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Perspectiva da seletividade do IPTU em razão da função socioambiental

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Academic year: 2017

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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

ALESSANDRO CAVALCANTE SPILBORGHS

PERSPECTIVA DA SELETIVIDADE DO IPTU EM RAZÃO DA FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL

(2)

Alessandro Cavalcante Spilborghs

PERSPECTIVA DA SELETIVIDADE DO IPTU EM RAZÃO DA FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Direito Político e Econômico da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Direito

Orientador: Prof. Dr. Alcides Jorge Costa

(3)

S756p Spilborghs, Alessandro Cavalcante

Perspectiva da seletividade do IPTU em razão da função socioambiental. / Alessandro Cavalcante Spilborghs. São Paulo, 2012.

69 f.; 30 cm

Dissertação (Mestrado em Direito Político e Econômico)

Coordenadoria de Pós-graduação, Universidade Presbiteriana Mackenzie, 2012.

Orientador: Alcides Jorge Costa Bibliografia: f. 66-69.

1. IPTU. 2. Extrafiscal. 3. Socioambiental. 4. Função social. 5. Capacidade contributiva. 6. Federação. I. Autor. II. Título.

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ALESSANDRO CAVALCANTE SPILBORGHS

PERSPECTIVA DA SELETIVIDADE DO IPTU EM RAZÃO DA FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Direito Político e Econômico da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Direito

Aprovado em

BANCA EXAMINADORA:

___________________________________________________________________ Prof. Dr. Alcides Jorge Costa

___________________________________________________________________ Prof. Dra. Zélia Luiza Pierdoná

(5)

RESUMO

O trabalho tem por escopo demonstrar que o atual texto constitucional já oferece ferramentas suficientes para que o IPTU seja também utilizado como via extrafiscal em razão da função socioambiental.

Primeiro porque o imposto já traz em sua estrutura características para a alteração de sua alíquota, seja atentando-se à função social da propriedade, seja por conta do uso ou da localização. Neste sentido, tal possibilidade é sobremodo importante, pois, no máximo, são necessárias reformas legais na esfera municipal, afastando qualquer alteração no patamar da Carta Magna. A aplicação desta extrafiscalidade da exação seria, portanto, factível e imediata, iniciando um processo de reforma com vista à proteção ao meio ambiente em larga escala, a qual, se coordenada entre os entes federados naturalmente repercutiria numa abrangente rede de preservação, demonstrando um importante artifício do Poder Público em aliar a cobrança tributária a um meio ambiente ecologicamente equilibrado.

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ABSTRACT

The scope of the work is to demonstrate that the current constitutional text already

provides sufficient tools for the “Imposto Predial e
Territorial Urbano” (Urban

Property and Land Tax) to also be used in an extra tax purposes due to its social-environmental role.

In the first place, because the tax already brings within its own structure characteristics that enable to change its rate, be it for attending a social function of property, either on account of the use or location. In this sense, this possibility is particularly important because, at most, these legal reforms are needed at the municipal level, ruling out any change on the Constitution. The application of this extra taxation is therefore feasible and immediate, which starts a reform process aimed at protecting the environment on a large scale. If coordinated among the members of the federation, this would naturally resonate in a comprehensive network of preservation, demonstrating an important artifice of the government for combining tax collection and an ecologically balanced environment.

(7)

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 6

2 PRINCÍPIOS CORRELACIONADOS ... 10

2.2 A EXTRAFISCALIDADE ATRAVÉS DAS NORMAS INDUTORAS ... 16

2.3 NORMAS TRIBUTÁRIAS INDUTORAS E MEIO AMBIENTE ... 21

2.4 NORMAS TRIBUTÁRIAS INDUTORAS E A IGUALDADE ... 25

2.5 IGUALDADE E CAPACIDADE CONTRIBUTIVA ... 28

2.6 SELETIVIDADE ... 35

3 GUARIDA DA PROPRIEDADE PRIVADA NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ... 37

3.1 FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE E DIREITO DE PROPRIEDADE COMO DIREITO FUNDAMENTAL ... 37

3.2 TRIBUTAÇÃO COM BASE NA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE ... 41

3.3 FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE E MEIO AMBIENTE ... 44

4 A QUESTÃO DO FEDERALISMO ... 48

4.1 REFORMA CONSTITUCIONAL E REFORMA LEGAL ... 48

4.2 COORDENAÇÃO ENTRE OS ENTES ... 52

4.3 POR QUE O IPTU? ... 60

5 FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE, DESENVOLVIMENTO E FEDERALISMO. CONCLUSÕES ... 63

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1 INTRODUÇÃO

A Constituição da República Federativa do Brasil em seu artigo inicial aponta como fundamentos do Estado Democrático de Direito: a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, bem como o pluralismo político.

Quando em destaque a dignidade da pessoa humana não há como negar que tal fundamento envolve, necessariamente, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, haja vista tratar-se de atributo essencial a uma qualidade de vida sadia não só às presentes gerações, bem como às futuras (conforme delineamentos do art. 225 da Constituição Federal).

Nesse sentido o Poder Público tem obrigação de garantir o bem de todos (como um de seus objetivos fundamentais), inclusive promovendo medidas e políticas que visem assegurar a eficácia do direito a um adequado e saudável meio ambiente, tais como: preservar e restaurar processos ecológicos essenciais, reservar espaços territoriais assegurando o ecossistema, proteger a fauna e flora, entre outras igualmente importantes.

Todavia, ainda que possa parecer que o direito ao meio ambiente seja correlato apenas à dignidade da pessoa, para importante parte da doutrina1o raciocínio é incipiente, a ponto de indicar a relação do meio ambiente com todos os princípios fundamentais da República Federativa brasileira (soberania; cidadania; os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, alcançando até o pluralismo político e, claro, a dignidade da pessoa humana).

Sem dúvida o direito ao meio ambiente deve restar equacionado aos fundamentos constitucionais, os quais, por sua vez, norteiam as funções do Estado, especialmente quando se desenvolve um regime capitalista onde a atividade econômica possui relevo ainda maior. Primeiro porque é o setor econômico a pedra basilar do capitalismo e segundo porque, por se tratar de um sistema produtivo, a sociedade oscila de acordo com o movimento da economia.

1 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco; FERREIRA, Renata Marques. Direito ambiental tributário, São

(9)

Nesse sentido cumpre ao Estado angariar recursos da população que em seu território convive a fim de buscar os objetivos constitucionais (art. 3º da Carta Magna), de modo que os impostos se apresentam em seu papel principal.

Contudo, atualmente não há mais como se negar que os tributos, entre eles a figura marcante dos impostos, causa impacto não só sobre a coletividade que sofre com sua onerosidade, mas também a Ordem Econômica que se contorce conforme o peso tributário que sobre ela recai.

Tributos e a Ordem Econômica, não se trata da forma simplista de se concluir que a cobrança tributária é sempre prejudicial ao desenvolvimento do País. A Constituição Federal descreve inúmeras normas tributárias que aliadas à finalidade buscada pelo Estado, favorece ou desfavorece determinados comportamentos por parte do contribuinte, com reflexos claros na Economia.

Em se tratando de impostos e seus fins marcantemente arrecadatórios, estes não deixam sua natureza tributária de lado quando utilizados para fomentar outra postura do Estado, como por exemplo, estimular ou desestimular comportamentos vários. Um imposto não é definido pelo destino da sua arrecadação, logo, se o perfil da cobrança tende ao impactar mais na atitude do cidadão e na direção da atividade econômica que propriamente no abastecimento dos cofres públicos, este não deixará de ser imposto, porém deverá ser atentamente observado por outros critérios alheios ao fim arrecadatório, mas não o desprezando.

Diversos são os tributos com capacidade de auxiliar os entes federados no trabalho regulatório. São impostos sobre o patrimônio, sobre a produção e sobre a circulação. E isto há de ser observado nas diversas esferas de competência, da municipal à federal.

(10)

Em se tratando de automóveis, o IPVA hoje possui autorização constitucional para que suas alíquotas sejam alteradas de acordo com o tipo ou o uso do veículo. Características essas que oferecem ao governo estadual a possibilidade de incentivar a aquisição de veículos novos com baixa emissão de gases, mas também por outro lado pode tornar mais oneroso um veículo que não atenda a necessidade de diminuir o impacto sobre o efeito estufa.

Para o campo do consumo dois impostos tem aplicação marcante. O ICMS e o IPI, pois ambos funcionam sob a égide do princípio da seletividade, quando as alíquotas destes tributos são variadas em função da essencialidade do produto. Assim quanto mais essencial for o produto menor será sua alíquota e a recíproca é verdadeira.

Afora estes ainda percebemos a extrafiscalidade tributária no comércio exterior pelos impostos sobre a importação e exportação, bem como essa mesma característica no funcionamento da economia com relação a obtenção de crédito, fato que enseja o pagamento do imposto sobre operações financeiras.

Além destes impostos é possível pensar em outras espécies tributárias tais quais as contribuições, entre elas CIDE combustível, a contribuição de intervenção do domínio econômico que a própria Constituição Federal determinou sua extrafiscalidade e direcionou sua arrecadação para, por exemplo, o financiamento de projetos ambientais relacionados com a indústria do petróleo e do gás.

O que se observa nessas primeiras linhas é a conjunção das funções arrecadatória e regulatória das espécies tributárias, fundamentadas em critérios diferentes, porém ambas as funções no mesmo sentido: a construção de uma sociedade justa, livre e solidária.

Surge a necessidade latente de averiguar o comportamento das normas tributárias indutoras2haja vista os meios de intervenção do Estado sobre e nos diversos domínios econômicos (intervenção direta e indireta, portanto). Sua relação com a função social da propriedade diante das limitações ao poder de tributar tais como a capacidade contributiva e a vedação ao confisco.

2 SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas tributárias indutoras e intervenção econômica. Rio de Janeiro:

(11)

O corte deste estudo é feito sobre o IPTU, imposto de importante arrecadação e grande aliado do Município como ferramenta autorizada pelo texto constitucional e receber alíquotas variadas em virtude do uso e da localização do imóvel, bem como no cumprimento da função social da propriedade, vez que em qualquer das vias veremos a inegável associação com o meio ambiente equilibrado.

(12)

2 PRINCÍPIOS CORRELACIONADOS

2.1 A EXTRAFISCALIDADE TRIBUTÁRIA. PRIMEIROS APONTAMENTOS

Difícil dissociar a carga tributária do comportamento da sociedade. Tributar mais ou menos uma atividade ou uma situação traz consequências de rápida percepção quanto ao seu desenvolvimento. O Estado, muito antes que o contribuinte, tem esse conhecimento e sempre, de alguma forma, se valeu desse efeito colateral dos tributos em benefício de suas diretrizes com implicações na economia em geral3.

Temos daí a denominada extrafiscalidade quando a utilização de um tributo que prima por interferir nos mais variados setores sociais e econômicos, estimulando ou desestimulando comportamentos, situações e atividades.

Logo, apesar de sua eminente faceta arrecadatória, os tributos apresentam-se também com personalidade variável, modificações estas feitas a gosto (desde que observadas as limitações constitucionais) do ente competente através de sua legislatura. Essa extrafiscalidade é função também ordinária do tributo e portanto tão importante quanto a arrecadatória, senão por vezes até mais, pois conforme Alfredo Augusto Becker os tributos ainda que veículos arrecadatórios passam a atender interesses do Estado no meio social e na economia privada, lembrando o autor que a coexistência do finalismo extrafiscal com o custeio das despesas públicas tende cada dia mais a ser consciente, de modo que ao se observar o tributo perceberemos as duas vertentes4. Assim, não haverá uma função em detrimento da outra, mas o que se poderá observar é uma função prevalecendo sobre a outra e isso altera a análise da cobrança tributária.

3 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 66-6

7. “O

objetivo do tributo sempre foi o de carrear recursos financeiros para o Estado. No mundo moderno, todavia, o tributo é largamente utilizado com o objetivo de interferir na economia privada, estimulando atividades, setores econômicos ou regiões, desestimulando o consumo de certos bens e produzindo, finalmente, os efeitos mais diversos na economia. Aliás, registro s existem da utilização do tributo, desde a Antiguidade, com a finalidade de interferir nas atividades econômicas; mas os autores em geral apontam o uso do tributo com essa finalidade como um produto do moderno intervencionismo estatal. A esta função intervencionistas do tributo dá-se o nome de função extrafiscal”.

(13)

Essa mudança é vislumbrada através de interessante exemplo que foi lembrado por Luís Eduardo Schoueri5 quando no ano de 1994 um decreto alterou a alíquota do imposto de importação, tornando o tributo mais oneroso. Conforme posicionamento do Supremo Tribunal Federal a majoração alcançava inclusive os produtos que já se encontravam no País, porém que não tinham sido desembaraçados, pois o lançamento deveria se reportar à data da ocorrência do fato gerador, o qual, conforme regulamento aduaneiro apenas se daria com o registro da declaração de importação (art. 23 do Decreto Lei 37/66). Desta forma a alegação à violação ao princípio da irretroatividade foi afastada.

Contudo, se observado o perfil da norma e a intenção da União, o objetivo era controlar a entrada de certos produtos em território nacional, desestimulando a aquisição destes. Ora, se a pretensão da norma era desestimular a aquisição, esta não deveria abarcar aqueles contribuintes que já haviam promovido a importação, pois quanto a eles a intenção do legislador já não causaria nenhum efeito.

Acreditando na mesma dupla característica atual dos tributos, Hugo de Brito Machado, verificando a dificuldade de se observar um tributo puramente arrecadatório admite que o abastecimento dos cofres públicos seja a principal função, mas que isso não rechaça os contornos além arrecadação.6

A função marcantemente regulatória dos tributos é carreada inclusive da responsabilidade de retirar sobre as exações compulsórias o fardo de serem mal vistas pela coletividade, haja vista que o seu pagamento, com maior ou menor oneração, se mostrará inclinado ao interesse público, o que não significa interesse da Fazenda Pública.

Neste sentido, Pierre Beltrame, autor francês, já desnudava a grande valia de um tributo extrafiscal, haja vista que tal característica seria capaz de afastar a repulsa do contribuinte em relação aos tributos, de modo que seu pagamento repercutiria num fim efetivamente socio-economico visto sob um ângulo apropriado à população, quem sabe até mesmo sob o olhar do próprio contribuinte7.

5 SCHOUERI, Luís Eduardo. op. cit., p. 272.

6 MACHADO, Hugo de Brito. op. cit, p 67.

7 Apud SEBASTIÃO, Simone Martins. Tributo ambiental. Extrafiscalidade e função promocional do

(14)

Assim, a articulação de tributos com características extrafiscais a fim de atingir os objetivos apontados é realidade contemporânea e sua benesse pode ir além da mera característica regulatória, mas especialmente no plano da psicologia social. Tarefa essa que não depende simplesmente de normas dessa natureza, ao contrário, as normas extrafiscais seriam a finalização de uma mudança que envolve cada um dos entes federados.

Os valores arrecadados com a carga tributária devem primeiramente ser aplicados aos fins aos quais se destinam. É o mínimo, sem dúvida, mas de certo que não havendo desvio no emprego do dinheiro, o gasto público (o qual, em tese, justifica a arrecadação) trará muito maior eficiência à Administração.

E o princípio da eficiência assim deve ser tratado, como regra norteadora para a Administração Pública8. Observando-se o ordenamneto jurídico em vigor, estará a Administração no caminho da eficiência, contudo os fins não justificam os meios, pois ainda que uma norma seja flexibilizada para atingir um objetivo, continua o ente federado sujeito a disposições constitucionais acerca da Ordem Econômica (art. 170 da Constituição Federal).

Aliás,a citada flexibilização das normas atinentes à redução da carga tributária, correspondendo a incentivos fiscais, em vista de razões específicas, pode num primeiro momento parecer irresponsabilidade fiscal do governante, porém como explica Ives Gandra da Silva Martins9, o assunto deve ser sopesado, pois conforme

o jurista existem estímulos fiscais a ‘custo zero’ que são aqueles que permitem o

desenvolvimento dos entes federados, repercutindo em mais investimentos para a região em virtude da atração de mais agentes econômicos, geração de emprego, bem como todas as demais atividades relacionadas a um centro em franca situação de progresso.

8 FRANÇA, Vladimir Rocha da. Eficiência administrativa na Constituição Federal.

Revista Eletrônica sobre a Reforma do Estado (RERE), Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Público, número 10, junho/julho/agosto, 2007. Disponível em:<http//www.direitodoestado.com.br/rere.asp>. Acesso em 22 fev. 2011.

9 SCAFF, Fernando Facury; CONTI, José Maurício (coordenadores).

(15)

Os denominados incentivos não onerosos, segundo o autor, estariam, portanto, dispensados de atentar para as restrições da Lei de Responsabilidade Fiscal nos termos de seu artigo 1410. Temos por assim dizer mais uma vantagem na aplicação de normas com viés regulatório.

Por outra volta, inclusive também assinalado na citação acima, uma redução do tributo pode apenas num primeiro momento parecer uma diminuição da carga arrecadatória, contudo, justamente por fomentar uma finalidade, mais e mais contribuintes surgirão e invariavelmente haverá a multiplicação dos fatos geradores, o que, por fim, resultará num crescimento econômico acompanhado de inevitável incremento arrecadatório.

Sobremodo a extrafiscalidade tributária caminha em campo de horizonte amplo, porém não ilimitado. Campo de percursos vários, mas não de sentido único. Campo de caminhos que seguem paralelos num momento e noutro se entrecruzam. Assim é a extrafiscalidade, de notória aplicação aos tributos, desde que os parâmetros constitucionais sejam respeitados. E tais parâmetros (como os princípios) são fixados pela Constituição e esta, por sua vez é dinâmica11.

Eros Roberto Grau, lembrando seu Ensaio e discurso sobre a

interpretação/aplicação de direito que devemos interpretar não o texto constitucional normativo, mas cabe a interpretação do Direito. Não se interpreta um ou outro texto

10 Art. 14. A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra

renúncia de receita deverá estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a pelo menos uma das seguintes condições:

I - demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma do art. 12, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias;

II - estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado no caput, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

§ 1o A renúncia compreende anistia, remissão, subsídio, crédito presumido, concessão de isenção

em caráter não geral, alteração de alíquota ou modificação de base de cálculo que implique redução discriminada de tributos ou contribuições, e outros benefícios que correspondam a tratamento diferenciado.

§ 2o Se o ato de concessão ou ampliação do incentivo ou benefício de que trata o caput deste

artigo decorrer da condição contida no inciso II, o benefício só entrará em vigor quando implementadas as medidas referidas no mencionado inciso.

§ 3o O disposto neste artigo não se aplica:

I - às alterações das alíquotas dos impostos previstos nos incisos I, II, IV e V do art. 153 da

Constituição, na forma do seu § 1o;

II - ao cancelamento de débito cujo montante seja inferior ao dos respectivos custos de cobrança.

(16)

de forma isolada, mas a Constituição Federal como um todo. O Direito, dessa maneira, é trabalhado conforme políticas públicas, as quais devem perseguir os objetivos constitucionais.A interpretação e aplicação do Direito consubstancia-se em

“processo de contínua adaptação de suas normas à realidade e seus conflitos”. O

sentido dos princípios constitucionais sofre variações no tempo e no espaço12.

Cumpre, nesse instante, discriminar princípios e regras para a fluidez do presente trabalho. Um dos critérios que distingue princípios das regras é o grau de importância. Princípios tem importância maior que as regras. Sua amplitude supera imensuravelmente a de uma regra. Os princípios pesam mais que as regras. Assim, podemos nos deparar com vários princípios em virtude da mesma situação, de modo que todos eles deverão ser observados. Ainda que naquela circustância peculiar um princípio pese mais que outro, ambos serão atendidos, mesmo que um em maior dimensão que o outro. Diferentemente ocorre com as regras, vez que se duas aparentam aplicabilidade à particular hipótese, apenas uma delas será aplicada13.

Nesse sentido essa aparente liberdade dos princípios não significa afastá-los do caso concreto. Exemplo factível há na tributação quanto ao princípio da segurança jurídica. Há defensores da tipicidade cerrada no Direito Tributário, alerta Luís Eduardo Schoueri14, entre outras razões justamente em obediência da segurança jurídica. No entanto, é comum a utilização de claúsulas gerais e conceitos indeterminados (porém não indetermináveis).

Essa generalidade e a indeterminação, por vezes empregada pela Constituição Federal, não vem de encontro com a segurança jurídica, pois não se está a permitir que a tributação ocorra por outro veículo que não a lei. Por mais elástica que seja uma cláusula geral e um conceito indeterminável o tributo deve ser regulado por lei, permanecendo a cobrança sob o manto da segurança jurídica. Por outro lado, a citada flexibilidade da claúsula ou conceito é importante para moldar a lei ao mundo fenomênico e isso não afeta, muito menos afasta a obediência às normas constitucionais, muito pelo contrário, a possibilidade de molduramento decorre da Lei Maior.

12 GRAU, Eros Roberto. op. cit., p. 164-166.

13 Ibid., p. 162.

(17)

Por outro entrecho o papel do legislador, com a afirmação acima, não fica restrito à simples conferência de limitações ou competências. Seu papel não fica diminuído ao cumprimento das claúsulas gerais e conceitos indeterminados15, tal qual um preenchimento de formulário. Seu papel é atentar-se às normas constitucionais e estabelecer regras que, aplicadas, caminhem em direção ao descrito pelo constituinte.

Inúmeros são os exemplos desses conceitos e cláusulas, como o papel da lei complementar em estabelecer adequado tratamento tributário ao ato cooperativo (146, III, c, CF) ou mesmo quando cabe à lei complementar a definição de tratamento diferenciado e favorecido às micro empresas e empresas de pequeno

porte (art. 146, III, d, CF). O que seria tratamento “adequado” ou “diferenciado e favorecido”? A instituição de empréstimo compulsório em razão de investimento público de caráter urgente e relevante interesse nacional (art. 148, II, CF). A caracterização da urgência e relevância implica em muitas interpretações. Na instituição de impostos federais qual seria a indicação de proriedade rural (art. 153, VI, CF)? A finalidade do imóvel ou sua destinação? E o imposto sobre operações financeiras que segundo a Carta Magna poderá ser cobrado sobre títulos os valores mobiliários (art. 153, V, CF). Que “valores” são esses? Para os impostos estaduais a discussão é grande quanto o verdadeiro significado de “operações relativas” à

circulação de mercadorias (art. 155, II, CF).E especialmente, alvo deste trabalho, quais as fronteiras da utilização do IPTU como instrumento tributário que se apresenta para estimular o adequado aproveitamento do imóvel (art. 182, § 4º, II, CF). Quais os limites do imposto nesse sentido e o que se deve compreender por adequado aproveitamento?

Vejamos que não questionamos se há ou não mitigação da legalidade (até porque quando o constituinte pensou em suavizar o princípio o fez expressamente como para os impostos de importação, exportação, entre outros – art. 153, § 1º, CF) através dos exemplos arrolados.

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Mitigação também não há nem mesmo na legalidade da Administração, mesmo diante de normas indutoras16. Corresponde ao conceito de tributo indicado pelo Código Tributário Nacional e seu 3º artigo uma prestação pecuniária compulsória instituída em lei cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada que não constitua sanção a ato ilícito.A vinculação a que se refere o dispositivo diz respeito à lei, conduzindo a autoridade administrativa a cobrar o tributo conforme os termos, nas condições e quando a lei assim autorizar. Livrando, desta feita, o lançamento tributário de discricionariedade, ainda que diante dos conceitos indeterminados e cláusulas gerais. Logo, diferencia-se discricionariedade dos conceitos indeterminados, pois a primeira permite a adoção dos critérios de conveniência e oportunidade, enquanto para o segundo, o ordenamento flexibiliza à

Administração uma “reconstrução, no seu significado jurídico exato, adaptado ao caso”17.

2.2 A EXTRAFISCALIDADE ATRAVÉS DAS NORMAS INDUTORAS

A extrafiscalidade e a fiscalidade dos tributos são modalidadaes de uma forma de classificação que leva em consideração a função do tributo. No entanto, já alertamos anteriormente que essas funções fiscais e extrafiscais de uma exação já não se separam. Não é possível discriminar um tributo fiscal de um extrafiscal. A função regulatória e arrecadatória do tributo se mostram sempre presentes.

Um imposto tem por objetivo abastecer os cofres públicos. Como dizer, por exemplo, que o imposto sobre produtos industrializados, historicamente enquadrado no grupo dos tributos extrafiscais, não arrecada recursos mesmo com o emprego da seletividade em função da essencialidade do produto. Ora, mesmo que sua alíquota seja mínima, porque o produto fabricado é de primeira necessidade, em virtude do alto consumo do bem certamente a arrecadação será alta também. Função arrecadatória e regulatória caminhando lado a lado.

16 SCHOUERI, Luís Eduardo. op. cit., p. 257-259.

17 SATTA, Filippo apud SCHOUERI, Luís Eduardo.

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Por outra volta como dizer que o imposto sobre serviços é tributo tipicamente fiscal, se a sua incidência promove impacto regular na atividade econômica, quando empresas buscam o Município com tributação menos elevada para se fixarem, ensejando em verdadeiro êxodo de grandes centros metropolitanos para outras cidades que oferecem estrutura aproximada, porém com carga tributária inferior? Arrecadatório por certo, mas regulatório também.

Por esse entrecho, não é o melhor caminho classificar uma norma tributária por sua finalidade, pois as duas finalidades se fazem presentes de modo inquestionável, porém a observação que se faz é verificar o efeito extrafiscal da norma18.

Ao se estudar o efeito da norma tributária, insta estudar o método aplicado. Qual era o caminho buscado pelo legislador quando disciplinou a norma da essencialidade do produto, o imposto progressivo em razão da função social da propriedade, a variação de alíquotas conforme o tipo e o uso do veículo.

Método (meta = através de, odos = caminho) visa observar o caminho traçado para se alcançar um objetivo19. Qual objetivo da norma tributária? Arrecadatória ou regulatória? Ambos. Um provavelmente com destaque maior que o outro, mas ainda assim, ambos.

Conforme Othon M. Garcia existem dois métodos de raciocínio em busca da verdade, a indução (partindo do particular para o geral) e a dedução (partindo do geral para o particular)20. Por este último partimos da norma (geral) para alcançar o particular (especificação), quando então devemos considerar premissas para alcançar uma conclusão. Portanto o caminho é da causa para o efeito, trata-se do emprego do silogismo: Todo tributo depende de lei. IPTU tem natureza tributária. Logo o IPTU depende de lei.

Na indução temos o sentido inverso: do efeito para a causa. Aqui o início não é a norma, mas o efeito. A observação recai sobre os fatos, a análise é feita sobre os fatos (dado específico) para então se generalizar. E generalização é regra, generalização serve a todos, portanto, alcançamos a natureza da norma.

18 SCHOUERI, Luís Eduardo. op. cit., p. 29.

19 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário Aurélio da língua portuguesa. Curitiba:

Positivo, 2009, p. 1322.

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A extrafiscalidade encontra-se em maior ou menor grau nas normas tributárias, conduzindo o contribuinte a uma ação ou omissão, estimulando ou desestimulando. Estudamos então uma norma específica para se observar sua causa. O comportamento do contribuinte é o resultado, é o efeito. Esse efeito é perseguido pelo legislador, pois deve ser a regra. Portanto, o efeito da norma tributária, carreando o contribuinte de pagamento mais elevado ou mais brando terá uma causa. A causa será a norma, a causa será aquilo buscado pelo legislador.

Esse raciocínio se aproxima, portanto, da teoria das causas. Em se tratando de impostos (afinal o trabalho tem por alvo o IPTU), justifica-se sua cobrança em vista de custear despesas gerais, contudo na extrafiscalidade o motivo de sua arrecadação seria outro (em vez da justificativa arrecadatória para o Estado a justificativa intervencionista sobre o Domínio Econômico), logo o estudo deve calcar sobre a razão da norma e não sobre a razão do imposto21. Tanto para a primeira justificativa, bem como para a segundo é o objetivo fundamental da construção de uma sociedade livre, justa e solidária que está sendo perseguida, não havendo, assim, nenhum tipo de incompatibilidade.

Desta feita, a causa não é a norma específica. A causa é a norma constitucional com a roupagem de princípio. A causa da norma tributária indutora são os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil. Por isso tão importante quanto estudar o efeito indutor das normas tributárias é estudar os parâmetros que devem circundar a indução. O interesse público é o que se busca, flexibilizando-se a generalidade da norma dentro dos princípios constitucionais.

O primeiro ponto que deve ser observado e questionado é o que se entende por supremacia do interesse público? Estaríamos diante de um querer do Estado acima do individual? Interesse público em detrimento dos direitos individuais? Apenas algumas perguntas, as quais almejamos responder através das normas tributárias indutoras.

As questões são muito comuns de serem feitas em vista dos intermináveis apontamentos que são feitos ao princípio da supremacia do interesse público.De certo que objetivamente o interesse público não corresponde ao interesse estatal,

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portanto interesse público não é equivalente ao interesse da Administração Pública, muito menos da Administração Fazendária. Do mesmo modo, interesse público não deve se sobrepor aos interesses individuais livremente, independente de restrições, apenas fundado em sua supremacia.

Os direitos fundamentais funcionam como o limite natural da supremacia do interesse público, pois não se justifica o atropelamento dos direitos individuais desde que atendido o interesse da sociedade. O interesse público não retira o individual. O interesse público não dispensa o individual. O interesse público não afasta o individual. O interesse público se sobrepõe ao individual guardada razoabilidade

para “compatibilizar e ajustar o conteúdo e a extensão desta supremacia”.22

Equivocado seria afirmar também que interesse público representa o resultado da somatória dos interesses individuais, pois a possibilidade de um cidadão pensar em seus próprios interesses independente daquele almejado pela sociedade é bastante latente.

Contudo, apesar desses alertas, por muitas vezes o interesse público é confundido e ganha ares diferentes daqueles que verdadeiramente deveria ter. Lúcia Valle Figueiredo chega a lamentar, recordando que o interesse público consiste em conceito, dentre outros, que costuma ser tratado como se não tivesse conteúdo, como se pudesse ser alimentado a bel prazer do intérprete da lei.23

Diante da constatação, ainda mais sentido faz exigir que decisões judiciais ou administrativas que envolvam o interesse público sejam cercadas de inúmeros fundamentos, o mais específicos possível, justamente para demonstrar a proporcionalidade em razão da necessidade que se afigurou.24

Exemplificando o discurso, o Superior Tribunal de Justiça já se precaveu em suas manifestações acerca da impossibilidade de a supremacia do interesse público tomar dimensão inatingível, a ponto, até mesmo de se sobrepor aos direitos fundamentais.

22 JUCÁ, Francisco Pedro; TANAKA, Sônia Yuriko Kanashiro (coordenadora) e outros.

Direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 75.

23 FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 67.

24 MACHADO, Raquel Cavalcanti Ramos. Interesse público e direitos do contribuinte. São Paulo:

(22)

Na ementa da decisão proferida em sede do AgRg no Ag 445.996 / PR – D 20.06.2005 tem-se o seguinte entrecho:

O sigilo bancário, como não se configura em direito ilimitado ou absoluto, pode ser quebrado em nome do interesse público ou do interesse social e para a regular administração da justiça. Não há perder de perspectiva, no entanto, que o interesse que protege a pessoa está expressamente elencado entre as garantias individuais,de sorte que o interesse público, social e o da distribuição de justiça, para justificar o sacrifício daquele, deverá emergir estreme de dúvida (cf. "O processo e a quebra do sigilo bancário". Artigo da autoria deste Magistrado publicado no Informativo da Biblioteca Ministro Oscar Saraiva, v. 13, n. 1, p. 27-56, jan/jun 2001)25.

Na mesma esteira do raciocínio acima há a tese de que incentivos fiscais fundamentar-se-iam apenas quando buscassem o Bem Comum. Levando-se em consideração incentivos fiscais como exemplos de normas extrafiscais, o que seria o Bem Comum?

A pergunta é feita e também respondida por Klaus Tipke, fazendo referência especialmente a autores e juristas alemães,26afirmando que um incentivo fiscal concedido não se justifica se atender apenas indiretamente o Bem Comum (“o que é bom para a Volkswagen é bom para a Alemanha”; “What is good for General Motors, is good for the United States”), pois facilmente restaria aqui um meio de agraciar um determinado setor econômico ou grupo social, sem que a coletividade como um todo fosse beneficiada. O alcance deve ser amplo, a vantajem deve resvalar em toda a sociedade ainda que para uns seja maior que para outros.

E ainda pondera o autor que “normas dirigistas têm a desvantagem de ser difícil, no

momento de sua introdução, julgar com segurança sua eficácia para a finalidade

aspirada”, tendo por premissa que “todo incentivo fiscal ou subvenção tem de ser eficaz e imprescindível, para cumprir o fim dirigista por eles perseguido”, lembrando

ainda que tais modulações nos tributos, por exemplo, a supressão de incentivos têm reflexos também no plano político, na medida em que os até então beneficiados certamente protestariam diante da perda.

25 Acórdão citado e comentado por MACHADO, Raquel Cavalcanti Ramos.

Interesse público e direitos do contribuinte. São Paulo: Dialética, 2007, p. 89-90.

26 TIPKE, Klaus; YAMASHITA, Douglas. Justiça fiscal e princípio da capacidade contributiva. São

(23)

Queremos tratar aqui, porém, a extrafiscalidade que pode se apresentar como gênero, mas também figurar como espécie27. Gênero na medida em que abarca todas as formas e casos que não buscam a solidariedade da arrecadação, através da distribuição da renda, nem mesmo a simplificação do sistema tributário.

Já a extrafiscalidade mostrar-se-á como espécie na medida da atuação das normas tributárias indutoras, quando mesmo que estabelecendo tributação que abastecerá os cofres públicos, oferecem ao contribuinte a condição de pagar mais ou menos conforme sua postura diante de critérios variados, como a função social da propriedade, a essencialidade do produto, a função socio-ambiental, o uso e a localização do imóvel, entre outros28. Restará preservado ao contribuinte sua liberdade de ser mais ou menos tributado, não se confundindo a situação com sanção, pois se assim o fosse perderia a lógica a norma que permite a ação, mas depois aplica um tributo-castigo.

As normas tributárias indutoras, as quais trazem como efeito o comportamento da sociedade encontram-se no campo extrafiscalidade, mas são espécie desta, na qualidade indução.

2.3 NORMAS TRIBUTÁRIAS INDUTORAS E MEIO AMBIENTE

O capitalismo é o regime econômico hoje vigente em grande parte do planeta e os países são obrigados a conviver, especialmente por força da globalização com as consequências, queiram ou não, decorrentes da voracidade e competitividade do mercado.Trata-se de uma constatação fática em que podemos afirmar que os Estados de grande poder econômico não só dirigem esse capitalismo moderno como chegam até mesmo a modelá-lo, ou talvez melhor fosse dizer modulá-lo.

Países eminentemente consumidores pagam o preço não só dos bens e serviços que adquirem, bem como o preço do processo de industrialização envolvido. Dentre o montante do preço (ou dentre as consequências) temos a geração de poluição de diversas espécies, as quais, contudo apenas percebidas de imediato na esfera local

27 SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas, op. cit., p. 32.

(24)

acabam em pouco tempo se socializando (afinal vivemos a globalização). E, segundo, o processo de industrialização necessitou de uso, muitas vezes indiscriminado, de recursos naturais (cada vez mais escassos) e recursos pessoais, como a mão de obra necessária para compor um polo industrial. Milhares se deslocam para áreas onde o emprego é oferecido e, daí, sem que a cidade absorva o aumento populacional na região, áreas múltiplas passam a ser ocupadas de modo, invariavelmente desordenado.

Em nosso País a preocupação não vem de agora e continua crescente. Desenvolvimento econômico deve vir acompanhado de desenvolvimento social e desenvolvimento local, para começar a partir de um ponto básico, qual seja, a capacidade de um Município comportar tais crescimentos, inclusive crescimento do consumo de recursos naturais, do nível populacional e da ocupação desenfreada de áreas até então não habitadas. O que nosso País pode fazer para se salvaguardar de todas essas intempéries relacionadas? Quais são suas armas e seus escudos de defesa diante do capitalismo e do inafastável impacto ambiental?

O Sistema Tributário Nacional funciona ao mesmo tempo como meio de ataque e de defesa. Discorreremos então sobre como a tributação pode ser desenvolvida em seus aspectos gerais alinhavando capitalismo e meio ambiente e jamais contrapondo um ao outro. Não se trata aqui de atacar o capitalismo e defender o meio ambiente, ou de se defender do capitalismo como se fosse um mal necessário.

Ataque e defesa do Estado cumprindo seu papel político, atendendo os objetivos fundamentais traçados pela Constituição Federal, bem como fazendo prevalecer e assegurando sua soberania no plano internacional.

Sob um primeiro aspecto o capitalismo depende da tributação e a recíproca também está correta, pois a tributação depende do capitalismo. O poder coercitivo do Estado trabalha como um sistema por vezes propulsor do consumo e da produção e noutra via como freio motor.

(25)

E como seria alcançada essa receita se não houvesse o capitalismo para produzir, e ainda mais importante, circular a riqueza dentro do território local, regional e nacional, verificando-se assim papel destacado para todas as esferas de competência tributante (seja ela municipal, estadual ou federal).

Já, por outro trilho, parte da arrecadação será utilizada para promover o bem de todos, situação em que temos, por exemplo, a proteção ao meio ambiente.

Ocorre que um processo produtivo consome recursos da natureza. O primeiro elemento (processo produtivo) não dá sinais de diminuir o ritmo, já o segundo (recursos naturais) se mostra limitado e, portanto, escasso.

Neste sentido o empreendedor precisa competir em igualdade de condições no mercado globalizado, por outro lado o Estado precisa cumprir com seu papel de proteção à sociedade, garantindo à presente e às futuras gerações um meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Seguindo esse raciocínio o Estado solicita ao empresário investimento em tecnologia para que a utilização dos recursos naturais sejam otimizados e mesmo com menor captação o processo produtivo possa ser potencializado.No entanto, alegando a empresa o princípio da livre concorrência, receará realizar o investimento necessário a menos que lhe seja garantida sua posição no plano de mercado.Neste ponto, para compelir o agente econômico a realizar o investimento sugerido, o Estado dispõe de uma prestação pecuniária compulsória (logo, o tributo) a qual, por uma vertente, dirige ao cumprimento das funções buscadas pelo Estado, e por outra vertente, merece ser mitigada a partir do momento que os investimentos limpos forem realizados (daí a liberdade oferecida pela extrafiscalidade).

A função mais conhecida do tributo é a arrecadatória e quando se pensa na espécie dos impostos tal função mostra-se ainda mais latente, porém chega a causar repulsa na população, pois a arrecadação não terá um fim específico, dificultando, aos olhos do leigo, enxergar a importância do pagamento.

(26)

um tributo). Por essa função o Estado pode oferecer ao contribuinte compensação tributária ou simplesmente sugerir alíquotas mais baixas para aquele tipo de comportamento que pretende incentivar.

A relação entre o meio ambiente, economia e tributação é inegável, porém percebemos que se trata de um trinômio muito mais íntimo do que inicialmente se apresentava. A relação é íntima e sadia, pois se um produto foi taxado com menor grau de onerosidade porque resultado de um processo de industrialização com preocupações socioambientais, portanto um produto estimulado com um “tributo verde” (nomenclatura pessoalmente escolhida para tributos incidentes sobre produtos ou processos produtivos limpos) tende, ao contrário do que parece, ser um produto com preço mais acessível.

Esse é o ponto. Um produto ou um processo de produção ecologicamente corretos provavelmente receberam investimentos mais intensos, seja através da aquisição de novas tecnologias, seja pela adaptação da empresa às novas (porém sempre presentes) necessidades.

Tais atitudes devem ser recompensadas pelo Estado, pois ainda que arrecade em valores líquidos um valor mais modesto, por outro turno dispensará menos recursos para sanar as enfermidades ambientais, mesmo porque elas se apresentarão em número reduzido. Os montantes, no final das contas, serão maiores. E não porque se arrecadou mais, porém porque se gastou menos.

Porém, há um alerta de Höfling29 quando se depara com a situação em que empresas de maior poderio econômico tornam-se ainda mais fortes, em virtude da norma indutora. Explica-se: adequar o processo produtivo às novas exigências fixadas pelo Estado implica em grande investimento. Com a adaptação, a carga tributária é reduzida, refletindo para quem se adequou em retorno financeiro com o passar dos anos.

Para aquelas empresas que não possuem capacidade econômica para atender as exigências ambientais rapidamente, mas que continuam com a atividade produtiva, mantem também a carga tributária mais elevada. Ao longo do tempo a empresa que de pronto realizou os investimentos necessários passará a recolher um tributo mais

(27)

brando se comparado àquela que não o fez inicialmente. No caso a empresa de porte mais singelo deixou de promover o investimento não porque era sua faculdade, mas por falta de recursos financeiros, por tanto, por falta de opção. O decurso do tempo mostrará que aquele que primeiro se adaptou, aquele que já tinha posição de destaque no setor, tornar-se-á ainda mais forte, provocando efeitos indesejados ao princípio da livre concorrência. Correções se fazem necessárias (para Gawel seria uma correção na alocação – Allokationskorrektur) 30 e a Administração Pública deverá atuar de maneira insofismável, quando as normas

indutoras repercutirão numa mudança comportamental importantíssima

especialmente quando do emprego de bens ambientais.

2.4 NORMAS TRIBUTÁRIAS INDUTORAS E A IGUALDADE

Foi visto que o interesse público deverá prevalecer sobre o individual na medida em que as garantias individuais mantenham-se preservadas. Contudo, justamente porque o fim público deve prosperar, de certa forma haverá agravos à isonomia31 entre os individuais, porém, repisa-se, tal agravo deverá ser proporcional ao fim ao qual ele se destina.

Corroborando o raciocínio, em breve trabalho sobre a Justiça, Prudência e Condição Humana, Márcia Cristina de Souza Alvim, baseada em Aristóteles, ensina:“O homem

pode errar de muitas maneiras, mas para acertar é apenas de uma forma, o meio

termo”32.

Assim, o termo indicado não é mais para um ou menos para outro, não é para ninguém e, portanto, é para todos, ratificando o interesse público.

Ora, se construir uma sociedade livre, justa e solídária é objetivo fundamental da República Federativa do Brasil, também o é o desenvolvimento nacional. Daí surge uma parceria praticamente indissociável, vez que se apresenta a colocação das

30 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 346.

31 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Conteúdo jurídico do princípio da Igualdade. São Paulo:

Malheiros, 2006, p. 25.

32 GONZAGA, Alvaro de Azevedo; GONÇALVES, Antonio Baptista. (Re)Pensando o direito. Estudos

(28)

premissas na seguinte equação: a igualdade vem em acordo com a supremacia do interesse público e o interesse público tem-se por atingido também quando do tratamento igualitário.

Essa soma de valores, esse caminho de mão dupla entre interesse público e igualdade implica em consequências que são da mesma maneira benéficas ao cidadão indivíduo e ao cidadão coletivo, pois logram o desenvolvimento local, que de forma coordenada levam ao desenvolvimento regional, com vistas ao desenvolvimento nacional.

Desenvolvemos em tópico anterior sobre a extrafiscalidade quando destacamos a necessidade de sua aplicação importar em liberdade para o contribiunte, pois a oneração tributária restará para aqueles que, apesar da indução da norma, não voltar sua postura para o direcionamento querido pelo legislador especialmente quanto ao crescimento e desenvolvimento econômico. Para Lafayette Josué Petter33 o desenvolvimento buscado deve considerar justamente as “liberdades substanciais existentes”, pois se o indivíduo é livre assim o é não porque não existam limitações, mas em razão das possibilidades que lhe são proporcionadas, aproximando-se essa organização do modelo do Estado Democrático de Direito.

Na igualdade, a aplicação de parâmetros é irrefutável, pois apenas se mede um igual diante de uma referência, mediante um critério. Essas medidas a rigor são os princípios34. Algumas dessas medidas já se encontram no texto constitucional, outras o legislador deverá eleger. Para as primeiras temos, por exemplo, a capacidade contributiva (art. 145, § 1º, CF); a progressividade em razão da função social da propriedade (art. 182, § 4º, II, CF) ou mesmo o uso e a localização do imóvel (art. 156, § 1º, II, CF).

Aliadas a essas medidas35 outras regras também devem ser observadas36:

a) O critério utilizado não se pode resumir à identificação de um único indivíduo;

33 PETTER, Lafayette Josué.

Princípios constitucionais da ordem econômica. O significado e o alcance do art. 170 da Constituição Federal. São Paulo: RT, 2008, pp. 78-79.

34 SCHOUERI, Luís Eduardo. op. cit, p. 274-275.

35 Ibid. p. 276.

36 MELLO, Celso Antônio Bandeira. Conteúdo jurídico do princípio da igualdade. São Paulo:

(29)

b) O mesmo critério seja utilizado para pessoas ou situações alvo da comparação e em razão desse critério possa verificar a discriminação;

c) Deve existir correlação lógica entre os critérios para diferenciação e o regime jurídico diferenciador; e

d) Para o caso concreto os parâmetros utilizados mantenham guarida no texto da Carta Magna.

Trazendo a lume mais uma vez as lições de Luís Eduardo Schoueri, ao se entrelaçar o princípio da igualdade com as normas tributárias indutoras, um de três posicionamentos pode ser adotado:37

a) Afastar toda e equalquer norma tributária indutora em razão da colisão com a igualdade;

b) Aceitar as normas tributárias indutoras para o princípio da igualdade, porém, neste caso, afastando o princípio da capacidade contributiva; ou

c) Alinhavar igualdade e capacidade contributiva, como corolários que são, compatibilizando-os com a norma tributária indutora.

Haja vista os posicionamentos apresentados, também aqui neste trabalho adotaremos a terceira corrente, exatamente como conduzido no desenvolvimento da obra do citado autor38. Por essa via, então, cabem apontamentos sobre a igualdade e a capacidade contributiva, correlacionando os princípios.

37 SCHOUERI, Luís Eduardo. op. cit, p. 277.

(30)

2.5 IGUALDADE E CAPACIDADE CONTRIBUTIVA

Após a 2ª Guerra Mundial, especialmente na Itália e na Espanha passou a ser desenvolvido um conceito de proteção aos direitos fundamentais fortalecendo a jurisdição constitucional, criando inclusive técnicas de proteção contra o próprio legislador. Adveio então o neoconstitucionalismo, tornando-se comum a aplicação do princípio da proporcionalidade39.

É bem verdade que no Brasil mesmo após o advento da Constituição Federal de 1988, o conceito ainda não se encontrava plenamente desenvolvido, porém, já se

observava o que se denominou de “o constitucionalismo brasileiro da efetividade”.

Nesse ponto a Constituição passou a incidência direta sobre a realidade social, tornando despicienda a ação legislativa para o alcance da justiça e da igualdade. Embora ainda não se tratasse daquele neoconstitucionalismo europeu, este foi o primeiro passo para tanto.

Um ponto de grande relevo que veio a se destacar com o novo conceito foi a utilização reiterada de teorias de argumentação, exigindo muito mais dos intérpretes da lei, do que propriamente a lei em si. Aliás, a abundância positivista passou a ser observada quase que com demérito, em vista de sua carga muito mais burocrática que paradigmática. Entre os princípios mais utilizados, destacaram-se a da dignidade da pessoa humana e o da razoabilidade40.

Diversas são as acepções de razoabilidade e proporcionalidade, porém o objetivo deste trabalho não é definir exatamente o melhor conceito para tanto, porém cabe aqui apenas lembrar essa diversidade. Segundo Lúcia Valle Figueiredo a razoabilidade corresponde à congruência lógica entre o fato e atuação estatal. A razoabilidade deve corresponder ao liame lógico entre a atuação concreta da Administração e o motivo que a levou a agir. E paralelo à razoabilidade, mas sem com ela se confundir a proporcionalidade, equivalendo-se essa à adequação da medida adotada, em face da necessidade administrativa. Sendo assim, a mitigação

39 SARMENTO, Daniel. O Neoconstitucionalismo no Brasil: riscos e possibilidades. Revista Brasileira

de Estudos Constitucionais. Ano 3, n 9. p. 95-133.

(31)

de um interesse particular só restaria válida mediante o interesse coletivo e ainda apenas sob a hipótese de se atender à estrita necessidade pública41.

Certeza é que proporcionalidade e razoabilidade guardam um efeito semântico comum, qual seja, a melhor decisão é aquela que não se aproxima dos extremos. Aquela que não é exagerada, aquela que não caminha além ou aquém do esperado. Porém essa similaridade não quer significar que as expressões funcionam como termos sinônimos, porque assim não o são. Pelo menos quatro diferenças42 podem e devem ser notadas entre elas:

a) O grau de motivação racional da decisão. Na razoabilidade basta que a decisão não seja irracional, basta que a decisão não seja irrazoável. Na proporcionalidade é preciso mais, é preciso que a decisão seja caracterizada pelo agrupamento da adequação, necessidade e compatibilidade.

b) Diferença no conteúdo da decisão. Para a razoabilidade é suficiente pensar se a decisão guarda sentido com o caso analisado. Basta que seja uma decisão entre outras possíveis. Para a proporcionalidade é analisado se a medida adotada tem relação com o fim buscado. Não se pensa aqui só a alternativa possível da decisão, mas se o fim comporta a medida escolhida.

c) Diferença quanto à natureza da decisão. Podemos dizer que a razoabilidade tem natureza social, pois visa apenas interpretar se a medida tomada não é irracional perante o que é socialmente aceito. A proporcionalidade tem natureza jurídica, vai além do socialmente aceito, exige que a medida escolhida leve em consideração o direcionamento constitucional.

d) Diferença nos efeitos produzidos: a medida é razoável quando se impediu uma tomada irracional, não aceita pela sociedade. A razoabilidade bloqueia a incongruência. Proporcionalidade não acaba no bloqueio, ultrapassa essa finalidade, uma vez que a medida proporcional assegura disposições constitucionais do caso concreto.

41 FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 50-51.

42 PONTES, Helenilson Cunha. O princípio da proporcionalidade e o direito Tributário. São Paulo:

(32)

De qualquer forma o que se passou a ganhar lume era o trabalho interpretativo cada vez maior por parte dos magistrados que se viam diante de princípios de horizonte extremamente amplo, porém, competindo a eles sua aplicação, atentando-se às diretrizes constitucionais.

A par desse desenvolvimento a dignidade da pessoa humana ganhou projeção. Ana Paula Barcellos chega a afirmar:

Na realidade brasileira a dignidade da pessoa humana tornou-se o principio fundante da ordem jurídica e a finalidade principal do Estado, com as conseqüências hermenêuticas que esse status jurídico confere ao princípio. Esses atributos da dignidade indicam a modalidade positiva ou simétrica da eficácia jurídica como a mais adequada para o principio como um todo, por ser a mais consistente43.

Interessante que a dignidade da pessoa resta intrinsecamente relacionada com seu tratamento igualitário perante toda a sociedade. Ninguém gostaria de receber um tratamento diferente daquele que é oferecido à sociedade como um todo na medida em que corresponde ao padrão.

Por outro lado, com a mesma intensidade que um cidadão exige respeito à igualdade, este exige que seu caso seja analisado em razão das particularidades que se apresentam. Portanto, diante da igualdade plena, o cidadão se vê como um indivíduo que deveria ser diferentemente tratado, ele preza pela individualidade, mais que pela igualdade.

Na seara tributária a situação é evidente: o cidadão-contribuinte não deve aceitar que uma norma tributária deixe de reconhecer seu caráter individual e desigual, portanto. Merece, nesse sentido, ser tratado de modo discriminado quando comparado aos demais, em vista de suas peculiaridades. A injustiça aqui se mostra pelo fato de ser tratado igualmente apesar de suas diferenças. A norma tributária é para todos, mas não se aceita uma padronização dos contribuintes, pois não há ninguém que seja perfeitamente equivalente a outro, não há ninguém que não tenha alguma particularidade que o diferencie dos demais44.

43 BARCELLOS, Ana Paula.

A eficácia jurídica dos princípios constitucionais. O princípio da dignidade da pessoa humana. São Paulo: Renovar, 2008.

(33)

Justamente esse tratamento diferenciado é que exsurge da leitura do texto constitucional, em seu art. 145, § 1º, CF, quando verificamos o princípio da capacidade contributiva. Princípio esse que visa aquinhoar o contribuinte de acordo com sua capacidade econômica. O princípio busca revelar a verdadeira condição econômica da pessoa, em razão da qual um imposto será exigido, tornando-se uma tributação individualizada, portanto, estabelecendo a igualdade entre os demais cidadãos.

Nessa linha de pensamento, mesmo com o indeterminado conceito da norma constitucional, extrai-se da disposição indicada o acerto do constituinte em conduzir a cobrança tributária na medida em que se observa a particular condição econômica do indivíduo45.

A exigência de um tributo dentro das limitações econômicas de um contribuinte torna a cobrança justa e seu adimplemento uma questão moral.

Conforme ensina Tércio Sampaio Ferraz Júnior, existem dificuldades em discriminar direito e moral, porém, algumas considerações são feitas e acertadas e entre elas faz-se importante esclarecer a noção de “sentido”. “Sentido” através da ideia que o

homem experimenta vivendo na sociedade e não apenas em relação a sua

capacidade de julgar e pensar. “Sentido” através do que é empregado pela exigência moral de justiça, como uma condição do direito.46

Naturalmente tanto a questão de justiça, como de igualdade são difíceis de serem demarcadas. Em relação a essa última é utópico o pensamento que acredita em sua plenitude. Para esse caso seria necessário um contentamento quanto a uma igualdade relativa, haja vista que encontrar pessoas absolutamente iguais e tributá-las com o mesmo acerto seria tarefa veementemente impossível47.

Essa relatividade do tratamento igual pode ser vislumbrada através da aplicação dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, vez que se faz necessária uma

45 UCKMAR, Victor.

Princípios comuns de direito constitucional tributário. Tradução e notas ao Direito brasileiro. Marco Aurélio Greco. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 82-83.

46 FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do direito. Técnica, decisão, dominação.

São Paulo: Atlas, 1996, p. 357-358.

(34)

ponderação e uma adequação para se colocar num mesmo grupo contribuintes de capacidade contributiva mais próxima possível.

Os tributos devem satisfazer o princípio da igualdade, na medida em que os iguais são tratados igualmente e os desiguais, obviamente de maneira distinta, desde que suas desigualdades sejam observadas. Haverá então a graduação da carga tributária em atenção não só à regra constitucional (art. 145, § 1º), mas também referindo-se a critérios vários expressamente indicados pela Constituição Federal e outros indicados pelo legislador, porém que se combinam num mesmo sentido: atender a fins constitucionais como a construção de uma sociedade livre, justa e solidária.

O dispositivo indicado refere-sea uma capacidade econômica do contribuinte, a qual, por sua vez, enseja a capacidade contributiva para com o Estado, pois, em se tratando de renda, conforme maior ela for, o indivíduo que a aufere revela uma riqueza maior, logo, provavelmente terá mais recursos disponíveis para recolher impostos mais altos, porém de acordo com sua capacidade.

Entrementes o raciocínio não pode ser tão simplório, cabendo observar que a referência constitucional deve ser analisada através de duas capacidades contributivas. Uma, absoluta ou objetiva, outra, relativa ou subjetiva48.

Por capacidade objetiva entende-se a identificação de um sujeito passivo em potencial, aquele que possui um sinal de riqueza passível de tributação. Por capacidade contributiva subjetiva compreende-se o contribuinte individualmente e sua capacidade particular de contribuir para com o Estado.

As acepções tratadas pela autora condizem com outra lição da doutrina acerca da capacidade contributiva ao se afirmar que cidadãos com grande disponibilidade de renda, portanto, além daquela necessária a sua subsistência, devem ser mais rigorosamente tributados. Na mesma medida, entre aqueles que se destacam por fazer parte do mesmo grupo, mas que possuem capacidade contributiva maior ainda, então a desigualdade na tributação far-se-á presente, tornando equivalente o tratamento mesmo entre os desiguais.49

48 COSTA, Regina Helena.

Praticabilidade e justiça tributária. Exeqüibilidade de lei tributária e direitos do contribuinte. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 114

(35)

Seguindo esse raciocínio percebe-se que a progressividade e a proporcionalidade são bases da capacidade contributiva e que através da coordenação dos princípios vislumbra-se atingir a justiça fiscal, sob o prisma quer do peso da tributação, quer da distribuição de renda50.

Desta feita, pessoas com a mesma condição de renda sujeitam-se a tributos com alíquotas equivalentes. A situação não guarda, pois, dificuldade em ser analisada. Contudo, quando se está diante de pessoas nitidamente desiguais (segundo o critério da renda) se a alíquota mantivera-se fixa, os contribuintes recolherão tributos com mesmo impacto sobre a pessoa, apesar de o montante final de pagamento ser diferente. Exemplifica-se essa situação, quando temos um contribuinte “A” com renda de R$ 1.000 e um contribuinte “B” com renda de R$ 10.000. Se a alíquota for de 10%, o contribuinte “A” recolherá R$ 100 e o “B” R$ 1.000, valores, portanto, proporcionais às rendas auferidas, porém com o mesmo impacto tributário sobre pessoas nitidamente diferentes. Ora, aplica-se alíquota igual para contribuintes desiguais, de modo que retirar 10% da renda do mais pobre e 10% do mais rico não traduz o objetivo constitucional. A capacidade de suportar o ônus tributário de um e de outro é diferente de modo que a simples proporcionalidade não alcança a justiça fiscal.

Com a progressividade, a relação da alíquota com a renda é mais densa, uma vez que a variação caminha conforme a alternância da renda. Para o exemplo citado, o contribuinte “A” sofrerá com um tributo aquinhoando 10% de sua renda, enquanto o contribuinte “B”, que recebe dez vezes mais que “A”, revela uma capacidade de suportar uma carga maior, contribuindo com o Estado a um aporte de 15%.

Assim temos “A”, com renda de R$ 1.000, pagando 10% e; “B”, com renda de R$ 10.000, pagando 15%. A proporcionalidade é evidente, pois o primeiro recolherá R$ 100, enquanto o segundo recolherá R$ 1.500. Mas, a progressividade da alíquota se faz presente no instante que o percentual aplicado sobre contribuintes desiguais é desigual também. Tratamos o assunto aqui apenas como meio exemplificativo, sem preocupações quanto à exata medida que uma alíquota deve ter considerando as rendas indicadas. O objetivo era apenas ilustrar as evidentes diferenças entre a progressividade e a proporcionalidade.

(36)

A tributação igualitária condiz então com igual sacrifício a ser suportado pelos contribuintes, logo, o sacrifício não pode ser desmedido sob pena de se violar a dignidade da pessoa humana e consequentemente esbarrar na vedação ao confisco, como também não pode impor exações idênticas a contribuintes com capacidade contributiva desigual.

José Maurício Conti51 listou em uma de suas obras as diversas teorias que se formaram para justificar a tributação progressiva. Sejam as teorias do sacrifício (absoluto, proporcional e marginal), seja a teoria da renda excedente, da importância social e mesmo a teoria sócio-política, lembrando que a teoria do sacrifício (acima preambularmente descrita) encontra-se superada diante dos critérios hoje indicados pelo constituinte, prestigiando a progressividade como forma de realização da justiça distributiva52.

Tendente se encontra esse trabalho à aplicação das normas indutoras, partindo do pressuposto que não só a renda abarca o bem-estar, mas tantos outros elementos, entre eles o meio ambiente equilibrado ea propriedade privada. Por essa linha, a capacidade contributiva toma por fundamento não só o dever de pagar um imposto ao Estado, mas uma consequência necessária em razão de o cidadão querer manifestar seu grau de riqueza através de sua propriedade. Assim quando se desloca a análise para a capacidade contributiva pressupõe sua importância como meio assecuratório da propriedade privada e a função social da propriedade53.

Vejamos que a progressividade pode ser dotada de análises diametralmente diferentes, porém, a primeira, já comentada, em consideração à justiça distributiva, a segunda tomando como parâmetro os cânones da Ordem Econômica (progressividade estrutural) e nesse caso sua aplicação agraciaria outros tributos além dos indicados pela Carta Magna54.

51 CONTI, José Maurício. Princípios tributários da capacidade contributiva e da progressividade. São

Paulo: Dialética, 1997, p. 80-81.

52 SCHOUERI, Luís Eduardo. op. cit., p. 297.

53 PONTES, Helenílson Cunha. O Princípio da proporcionalidade e o direito tributário. São Paulo:

Dialética, 2000, p. 105.

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