13
2.1. Justificativa pelo Estudo de Caso como método ... 13
2.2. Sujeitos da pesquisa ... 14
2.3. Coleta de dados ... 15
2.4. Tratamento dos dados ... 16
2.5. Limitações do método ... 18
3. ANÁLISE DE CONTEXTO ... 19
3.1. A EMBRAPA ... 19
3.2. Formação de redes e parcerias ... 21
3.3. O ProSAVANA‐JBM e ProSAVANA‐TEC:Uma Cooperação Triangular Sul‐Sul ... 22
3.4. Contexto da política externa brasileira (2003‐2010) ... 30
4. REFERENCIAL TEÓRICO ... 32
4.1. Capital Social, Formação de redes interpessoais eficientes e Institucionalizando Organizações e Redes. ... 32
4.1.1. Relações Interpessoais e Capital Social ... 32
4.1.2. Formação de redes interpessoais eficientes ... 34
4.1.3. Institucionalizando organizações e redes ... 38
4.2. Alianças estratégicas: conceito e teoria ... 39
4.3. Transferência de conhecimento em nível global com a base da pirâmide BoP ... 43
5. SÍNTESE DAS ENTREVISTAS ... 46
5.1. Relações interpessoais estabelecidas e motivação política ... 46
5.2. Confiança, Semelhança e Experiência Anterior: ProDECER ... 48
5.3. Fortalecimento de instituições e investimento financeiro ... 50
5.4. Transferência de conhecimento e parcerias locais ... 52
6. ANÁLISE DOS DADOS ... 55
6.1. Análise das Entrevistas: Fatores determinantes na condução do ProSAVANA ... 55
7. SÍNTESE INTERPRETATIVA ... 60
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS E PONTOS PARA DISCUSSÃO ... 65
REFERÊNCIAS ... 67
ANEXOS ... 72
ANEXO F – DESENHO DE MATRIZ DO ProSAVANA‐TEC E PLANO DE OPERAÇÕES ... 78
ANEXO G – RESULTADOS ESPERADOS (P.18, PROSAVANA‐TEC) ... 79
ANEXO I – ITENS INTEGRANTES DE “APPROACHES OF THE PROJECT”, PROSAVANA‐TEC (2‐2, 2‐3) .... 81
ANEXO J – MAPA DISTRITO NA PROVÍNCIAS DE NAMPULA: ÁREA PRIORITÁRIA BASE ... 83
ANEXO K –MAPA DISTRITO NA PROVÍNCIA DE NIASSA: ÁREA PRIORITÁRIA BASE ... 84
ANEXO L – MAPA DE LOCALIZAÇÃO ESPACIAL ‐ MOÇAMBIQUE ... 85
ANEXO M – MAPA DE LOCALIZAÇÃO ESPACIAL – CORREDOR DE NACALA ... 86
ANEXO N – MAPA DO POTENCIAL AGROPECUÁRIO NO CORREDOR DE NACALA ... 87
1. PROBLEMÁTICA 1.1. Introdução
Num dado contexto, um indivíduo X tem uma ideia e quer torná-la realidade. Ao mesmo
tempo, uma empresa Y possui uma estratégia e quer implementá-la. Simultaneamente, em
diversos países do mundo surge uma série de novos projetos, programas e negócios e
indivíduos, gestores e organizações precisam escolher qual iniciativa apoiar; qual deve ser
viabilizada e qual não deve ir adiante. O que contribui em uma tomada de decisão? Diante de
uma gama de alternativas, métodos e ferramentas gerenciais, quais os fatores que podem
efetivamente contribuir para a viabilização de uma ideia, estratégia ou projeto? E quais se
provam determinantes durante todo o período de condução?
O presente estudo lança luz a um antigo, porém atual, “mecanismo” de viabilização e
condução de projetos: as relações interpessoais. Relações interpessoais sempre exerceram um
papel fundamental na história da humanidade. De tratados políticos a acordos comerciais,
governantes, empresários, pesquisadores e profissionais de diversas áreas têm formado
parcerias e acordos de cooperação internacional muitas vezes a partir de suas relações
interpessoais.
No campo da administração, este fenômeno continua a ser observado em empresas,
instituições e governos em muitas partes do mundo. Neste cenário, novas formas de
colaboração técnica ou científica têm sido identificadas para a construção de redes de
cooperação internacional. Tais práticas são caracterizadas não como meios de cooperação
formais ou institucionais, mas como informais e interpessoais. Entretanto, percebe-se um
papel cada vez maior das relações interpessoais como ferramenta estratégica nas
organizações. Relações estas que podem colaborar para a formalização e condução de
parcerias de cooperação técnica ou científica entre países.
O estudo de caso aqui apresentado relata o papel das relações interpessoais na condução do
Programa de Cooperação Triangular para o Desenvolvimento Agrícola da Savana Tropical de
Moçambique (ProSAVANA–JBM: Japão, Brasil e Moçambique). Este Programa foi
formalizado por meio de uma parceria entre a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
(EMBRAPA), a Agência Brasileira de Cooperação (ABC), o Ministério da Agricultura de
Agência de Cooperação Internacional do Japão (JICA:Japan International Cooperation
Agency).
O principal objetivo do ProSAVANA-JBM é aumentar a produção agrícola no Corredor de
Nacala ao desenvolver e transferir conhecimento e tecnologia apropriada de agricultura à
região. Este objetivo é formalmente sintetizado na versão a seguir:
(...)melhorar a competitividade do setor rural da região, tanto em matéria de segurança alimentar, a partir da organização e do aumento da produtividade no âmbito da agricultura familiar, como na geração de excedentes exportáveis a partir do apoio técnico à agricultura orientada para o agronegócio. (Resumo Executivo do ProSAVANA, 2011).
1.2. Formulação do problema
Diante do exposto, o problema norteador do estudo refere-se ao desconhecimento do papel e
da contribuição das relações interpessoais na condução de um Programa estabelecido no
âmbito de uma parceria internacional entre instituições de três países.
1.3. Objetivos
1.3.1. Objetivo Primário
O objetivo primário deste estudo de caso é identificar quais fatores humanos determinantes,
especificamente as relações interpessoais que se deram, podem ter contribuído e ainda
contribuem para a condução e operacionalização do JBM e do
ProSAVANA-TEC, a primeira fase de execução deste Programa.
1.3.2. Objetivos Intermediários
Os objetivos intermediários desse estudo são:
Identificar, no contexto da condução do ProSAVANA, quais fatores podem ter contribuído ou têm sido importantes para a condução desta aliança estratégica; e
Compreender a construção de redes de relações interpessoais efetivas e eficazes de informação a partir de perspectivas proporcionadas pelos dados coletados e
1.4. Proposições Teóricas
Este estudo parte de uma proposição teórica de que certos tipos de relações interpessoais
podem ser formados, construídos e mantidos, de forma a contribuírem para a formalização e
condução de parcerias trilaterais de cooperação, como a parceria estudada.
Este estudo pretende, assim, por meio de uma análise triangular e interpretativa dos dados
apresentados, verificar se as proposições teóricas a seguir podem ser constatadas :
Algumas relações interpessoais foram significativas para a formalização do acordo ProSAVANA-JBM;
Entre os fatores determinantes à condução do ProSAVANA, as relações interpessoais
exerceram um impacto maior; e
Relações interpessoais, que construam uma ponte entre organizações e instituições vinculadas à pesquisa, meio governamental ou empresarial, contribuem para uma
condução mais exitosa de determinado projeto e contribuem para a transferência de
conhecimento.
1.5. Unidade de análise e delimitação do estudo
A Unidade de análise estudada são as relações interpessoais no contexto representado pelo
campo de estudo do ProSAVANA. O ProSAVANA-JBM está sendo analisado com enfoque
de pesquisa a partir de dados documentais cedidos pela EMBRAPA, dados de campo e
teóricos.
Este estudo não pretende esgotar todas as questões que podem contribuir para a condução
exitosa de um projeto. Também não pretende investigar em detalhes o contexto legal,
internacional, político ou empresarial envolvido, mas sim lançar luz ao papel das relações
interpessoais e os principais fatores que podem ter contribuído e ainda contribuem à condução
do ProSAVANA-JBM, e mais especificamente ao ProSAVANA-TEC, primeira fase deste
1.6. Relevância do estudo
O estudo de caso é relevante para o campo das ciências aplicadas, pois pretende integrar as
discussões acerca do papel das relações interpessoais na condução de projetos de impacto
internacional, assim como levantar outros fatores importantes à viabilização e realização de
um projeto desta magnitude. Em complemento ao campo teórico e empírico, este estudo
contribui para a sinalização de possíveis lacunas existentes em estudos sobre capital social e
das relações interpessoal e seus desdobramentos para o campo da gestão empresarial.
No campo das relações internacionais e políticas, e do incentivo ao desenvolvimento
socioeconômico de países, este estudo também é relevante por contribuir para a difusão de um
programa de cooperação técnica internacional entre Brasil, Japão e Moçambique, a partir da
experiência do agronegócio brasileiro. Integra um assunto de interesse mundial no campo do
desenvolvimento agrícola sustentável. O ProSAVANA, objetivando o desenvolvimento
agrícola no Corredor de Nacala, pode se tornar uma experiência replicável especialmente a
outras regiões em países da África. Ademais, o programa assume uma colaboração em
termos socioeconômicos, ambiental e político importante. O ProSAVANA não só está
inserido na discussão da sustentabilidade global, segurança energética e alimentar, mas
também objetiva o progresso social e desenvolvimento regional e econômico, a partir da
utilização de técnicas agrícolas e uso sustentável de recursos naturais de países pobres ou em
2. METODOLOGIA
Esta seção apresenta o tipo de método de pesquisa utilizado para a investigação deste estudo e
descreve o processo e técnicas utilizadas na preparação, coleta e análise dos dados
encontrados. O método de pesquisa escolhido para investigar este projeto foi o método do
Estudo de Caso Único Exploratório, de acordo com taxonomia proposta por Yin (2010), pois
possibilita tornar conhecido um fenômeno contemporâneo. O estudo de caso é único, pois se
refere a uma investigação exploratória, tendo por objetivo entender quais foram os fatores
humanos, especificamente o das relações interpessoais, que contribuíram para a condução do
ProSAVANA.
2.1. Justificativa pelo Estudo de Caso como método
O método do estudo de caso é adequado à investigação do fenômeno aqui apresentado, pois:
Pretende analisar em profundidade e detalhamento um fenômeno contemporâneo e
seu funcionamento num contexto de vida real. Trata-se de um fenômeno social, pois
são as relações que se deram, e contemporâneo, por ser um projeto atual e dinâmico,
pelo tempo estimado de sua duração. Procura-se entender “como” as relações
interpessoais podem ter contribuído para a condução da parceria formada entre a
EMBRAPA e outras organizações, originando o ProSAVANA. Ademais, tenta lançar
luz a uma investigação na qual “os limites entre o fenômeno e o contexto não são
claramente evidentes” (YIN, 2010, p.39)
Possibilita o levantamento de uma variedade de evidências a serem coletadas, entre documentos, entrevistas com pessoas envolvidas, observação direta do evento, pelo
estudo e revisão de literatura, oferecendo técnicas de análise, que incluem a
convergência triangular das fontes de evidência;
Permite que investigadores retratem as principais características dos acontecimentos de forma significativa, marcando determinado fenômeno que se mostra relevante
tanto para a EMBRAPA, como também para os governos do Brasil, Japão e
Moçambique, suas instituições e indivíduos envolvidos;
Ao aplicar uma pesquisa qualitativa, pode:
determinado grupo, e possibilitar, em maior nível de profundidade, o entendimento das particularidades do comportamento dos indivíduos. (RICHARDSON, 1999, p. 80).
A pesquisa atendeu a critérios de avaliação de projeto (YIN, 2010, p. 63), como:
Validade do constructo: utilizando múltiplas fontes de evidência e buscando conexões entre estas durante a coleta de dados e o desenvolvimento. Este estudo também foi
submetido à revisão de minuta preliminar por informantes-chave; e
Confiabilidade: utiliza fontes de evidência concretas e reveladas ou citadas ao longo deste estudo. Para preservar a identidade dos entrevistados, o trecho de suas
entrevistas foi omitido, sendo listada a relação dos sujeitos de pesquisa no item 2.2.
2.2. Sujeitos da pesquisa
Este item introduz os sujeitos da pesquisa contemplados na pesquisa individual e aberta. Os
sujeitos da pesquisa foram definidos de acordo com sua atuação ou liderança (política,
operacional ou estratégica), assim como seu grau de envolvimento no ProSAVANA-JBM.
Adotando este critério, os entrevistados selecionados são representados por:
representantes da EMBRAPA: coordenadores do projeto e responsáveis pela operacionalização do Programa; e
representantes de governo ou de instituições parceiras com atuação participativa e fundamental para a realização do ProSAVANA-TEC.
Os sujeitos da pesquisa são identificados a seguir, por nome, organização e cargo,
respectivamente:
Alberto Santana, EMBRAPA: Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, Coordenador do ProSAVANA-JBM;
Calisto Bias, IIAM:Instituto de Investigação Agrária de Moçambique, ex-Diretor-Geral IIAM, coordenador técnico ProSAVANA-JBM;
Eliane Valéria, EMBRAPA: Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, Secretaria de Relações Internacionais;
José Pacheco, MINAG: Ministério da Agricultura de Moçambique, Ministro;
Jusimeire Mourão, JICA: Agência de Cooperação Internacional do Japão, Consultora do Projeto - Programa de Cooperacão Triangular e Divisão Social no escritório da
Jica/Brasil/ Coordenadora;
Nobuyuki Kmura, JICA: Agência de Cooperação Internacional do Japão,
Coordenador do Projeto - Programa de Cooperação Triangular e Divisão Social no
escritório da JICA/Brasil;
Paulo Nogueira, EMBRAPA: Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, Conselheiro da Secretaria de Relações Internacionais da EMBRAPA;
Roberto Rodrigues, ex-ministro da Agricultura Brasil (2003- 2006), Embaixador da FAO no Brasil, Coordenador do GV/Agro; e
Thais Braga, ABC: Agência Brasileira de Cooperação, Analista de Projeto responsável pelo ProSAVANA-JBM / Coordenadora de Projetos de Cooperação
Técnica em Agricultura em Moçambique
Agência Brasileira de Cooperação (ABC).
2.3. Coleta de dados
Este item trata da coleta de dados alinhada aos objetivos do estudo, suas proposições
predefinidas e unidade de análise investigada. O uso das múltiplas fontes de evidência,
descritas abaixo, representam uma vantagem no “desenvolvimento de linhas convergentes de
investigação, um processo de triangulação e corroboração” (YIN, 2010). O recurso conhecido
como triangulação dos dados, representa não só uma coleta de dados estritamente documental
ou de campo, mas um conjunto de informações que contribuem para a validade da pesquisa
científica, além de perspectivas variadas do mesmo fenômeno. (RICHARDSON, 1999; YIN,
2010; VERGARA, 2009).
Foram levantados:
Dados documentais, por meio de arquivos e documentos disponibilizados pela EMBRAPA, conforme identificados nas referências deste documento e utilizados
como referência de conteúdo para o item 3;
Perspectivas proporcionadas pelo referencial teórico pesquisado. A revisão da literatura de pesquisa encontrada foi realizada de acordo com a definição do caso e da
unidade de análise aqui estudada. O referencial teórico pôde nortear a unidade de
análise, como também apoiar a análise posterior, conforme se observa no item 4;
Dados referentes a matérias e notícias encontradas em pesquisa on-line relevantes ou
Dados no campo, a partir da realização de entrevistas semiestruturadas com pergunta
aberta e individual1, conduzidas com público-alvo definido nos sujeitos da pesquisa,
listados acima.
Sobre este último dado, do ponto de vista das entrevistas individuais, o número de pessoas foi
estabelecido de acordo com a estratégia snow ball (VERGARA, 2009, p.6.), pela qual um
entrevistado indica outros As entrevistas realizadas cessaram a partir do momento em que o
ponto de saturação foi identificado, identificado por THIRY-CHERQUES (2009), pelo
“momento em que o acréscimo de dados e informações em uma pesquisa não altera a
compreensão do fenômeno estudado”, tornando-se redundante e sem contribuir com novas
perspectivas ou informações originais. Recomenda-se que seja contemplado um mínimo de 8
observações e um máximo de 15 observações. Extrapolado este número “evidencia-se que o
ponto de saturação é imprevisível e que, portanto, este critério é
inapropriado.”(THIRY-CHERQUES, H.R., p.21-26, 2009.)
As entrevistas foram realizadas com uma pergunta aberta e atendendo à questão de pesquisa
exploratória alinhada aos objetivos primário e intermediário, a saber: “Meu objeto de estudo
refere-se ao fator humano identificado pelas relações interpessoais do ProSAVANA. Neste
contexto, quais têm sido os fatores determinantes na condução do ProSAVANA-JBM?” Os
sujeitos da pesquisa falaram livremente e foram solicitados, ao final de suas entrevistas, a
esclarecer alguma lacuna que porventura tivessem deixado na narrativa.
2.4. Tratamento dos dados
Os dados coletados foram tratados seguindo uma estratégia analítica geral (YIN, 2010, p.154),
na qual a prioridade de análise volta-se para as relações interpessoais, e suas interpretações
possibilitadas pela coleta de dados. A estratégia aplicada à análise deste estudo combinou as
estratégias (i) proposições teóricas, levantadas pelas proposições e revisões de literatura; (ii)
utilização dos dados qualitativos, revelados na coleta de dados documentais ou de campo; e
(iii) explanações rivais, que podem surgir nas entrevistas e levantar outros fatores
determinantes na condução do ProSAVANA.
Os objetivos primário e intermediários e as proposições teóricas nortearam o começo da
análise dos dados, permitindo a correlação entre evidências coletadas e pontos a serem
1
investigados neste estudo2. Os dados obtidos a partir das entrevistas foram o objeto de análise
de conteúdo, para complementar a análise de documentos e revisão de literatura. Esta técnica
permite analisar o que é comunicado em diferentes fontes: “A análise de conteúdo procura
conhecer aquilo que está por trás das palavras sobre as quais se debruça” (BARDIN, 1977, p.
44). A análise de conteúdo integra um conjunto de técnicas e processos, com vistas a
descrever os conteúdos das mensagens analisadas (BARDIN, 1977).
Os dados coletados foram analisados a partir da identificação de categorias preestabelecidas e
da unidade de análise definida pelo pesquisador. Esta categorização permite a análise e
sistematização dos temas mais recorrentes na fala dos entrevistados. Foi utilizado o critério
semântico de categorização, pelo qual cada categoria corresponde ao tema que integra
elementos de análise. Estes elementos são obtidos a partir da pergunta de entrevista. Para
ilustrar essa opção, será observado o exemplo dado por Dellagnelo e Silva (2005, p.112): “os
elementos que refletem ansiedade serão agrupados em uma categoria ansiedade; os
elementos que refletem valores individuais serão agrupados em uma categoria
individualismo”.
A partir da seleção dos trechos mais significativos revelados nas entrevistas, busca-se
identificar elementos de cada categoria e sua interpretação segundo os parâmetros definidos
previamente para o trabalho. Estes dados são então categorizados e interpretados através de
procedimentos qualitativos, no qual quanto mais uma categoria aparece na entrevista, mais
influência tem na estrutura de análise. Assim sendo, as entrevistas possibilitaram mapear as
percepções dos sujeitos da pesquisa sobre os fatores determinantes na condução do
ProSAVANA, especificamente relacionados ao fator humano. Para um tratamento de dados
adequado, foi fundamental a estruturação das informações a partir da veracidade das
informações coletadas pelas entrevistas ou dos documentos cedidos pela empresa, além do
apoio na revisão de literatura disponível. A análise completa dos dados consta no item 6.
2
As entrevistas foram gravadas com o consentimento dos entrevistados. Entretanto, para possibilitar uma coleta de informações mais aprofundada, a identidade dos entrevistados foi dissociada dos trechos de entrevistas revelados. Sendo as informações, fornecidas nas entrevistas, muito sensíveis, o conteúdo completo gerado pelas entrevistas se encontra sob posse do autor deste estudo.
2.5. Limitações do método
Existem algumas críticas relacionadas à utilização de estudos de caso em pesquisas
acadêmicas, às vezes erroneamente identificadas como “pesquisa sem valor científico”. Yin
(2010) afirma existir alguns preconceitos ou possíveis limitações sob as quais os estudos de
caso estão sujeitos, como, por exemplo, falta de rigor metodológico, em que o objeto de
investigação seria de difícil delimitação, e, por isso, o pesquisador poderia ser tendencioso em
suas descobertas. De toda forma, deve-se ao mesmo tempo procurar uma aproximação entre o
pesquisador e as atividades, processos e sujeitos-chave responsáveis pela aproximação da
‘empresa-caso’, a EMBRAPA e as demais instituições envolvidas.
Outra crítica a este método do estudo de caso refere-se à dificuldade que se impõe pela
impossibilidade de replicação e generalização científica, considerando que não seria possível
emitir avaliações sobre determinado comportamento, a partir de um estudo de caso único. Por
outro lado, o programa ou empresa estudados pode ser de grande relevância para o
desenvolvimento nacional, e poderia complementar estudos e pesquisas sobre o tema em
questão. Argumenta-se, portanto, de acordo com Yin (2010) que o objetivo central desse
3. ANÁLISE DE CONTEXTO
Este tópico sintetiza alguns dados documentais relevantes à investigação e análise deste
estudo, reunindo informações acerca da EMBRAPA - empresa integrante da parceria e
responsável pela transferência de conhecimento e tecnologia para o desenvolvimento da
agricultura no Corredor de Nacala do ProSAVANA-JMB e sua primeira fase, o
ProSAVANA-TEC, como também da contextualização no cenário político e organizacional
no qual este programa se insere.
3.1. A EMBRAPA
3.1.1 Histórico, Estrutura Organizacional e Modelo de Gestão
A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) é uma empresa pública
vinculada ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento do Brasil, e foi criada em
26 de abril de 1973. Sua missão é “viabilizar soluções de pesquisa, desenvolvimento e
inovação para a sustentabilidade da agricultura, em benefício da sociedade brasileira” (Site
EMBRAPA). Desde sua criação, a EMBRAPA tem se consolidado a partir do
desenvolvimento e implantação de: (i) Projetos de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) e
Transferências de Tecnologias; e (ii) Mudanças organizacionais para o aprimoramento
permanente de sua gestão.
Em 2005, a EMBRAPA foi considerada a melhor e maior empresa do Brasil no setor de
serviços e tecnologia, representando também “excelência em pesquisa no campo, e é
unanimemente apontada como uma das principais responsáveis pelo sucesso do agronegócio
brasileiro" (apud Anuário Exame Agronegócio 2006/2007). Além disso, é empresa líder em
agricultura tropical no Brasil e também lidera a lista de inovação tecnológica, figurando na
lista das instituições de pesquisa nacional que mais entraram com solicitação de patentes, um
total de 167 pedidos, em 18 anos3.
3
Sua estrutura organizacional está dividida entre unidades de pesquisa e de serviços e unidades
administrativas (Anexo A). Sua estrutura abrange os níveis de gestão estratégica, tática e
operacional (Anexo B), com o objetivo de seguir um “modelo de gestão organizacional mais
ágil, flexível e dinâmico, visando ao atendimento eficiente e eficaz das demandas internas e
externas da Empresa.” Seu mapa estratégico relativo ao PDE (Plano Diretor da EMBRAPA
2008-2011-2023) contempla as seguintes estratégias:
Figura 1 Mapa Estratégico relativo ao PDE/ EMBRAPA Fonte: Plano Diretor da EMBRAPA 2008-2011-2023
Neste mapa, destaca-se entre seus “Desafios Organizacionais e Institucionais” uma motivação
por uma gestão ágil e flexível, que permita autonomia para associações e parcerias. Nesse
contexto, evidencia-se o objetivo de expansão da atuação internacional da EMBRAPA. Para
sustentar esse crescimento, percebe-se uma preocupação da empresa em atrair e manter
talentos. Reconhece-se a necessidade na atração e retenção de talentos técnicos e gerenciais, e
velocidade da inovação e transferência de tecnologia” (apud Plano Diretor da EMBRAPA
2008-2011-2023). A empresa está presente em todos os estados brasileiros e atribui sua
liderança em agricultura tropical no Brasil a seus investimentos no treinamento de recursos
humanos. Seu quadro organizacional é composto por 9.657 empregados, sendo 2.392
pesquisadores. Do total de empregados pela EMBRAPA, 9% possuem especialização ou
pós-graduação; 11% mestrado; e 22% doutorado, pós-doutorado ou livre docência. O orçamento
da empresa para 2012 é de R$ 2,1 bilhões (site EMBRAPA).
3.2. Formação de redes e parcerias
A EMBRAPA mantém laços fortes no setor público, nas esferas federal, estadual e municipal.
Em 2006, criou a Assessoria de Relações Nacionais, com o objetivo de desenvolver outras
parcerias com órgãos governamentais, no Brasil e no exterior.
A empresa vem também investindo na renovação de redes de pesquisa, seja por meio da
criação de novas unidades operacionais ou de transferência de tecnologia, ou da revitalização
de organizações de pesquisa existentes. Nesse contexto, mantém e fortalece redes com
diversos institutos de estudo, pesquisa, tecnologia, financiamento entre outros, já tendo
mobilizado, por exemplo, “mais de 600 instituições públicas e privadas no mapeamento de
competências regionais e de gargalos tecnológicos, e na definição de plataformas de
desenvolvimento de tecnologias” (Ciência, gestão e inovação: dimensões da agricultura
tropical. EMBRAPA, 2005-2007). Dentre as principais instituições parceiras, estão:
secretarias de agricultura; organizações públicas de pesquisa na área agrícola; organizações de
extensão rural; universidades; cooperativas; agências de fomento; fundações; empresa
privadas; e organizações não governamentais.
Segundo dados da empresa, a EMBRAPA possui na área internacional 78 acordos bilaterais
com 56 países e 89 instituições estrangeiras4, especialmente no que se refere à transferência
do conhecimento ou desenvolvimento de tecnologia relacionada à pesquisa agrícola.
Demandas referentes a projeto de transferência de tecnologias tropicais provenientes de países
em desenvolvimento no eixo Sul-sul, como o ProSAVANA, são intermediadas pela Agência
Brasileira de Cooperação do Ministério de Relações Exteriores - ABC/MRE. Seus projetos de
cooperação são desenvolvidos nos chamados Laboratórios Virtuais no Exterior - LABEX 5, e
os projetos de Transferência de Tecnologia, junto a instituições, empresas ou organismos de
cooperação internacional de países da América, África, Europa e Ásia.
Temos os LABEX que facilitam nossa área de internacionalização nos EUA, França, Alemanha e Coreia. Os LABEX, laboratórios no exterior são virtuais, existe o pesquisador ou os pesquisadores numa instituição parceira nestes países. Tem uma agenda de pesquisadores que funcionam como “adidos” científicos nestes LABEX. Como a integração foi acontecendo, depois eles entraram nessa rede de conhecimento e iam estabelecendo contatos pelos laboratórios. EMBRAPA está fazendo este papel de criar redes externas há muitos anos. Ela cria os arranjos institucionais, e coloca pesquisadores em contato com estas instituições e outros laboratórios nos países. São identificadas pessoas-chave nas instituições. Temos procurado casar interesse nosso de pesquisa e cooperação com o deles . Aumentaram gradativamente o orçamento em ciência e tecnologia. (Depoimento concedido por representante EMBRAPA, em julho,2012)
3.3. O PROSAVANA-JBM E PROSAVANA-TEC: UMA COOPERAÇÃO
TRIANGULAR SUL-SUL
Entre 1970 e 2011, alguns acordos de cooperação têm sido formalizados entre os países
Japão, Brasil e Moçambique (Anexo D).O ProSAVANA-JBM é um programa de cooperação
triangular entre Japão, Brasil e Moçambique, para o desenvolvimento agrícola e rural das
savanas tropicais, em Moçambique (Anexo E). O ProSAVANA-TEC, por sua vez, representa
a primeira fase do ProSAVANA-JBM, e refere-se ao Projeto de Melhoria da Capacidade de
Pesquisa e de Transferência de Tecnologia para o Desenvolvimento da Agricultura no
Corredor de Nacala.
4 Informação disponível em http://www.embrapa.br/a_embrapa/missao_e_atuacao/ 5
Este programa faz parte de uma cooperação triangular, definida “como uma modalidade de
cooperação internacional, assim como outras cooperações: bilaterais, multilaterais e Sul-Sul
(PANTOJA, 2009,p.3.). A cooperação internacional pode ser representada pela “formação de
associações e alianças estratégicas, (…) especialmente com vistas a compartilhar
conhecimentos tácitos e habilidades, e desenvolver competências comuns e explorar
conjuntamente segmentos do Mercado” (COOPERAÇÃO…, 2010, p.7,). Por cooperação
triangular entende-se também como a inclusão de países do eixo Norte-Sul-Sul, pelas quais
estas iniciativas “devem ser planejadas, financiadas e executadas por uma parceria que deve
incluir, pelo menos um país doador tradicional, um novo doador ativo em relações de
cooperação Sul-Sul6,além de um terceiro país receptor. (ACCRA DECLARATION apud
PANTOJA, 2009).”
Apesar desta ser uma temática de grande relevância internacional e assumir um papel cada
vez mais relevante na agenda internacional, identifica-se, até a presente data, pouco consenso
sobre este assunto na literatura acadêmica, e entre países e organismos multilaterais.
Com efeito, aquilo que denominamos de relações Sul-Sul e Norte-Sul são conceitos cada vez mais desadequados à realidade, com alguns países do chamado “Sul” a adquirirem um poder econômico e uma projeção de influência muito superior a alguns países do chamado “Norte” (nomeadamente pequenos doadores). Estas alterações globais dos equilíbrios de poder entre doadores e beneficiários, e a própria diluição desta distinção em alguns casos, levantam também questões sobre quem lidera, e quem deve liderar no futuro, a agenda de eficácia da ajuda. (...) Para além disso, a construção de uma nova geografia da ajuda internacional tem assentado, nos últimos anos, no reforço da cooperação entre países em desenvolvimento e na presença crescente de “novos” doadores - como a China, Índia, Brasil, Turquia, Arábia Saudita ou Coreia do Sul -, que oferecem fortes fontes alternativas de apoio aos países em desenvolvimento, em boa parte desiludidos com os resultados da ajuda dos chamados doadores “tradicionais”. (EFICÁCIA…,2011,p.27)
6 Doadores tradicionais são aqueles países que têm trabalhado com cooperações bilaterais ou multilaterais, e que
Em outro relatório, emitido pela United Nations Economic and Social Council faz-se necessário:
(...) um processo que facilite o intercâmbio de informacão e análises aprimoradas, pelo qual outros atores possam aprender as lições positivas Sul-Sul e de desenvolvimento da cooperacão triangular, especialmente em assistência técnica, desenvolvimento de capacidades, infraestrutura, programas regionais e retorno rápido como resultado do desenvolvimento7. (UNITED NATIONS ECONOMIC AND SOCIAL COUNCIL,2008)
Desde 2005, algumas iniciativas mais efetivas têm sido implementadas com o objetivo de
ampliar o debate acerca do papel da ajuda e da cooperação internacional como resposta aos
desafios globais que se apresentam, principalmente nos temas relacionados economia,
meio-ambiente e sociedade. Entre estas iniciativas, destacam-se a “Declaração de Paris sobre a
Eficácia da Ajuda ao Desenvolvimento” (PARIS DECLARATION..., 2005), adotada durante
o II Fórum de Alto Nível da (High Level Forum:HLF), posteriormente realizado em Acra,
Gana e Busan, Coreia. A partir dessa declaração, de fóruns e de iniciativas similares, novos
compromissos e metas internacionais foram assumidas, buscando o avanço progressivo de
parcerias globais para o desenvolvimento e no alcance aos Objetivos do Milênio até 2015,
entre outros.
Experts believe that high food prices may be here to stay. Even so, we have the tools and technology to beat hunger and meet the Millennium Development Goals. We know what to do. What is required are political will and resources, directed effectively and efficiently. (…)Roughly a third of the world's food shortages could be alleviated to a significant degree by improving local agricultural distribution networks and helping to better connect small farmers to markets. 8 (Ban Ki-moon, 2008)
O ProSAVANA é citado também como um bom exemplo de cooperação triangular:
(…) The G20 Conference on Agricultural Research for Development, held in Montpellier, France, on 12-13 September 2011, rought together the G20 Agricultural Research Systems and key international bodies(…) to promote scientific partnerships for Food Security.The presidency summary recognised that:(…)triangular cooperation like PROSAVANNAH program, provide good examples of partnershipsaround the G20 Agricultural Research Systems that
7 Tradução livre. 8
include stakeholders in developing countries and address their food security and sustainable development needs. (SUSTAINABLE…,2012,p.20)
Moçambique, por sua vez, é um país receptor marcado por uma história de conflitos, guerras
civis e políticas, sendo, portanto, ainda recentes a sua independência de Portugal, seus
processos de pacificação, democratização, fortalecimento institucional e reforma econômica.
Os problemas enfrentados pelo país são refletidos até hoje em seus índices sociais e
econômicos. De acordo com dados do PNUD de 2011, o país no desempenho de seu IDH
(Índice de Desenvolvimento Humano) classifica-se na posição 184, em um ranking de 187
países.
A região do Corredor de Nacala, localizada ao norte de Moçambique entre o Porto de Nacala
(província de Nacala) até a cidade de Lichinga (Província de Niassa), oferece recursos
agroclimáticos favoráveis à agricultura e ao desenvolvimento rural e regional, porém carece
de tecnologia apropriada à demanda crescente por alimentos. A população habitante das
províncias de Nampula (Anexo J) e Niassa (Anexo K) é predominantemente rural e está
inserida num contexto socioeconômico precário, em que somente 60% da população tem
acesso à água potável e 57% à educação. Adicionalmente, estas regiões são até hoje atingidas
por doenças como Malária, Cólera e Aids9. A agricultura em Moçambique, por sua vez, é um
dos setores mais importantes para o fortalecimento econômico do país, representando
atualmente:
(...)cerca de 24% do PIB, da ordem de US$ 8,1 bilhões, além de empregar a maior parte da população economicamente ativa. Pelo menos 14,3 milhões (70% do total) de moçambicanos vive na zona rural, dos quais 95,0% dedicam-se à agricultura, caracterizada quase que integralmente pela agricultura familiar de subsistência, com limitado acesso a insumos e recursos, gerando baixos níveis de produtividade. Entretanto, contando com cerca de 36 milhões de hectares de terras agricultáveis, apenas 5,7 milhões de hectares são utilizadas por cerca de 3,34 milhões de pequenas e médias explorações com tamanho médio de 1,5 hectares, denominadas ‘machambas’. (Resumo Executivo ProSAVANA-TEC, 2011).
O propósito do ProSAVANA-JBM é
(...)melhorar a competitividade do setor rural da região, tanto em matéria de segurança alimentar a partir da organização e do aumento da produtividade no âmbito da agricultura familiar, como na geração de
9
excedentes exportáveis a partir do apoio técnico à agricultura orientada para o agronegócio. (Resumo Executivo ProSAVANA-TEC, 2011).
Especificamente, sua meta mais ampla é “aumentar a produção agrícola no Corredor de
Nacala”, e seu propósito de projeto é “desenvolver e transferir tecnologia apropriada de
agricultura no Corredor de Nacala”. (Anexos D, E, F, G, H, I)
Trata-se de um programa inspirado na experiência do ProDECER - Programa de Cooperação
Nipo-Brasileiro para Desenvolvimento dos Cerrados, firmado em 1973, entre o Governo
brasileiro e a Agência de Cooperação Internacional do Japão. O objetivo era desenvolver os
cerrados brasileiros, área representada por 200 milhões de hectares e concentrada
especialmente na região Centro-Oeste, a partir do desenvolvimento do agronegócio. Naquele
período, a EMBRAPA participou posteriormente com pesquisas sobre o cerrado, por meio do
seu Centro de Pesquisa Agropecuária dos Cerrados (CPAC). Após quase 40 anos de
implantação do ProDECER, a área foi desenvolvida em cerca de 60 milhões de hectares e,
hoje, esta região é responsável por cerca de 50% de toda a produção nacional de soja do país,
por exemplo. O ProDECER teve também um impacto positivo para o progresso social e
desenvolvimento econômico da região.
Figura 2 Transferência de conhecimento do ProDECER para o ProSAVANA Fonte: ProSAVANA-TEC (p. 49)
O ProSAVANA-JBM busca, entre outros objetivos, transferir o aprendizado do ProDECER e
o conhecimento e técnicas agrícolas desenvolvidas pela EMBRAPA ao desenvolvimento
agrícola das savanas de Moçambique, conforme ilustrado na Figura 2. Importante ressaltar
que a região do Corredor de Nacala se assemelha em condições agroclimáticas às encontradas
no cerrado brasileiro.
Por ser um programa de longa duração, aproximadamente 20 anos, o ProSAVANA-JBM
contempla três projetos sequenciais:
Fase 1: ProSAVANA-TEC – Projeto de melhoria da capacidade de pesquisa e de transferência de tecnologia para o desenvolvimento da agricultura no Corredor de Nacala.
Este projeto prevê a implementação de um centro tecnológico regional dedicado à pesquisa,
extensão rural e capacitação de recursos humanos e treinamento;
Fase 2: Implementação do projeto piloto para o desenvolvimento da região através da transferência e implantação de tecnologias de processamento agroindustrial e
desenvolvimento da comercialização de produtos agrícolas; e
Fase 3: Com base nas fases anteriores, prevê-se a elaboração de um plano diretor para o desenvolvimento agrícola regional integrado.
cujo projeto foi formalizado, em junho de 2011, por meio de uma aliança estratégica10
EMBRAPA, Agência Brasileira de Cooperação (ABC), o Ministério da Agricultura de
Moçambique (MINAG), o Instituto de Investigação Agrária de Moçambique (IIAM), e a
Agência de Cooperação Internacional do Japão (JICA: Japan International Cooperation
Agency). De acordo com o Resumo Executivo do ProSAVANA-TEC, o projeto é descrito
integralmente, conforme os itens a seguir:
Objetivo:
• Contribuir para o desenvolvimento regional do Corredor de Nacala, mediante o fortalecimento da capacidade de pesquisa e de difusão de soluções tecnológicas para a agricultura regional.
Duração:
• 60 meses, a partir de 01 de maio de 2011, podendo ser passíveis de prorrogação com base nos resultados de avaliações ou revisões de meio termo.
Resultados esperados: No curto prazo:
• Construção de uma base tecnológica em agropecuária interna capaz de dar sustentabilidade aos programas de produção agropecuária e de desenvolvimento rural da região.
No longo prazo:
• Obtenção de incrementos da produção e da produtividade da agropecuária regional a uma taxa média de 12,0% ao ano a partir de 2015.
Beneficiários: Diretos:
• Profissionais em investigação agrária lotados nos Centros Zonais Nordeste e Noroeste do Instituto de Investigação Agrária de Moçambique (IIAM)
• Profissionais em extensão rural atuantes nas Direções Províncias de Agricultura de Niassa e Nampula,
• Cerca de 40.000 famílias de pequenos e médios produtores agrícolas organizados.
Indiretos:
• 7,6 milhões de produtores rurais em atividade no Corredor de Nacala, cerca de 20% do total de produtores familiares de Moçambique.
Orçamento:
Serão aplicados durante os cinco anos de duração do ProSAVANATEC, um total de US$ 14,68 milhões de dólares americanos, dos quais:
• US$ 6,19 milhões (42,1%) financiados pela Agência Brasileira de Cooperação (ABC);
• US$ 6,43 milhões (43,8%) custeados pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) em horas técnicas equivalentes; e
• US$ 2,07 milhões (14,1%) custeados pelo Governo Moçambicano em horas técnicas equivalentes e outras despesas de custeio. (Resumo Executivo ProSAVANA-TEC, 2011)
10
Os objetivos específicos a serem alcançados no curto prazo pelo ProSAVANA-TEC são
especificamente os listados abaixo, conforme plano operacional, resultados e marco
conceitual do Programa, apresentados nos Anexos F, G e H, respectivamente:
1. Fortalecer a capacidade operacional e de disseminação de tecnologias dos Centros Zonais Nordeste e Noroeste do IIAM;
2. Avaliar as condições socioeconômicas e desenvolver métodos e critérios para avaliação de impacto socioambiental decorrente do uso de novas tecnologias;
3. Identificar e avaliar as condições dos recursos naturais para a prática da agricultura no Corredor de Nacala, e disponibilizar tecnologias para sua utilização sustentável;
4. Desenvolver e disponibilizar soluções tecnológicas eficientes para o cultivo agrícola e a produção animal; e
5. Desenvolver/validar, em conjunto com comunidades de produtores, tecnologias agrícolas em unidades demonstrativas selecionadas. (ProSAVANA-TEC, p.14)
A coordenação do ProSAVANA-JBM divide-se em três comitês conforme o exposto na
Figura 3:
Figura 3 Comitê de Coordenação do ProSAVANA-JBM
3.4. Contexto da política externa brasileira (2003-2010)
No contexto deste estudo de caso, é importante destacar o papel que a política externa
brasileira tem desempenhado, especialmente no período que compreende o governo do
ex-presidente Lula (2003-2010). Tomando como base o artigo dos autores Visentini e Silva
(2010), nesse período, ao mesmo tempo em que foram mantidas as parcerias tradicionais, o
Brasil não só buscou maior integração com diferentes países, como expandiu sua área de
atuação, exercendo um papel mais proeminente no debate de grandes questões globais
políticas, econômicas e ambientais, especialmente naqueles países de língua portuguesa. Nas
negociações com as grandes potências, o Brasil assumiu uma postura mais incisiva. No
âmbito regional, veio buscando, por meio de parcerias, estimular o crescimento dos países
vizinhos para, dentro desta nova visão estratégica, reforçar a integração do bloco.
Em 2003, em sessão realizada no Instituto Rio Branco, o chanceler Celso Amorim expôs 4
importantes diretrizes da então nova política externa brasileira, a saber: (1) América do Sul;
(2) compromisso com o multilateralismo como ferramenta no desenvolvimento da paz; (3)
agenda comercial afirmativa; (4) parcerias com países desenvolvidos e em desenvolvimento.
No entender do novo governo, estes seriam os instrumentos adequados para que o Brasil
retomasse os espaços perdidos durante a década anterior. Nessa perspectiva, o Brasil passou a
formar blocos de integração com países diversos, de forma a potencializar seus esforços.
Como exemplos importantes, o G-20 (dedicado às questões de agricultura – vide a Rodada de
Doha) e o G-3 ou IBSA (Índia, Brasil e África do Sul) – para articulação estratégica entre
estes países.
O Brasil na era Lula (2003-2010) assumiu então uma posição relevante nos debates das
grandes questões enfrentadas pela comunidade internacional, com um papel especialmente
significativo e integrador perante os países em desenvolvimento e os países vizinhos. Seus
recursos naturais e sua reconhecida capacidade no desenvolvimento e fornecimento de energia
alternativa o tornam interlocutor de peso nas reuniões com as grandes potências. Vê-se, então,
que a adoção desta nova estratégia multilateralista tem sido determinante para o sucesso do
país em diversas negociações, e que a formação de blocos específicos leva à otimização de
Com base no modelo de diplomacia triangular11 e sob o aspecto das relações
governo-governo, Guedes (2006) defende que “a diplomacia brasileira tem recentemente concentrado
seus esforços em três conjuntos de países” pela aproximação destas relações com (1) países da
América Latina, (2) países emergentes da África do Sul, Índia, China e Rússia, e o conjunto
de (3)países de língua portuguesa (GUEDES, p.344.2006). Especificamente, sobre estes
últimos conjuntos, a autora sugere que “a probabilidade de convergência de visões e
interesses estratégicos é muito mais elevada entre esses países do que, por exemplo, qualquer
tentativa de estabelecimento de vínculos com os países desenvolvidos da Europa.” Citando
Buzan a autora conclui que :
(...)as eventuais oportunidades de cooperação com países como o Brasil decorrem dos conflitos entre os países europeus e os EUA nas demais dimensões das relações internacionais contemporâneas. Mais especificamente, dos conflitos de visões e interesses nas questões ambientais e culturais, e mais recentemente quanto às decisões unilaterais na área de segurança. (BUZAN 2002 apud GUEDES;2006)
11
4. REFERENCIAL TEÓRICO
A partir de uma revisão de teorias correlatas ao campo deste estudo, o referencial aborda os
conceitos de (1) O capital social, abordando a formação de redes interpessoais eficientes e
efetivas e a institucionalização de organizações e redes; (2) aliança estratégica, para se
entender a parceria firmada entre EMBRAPA e as instituições listadas na introdução; e (3)
Transferência de conhecimento em nível global com a base da pirâmide BoP12.
Na nova tendência global, organizações que cooperam e trocam informações e conhecimento
entre si também aumentam sua competitividade a longo prazo, e desenvolvem novas
oportunidades de cooperação técnica. Esta habilidade pode levar a novos produtos e a novos
mercados. (DUTTA, 2011; CHRISTENSEN, 2000; BURT, 1993). Uma das condições para a
estruturação deste ambiente reside na capacidade de empresas ampliarem seu capital social13,
a partir do incentivo à construção de redes de relações interpessoais, que levam a uma maior
chance de aprendizado e troca de conhecimento.
O tópico seguinte levantará conceitos referentes à construção e operacionalização de alianças
estratégicas. Por fim, o referencial teórico encerra com uma introdução aos conceitos de
transferência de conhecimento e como executá-lo com a base da pirâmide (Base of the
Pyramid, BoP) e sua aplicação ao fenômeno e unidade de pesquisa deste estudo.
4.1. Capital Social, Formação de redes interpessoais eficientes e Institucionalizando Organizações e Redes.
When they ask the question, "What can this company do?" the place most managers look for the answer is in its resources-both the tangible ones like people, equipment, technologies, and cash, and the less tangible ones like product designs, information, brands, and relationships(…) (CHRISTENSEN, OVERDORF, 2000, p.68)
4.1.1. Relações Interpessoais e Capital Social
A literatura acadêmica disponível sobre relações interpessoais é vasta e com enfoques de
estudos distintos. Para a compreensão deste estudo do campo da administração, defino
12
Trechos deste item foram retirados de artigo publicado no Cadernos FGV Projetos. Disponível em:
http://fgvprojetos.fgv.br/publicacoes/cadernos-fgv-projetos-n-20%C2%B0-os-desafios-do-rio-sustentavel.
13
relações interpessoais como os acessos ou conexões sociais estabelecidas entre indivíduos, no
contexto do capital social e das redes interpessoais, em que “as relações que se dão dentro e
fora de uma organização representam o capital social” (BURT,1993,p.58). O Capital Social,
diferente de outras formas de capital, é também “menos tangível, pois existe nas relações
entre pessoas” (COLEMAN,1988, p.100).
O conceito de capital social é complexo e já foi explorado em teorias e estudos por muitos
autores. Na visão de Bourdieu, o capital social corresponde “ao conjunto de acessos sociais,
que compreende o relacionamento e a rede de contatos” (BOURDIEU apud
THIRY-CHERQUES, 2006, p.39). Para Bourdieu, seria um “capital de relações mundanas (fonte de
apoios úteis) de honradez e respeitabilidade, muitas vezes, indispensável para atrair ou
assegurar a confiança da boa sociedade” em sua visão de capital (econômico, cultural ou
social), sempre atrelado à classe dominante, que deteria poder sob tais capitais por ocupar
altas posições na sociedade. (BOURDIEU, 1998,p. 324).
Capital social também pode ser definido como “investimento em relações sociais com
retornos esperados no mercado (...) Indivíduos se envolvem em interações e redes14 para
produzir lucros” (LIN, 2001, p.20). Lin destaca 4 explicações para o investimento no capital
social, a partir das interações entre indivíduos, especialmente aqueles que ocupam uma
posição estratégica ou hierárquica em determinado contexto ou organização:
O fluxo de informações entre indivíduos ou organizações pode ser facilitado;
Laços sociais podem exercer influência em atores que possuem um papel crítico na
tomada de decisão;
Um indivíduo traz suas “credenciais sociais” - algumas refletidas através de seu acesso pessoal a recursos, por meio de suas redes ou relações sociais - a uma organização ou
atores, que entende que este indivíduo pode fornecer recursos adicionais e úteis à
organização; e
Relações sociais devem reforçar identidade e reconhecimento, seja como indivíduo ou membro de determinado grupo social que compartilha interesses e recursos
semelhantes.
14