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Aspectos dos rituais de passagem em Dickens

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Academic year: 2017

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ASPECTOS DOS RITUAIS DE PASSAGEM EM DICKENS

RlcaAdo UOAÁJCL doA SANTOS*

0 propósito d e s t a comunicação é t e n t a r e s t a b e l e c e r um p a r a l e l i s m o e n t r e algumas situações n a r r a t i v a s na obra de Charles Dickens e os r i t o s de passagem, e s p e c i f i c a m e n t e os r i t o s de i n i c i a ção, t a l como estão s i s t e m a t i z a d o s p e l a a n t r o p o l o g i a . Para i s s o , destacaremos alguns t r e c h o s

dos l i v r o s OLLvoJi Twlòt (4) , Vavld ZoppoJi^Ldld (2)

e Gnç,at ExpectcutionA (3) , v e r i f i c a n d o a sobrevivên c i a de aspectos ritualísticos na passagem das situações em que se envolvem os p r o t a g o n i s t a s dos romances.

E x p l i c i t a n d o o que sejam os r i t o s de passa gem, e l e s são, nas p a l a v r a s de Edward Norbeck, "eventos c e r i m o n i a i s que marcam a passagem de um s t a t u s s o c i a l ou r e l i g i o s o para o u t r o , e x i s t i n d o em todas as sociedades h i s t o r i c a m e n t e conheci, das" ( 6 , p. 1044). Essa definição baseia-se nos p o s t u l a d o s do etnólogo francês A r n o l d van Gennep, de que a " v i d a i n d i v i d u a l , nas socieda des t r a d i c i o n a i s , c o n s i s t e em uma sucessão de

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e t a p a s " ( 5 , p. 2 7 ) , em que os r i t o s de passagem promovem o d e s e n v o l v i m e n t o de um novo estado de equilíbrio como a j u s t e ãs mudanças s o c i a i s que os r i t o s enfocam, através das "instruções aos indivíduos i n i c i a d o s e do alívio da tensão p s i c o lógica que as transições i m p l i c a m " ( 6 , p. 1045), N a t u r a l m e n t e , nas sociedades modernas não se ve r i f i c a m essas características de uma forma t o t a l , mente explícita, mas sim o seu c o n t r a p o n t o na vi da psicológica das pessoas. É com e s t a r e s s a l v a que t e n t a r e m o s f a z e r a aproximação dos aspectos dos r i t o s de passagem na obra de um e s c r i t o r i n glês do século XIX, v i v e n d o numa época de i n t e n sa emergência i n d u s t r i a l , na sociedade i n g l e s a , p a r t i c u l a r m e n t e Londres, do chamado período v i t o r i a n o .

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r e f e r i m o s ãs mudanças do p r o t a g o n i s t a O l i v e r em

QLLveA TwÁj>t, notamos que seu p r i m e i r o a t o de d e c i são c o r a j o s a é a separação do a l b e r g u e em que v_i ve, através da f u g a para Londres. Assim também é a separação de David C o p p e r f i e l d — na o b r a homõ nima — de sua mãe, quando é e n v i a d o p a r a a esco l a (Salem House) e a de P i p , em Gnçout Expuctcutiom, quando se separa de sua casa e de Joe Gargery pa r a c u i d a r de sua educação, p r o p o r c i o n a d a p o r um p r o t e t o r desconhecido. Essas separações em s i não c o n s t i t u e m um aspecto ritualístico em seu s e n t i d o p l e n o , mas são necessárias para f u t u r a s transformações das personagens, c o n s t i t u i n d o - s e como preparações para mudanças mais s i g n i f i c a t ^ vas.

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p r i m i t i v a s .

As provas mais difíceis, p e l a exaustão fí s i c a e psicológica, se r e l a c i o n a m à tomada de de cisões c o r a j o s a s i m p l i c a d a s nas f u g a s . Já n o t a mos que a fuga de O l i v e r T w i s t f o i decisão que e l e tomou premido p e l a s condições a b j e t a s do a_l bergue de Mr. Bumble, quando O l i v e r assume que seu d e s t i n o depende de sua coragem para f u g i r . É i m p o r t a n t e o b s e r v a r que O l i v e r quase morre de fome e f r a q u e z a nos campos até s e r s o c o r r i d o p o r um c a s a l de camponeses, e s e g u i r sua viagem para a c a p i t a l .

Ilustração melhor dos p e r i g o s da transição para uma nova situação é dada p e l a fuga de David C o p p e r f i e l d da f i r m a do p a d r a s t o em Lon d r e s para a casa da t i a Betsey Trotwood em Dover. David perde sua bagagem, é atemorizado pe

l a s pessoas da e s t r a d a (que e l e p e r c o r r e a p é ) , tem seu único lenço roubado p o r um a n d a r i l h o v i o l e n t o , vende seus casacos para poder comer, tem c o n t a t o com pessoas insanas (como o dono do arma zém, que só se i n t e r e s s a v a p o r b a r g a n h a s ) , passa as n o i t e s em campos e em montes de f e n o ; e n f i m , chega num estado deplorável à casa de sua t i a , para poder se a p r e s e n t a r a e l a e p e d i r - l h e p r o t e

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A d o r física e os p e r i g o s o acompanham, assim, até que seu o b j e t i v o s e j a alcançado.

Em Gneat Expectationò a carga de p e r i g o s é i n tensifiçada. O r l i c k , um ex-empregado que se r e v e I a r a um c r i m i n o s o e que constantemente espiona as a t i v i d a d e s de P i p , l h e e n v i a um recado anôni mo para que e l e venha ao seu e n c o n t r o . Pensando

t r a t a r - s e de a s s u n t o do i n t e r e s s e de Magwitch (o ex-condenado que P i p d e s c o b r i u s e r seu benfe^i t o r ) , o jovem v a i a e l e e quase é m o r t o , sendo s a l v o p o r seu amigo Thomas T r a d d l e s .

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nha de tomar e os p e r i g o s que e n f r e n t o u , culmi. nando com a morte de Magwitch na prisão e o con f i s c o da herança que e l e p o d e r i a t e r d e i x a d o pa r a P i p . A dura prova sobre a o r i g e m de seu d i n h e i r o e,o p e r c u r s o i n t e r i o r que P i p r e a l i z a mos t r a m como e l e t e v e de s u p e r a r sua própria d o r pa r a então e n c a r a r a verdade sobre s i mesmo e i n t e g r a r um s t a t u s s o c i a l que e l e h a v i a r e p u d i a d o em seu p r e c o n c e i t o .

A ritualização da morte como uma etapa da iniciação, além das cenas de P i p em GnnaX.

ExpecttttLoM, pode s e r e n c o n t r a d a na última peripé c i a de O l i v e r T w i s t j u n t o à q u a d r i l h a de F a g i n : B i l l Sikes d e i x a O l i v e r em uma v a l a no campo, f e r i d o p o r uma b a l a na t e n t a t i v a f r u s t r a d a de r o u bo à casa dos M a y l i e s . Abandonado e sangrando, O l i v e r consegue, no e n t a n t o , s a i r da v a l a e enca minhar-se aquela casa, onde pede s o c o r r o e d e s f a

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Expe.ctati.oyu>, o p r o t a g o n i s t a deve l u t a r p o r sua sobrevivência, como um membro da sociedade econo micamente p r o d u t i v o , um dos traços implícitos nos r i t o s de iniciação das sociedades p r i m i t i . vas.

Quando D a v i d f i c a sabendo que sua t i a está a r r u i n a d a e não pode mais i n v e s t i r em sua educa ção, e l e assume i n t e g r a l m e n t e o ônus da respon s a b i l i d a d e de s u s t e n t a r sua família ( e l e , a t i a e Mr. D i c k ) ; e l e passa p o r várias p r o v a s : uma das mais severas é a aprendizagem da estenogrei f i a , para se t o r n a r um repórter das a t i v i d a d e s do Parlamento; e l e também aprenderá a v a l o r i z a r o d i n h e i r o ganho p o r seu próprio t r a b a l h o e t e n tará o r g a n i z a r seu d i a - a - d i a com a esposa Dora.

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Em resumo, é difícil d e l i m i t a r , nas s o c i e d a des modernas, os aspectos dos r i t o s de passagem do s e r humano em sua v i d a s o c j a l , da forma como eram m a n i f e s t a d o s nas sociedades p r i m i t i v a s . Em bora grande p a r t e das transformações p e l a s q u a i s as personagens d i c k e n s e n i a n a s c i t a d a s pas^

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. CASSIRER, E. O que é o m i t o . I n : . Ú

mito do E&tado. Rio de J a n e i r o : Zahar, 1976 .

2. DICKENS, C. David CoppoJihioJLd. Harmondsworth: Penguin, 1966.

3. DICKENS, C. Gfiaat expectaXionò. Harmondsworth: Penguin, 1965.

4. DICKENS, C. ÖlivVi Twidt. Harmondsworth:

Penguin, 1966.

5. GENNEP, A. van. 0& hitoA dt paòòagum. Petrópo l i s : Vozes, 1978. ( A n t r o p o l o g i a , 1 1 ) .

6. NORBECK, E. Passage r i t e s . I n : THE NEW

EncycJtopa&dia ßnitannica. 15. ed. Chicago: 1974.

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Ilustração melhor dos  p e r i g o s da transição  para uma nova situação é dada  p e l a fuga de  David  C o p p e r f i e l d da  f i r m a do  p a d r a s t o em Lon  d r e s para a casa da  t i a Betsey Trotwood em  Dover

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