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Subjacências do imaginário nas histórias de vida de um grupo de idosos tabagistas institucionalizados

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Academic year: 2017

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Universidade

Católica de

Brasília

PRO-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO

STRICTO SENSU EM GERONTOLOGIA

MESTRADO

SUBJACÊNCIAS DO IMAGINÁRIO NAS HISTÓRIAS DE

VIDA DE UM GRUPO DE IDOSOS INSTITUCIONALIZADOS

Autora: Elen Oliveira Pernin

Orientadora: Altair Macedo Lahud Loureiro

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SUBJACÊNCIAS DO IMAGINÁRIO NAS HISTÓRIAS DE VIDA DE UM GRUPO DE IDOSOS TABAGISTAS INSTITUCIONALIZADOS

Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação Stricto Sensu em Gerontologia da Universidade Católica de Brasília, como requisito para obtenção do título de Mestre em Gerontologia.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Altair Macedo Lahud Loureiro.

Brasília

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DO IMAGINÁRIO NAS HISTÓRIAS DE VIDA DE UM GRUPO DE IDOSOS TABAGISTAS INSTITUCIONALIZADOS”, como requisito para obtenção ao título de mestre em Gerontologia, defendida e aprovada em 17 de oubro de 2008, pela banca examinadora constituída por:

__________________________________________________________  Prof.ª Dr.ª Altair Lahud Macedo de Loureiro − UCB

Presidente da banca

____________________________________________________________  Prof.ª Dr.ª Iduina Mont’Alverne Chaves

Examinadora externa − UFF

_________________________________________________________ 

Prof. Dr. Vicente Faleiros Examinador interno − UCB

_____________________________________________________________ Prof. Dr. Vicente Alves − UCB

Examinador interno

Brasília

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Dedico esta dissertação:

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Agradeço em especial a minha mãe e a meu irmão, que me incentivaram a fazer o mestrado em gerontologia.

Agradeço ao Olivier, que soube entender que o estudo era algo fundamental na minha vida e apoiou minha decisão de voltar ao Brasil para continuar meu caminho pela vida acadêmica.

A minha orientadora, Prof.ª Dr.ª Altair, que me pegou pela mão e me conduziu pelos caminhos do imaginário, de forma firme, mas ao mesmo tempo com a paciência, disponibilidade e entrega daqueles que amam o que fazem.

Ao Prof. Dr. José Luiz Telles, que me ensinou a ter força e confiança frente as dificuldades da vida acadêmica, mostrou-me um mundo de possibilidades e me fez acreditar que nós temos o poder de transformar projetos em ações.

Às amigas da gerontologia e do trabalho, pelos momentos de afeto, incentivo e compreensão.

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Se o envelhecimento é uma realidade para cada indíviduo, este deve ser dito na primeira pessoa e visto na perspectiva e no movimento da história individual e singular de cada um. Ouvindo o idoso, o olhar que teremos sobre ele e o envelhecimento não será jamais o mesmo.

(ARGOUD e PUIJALON,1999)

O homem se situa, se inscreve em seu meio e age sob o comando da razão comum, e mais ainda de suas próprias razões onde se misturam seus interesses, desejos, suas interpretações e suas crenças.

O imaginário permanece mais que nunca necessário; de algum modo o oxigênio sem o qual toda a vida pessoal e coletiva se arruinaria. É feito de todas as imagens que cada um cria a partir da apreensão que tem de seu corpo e de seu desejo, de seu ambiente imediato, de sua relação com os outros, a partir do capital cultural adquirido, bem como das escolhas que provocam uma projeção no futuro próximo.

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Esta dissertação propôs-se a conhecer o imaginário de um grupo de idosos tabagistas asilados e a identificar as motivações para a cessação ou não do tabagismo, considerando a dimensão simbólica na possível reorganização do asilo e na melhoria da qualidade de vida dos idosos institucionalizados. A pesquisa, integrada à pesquisa mais ampla apoiada pelo CNPq/UCB, desenvolveu-se em uma Instituição de Longa Permanência para Idosos − ILPI − sediada no Distrito Federal. Para tal, foram colhidas histórias de vida de oito idosos, sendo três mulheres e cinco homens. Os pontos principais considerados para a análise das histórias foram a motivação para o abandono do fumo; o tempo de institucionalização; e a disposição para transformações no asilo. Foram registradas as pontuações mnemônicas de suas vidas passadas e considerações do presente. A análise, fez-se à luz da teoria antropológica do imaginário, de Gilbert Durand (1989), validada por Yves Durand (1988) com a criação do Teste AT-9, nos achados gerontológicos e nos conceitos presentes nas obras de Ferrarotti (1983) e Bertaux (1997) sobre histórias de vida. Os dados míticos informaram que a maioria dos idosos ouvidos apresentou imaginário com estrutura mística, de não-luta e acomodação. Os sujeitos de esta pesquisa ressignificaram o espaço asilar por eles ocupado de forma positiva e negativa, com imagens trazidas de um lar que não existe mais. Em sua maioria, os idosos, mesmos aqueles que eufemizam os males do tabaco para saúde, demonstraram motivação para abandonar o vício. Os resultados encontrados refletem a insatisfação do grupo com relação à atenção requerida no cotidiano asilar, mas naqueles idosos com imaginário místico a ação não acompanha este desagrado, enquanto os idosos com imaginários sintéticos ensaiam uma reação. Ante estes resultados, verifica-se que a reorganização do asilo se faz necessária e de forma urgente. Considerando os dados míticos apresentados ao final desta pesquisa, pistas foram deixadas para a efetivação das campanhas para inibir o tabaco na instituição e para que haja melhoria na qualidade de vida do idoso institucionalizado. Para isso, outras formas de institucionalização foram propostas.

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This work intends to analyze the imaginary of a group of elderly people who smoke and live in asylums identifying there motivation or not to quit smoking, considering the symbolic dimension of a possible re-organization of the asylum and in the improvement of the life quality of the elderly people institutionalized. This research was developed in an Institution of Long Permanence to Elderly – ILP- of the Distrito Federal, integrated to the biggest research supported by CNPq/UCB. For this research, were collected the life history of 8 elderly people, 3 women and 5 men. The main points considered to analyze these people were there motivation to abandon smoking, the time of institutionalization and the desire of transformations in the asylum. Were registered the mnemonic punctuations of there past lives and considerations of there present life. The analysis was made based on the anthropologic theory of Gilbert Durand (1989), validate for Yves Durand (1988) with the creation of the test - AT 9, and with the present concepts of the studies of Ferrarotti (1983) and Bertaux (1997) about life stories. The mythical data informed that most elderly people heard, who smoke, presented imaginary with mythical structure, of non beat and accommodation. The senior citizens from this research identified the asylum’s place for them occupied, positively and negatively, with images brought from a home that does not exist anymore. The majority of seniors, even those ones who soften the badly of smoking to the health, demonstrated motivation to give up the addiction. The results found reflected the dissatisfaction of the group with the attention required in the asylum daily life, but in those seniors with the mythic imaginary, the actions does not follow this displeasure, while the elderly people with the synthetic imaginary, try out a reaction. Facing these results, can be verified that the (re) organization of the asylum is necessary and urgent. Considering the mythical data presented, at the end of this research, clues were let for the carry out of the campaign to inhibit tobacco in the institution and for the improvement in the quality life of the institutionalized seniors. For this, other ways of institutionalization were proposed.  

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INTRODUÇÃO ... 12

PROBLEMATIZAÇÃO E JUSTIFICATIVA ... 17

PARTE I − QUESTÕES DE MÉTODO E DE TEMÁTICA ... 19

CAPÍTULO 1 − QUESTÕES DE MÉTODO ... 19

1.1. Objeto da Pesquisa ... 19

1.2. Possíveis Indagações no encaminhamento da recolha das Histórias de Vida .... 19

1.3. Objetivos ... 20

1.3.1.Objetivo Geral ... 20

1.3.2.Objetivos Específicos ... 20

1.3.3.Natureza da Pesquisa ... 21

1.3.4.O Retrato do Grupo ... 22

1.4. Descrição do Espaço Pesquisado ... 23

1.5. Trabalho de Campo ... 24

CAPÍTULO 2 − QUESTÕES DE TEMÁTICA ... 26

2.1. O Envelhecimento, a Velhice e o Velho: pontuações gerontológicas ... 26

2.2. A Velhice Asilada e o Asilo ... 29

2.3. O Tabagismo e suas Repercussões na Velhice ... 34

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3.2. Trajeto Antropológico ... 40

3.3. Potência Organizativa ... 41

3.4. Regimes do Imaginário ... 41

3.5. As Estruturas Antropológicas do Imaginário ... 45

CAPÍTULO 4 − HISTÓRIAS DE VIDA ... 48

PARTE III − REGISTROS E ANÁLISES... 52

CAPÍTULO 5 −REGISTRO DAS FALAS ... 52

5.1. N.º1: Dona Jô ... 52

5.2. N.º 2: Seu Dedé ... 58

5.3. N.º3: Seu Léo ... 67

5.4. N.º 4: Dona Zazá ... 73

5.5. N.º 5: Seu Cadu ... 84

5.6. N.º 6: Seu Aldo ... 91

5.7. N.º 7: Seu Val ... 99

5.8. N.º 8: Dona Tatá ... 106

CAPÍTULO 6 − UNIVERSO MÍTICO CONFIGURADO: RESULTADOS ... 113

6. Quanto ao tabagismo, foram notadas diferenças ... 113

6.1.1.Da idade e da motivação para o inicio do tabagismo ... 113

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6.2. Quanto à situação de asilados ... 115

6.3. Quanto à organização e o cotidiano do asilo ... 115

6.4. Quanto ao conjunto relacional de imagens – imaginário ... 116

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 119

REFERÊNCIAS... 124

APÊNDICE - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO ... 130

ANEXO - APROVAÇÃO DO COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA-CEP ... 132  

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INTRODUÇÃO

Os avanços científicos e tecnológicos dos tempos modernos, evidenciados pela queda da mortalidade infantil e pelas mudanças nos perfis epidemiológicos, tiveram como conseqüência uma nova realidade social caracterizada pelo aumento na expectativa de vida da população mundial. Esse prolongamento da expectativa de vida trouxe consigo um novo homem, um novo velho, e a conseqüente necessidade de maior entendimento e acompanhamento do processo de envelhecimento, agora mais longo e com díspares situações.

Nesta pesquisa, o fenômeno da velhice será entendido na sua complexa heterogeneidade atual, pois parte do pressuposto de que existem várias velhices, desiguais processos de envelhecimento e diferentes velhos na sociedade, sendo a categoria institucionalizada – aquela considerada nesta dissertação – apenas uma destas categorias, entre as múltiplas dimensões e situações que formam o caleidoscópio do fenômeno, do processo e do ser humano nesta fase da vida.

Os critérios mais comumente utilizados para situar a velhice ainda são o cronológico e o quantitativo. Estima-se que em 2008 o número de idosos em nosso País some 18.000.000 (dezoito milhões) [BGE/PNAD, 2007; DATASUS, 2007] e destes, segundo Camarano (2005), aproximadamente, 1% (um por cento) vive em Institucição de Longa Permanência para Idosos − ILPI.

Associado ao aumento da expectativa de vida acontece também o avanço de doenças respiratórias em pessoas idosas, em decorrência, principalmente, do fumo (GOMES, In: LOUREIRO, 2007-2009). Partindo da preocupação gerontológica em preservar e melhorar a qualidade de vida do sujeito idoso, sendo este asilado ou não, mostram-se de relevância as pesquisas endereçadas a conhecer melhor a repercussão do tabagismo entre idosos asilados.

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Nas campanhas mais recentes sobre tabagismo, promovidas pelo Ministério da Saúde do Brasil, a pessoa idosa não tem sido lembrada no que tange às questões preventivas de abandono do cigarro. Os possíveis ganhos para a sua saúde na prevenção são lembrados somente quando é abordada a questão de patologias crônicas já instaladas, com medidas curativas; normalmente a ênfase da prevenção é focada no jovem. Não é a intenção mostrar aqui, a partir de tais constatações, que não se deve educar os jovens a não começarem a fumar. Pelo contrário, esse alerta é importante. Contudo, é preciso que não seja desprezada a pessoa idosa.

Quanto ao espaço habitado, lembrando Bachelard (1988), Loureiro1 diz que “o espaço exerce influência no imaginário dos indivíduos e dos grupos que nele habitam, vivem”. Estudar idosos saudáveis, autônomos e independentes no “aconchego” do lar é diferente de estudá-los no reduto de um asilo. No ambiente asilar, os idosos convivem, em um espaço comum, partilhando suas experiências de vida e de morte e seus hábitos e vícios, entre estes: o tabagismo.

O fumo é um dos vícios mais nocivos e prejudiciais à saúde humana, principalmente em pessoas com idade avançada, quando, no processo normal de envelhecimento, os meios de defesa do organismo estão diminuídos (TARANTINO, 1976). Torna-se ainda mais complexa a análise da situação do tabagismo entre idosos ao se considerarem fatores outros que não apenas os orgânicos, como, por exemplo, as afeições interrompidas, as desilusões do amor humano, as quebras de vínculos familiares, do trabalho, das amizades, a perda da residência, a falta de solidariedade, a possível solidão, o medo da morte e a situação espacial em que vivem

.

Esta pesquisa deteve-se em desvendar o imaginário de um grupo de idosos institucionalizados tabagistas, por acreditar na potência organizativa do imaginário – imaginário entendido como o conjunto relacional de imagens, a constelação das imagens que se formam e se estruturam de forma mais ou menos isomorfas ao redor de um nó aglutinador (LOUREIRO, 2000). Nesse entendimento, o imaginário propicia pistas para uma (re)organização das instituições e/ou dos grupos, ao mesmo tempo em que proporciona o conhecimento mais aprofundado do ser

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humano. No caso desta dissertação, o ser humano envelhecido institucionalizado. Conforme Pitta (2005, p.17), “[...] os símbolos são a maneira de expressar o imaginário, estes não serão independentes, decorrem da visão de mundo específica, imaginária [...]”.

A Teoria Antropológica do Imaginário de Gilbert Durand (1989) consegue articular em sua noção de “trajeto antropológico” a totalidade do indivíduo, quer dizer, consegue entender de que maneira o ser humano vai carregar o mundo, o que dependerá da incessante troca que existe entre as pulsões subjetivas e assimiladoras e as intimações que sofremos constantemente do ‘meio cósmico e social’ (DURAND, G., 1989).

O trabalho de campo efetivado na busca do imaginário do grupo de idosos foi compatibilizado com os dados parciais obtidos na pesquisa em desenvolvimento denominada “Imaginário, Idosos Asilados Tabagistas e Organização de Asilos − IATO (CNPq/UCB)2 [...]” e cruzado com as teorias publicadas sobre velhice, imaginário, tabagismo e asilo – ILPI – com o objetivo de se conhecer as subjacências contidas nas falas, as representações imagéticas, as raízes do vício, as razões e justificativas apresentadas pelos próprios idosos asilados tabagistas – permeadas de emoções presentes, de lembranças passadas e das situações atuais – para o uso do tabaco no asilo e o entendimento dos idosos sobre sua vida asilada, e sobre a ILPI.

A identificação do imaginário do grupo deu-se por meio da escuta das histórias de vida – conhecimento este ampliado pela escuta da fala, observação dos gestos e atitudes – buscando o simbolismo existente no uso do cigarro e no habitar em um asilo. De acordo com Debert (2004, p. 101) “cada vez que deixamos o idoso expressar seus sentimentos e conhecimentos por meio de suas histórias de vida estamos devolvendo-lhe sua dignidade humana como cidadão”, dando-lhe “vez e voz” (FALEIROS, V; LOUREIRO, 2006). É o que se convencionou nesta pesquisa: dar voz aos idosos que vivem em uma ILPI.

A análise dos relatos de vida colhidos no grupo realizou-se à luz da Teoria do Imaginário de G. Durand (1989), apoiada em pesquisas e obras de estudiosos e

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pesquisadores do imaginário, como no caso de Y. Durand (1988), bem como em Ferrarotti (1983) e Berteaux (1997), autores de obras publicadas sobre conceitos e estratégias no uso e no entendimento do método de histórias de vida. O trabalho de Tanus (2002) deu o exemplo de pesquisa com histórias de vida e imaginário e, por Paula Carvalho (1998), foram apresentados os passos para uma mitanálise.

A presente dissertação está estruturada em três partes. Na primeira parte, constam as questões de método e de temática, em que estão apresentados os caminhos metodológicos seguidos na pesquisa, explicitando sua natureza, a população envolvida e os objetivos da investigação. Os temas abordados no estudo são o tabagismo, o idoso institucionalizado e o asilo.

A segunda parte contém os pilares teóricos que sustentam a dissertação, os veículos condutores que embasam a análise dos achados – a teoria antropológica do imaginário de Gilbert Durand, antropologia do imaginário, e a teoria das Histórias de Vida, com Ferrarotti, Berteaux. Outros estudiosos e pesquisadores foram chamados no momento oportuno: Tanus, Yves Durand, Loureiro, entre outros.

A terceira parte resgata e registra as falas dos idosos tabagistas escutados, com suas respectivas análises. Nesta parte, são apresentados os microuniversos míticos dos sujeitos e está descrita a interpretação dos resultados, o microuniverso mítico do grupo, de acordo com os objetivos anunciados, perseguidos e atingidos na pesquisa.

Nas considerações finais, apoiadas nos resultados obtidos, estão apontados os indícios e sugeridos possíveis outros caminhos a serem seguidos para que os idosos tenham melhor qualidade de vida na instituição, se possível sem tabagismo. A (re)organização do asilo é proposta em uma “organizacionalidade antropolítica” (LOUREIRO, 2007-2009), que deverá considerar a dimensão simbólica, quer dizer, o imaginário do grupo de idosos institucionalizados. Esta dissertação sugere também outras formas de institucionalização e a maior participação oficial do Estado junto aos idosos carentes, sem vínculos familiares ou com estes rompidos, em busca da melhoria da situação institucional em nosso País.

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das diferenças culturais (MINAYO, 2000). Qualidade de vida é um conceito que engloba dois aspectos: subjetividade e multidimensionalidade. É importante, portanto, considerar neste conceito como o indivíduo avalia a sua situação pessoal em várias dimensões: saúde, social, econômica (SEIDL; ZANNON, 2004)

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PROBLEMATIZAÇÃO E JUSTIFICATIVA  

O interesse em abordar o referido tema nasceu do resultado da atuação da pesquisadora como fisioterapeuta, especialista em fisioterapia respiratória, e na experiência com idosos tabagistas em clínicas de reabilitação pulmonar. A partir de uma leitura prévia sobre o tema em questão e do contato direto com idosos, constatou-se a carência de relatos e estudos sobre o tabagismo na velhice e que pouco se conhece sobre o fumo nos asilos. O tabagismo, por ser um mal que aflige a humanidade há muitos anos, afetando pessoas de diferentes classes sociais, gêneros e idades, é assunto de relevância a ser estudado na gerontologia. É objeto de interesse da medicina e da sociologia. Entretanto, é inédito e oportuno estudá-lo a partir da vertente antropológica do imaginário, buscando conhecer a dimensão simbólica da situação.

Acredita-se que a decisão de estudar a velhice institucionalizada, considerada no convívio direto com o idoso institucionalizado, é passo importante para a compreensão do que é a velhice, nesta sua diferente situação. Em uma ILPI, as várias velhices encontram-se diferentemente caracterizadas: velhos felizes e/ou infelizes; lutadores e/ou acomodados; sadios e/ou doentes; instruídos e/ou analfabetos; e outros. A partir dessa constatação, já se percebem as subjacências do imaginário desses diferentes idosos, na maneira de “carregarem o mundo”, suas posturas ante “as realidades da morte e da angústia do passar do tempo” (LOUREIRO, 2004, p. 16), refletido nas suas ações no cotidiano asilar. Segundo G. Durand (1989), o imaginário tem força que organiza, ele está sob qualquer ação humana.

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distintas, com campos de atuação diversos, mas que têm o objetivo comum, o estudo dos múltiplos processos do envelhecimento” (PAPALÉO NETO, In: FREITAS et al., 2002, p. 9).

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PARTE I − QUESTÕES DE MÉTODO E DE TEMÁTICA  

CAPÍTULO 1 − QUESTÕES DE MÉTODO  

1.1. Objeto da Pesquisa  

O objeto de estudo desta dissertação, de acordo com o objeto do projeto de pesquisa, já mencionado: “Imaginário, Idosos Asilados Tabagistas e Organização de Asilos[...]” –IATO – é o asilo, moderna e politicamente denominada ILPI.

1.2. Possíveis Indagações no encaminhamento da recolha das Histórias de Vida

 

Algumas indagações, retiradas do projeto maior(IATO) são aqui relembradas, com a ressalva explicitada por Loureiro (2007-2009, p. 3):

[...] não é um roteiro de entrevista ou questionário fechado e sim as considerações de possíveis situações que merecem ser explicitadas e consideradas na pesquisa; investigadas em profundidade, lembrando que o espaço resta aberto para a riqueza trazida nos momentos de imprevistos e surpresas presentes nas atitudes e falas do grupo.

• Como os idosos asilados tabagistas representam em imagens e símbolos a instituição asilar que os acolhe e o uso que fazem do cigarro neste ambiente?

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• Quanto tempo e desde quando o idoso fuma, por que fuma, continua e se gostaria de deixar de fumar?

• A Instituição de Longa Permanência para Idosos − ILP − possui espaço próprio (aberto) onde os idosos tabagistas possam fumar?

• Existe a interdição explicita de fumar nos quartos?

• Quais são suas lembranças mais recorrentes, as pontuações mnemônicas trazidas nas histórias de vida relatadas/disponibilizadas?

• O que contém estas pontuações imagéticas que podem remeter ao uso e ao possível desuso do cigarro?

• Como se dá o relacionamento social e afetivo dos idosos tabagistas no asilo?

1.3. Objetivos  

1.3.1. Objetivo Geral

 

Partindo do pressuposto durandiano e bachelardiano de que o imaginário organiza as ações dos indivíduos e dos grupos (DURAND, G., 1989; BACHELARD, 1988); que o tabagismo está presente no asilo; que “o espaço influencia, condiciona uma subjetividade diferente” (GOFFMAN, 2001, p. 8 e BACHELARD, 1988), a presente pesquisa objetivou:

Conhecer a estrutura do imaginário de um grupo de idosos tabagistas institucionalizados, com a intenção de proporcionar com os resultados da pesquisa uma melhor qualidade de vida aos idosos asilados, sendo considerada a dimensão simbólica, na possível, se requerida, re-organização do asilo, vislumbrando a erradicação, ou minimização, do uso do tabaco na instituição.

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• Colher as histórias de vida reconhecendo nelas se os idosos lutam − de forma heróica −, se acomodam – de forma mística − ou conciliam ações de forma disseminatória.

• Identificar como se relacionam as imagens e os símbolos, nas representações contidas nas histórias de vida dos idosos.

• Efetuar a observação e a escuta do grupo, dando voz ao idoso tabagista asilado.

• Detectar, na história de vida relatada pelo idoso asilado tabagista, a influência do tabaco e da situação de asilado, na estrutura do seu imaginário.

• Analisar as histórias de vida colhidas e os apontamentos do “diário de bordo”,3 à luz da teoria do imaginário, de Durand, G. (1989), complementado com os achados de Durand, Y. (1988), Bachelard (1988) e Goffman (2001), Loureiro (2004), bem como dos indicativos contidos nas obras dos autores/pesquisadores do método histórias de vida.

• Oferecer subsídios simbólicos para a re-organização do asilo, se requerida.

1.3.3. Natureza da Pesquisa

 

Esta é uma pesquisa de natureza qualitativa. Foi escolhida a vertente da pesquisa qualitativa pela preocupação de se conhecer o humano, sem “catalogar” ou “reduzir” em categorias precisas o que decorre do discurso do sujeito. De acordo com Chizzotte (2006, p. 26) “a pesquisa qualitativa [...] não tem padrão único porque admite que a realidade é fluente e contraditória e os processos de investigação dependem também do pesquisador” – suas concepções, seus valores, seus objetivos – e de sua visão de mundo, quer dizer, o pensar, o sentir e o agir.

      

3 

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1.3.4. O Retrato do Grupo

 

De acordo com Ferrarotti (1983, p. 50):

A questão de qual o número de pessoas a serem ouvidas não se coloca neste tipo de pesquisa, já que toda prática individual é uma atividade sintética, uma totalização ativa de um contexto social (das estruturas sociais) que está interiorizada nas relações humanas de cada indivíduo, [...] a síntese social está inteiramente em nossos atos, sonhos, obras, comportamento e na história de um sistema inteiro que se mistura a nossa vida individual.

Nesta pesquisa, foram ouvidos oito idosos institucionalizados, sendo três mulheres e cinco homens, de um grupo de 25 (vinte e cinco) idosos selecionados na pesquisa principal (IATO).

Os idosos desta pesquisa foram submetidos ao minimental, ao Mini-Exame do Estado Mental (MEEM), aplicado por equipe da pesquisa que constatou capacidade cognitiva deles para assinar o termo de consentimento livre e esclarecido e para que pudessem ser ouvidos, quer dizer, participar da pesquisa.

A escolha dos idosos ouvidos seguiu o critério de conveniência. Os idosos tabagistas eram abordados após conversa com a equipe de cuidadores da instituição que auxiliaram no primeiro contato com o grupo. Aqueles idosos que dentro da seleção inicial tinham efetuado o minimental e que se dispuseram a relatar suas vidas, sempre respeitando sua vontade ou não de continuar, foram considerados sujeitos da pesquisa. Entre os idosos selecionados, não houve desistências de participarem do estudo.

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O quadro geral composto pelo número atribuído a cada história de vida, sexo, idade, escolaridade, idade de início do tabagismo, tempo de asilo e microuniverso mítico encontra-se exposto no Capítulo 6 desta dissertação.

1.4. Descrição do Espaço Pesquisado

A pesquisa foi realizada em uma Instituição de Longa Permanência para Idosos − ILPI − do Distrito Federal. A ILPI em apreço foi fundada em 7 de março de 1980 e possui caráter filantrópico. Em 2005, realizou convênio com a Secretaria de Estado de Ação Social, recebendo ajuda para custeio de suas despesas. A instituição sobrevive com recursos do Governo, por meio de repasses de verbas do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, com parte dos proventos dos idosos e com doações de voluntários.

Atualmente a ILPI abriga 148 idosos, todos com idade igual ou superior a 60 anos. Este asilo, assim como muitos outros de seu gênero, foi construído em blocos onde os idosos são separados por sexo e por situação de dependência física. No bloco “A” estão as idosas; no bloco “B” estão os idosos; e no bloco “C” estão os idosos e idosas acamados, aqueles com grau de dependência dita de grau III, idosos com dependência que requerem assistência em todas as atividades de autocuidado para a vida diária e/ou com comprometimento cognitivo (BRASIL, 2005).

O corpo funcional da instituição é composto por: responsável técnico; membros da direção; assistente social; psicóloga; nutricionista; e auxiliares de enfermagem, além dos cuidadores, perfazendo um total de 15 profissionais. Conta ainda com equipes de voluntários da comunidade e acadêmicos que realizam pesquisa e prestam serviço na instituição em dias alternados.

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equipe multiprofissional que trabalha na instituição e, no caso de agravos no quadro de saúde, são transportados à rede hospitalar. A ILPI possui condução para deslocamento dos idosos quando são realizados passeios e em necessidades hospitalares.

Os idosos residentes nessa instituição asilar podem receber visitas todas as tardes. No período da manhã são realizados serviços de limpeza e atendimento aos idosos acamados pela equipe de enfermagem. As saídas são permitidas, mas controladas pela direção. Este dado foi confirmado por Dona Zazá (N.º 4, Capítulo 4, p. 81), uma das idosas que se dispôs a participar da pesquisa, quando, no seu relato de vida, conta: “Eu não tenho toda liberdade para tá saindo, a casa se preocupa com

a gente”.

1.5. Trabalho de Campo  

Foram feitas de duas a três visitas semanais à ILPI em um período de um ano, pois, de acordo com Bertaux (1997), para se chegar à realidade objetiva do que é realmente importante na vida de uma pessoa, é preciso se concentrar na prática cotidiana, repetitiva.

Todos os encontros foram gravados, além de terem sido complementados por anotações no Diário de Bordo, consideradas as expressões faciais, posturas, trejeitos, lágrimas e sorrisos. Bertaux (1997) lembra que o gravador ignora gestos e expressões do rosto de seu interlocutor, coisas que podem dizer muito. Daí a importância do Diário de Bordo. Além disso, este estudo valeu-se da observação participante, da interação com o corpo funcional da instituição e, sempre que necessário, de entrevista semi-estruturada para retomar o fio, por vezes interrompido, no lembrar e contar a história, os fatos recordados de uma vida há muito tempo vividos.

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[...] desenvolve uma vida própria que se torna significativa, razoável e normal, desde que você se aproxime dela, e que uma boa forma de conhecer qualquer destes mundos é submeter-se à companhia de seus participantes [...].

De acordo com Tanus (2002), o pesquisador não deve procurar ser adotado ou integrado totalmente ao grupo social pesquisado, mas deve estar disposto a sentir junto, captar a visão de mundo por dentro do cotidiano, com atenção especial ao universo pesquisado.

A escuta das histórias de vida começou com uma questão inicial em que se perguntou ao idoso sobre sua disponibilidade em relatar sua vida, dando ênfase que o objetivo da pesquisa era conhecer as trajetórias de vida dos idosos tabagistas antes e após estarem vivendo na ILPI. Após esta introdução, a pesquisadora manteve-se em silêncio a maior parte do tempo, deixando que o idoso relatasse sua história em seu ritmo e como lhe conviesse. Mesmo que em alguns momentos fugisse um pouco do que foi proposto inicialmente, o idoso não era interrompido em seu relato, pois não se poderia perder a riqueza do improviso e a veracidade que somente a espontaneidade e a confiança são capazes de trazer.

Ao final dos relatos que, muitas vezes, se estendiam até por duas horas diárias e por vários dias, o gravador era desligado. Todavia, em dois ou três relatos foi preciso elucidar alguns pontos por meio de rápidas perguntas expostas de forma aberta, deixando sempre a possibilidade de o idoso dar continuidade ao seu relato interrompido. No caso de Dona Tatá (N.º 8, Capítulo 4, p. 109) foi preciso realizar a condução e várias reconduções da história para maior entendimento, pois esta apresentou incoerência no relato, o que identificou laivos de desestrutura em seu imaginário. Nesses momentos, era solicitado que ela explicitasse mais os pontos que não tinham ficado claros, o que nem sempre foi conseguido com sucesso.

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CAPÍTULO 2 − QUESTÕES de TEMÁTICA  

 

2.1. O Envelhecimento, a Velhice e o Velho: pontuações gerontológicas

Com o aumento do número de idosos em todo o mundo, o estudo do processo do envelhecimento humano passou a ser tema de interesse da sociedade acadêmica. Surge, então, no século XX, a Gerontologia, que se propõe a estudar a velhice de forma interdisciplinar e multidimensional (PAPALÉO NETO, In: FREITAS et al., 2002), considerando seus aspectos biológicos, psicológicos e socioculturais. O envelhecimento passa a ser visto como um processo global e complexo (Ibid., 2002). “O processo de envelhecimento não é privilégio da velhice, este é um processo dinâmico e progressivo que começa com o nascimento e termina com a morte” (PAPALÉO NETO, In: FREITAS et al., 2002, p. 5), processo permeado de mudanças morfológicas, funcionais, psicológicas, que se acentuam na velhice”. De acordo com Loureiro (In: FALEIROS; LOUREIRO, 2006) o envelhecimento não se configura em uma trajetória linear e única, mas se articula de forma complexa e multidimensional nas relações sociais e nas condições de vida.

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Assim, não só o tempo nos diz da velhice, mas também a cultura e o espaço devem ser considerados no seu entendimento.

As pessoas estão vivendo cada vez mais, fazendo crescer o contingente dos mais velhos entre os idosos. A partir desta nova realidade, foi preciso reclassificar a velhice em fases: as pessoas entre 65-75 anos são ditas jovens idosos; acima de 75 anos são os idosos-idosos; e os idosos mais idosos são aqueles sujeitos com mais de 85 anos, como sugere Johnson (In: DEBERT, 2004, p. 93), e “esta classificação daria ao envelhecimento recortes diferenciados mais significativos” (Ibid, 2004).

A velhice, dita “fragilizada”, irá necessitar de cuidados especiais (PERRACINE In: FREITAS et al., 2002.). Fenômeno comum entre os mais idosos é apresentar algum grau de dependência. Esses idosos irão demandar tratamento diferenciado, como moradia adaptada a seus déficits motores ou cognitivos e pessoas qualificadas e disponíveis a seu lado. Considerando que a sociedade moderna passa por mudança em seus arranjos familiares com famílias que estão diminuindo e as mulheres no mercado de trabalho (CAMARANO, 2005), quer dizer, não podem mais desempenhar o papel de cuidadoras, pode-se, então, compreender a procura crescente por Instituições de Longa Permanência para Idosos − ILPS. Estas instituições surgem neste cenário como “uma” opção de moradia.

Mesmo que a velhice não represente somente perdas, a sociedade moderna ainda enfrenta a dificuldade de dissociar a velhice da noção negativa de decadência física. Entretanto, a partir do século XX, nasce na sociedade a necessidade de discutir a questão da qualidade de vida da população idosa (DEBERT, 2004). Para que os idosos tenham uma boa condição de vida, é preciso que estes se adaptem a esta sociedade em transformação, mas também que tenham disposição para enfrentar os desafios e que lutem pelos seus direitos de cidadãos (NERI, 2000), mesmo estando em idade avançada.

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sujeito como um ser único, com sua história de vida, suas lembranças e seu caráter. Infelizmente, “a pessoa idosa virou o habitante da velhice” (Ibid., 1993).

Diferentes termos são empregados para indicar o ser humano com mais idade que os demais: ancião, velho, idoso, pessoa idosa. E para se referir à velhice nos valemos de expressões como “terceira idade”, entre outras (DEBERT, 2004). No fundo, todas se referem às conotações dadas pela sociedade às pessoas que viveram mais que as demais e que estão passando pelas transformações inerentes ao processo natural do envelhecimento. Beauvoir (1970) confirma esta dificuldade em definir esta heterogênea velhice, registrando em sua obra que é possível encerrar essa pluralidade de experiências da velhice num conceito, ou mesmo numa noção. Pelo menos, podemos confrontá-las uma com as outras, tentar destacar delas as constantes e dar as razões de suas diferenças.

Não é fácil ser reconhecido como velho nesta sociedade em que o belo, os aspectos físicos e a juventude eterna são tão almejados. Beauvoir (1970) exemplifica bem esta dificuldade quando diz que o velho é sempre o outro. E, segundo Loureiro (2000, p. 22), “é difícil se aperceber quando a velhice se instala em si mesmo”. Talvez esse repúdio ocorra pelo fato de a velhice ter sido estereotipada ao longo dos anos como uma fase de perdas, associada a incapacidades, degeneração e proximidade da morte. Nem sempre foi assim: nas sociedades tradicionais, o velho representava sabedoria, paciência e transmitia valores a seus descendentes (GOLDFARB, 2001).

O velho é, sobretudo, um ser humano como qualquer outro cidadão, com direitos e deveres, que não deve ser menosprezado nem infantilizado, como registra Loureiro (2000). O velho, apesar de sofrer com os estereótipos impostos pela sociedade, precisa continuar a viver e a aprender, pois ainda tem muita coisa a transmitir e também a receber dos mais jovens. Paula Carvalho (1995, p. 35), em reflexão sobre a dignidade humana do velho, lembra “estudiosos de mentalidades, que mostram como o velho e a velhice passam a ser construídos-produzidos socialmente como ‘alteridades’ passíveis de assim serem tratados”.

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reconhecimento do idoso, Debert (2004, p. 100) registra que “através da fala podemos dar dignidade a este idoso, tornando-o historiador”. O idoso institucionalizado precisa mais do que falar, precisa ser ouvido. Nesta pesquisa, a escuta procurou ser humana, paciente e cientificamente registrada, por falas muitas vezes truncadas, desconexas, destes sujeitos, na sua grande maioria sofrendo pela falta do convívio cotidiano de seus familiares e amigos, situação que muitas vezes reforçou o uso do cigarro.

2.2. A Velhice Asilada e o Asilo  

Pesquisar a questão asilar é ação investigativa complexa, pois a complexidade já se inicia pelas diferentes formas com que os asilos vêm sendo denominados em nosso País. Partindo deste pressuposto, este item se detém, antes de qualquer consideração, a conceituar o que é uma Instituição de Longa Permanência para Idosos − ILPI −, ou asilo.

De acordo com a história, no período entre a Idade Média e o Século XVIII – período dominado pela Igreja Católica e o Império – a noção de isolamento já estava presente. Mosteiros e conventos eram encarregados de se ocuparem dos pobres e mendigos. A institucionalização dos pobres nos asilos era uma forma de controlar a liberdade e de impor normas vigentes de maneira mascarada, de dar-lhes hábitos morais e de comportamento (FALEIROS, V., 2002). O primeiro objetivo dos asilos ou albergues era abrigar os pobres e os sem-família. Os idosos que não tinham apoio familiar eram colocados junto a mendigos e doentes mentais nas mesmas instituições (Ibid., 2002), não havia consideração com a pessoa idosa, os abrigos funcionavam como “depósito de pessoas”.

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porque precisamos delas. Neste contexto, enquadram-se também as Instituições de Longa Permanência para Idosos.

No Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2004, p. 67), consta que “asilo é uma instituição de assistência social que abriga crianças, doentes mentais e idosos com intuito de proteção e segurança”. Esta definição é complementada na definição de proteção e segurança dada pelo Decreto n.º 1.948, de 03/07/1996, que define asilo como sendo:

Uma forma de assistência social, sob o regime de internato, que acolhe idosos sem vínculo familiar, de modo a prover sua própria subsistência, satisfazendo as suas necessidades de moradia, alimentação, saúde e convivência social (BRASIL, 2007b).

No Brasil, a designação para o serviço de assistência ao idoso era asilo, mas atualmente recebe o nome de Instituição de Longa Permanência para Idosos − ILPI. De acordo com Resolução da Diretoria Colegiada da ANVISA (RDC/283, 2005), as ILPI são instituições governamentais e não-governamentais de caráter residencial, destinadas ao domicílio coletivo de pessoas com idade igual ou superior a 60 anos, com ou sem suporte familiar, em condição de liberdade, dignidade e cidadania. É uma opção a mais de moradia para os idosos (SCHARFSTEIN, 2006).

A instituição asilar pode não ser considerada uma instituição fechada, como coloca Goffman (2001, p. 15), já que os residentes podem muitas vezes sair para realizar atividades exteriores, mas tem muitas características destas. As rupturas com o meio exterior nestas instituições ocorrem porque novas regras são impostas aos residentes, há uma reorganização de atitudes de acordo com o novo meio cultural.

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A instituição asilar é carregada de estereótipos negativos, sendo designada por muitos como “Lar dos Velhinhos”, “Jardim” ou “Casa de Repouso”, termos estes sugeridos para minimizar o impacto de dizer “asilo”, talvez porque pensar que um idoso vive em um “lar” ou em uma “casa” seja menos difícil do que dizer que ele se encontra ilhado em situação asilar. Com estas denominações eufêmicas suavizamos nossos preconceitos e, quiçá, nossa consciência. Sendo assim, usamos de nossa imaginação para fugir desta realidade que não conseguimos aceitar. O repúdio pela palavra asilo existe pela imagem negativa que se criou, no imaginário coletivo, ao longo dos anos. Para Born (In: PAPALÉO NETTO, 2002, p. 403), nós associamos a palavra asilo a “um lugar sombrio, onde pessoas idosas inativas estão a esperar não sei o quê”. Loureiro anota em sua pesquisa sobre asilos (não-publicada), ao observar as mulheres asiladas:

Elas descansam, não se sabe do quê. Será da vida? Parecem descansar de um trabalho que há muito terminou, pois no asilo elas são impedidas, aquelas que querem, de executar tarefas na cozinha, por exemplo. Explicaram-me que é pelo perigo de elas se cortarem com a faca da cozinha, se queimarem no fogão ou sofrerem outro qualquer acidente, sem se dar conta que acidentes outros, mais profundos, podem estar resultando deste impedimento.

A inatividade ou a falta de atividade no asilo é queixa recorrente, fato que pode ser constatado nos registros das falas dos idosos da pesquisa, como no caso de D. Zazá: “... o problema é que aqui na ‘casa’ eu não faço nada... fico quebrando

mato.... E Seu Val, diz: “quando a gente vem para cá é para morrer, aqui é um

tédio.

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Na maioria das vezes, as instituições asilares subsistem por meio de filantropia, com ajuda de instituições religiosas e do trabalho voluntário. Há uma grande variedade de tipos de asilos, de diferentes organizações, para abrigar idosos, principalmente a parcela mais carente. Hoje existem outras formas de instituição para idosos, como vilas, hotéis e spas de luxo, disponibilizados, por preços altos, a uma fatia privilegiada da velhice. Existe também o empenho do setor governamental em melhorar as Casas Lares e os Centros Dia. Como diz Beauvoir (1970), como são várias e diferentes as velhices, as organizações dedicadas a elas também se diversificam. Convém relembrar que o asilo no qual foi realizada a presente pesquisa é uma instituição filantrópica que atende, principalmente, à parcela da população idosa mais carente.

As instituições asilares têm a função, como dito anteriormente, de cuidar e de trazer proteção aos idosos para que eles possam agir da forma mais autônoma possível. Conforme V. Faleiros (2002), pessoa autônoma é aquela com poder decisório, capaz de controlar sua vida. Mas, no asilo, nem todos os seus habitantes estão com suas condições de autonomia presentes; muitos já perderam sua independência, são fragilizados. A velhice fragilizada é comum principalmente entre os mais idosos (KARSH, 1998). Na instituição estudada nesta pesquisa os idosos com maior grau de dependência estão no Bloco “C” e representam mais de 40% do total.

A adaptação do idoso ao ambiente asilar é lenta e progressiva e, muitas vezes, ela não acontece. O idoso não sofre apenas o impacto da mudança de um espaço físico para outro. As mudanças são mais profundas, como a perda do “Lar”, do espaço afetivo, aquele que é carregado de emoções, das histórias de sua vida e de uma bagagem cultural própria de cada um.

Segundo Loureiro (Moléculas de Mundo, não-publicado):

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De acordo com Vieira (2003, p. 49), “habitar um local é apropriar-se de um espaço”. Muitas vezes esta apropriação não é necessariamente concreta, podendo o lugar tornar-se um espaço simbólico de um desejo ou uma idéia. Para Bachelard (1988, p. 5), “a casa é um ser privilegiado, uma unidade complexa, onde devem ser considerados as memórias, as lembranças e os sonhos; casa é corpo e alma”. Os idosos asilados re-significam os espaços do asilo, com suas emoções, sentimentos positivos e negativos, afetos e desafetos.

As Instituições de Longa Permanência para Idosos, em parte, têm buscado se adequar às mudanças ocorridas no cenário social e demográfico do País nos últimos anos; talvez essas mudanças sejam impulsionadas pelo aumento na demanda por instituições asilares. Muitas instituições já estão seguindo orientação gerontológica na sua projeção (BORN, In: PAPALEO NETO, 2002). Quanto à estrutura física, deve haver preocupação grande em adaptar o espaço asilar em algo confortável e seguro aos idosos. Born (In: PAPALEO NETO, 2002, p. 411) sugere que devem ser adaptados aos idosos desde “a cor das paredes até o mobiliário, assim como dispositivos de segurança, corredores com pisos antiderrapantes, corrimão e iluminação adequada, e pisos sem contrastes para evitar quedas”.

Na proteção ao direito ao bem-estar do idoso, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) lançou a Resolução n.º 283, de 28 de setembro de 2005, que estabelece o que deve constar em uma ILPI para que ela possa funcionar. São normas que delimitam o espaço físico adequado, alimentação, áreas de lazer e de integração entre a equipe funcional e os idosos. São resoluções como esta que vêm ajudando a melhorar a condição da velhice asilada. Atualmente, já está começando a surgir também o interesse em se formarem equipes multidisciplinares nos asilos. Mesmo que esta seja ainda uma realidade que não ocorra em todas as instituições asilares, as mudanças estão-se iniciando.

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Nesta dissertação, em outro espaço, será mostrado o registro das falas de idosos tabagistas asilados que confirmam o que descreve Debert.

2.3. O Tabagismo e suas Repercussões na Velhice

Como já foi dito anteriormente, a literatura acerca da questão do tabagismo em pessoas idosas é escassa, parece que ainda não existe grande preocupação por parte da sociedade acadêmica em aprofundar e debater essa questão, mesmo sendo um tema de relevância. Existem poucos estudos sobre a prevalência do tabagismo na terceira idade no Brasil e no mundo. Apesar da “suposta” falta de interesse por esses tabagistas, acredita-se que 10 a 11% da população geral de fumantes sejam de idosos (SILVA FILHO, 2007).

O tabaco surgiu aproximadamente no ano 1000 a.C nas sociedades indígenas da America Central e a partir do século XVI seu uso foi introduzido na Europa. No início do sec. XVIII inicia-se o uso do charuto na Europa, hábito que se expandiu para todos os continentes. Somente no século XIX surge o cigarro, sua expansão ocorreu após a Primeira Guerra Mundial, sendo difundido primeiramente entre homens. Em meados de 1945, após a Segunda Guerra Mundial, cresce o consumo entre as mulheres, não sendo ainda foco de interesse dos pesquisadores. Os primeiros estudos epidemiológicos surgiram em 1950 (HISTÓRIA DO TABACO, 2007).

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a reflexão em torno das leis de regulamentação da produção, da propaganda e do consumo do cigarro (BRASIL, 2007c).

O grande avanço dos anos 90 em diante é o surgimento de fármacos e psicoterapias no tratamento do tabagismo. De acordo com a comunidade médica internacional, fumar já não é visto como um hábito diferenciado e singular, não é mais associado à imagem de liberdade e independência. Pelo contrário, cada vez mais é identificado como um problema de saúde pública e, por isso, combatido como uma doença social.

“O Brasil juntamente com a Índia e os Estados Unidos produz cerca de 30% de todo o tabaco consumido no mundo” (KÜMPEL, 2005, p. 15). “Dentre estes países o Brasil se destaca como sendo o primeiro exportador global de fumo” (Ibid., 2005). Estes dados mostram a importância do tabaco para a economia brasileira, situação econômica que terá conseqüências sociais, pois por ser de valor acessível o cigarro é mais consumido pela parcela da população mais carente e por jovens.

O tabagismo pode ser ativo ou passivo. A situação passiva vem ocorrendo no asilo pesquisado, constatada in loco pela pesquisadora e confirmada pelos idosos em seus relatos. Seu Léo nos diz: “eu fumo em qualquer lugar, eu durmo com dois

amigos [...] fumo no quarto”.

Para a Organização Mundial de Saúde (OPAS/OMS, 2007) o tabagismo passivo é a terceira maior causa de morte evitável no mundo, subseqüente ao tabagismo ativo e ao álcool (IARC, 1987). De acordo com a OMS, o tabagismo passivo é a inalação de fumaça do tabaco por indivíduos não-fumantes, que convivem com fumantes em ambientes fechados. Na instituição visitada, os idosos fumantes dormem e convivem nos mesmos aposentos e locais comuns com os não-fumantes. Nem todos os fumantes respeitam a proibição declarada da instituição de não fumar nos quartos.

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depoimentos do seu Léo, que denuncia: “No asilo eu ganho cigarro, aqui tem

também pessoas que vendem para gente” e na fala de Seu Val: “Aqui tem vendedor

de cigarro”.

A questão econômica é de importância também quando se debate tabagismo e dependência química, pois o cigarro brasileiro é um dos mais baratos do mundo e de fácil acesso físico, chegando a todos os lugares com bastante facilidade (CAVALCANTE, 2005), levando a um problema social, já que, de acordo com dados de 2004 do Instituto Nacional de Câncer − INCA −, os tabagistas brasileiros são, em sua maioria, pessoas de classe social menos favorecida e de baixa escolaridade.

Mesmo sendo o tabaco uma droga considerada “leve”, estudo publicado por Nutt (2007), na revista The Lancet, mostra que a partir de nova classificação o tabaco deve ser considerado mais perigoso que a maconha. O tabaco foi considerado a 9.ª droga mais perigosa, ficando a maconha na 11.ª posição. Esta nova classificação baseou-se nos danos físicos causados ao usuário, na dependência e nos seus efeitos nas relações sociais (família e amigos).

Estudos realizados na Inglaterra mostraram que “adultos de 30 a 60 anos que fumam mais de 15 cigarros por dia, em cada dois apresentam sintomas respiratórios” (PACHÁ, 1980, p. 50). Esses dados vieram confirmar a importância do combate ao tabagismo em pessoas com mais de 60 anos, importância esta antes questionada em alguns estudos iniciais.

Em idade avançada, o fumo está associado a doenças como enfisema, bronquite crônica, câncer de pulmão e laringe (TARANTINO, 1976). Tabagismo e Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica − DPOC − são fatores predisponentes para o desenvolvimento de pneumonia adquirida na comunidade, por alterarem as defesas locais pulmonares, tais como a eliminação mucociliar (GOMES; PEREIRA, 2006). A DPOC afeta cerca de 10% da população mundial e, de acordo com a OMS, entre 15 a 20% dos fumantes, os que vão desenvolver DPOC, serão aqueles que consomem mais tabaco, são mais dependentes da nicotina e que nunca tentaram deixar de fumar.  

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De acordo com Kümpel (2005), uma pessoa que tenha fumado um maço cigarro/dia por 20 (vinte) anos tem expectativa de vida 20% (vinte por cento) menor que o não-fumante. A conseqüência na análise do tabagismo em idosos diz respeito à qualidade de vida, almejada por todos.

Silva Filho (2007) coloca-nos que para se chegar a uma velhice “saudável”, em boas condições físicas e psicológicas, é preciso ter algumas metas: promoção da saúde, manter-se ativo e a abstenção do tabaco. Ainda de acordo com o autor, para se tentar controlar o tabagismo e montar estratégias para ajudar os idosos que querem parar de fumar, é necessário conhecer os motivos pelos quais eles fumam. Deve-se pesquisar a questão ambiental, o fator familiar, socioeconômico e cultural, fatores que se relacionarão à qualidade de vida do indivíduo. Esta dissertação procurou explicitar os fatores da motivação para fumar, localizando nas histórias de vida o imaginário dos idosos tabagistas asilados, pois dele emergiram os mitos que os levaram a começar, a continuar ou a tentar deixar de fumar.

Os idosos tabagistas da atualidade são discriminados e “malvistos” socialmente por fumarem, mas não deve ser esquecido que a maioria desses começou a fumar em uma época em que se tolerava o fumo. Hoje são discriminados e recriminados pela sociedade e por familiares como se estivessem cometendo um crime. Sendo assim, quando se fala de tabagismo e dos fatores que envolvem o uso do tabaco em idosos, é preciso pensar que este é um tema complexo que vai além da questão saúde, engloba fatores socioculturais, a individualidade e a afetividade do sujeito.

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Para a empreitada da cessação do vício, a pesquisa IATO, já informada, à qual esta dissertação se vincula, composta por equipe multiprofissional, avalia funções cognitivas por meio do teste do minimental e a capacidade respiratória dos fumantes por meio da espirometria. Também está sendo verificada a taxa de gás carbônico no ambiente, com especial interesse pelo tabagismo passivo, e os tratamentos terão seqüência com o uso de medicamentos – adesivos de nicotina, bupropiona – e com terapia comportamental dos idosos tabagistas selecionados.

Assim sendo, esta dissertação vale-se das informações disponibilizadas no referido projeto, na constituição/seleção dos sujeitos e também nas suas considerações finais.

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PARTE II−PILARES TEÓRICOS

CAPÍTULO 3 − O IMAGINÁRIO  

Será aqui abordada de forma pontual a obra de Gilberto Durand (1989), que se fará presente na análise dos dados míticos colhidos. Foram integradas a esta base durandiana as colocações e os conceitos presentes na obra de Yves Durand (1988).

3.1. Conceituação

De acordo com DURAND, G. (1989, p. 14), “o imaginário é o conjunto das relações de imagens que constituem o capital pensado do homo sapiens”. Para Pitta (2005, p. 15), “o imaginário é a essência do espírito, levado pelo ato de criação do homem em sua totalidade (corpo, alma e sentimentos), enfim, é a raiz de tudo aquilo que, para o homem, existe”. Loureiro (2004, p. 16), baseado em Gilbert Durand, exemplifica o imaginário quando diz que este é “a arma dada ao homem para vencer a angústia do passar do tempo e o medo da morte”. De acordo com Mafessolli (2007, p. 53), o imaginário está presente na sociedade pós-moderna de uma forma diferente, como “um novo imaginário ‘societal’ que se fortalece pelas relações sociais, em que a importância está na reconciliação e não na crítica”, visão importante a ser considerada em uma pesquisa que trata de questões de velhice asilada e tabagismo, em que estereótipos e preconceitos estão ainda presentes, e a força societal faz-se presente.

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O imaginário está subjacente ao modo de ser, sentir e agir do indivíduo ou dos grupos, e as influências culturais do meio que interferem nesta visão de mundo pesam sobre estas ações. Seu estudo vai ajudar na compreensão do dinamismo das sociedades (NOGUEIRA, M.A.L, 2005) e na sua organização. Quando analisamos histórias de vida à luz da teoria do imaginário, como é feito na pesquisa em questão, é pertinente ressaltar que esta será feita pela análise dos mitos contidos em cada relato. De acordo com Pitta (2005, p. 20):

O mito vai transformar em linguagem, em relato (histórias), as escolhas feitas, e tal relato, por sua vez, vão organizar o mundo, estabelecer o modo das relações sociais, e seus personagens vão servir de modelo para ação cotidiana dos indivíduos.

Convém deixar claro que imaginário não é memória nem percepção e sim tudo isso junto. O imaginário não é signo vazio e sim a consideração do significado e do significante (DURAND, G., 1989).

3.2. Trajeto Antropológico  

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antropológico:

A incessante troca que existe no nível do imaginário entre as pulsões subjetivas e assimiladoras e as intimações objetivas que emanam, do meio cósmico e social (...); que tendem a mostrar vastas constelações de imagens, constelações praticamente constantes e que parecem estruturadas por certo isomorfismo dos símbolos convergentes. (DURAND, G., 1989, p.29)

 

Na noção de trajeto antropológico, conectam-se o pólo subjetivo da natureza humana com o pólo objetivo das manifestações culturais, que se relacionam por meio de esquemas arquétipos e símbolos. É neste processo dinâmico entre o interior e o exterior (entre pulsões e pressões do meio), dinamismo este organizador, que se formarão asimagens, as constelações de imagens.

3.3. Potência Organizativa  

O movimento organizador das imagens, o processo de permutação constante entre o interior, com suas pulsões subjetivas, e exterior, com suas pressões e intimações do meio, é dinâmico. E este dinamismo tem potência organizativa. Esta organização irá formar os arquétipos (LOUREIRO, 2004).As imagens constelam em nós aglutinadores que expressam as estruturas do imaginário. Jung (apud DURAND, G., 1989, p. 42) define arquétipo como sendo “uma zona onde nascem as idéias, as primeiras imagens de caráter coletivo e inato”. De acordo com Loureiro (2004 p. 16-17):

Os arquétipos irão se entrecortar, se misturar, se agrupar, resultando a possibilidade do estudo das imagens e de suas relações, das “estruturas simbólicas” e dos “Regimes” nas quais elas se encontram imbricadas [...]. Para conceber as estruturas antropológicas do imaginário Gilbert Durand toma por base a “reflexologia betchereviana”, com a noção de “gestos dominantes”, observando os recém-nascidos.

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G. Durand (1989, p. 41) diz que “que tendo em conta as notáveis convergências da reflexologia, da tecnologia e da sociologia, será fundamentado ao mesmo tempo sobre uma vasta bipartição entre dois Regimes do simbolismo, um regime diurno e outro noturno e sobre a tripartição reflexológica”.

Segundo Pitta (2005, p.22):

Gilbert Durand percebe no material que estuda duas intenções fundamentalmente diversas na base da organização das imagens: uma dividindo o universo em opostos (alto/baixo, esquerda/direita, feio/bonito, bem/mal, etc.), outra unindo os opostos, complementando, harmonizando. O primeiro é o regime diurno, caracterizado pela luz que permite as distinções, pelo debate. O segundo é o regime noturno caracterizado pela noite que unifica, pela conciliação.

O que caracteriza o Regime Diurno é a luz. O Regime Noturno representa-se pela noite aconchegante e/ou conciliadora. G. Durand (1989) conceitua o Regime Diurno como o regime das antíteses, das diferenças, sendo, portanto, polêmico, representado por meio das estruturas esquizomorfas ou heróicas do imaginário. “Este regime é pensado contra o semantismo das trevas, da animalidade e da queda” (DURAND, G., 1989, p. 130). E é nesta antítese contra as faces do tempo que este regime se representa: pela verticalização, pelo pensamento diairético, ilustrado pelos arquétipos do cetro e do gládio (Ibid., 1989).

A dominante postural (BETCHEREV apud, DURAND, 1989) identifica a localização da esquizomorfia situada no regime diurno das imagens. Esta estrutura aciona o ideário e a imaginária da purificação, da luta, do combate, da guerra, da análise, despertando, assim, simbolismo heróico (esquizomorfos), representados por armas, espadas, flechas, gládio (LOUREIRO, 2004, p. 17). Por tal, Yves Durand (1988) orienta, na análise dos protocolos do teste AT-9, ser fundamental observar a postura/posição que o elemento personagem ocupa no espaço/cenário da dramatização imaginada. E por analogia, na análise das histórias de vida relatadas nesta pesquisa, a postura também foi considerada.

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agrupam-se em duas estruturas: uma mística, formada em torno da noção de aconchego, e outra sintética, que concilia intenções de luta e de aconchego e expressa dualidade (LOUREIRO, 2004). No Regime Noturno, não há mais a ascensão em busca de poder, mas descida em busca de conhecimento (PITTA, 2005).

É possível exorcizar o tempo, medo da morte – face ameaçadora do tempo – sem ser pela antítese polêmica. No lugar de lutar, de fugir, de combater o monstro hiperbólico da angústia temporal, pode-se,

na interação de valores simbólicos, extirpá-lo ou acomodá-lo numa eufemização (DURAND, apud LOUREIRO, 2004, p. 18).

Os dois regimes que abrigam as três estruturas do imaginário (heróica, mística e sintética) têm como ponto fundamental a questão de como o homem e os grupos entendem a mortalidade e a angústia do passar do tempo. Segundo Y. Durand, (1988), esta angústia irá gerar três atitudes: pegar em armas e destruir o monstro (em atitude heróica); agir de maneira harmoniosa, sem pegar em armas (atitude mística), em que as armas podem estar presentes, mas não conseguem e não servem para matar o monstro ou este é eufemizado em seu tamanho ou poder, de maneira que possa ser despistado; conciliar as duas atitudes anteriores em uma estrutura sintética ou disseminatória com uma visão cíclica do tempo no qual toda morte é renascimento (atitude sintética).

Para melhor compreensão das imagens que compõem os regimes e as estruturas do imaginário, será apresentado a seguir o quadro com a classificação isotópica das imagens de G. Durand, (1989, p. 305).

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POLARIDADES Estruturas ESQUIZOMORFAS (ou heróicas) SITÉTICAS (ou dramáticas) MÍSTICAS (ou antifrásicas)

1ª idealização e «recuo» autístico.

1ª coincidência «oppositorium » e sistematização

1ª redobramento e perseveração.

2ª diairetismo (Spaltung). 2ª dialética dos antagonistas, dramatização.

2ª viscosidade, adesividade antifrásica.

3ª geometrismo, simetria,

giagantismo. 3ª historização 3ª realismo sensorial.

4ª antítese polêmica. 4ª progressismo parcial

(ciclo) ou total. 4ª miniaturização (Gulliver).

Princípios de explicação e de justificação ou lógicos.

Representação objetivamente heterogeneizante (antítese) e subjetivamente homogeneizante (autismo). Os Princípios de

EXCLUSÃO, de CONTRADIÇÃO, de IDENTIDADE funcionam plenamente.

Representação diacrónica que liga as contradições pelo fator tempo. O princípio de CAUSALIDADE, sob todas as suas formas (espec. FINAL e EFICIENTE), funciona plenamente.

Representação objetivamente homogeneizante (preservação) e subjetivamente heterogeneizante (esforço antifrásico). Os Princípios de ANALOGIA, de SIMILITUDE funcionam plenamente.

Reflexos dominantes

Dominante POSTURAL com os seus derivados manuais e o adjuvante das sensações à distância (vista, audiofonação).

Dominante COPULATIVA com os seus derivados motores rítmicos e os seus adjuvantes sensoriais (quinésicos, músico- rítmicos, etc.)

Dominante DIGESTIVA com os seus adjuvantes cenestésicos, térmicos e os seus derivados tácteis, olfativos, gustativos.

Esquemas (verbais)

DISTINGUIR LIGAR CONFUNDIR

Separar ≠

Misturar Subir ≠ Cair

Amadurecer Progredir

Voltar

Recensear Descer, Possuir, Penetrar

Arquétipos (atributos)

Puro ≠

Manchado Claro ≠ Escuro

Alto ≠ Baixo Para frente, Futuro

Para trás, Passado

Profundo, Calmo, Quente, Íntimo, Escondido

Situação das (categorias) do

jogo de tarots O GLÁDIO (O Cetro) O PAU

O

DENÁRIO A TAÇA

Arquétipos (substantivos)

A Luz ≠ As Trevas.

O Ar ≠ O

Miasma.

O Arma Heróica ≠ A Atadura. O Batismo ≠ O Mancha.

O Cunte ≠

Abismo.

O Céu ≠ O

Inferno. O Chefe ≠ O Inferior. O Herói ≠ O Monstro. O Anjo ≠ O Animal. A Asa ≠ Réptil.

O Fogo-chama O Filho. A Árvore. O Germe. A Roda. A Cruz. A Lua. O Andrógino. O Deus Plural. O Microcosmos. A Criança, O Polegar O Animal gigone A Cor. A Noite. A Mãe. O Recipiente. A Morada. O Centro. A Flor. A Mulher. O Alimento. A Substância.

Dos Símbolos aos Sistemas

O Sol, O Azul celeste,

O Olho do Pai, As Runas, O Mantra, As Armas, A Vedação, A Circuncisão,

A Escada de mão, A Escada, O Bétilo, O Campanário, A zigurate, A Águia, A Calhandra, A Pomba,

O Calendário, a Aritmologia, a Tríade, a Tétrade, a

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3.5. As Estruturas Antropológicas do Imaginário

A escola reflexológica de Betchrev com suas noções de gestos dominantes forma a base para fundamentar as estruturas antropológicas do imaginário (DURAND, G. 1989, p. 34). Betcherev (apud DURAND, G. 989) descobre, primeiramente, duas dominantes no recém-nascido humano. A primeira dominante é a de posição que coordena ou inibe todos os outros reflexos, ligada à verticalização do corpo; a segunda dominante é de nutrição que nos recém-nascidosse representa pelo movimento de sucção labial e de orientação correspondente da cabeça; e a terceira dominante, estudada mais tarde por Oufland, reflexo copulativo, de movimento de vai e vem observado em rãs adultas (DURAND, G., 1989). Do estudo destas três dominantes resulta o princípio fundamental da identificação das estruturas antropológicas, distribuídas nos dois regimes (diurno e noturno) (LOUREIRO, 2004, p.17). As estruturas do imaginário são: heróica ou esquizomorfa; mística ou antifrásica; e a estrutura sintética ou disseminatória. Pode ainda acontecer de a estrutura não se formar, acontecer a não-estrutura considerada como desestrutura do imaginário, em que as imagens não se aglutinam em torno de um ou de outro nó aglutinador. Elas aparecem sem a coerência mítica buscada.

Como esta dissertação tem como um de suas bases os estudos de Yves Durand (1988), serão descritos a seguir as particularidades encontradas pelo autor em cada universo mítico descrito por G. Durand (1989). Estas são resultados de observações feitas por Y. Durand (1988) após a aplicação do Arquétipo Teste de Nove Elementos-AT9. Segundo Chaves (2000, p.19) “é o AT-9 instrumento de sociodiagnóstico criado por Yves Durand, a partir da estruturas do imaginário propostas por Gilberto Durand".

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Yves Durand (1988) considera que as estruturas descritas por Gilbert Durand (heróica, mística ou sintética) não são rígidas e, portanto, propõe subdivisões para elas. Estare-classificação é utilizada nesta pesquisa no momento das análises das histórias de vida.

Segundo Y. Durand (1988), o universo heróico se caracteriza pela ação heróica do personagem. De acordo com o autor a estrutura temática gira em torno de três elementos: personagem – espada – monstro. O monstro é geralmente valorizado, ameaçando a personagem (obstáculos, perigos na vida e na habitação). Há sempre um combate para se defender ou atacar o perigo; a espada será utilizada. O modo como a espada será utilizada e como termina o combate é que irá mostrar se a solução para esse universo mítico ocorreu de forma positiva ou negativa (Ibid., 1988).

O universo heróico na “forma positiva” caracteriza-se por combate com vitória do herói sobre o monstro. Já no heróico em sua “forma negativa” o combate é fatal para o personagem, a espada pode trair o personagem, o herói morre ou foge (DURAND, Y, 1988). Ainda segundo o criador do teste, o microuniverso heróico pode ser: heróico integrado, heróico impuro, super heróico, ou heróico distendido.

No super-heróico o combate é realizado por todos os elementos; no heróico integrado o monstro aparece hiperbolizado, o combate está presente, mas pode-se vislumbrar o refúgio; no heróico impuro o tema heróico é predominante, mas existe falta de lógica na colocação de alguns elementos. O regime noturno, em alguma forma, também é considerado; no heróico descontraído ou distendido falta a coerência simbólica, pois símbolos místicos agregam-se aos heróicos e à tensão diminui (LOUREIRO, 2004, p. 27).

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Na estrutura mística integrada, todos os elementos integram-se sobre o tema místico, realizando constelação simbólica perfeitamente isomórfica (DURAND, Y., 1988). Os elementos giram em torno de uma vida calma.

Na estrutura super-mística a síntese é incompleta: falta o elemento monstro. Na estrutura mística impura, mesmo que o monstro e a espada estejam presentes estes não servem para nada, não são úteis para o personagem. Na estrutura mística lúdica como no heróico distendido há uma diminuição da intensidade funcional do tema místico de base (DURAND, Y., 1988, p. 92-94).

No Universo Sintético, o personagem participa de um universo duplo: heróico e sintético. Podendo esta situação ocorrer de forma sincrônica ou diacrônica. Segundo Loureiro (2004, p. 27):

A estrutura disseminatória ou sintética pode-se expressar de maneiras diferentes: bipolar (os temas anteriores se atualizam, ao mesmo tempo, numa sincronia), e polimorfa (a ação acontece no correr do tempo, historicamente, diacronicamente, numa trama histórica).

Vale registrar que em alguns casos serão encontrados universos míticos que irão fugir das categorias arquetipológicas expostas anteriormente. Existe o imaginário que se apresenta de forma desestruturada (elementos sem ligação alguma). Os subgrupos não estruturados (os elementos não estão ligados entre si, mas podem ser estruturados como subgrupo) e os pseudo-desestruturados (os elementos não se agrupam, mas cada elemento tem um valor simbólico) (PITTA apud, LOUREIRO, 2004, p. 29).

Referências

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