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Na luta é que a gente se encontra : um roteiro sobre a construção do letramento midiático geográfico no ensino médio público

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Academic year: 2021

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(1)

BRUNO CUTER ALBANESE

“NA LUTA É QUE A GENTE SE ENCONTRA”:

UM ROTEIRO SOBRE A CONSTRUÇÃO DO LETRAMENTO

MIDIÁTICO GEOGRÁFICO NO ENSINO MÉDIO PÚBLICO

CAMPINAS,

2020

(2)

“NA LUTA É QUE A GENTE SE ENCONTRA”:

UM ROTEIRO SOBRE A CONSTRUÇÃO

DO LETRAMENTO

MIDIÁTICO GEOGRÁFICO NO ENSINO MÉDIO PÚBLICO

Tese de doutorado apresentada ao Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do título Doutor em Linguística Aplicada na área de Linguagem e Educação.

Orientadora: Profa. Dra. Claudia Hilsdorf Rocha

Este exemplar corresponde à versão final da Tese defendida pelo

aluno Bruno Cuter Albanese e

orientada pela Profa. Dra. Claudia Hilsdorf Rocha

CAMPINAS 2020

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Leandro dos Santos Nascimento - CRB 8/8343

Albanese, Bruno Cuter,

1992-AL13n Alb"Na luta é que a gente se encontra" : um roteiro sobre a construção do letramento midiático geográfico no ensino médio público / Bruno Cuter Albanese. – Campinas, SP : [s.n.], 2020.

AlbOrientador: Claudia Hilsdorf Rocha.

AlbTese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Estudos da Linguagem.

Alb1. Letramento midiático. 2. Educação geográfica. 3. Crítica. 4. Criatividade. I. Rocha, Claudia Hilsdorf. II. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Estudos da Linguagem. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: "Fighting is where we meet": : a script of the construction of geographic media literacy in a public high school

Palavras-chave em inglês: Media Literacy

Geographic education Criticism

Creative ability

Área de concentração: Linguagem e Educação Titulação: Doutor em Linguística Aplicada Banca examinadora:

Claudia Hilsdorf Rocha Cynthia Agra de Brito Neves Petrilson Alan Pinheiro da Silva Fabiana Poças Biondo Araújo Walkyria Maria Monte Mor Data de defesa: 30-10-2020

Programa de Pós-Graduação: Linguística Aplicada

Identificação e informações acadêmicas do(a) aluno(a)

- ORCID do autor: https://orcid.org/0000-0002-9646-2263 - Currículo Lattes do autor: http://lattes.cnpq.br/3957167838331604

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Cláudia Hilsdorf Rocha

Cynthia Agra de Brito Neves

Petrilson Alan Pinheiro da Silva

Fabiana Poças Biondo Araújo

Walkyria Maria Monte Mor

IEL/UNICAMP 2020

Ata da defesa, assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta no SIGA/Sistema de Fluxo de Dissertação/Tese e na Secretaria de Pós Graduação do IEL.

(5)

Cora Coralina, minha poetisa favorita, dizia que suas raízes brotavam das cordas de uma lira. Como ela, as minhas raízes, que me nutrem e me sustentam, também saem de uma lira cheia de cordas. Catorze cordas femininas, fortes, corajosas, doces e profundas como Anas Terra, Bibianas, Olívias e Aurélias. Dedico esta tese às cordas da minha lira:

Adriana, por tão bravamente escolher ser minha mãe; Terêsa, pelo amor incondicional; Helena, por dividir comigo seu amor pelos livros; Cristina, por cuidar de mim; Roberta, por me fazer sempre morrer de rir; Immaculada, por me guiar para o mundo das Letras; Carmen, por ter me tornado um professor; Cláudia, por me orientar para minha própria subjetificação; Cynthia, pela confiança em tantas parceiras; Fabiana, pelos ouvidos de irmã mais velha; Jéssica, pelo companheirismo carinhoso; Mônica, por compartilhar todas as minhas angústias; Bruna, por acreditar em mim mais do que eu mesmo; E, por fim, a Pacotinho, pelo presente de ser seu irmão.

(6)

Nenhuma reflexão, oração ou vírgula que se encontra nesta tese poderia estar aqui sem o altruísmo da participante desta pesquisa, a professora Roberta. Infelizmente, não posso revelar o seu nome verdadeiro. Mas quero deixar meu profundo agradecimento por sua imensa generosidade em abrir as portas de sua sala de aula e, verdadeiramente, me acolher. Em você e na sua luta, encontrei fonte de inspiração para escrever este trabalho. O relacionamento de respeito e confiança que construímos para desenvolver esta pesquisa é, com toda certeza, uma das minhas maiores conquistas.

Também quero agradecer às alunas e aos alunos que aceitaram fazer parte dessa jornada, por serem igualmente generosos e por dividirem um pouco de suas vidas comigo. Conhecê-los me fez acreditar ainda mais na importância da pesquisa em sala de aula como uma forma de luta por um mundo mais justo.

(7)

Para escrever uma tese é preciso de referências teóricas, ou seja, tomar da palavra de outros pesquisadores para interpretar os seus dados em vista de contribuir para o desenvolvimento da compreensão do mundo em um processo cíclico e infinito de expansão do conhecimento. Para o doutorando que escreve a tese é preciso o que Geraldi (1990) nomeou como as referências do coração, ou seja, receber as palavras de amor de familiares e amigos para enfrentar os desafios de se tornar um pesquisador. Esta tese precisou de mim para ser escrita. Eu precisei de muitos para conseguir escrevê-la. Eis minhas referências do coração: ALBANESE et al. Minha irmã, meus tios, minhas tias, minha madrasta e meus primos e primas, por me ensinarem o valor de estar juntos e celebrar a vida.

ALBANESE, Maria Helena C. Minha avó. Por ser uma guerreira que me ensinou o gosto das palavras e por ser o meu exemplo de garra.

ALBANESE, Rodrigo C. Meu pai, que como seu pai foi, é o melhor pai do mundo. Tenho certeza que o vovô Marsyl está orgulhoso de nós dois.

BIONDO ARAÚJO, Fabiana P. Minha irmã mais velha que a vida me deu. Foi um privilégio poder acompanhar sua jornada em se tornar a grande pesquisadora que você é, aprendendo com os seus passos e dividindo com você minhas dificuldades. Quando crescer, quero ser igual a você.

BOLOGNINI, Carmen Z. Minha querida professora e minha primeira orientadora. A você devo todos os valores e toda a base que me guiam como professor. Como também o despertar da minha vontade por pesquisar. Cada palavra doce que dividiu comigo estão guardadas na minha memória. Princesas da Disney têm fadas madrinhas. Eu, por sorte, tenho você.

CANDIDO, Nádia F. & FRANCHISCHINELLI, Laís Marina. Minhas loucuras mais queridas. Entre os muitos rolês errados em que nos colocamos ou em que acabamos caindo, vocês sempre me levaram a achar o riso. Pelo desprendimento e pela coragem, vocês sempre me ensinaram a levar a vida de forma mais leve e, algumas vezes, de forma mais absurda.

CAPES. O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior -Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001

CARVALHO, Stênio C. Minha mana. Dos formatos tortos que começamos a de fato conversar, não estava previsto que virássemos amigos. Porém com seu coração canceriano cheio de respeito e sensibilidade, foi fácil querer estar perto de você. Foram aninhos complicados para nós dois, mas que sorte poder crescer junto com você.

CORAZZA, Bruna X. Minha gêmea que nasceu separada, mas a vida me deu de volta. Mesmo dividindo o mesmo nome, os mesmos signos, a mesma profissão, a mesma pós-graduação, o mesmo professor de pilates, a mesma terapeuta, o mais importante ainda assim é poder dividir

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com você quem eu realmente sou. Obrigado por ser esse humano elevado que escuta sem julgamentos e me leva a me sentir sempre melhor comigo mesmo.

CUTER, Adriana M. Minha mãe, minha amazona Pelo orgulho (exacerbado) com que sempre me estimulou e por me ensinar a ser um pouco louco na busca para ser quem eu sou.

CUTER, Antônio F. & CUTER, Maria Terêsa. Meus avôs, meus heróis. A ele por ser o maior exemplo de integridade e fé. A ela por ser uma fortaleza, com cabeça elétrica e, sem dúvida, com o maior coração que esse mundo já viu.

CUTER et al. Meus tios, meu padrasto, meu primo e minhas primas, por construirmos relacionamentos de tantos cuidados, apesar de dividirmos os mesmos defeitos.

DORTA, Jéssica V. Meu encontro de alma. Como eu sempre digo, te amo desde o momento que te vi, porque te reconheci. Reconheci o muito que temos em comum: a nossa criatividade que nos faz ver o que ninguém vê até a procrastinação que nos faz ser os executores mais atrapalhados das melhores ideias. Porém também reconheci em você as muitas qualidades que eu não tenho. Sou aprendiz do seu amor.

FIAD, Raquel S. Minha querida professora. Obrigado por ser um exemplo de sabedoria. Uma mãe terra para tantos dos seus alunos que, como eu, puderam e podem contar com seus conselhos e palavras de salvação.

FRANCISCHINELLI, Immaculada O. & PECCHIO, Juliana C. Minhas amigas de sala de aula. Por dividirmos nossas histórias, alegrias e frustrações em nossos cafés e entre uma aula e outra. Obrigado por me confortarem em momentos que ser professor e pesquisador ao mesmo tempo parecia impossível.

GABARDO, Maristella. Meu encontro de similaridades. Somos baixinhos. Somos gordinhos. Nossos olhos fecham quando a gente ri. Falamos alto. Rimos mais alto ainda. Gostamos de desfrutar dos prazeres da vida. Gostamos da boemia. Não temos muitas papas na língua. Sempre acabam saindo algumas alfinetadas. Mas a gente se entende, porque a gente sabe as dores e as delícias de ser quem a gente é.

GRANDO, Keila. Minha parceira nos desencontros. Nesses caminhos da nossa formação, tivemos que superar as mesmas adversidades. Tudo foi muito mais fácil podendo dividir esses momentos com você e compreendendo as lições que podíamos aprender nessas situações. KWARST, Anamaria. Minha terapeuta. É quase um clichê sociológico o agradecimento do pós-graduando a seu ou a sua analista. Porém há uma razão dele existir: os caminhos do doutoramento nos levam a encontros desafiadores com nós mesmos, momentos em que pude contar com a sua capacidade em me conduzir pelas batalhas contra a ansiedade.

MONTE MOR, Walkyria; BRAGA, Denise. LUCENA, Maria Inês; & LINS, Heloísa. Professoras-pesquisadoras que muito admiro e que perpassaram pela minha trajetória acadêmica em momentos diferentes. É uma grande honra poder contar com a participação de

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NEVES, Cynthia A. B. Minha grande parceira acadêmica. Nossa história de amizade começa de uma forma tão improvável, mas, como todas as histórias que tinham que ser, a vida foi nos dando chances de nos encontrar. Em alguns momentos mais de longe e em outros bem de perto, você vem sendo meu anjo da minha jornada. Só tenho a agradecer pela proteção, pela confiança e pelo carinho.

NOVAIS, Murilo A. Meu eu de você. Nossa jornada começou junto com os momentos de maior dificuldade de desenvolvimento deste trabalho, mas, mesmo tão novo, você foi abrigo e aconchego para o meu coração aflito com seu olhar carinhoso, seu abraço gostoso, me deixando passear no seu céu.

OLIVEIRA, Yara M. P. Minha primeira grande amiga. Dos quatro anos de idade até agora e do agora até o fim é como posso descrever nossa relação. Às vezes um pouco longe, às vezes mais de perto, crescemos e viramos gente com o apoio um do outro. E que isso nunca se acabe. Não tem ponto final que dome nossa amizade.

PINHEIRO, Petrilson. Meu orientador do mestrado. Eu ainda era um menino da graduação, quando você aceitou me orientar no mestrado e me introduziu aos estudos dos multiletramentos. Muito obrigado por continuar a me acompanhar mesmo não sendo mais seu orientando e por fazer parte da banca final desta tese.

ROCHA, Claudia H. Minha orientadora. Referência teórica de tantas reflexões deste trabalho, mas é, principalmente, uma referência de como estar na academia sendo humana. Obrigado pela acolhida em um dos momentos mais decisivos da minha vida e por restabelecer o meu prazer por pesquisar. Como taurinos, sabemos como é difícil para nós demonstramos fragilidade. Jamais esquecerei o carinho com que você tomou conta de mim.

SIQUEIRA, Elis N. N. Minha amiga e leitora crítica. Sendo o taurino orgulhoso e teimoso que sou, tive a sorte de te encontrar e poder construir uma relação de enorme confiança com você, podendo contar com seus conselhos, acadêmicos e pessoais, sempre sinceros e, ao mesmo tempo, tão doces quanto você, que fizeram de mim um acadêmico e uma pessoa melhor. STAFFETTI, Gian. Meu grande e melhor amigo. Se nem os três anos dividindo uma suíte em república nos separaram, não seria o Atlântico que ia conseguir essa proeza. Eu vou ser sempre a Dolores da sua Cidinha. Obrigado por ser meu irmão e me deixar ser seu confidente. Sinto sua falta sempre, não há companhia como a sua.

VENTURINI, Mônica S. Meu oposto complementar. Seja nos momentos mais dramáticos a la Usurpadora ou nos momentos de mais alegria a la Don’t Stop me Now, você é o total eclipse of my heart. Obrigado por ser a escorpiana que entende todas as nuances desse meu coração taurino, estando do meu lado sempre.

ZOMER, Ályda H. Minha parceira de jornada. Desde o processo seletivo do mestrado até a defesa desse doutorado, viemos lado a lado. E que sorte foi a minha! Seja pela pesquisadora

(10)

sensacional que você é, seja pela amiga que torna tudo mais leve, essa caminhada foi muito mais especial por ter você compartilhando comigo cada passo do caminho.

E há tantas outras pessoas incríveis que tive o prazer de conhecer e compartilhar momentos que tornaram todos esses anos mais bonitos: Ana Carolina Agnolini, Paulo Salvador, João Gatti, Glauber Sampaio, Laerte Neto, Helena Camargo, Tatiana Gabas, Gustavo Javocone, Ricardo Marques, Sérgio Marino, Aline Corazza, Aline Pereira, Maria Loyola, Gabriela Claudino, Elaine Moraes, Claire Quirino, Cilmara Esteves, Renata Ming, Luciana Vaccari, Simone Boff e Benedita Searlini. A todos vocês obrigado por me deixarem fazer parte de suas vidas e acrescentarem tanto a minha, tornando minhas escolhas pela docência e pela pesquisa, com toda a certeza do mundo, as escolhas mais acertadas que fiz.

(11)

“Respeito muito minhas lágrimas Mas ainda mais minha risada Inscrevo, assim, minhas palavras

Na voz de uma mulher sagrada”

(12)

RESUMO

Situado nas margens entre o campo aplicado dos estudos da linguagem e o campo da educação geográfica, o objetivo central desta tese é investigar como se realizam e são vivenciadas as práticas educativas propostas por uma professora de Geografia, as quais envolvem a produção de um documentário curta-metragem por alunos do Terceiro Ano do Ensino Médio de uma escola pública do interior do Estado de São Paulo. Para tal, analisamos os pontos de tensão entre perspectivas educacionais (COPE & KALANTZIS, 2012) e como essas visões impactam o processo de construção do letramento midiático geográfico. Dessa forma, realizou-se um estudo de caso (YIN, 2005) do tipo etnográfico (ANDRÉ, 1995) que acompanhou a professora e os alunos durante o desenvolvimento do projeto, por meio da observação participante, de entrevistas, além da coleta de artefatos físicos. Os dados são analisados à luz das proposições sobre o letramento midiático crítico e criativo (DOUGLAS & SHARE, 2007; BUCKINGHAM, 2010; CONNOLY & READMAN, 2017) em diálogo com postulados freireanos (FREIRE, 2017), teorizações sobre a pedagogia da interrupção (BIESTA, 2012, 2016) e a pedagogia dos multiletramentos (GRUPO DE NOVA LONDRES, 1996; COPE & KALANTZIS, 2012). Os resultados das análises demonstram que as tensões emergem de modo mais perceptível no que se refere a: políticas curriculares e perspectivas educacionais; práticas de ensino e experiências de aprendizagem; políticas curriculares e práticas de ensino; objetivos educacionais e práticas de ensino. Essas tensões ora orientam mais fortemente para a construção do letramento midiático de modo autônomo, como um conjunto de habilidades para a produção de mensagens midiática, ora para a construção do letramento midiática crítico e criativo, como um conjunto de práticas de engajamento com a pluralidade e a transformação de discursos. Nesse sentido, as considerações finais apontam para importância de se ampliarem possibilidades de realização estratégica de projetos educativos visando ao fortalecimento da relação entre o potencial crítico e criativo da produção midiática e os letramentos em geografia, para que o ensino geográfico (DI PALMA, 2009; MARCUS & STODDARD, 2009;) possa evidenciar-se mais visivelmente transformativo e libertário e, assim, possa mobilizar dinamicamente as diferentes funções educativas, quais sejam a qualificação, a socialização e a subjetificação (BIESTA, 2012, 2016).

(13)

ABSTRACT

Nestled in the margins between the applied field of language studies and geographic education, the main objective of this dissertation is to investigate how educational practices proposed by a geography teacher are carried out and experienced. Among them, one specifically involves the production of a short documentary by the third secondary year high school students from a public school in the Brazilian state of São Paulo. To this end, we analyzed the tension points between educational perspectives (COPE & KALANTZIS, 2012) and how these views had an impact on the process of building geographic media literacy. Thus, we carried out an ethnographic (ANDRÉ, 1995) case study (YIN, 2005) in which we observed the teacher and some of her students throughout the development of the project. Data generation occurred through participant observation, interviews, and the collection of artifacts as well. Data analysis was carried out in the light of the propositions about critical and creative media literacy (DOUGLAS & SHARE, 2007; BUCKINGHAM, 2010; CONNOLY & READMAN, 2017) in dialogue with Freire's postulates (FREIRE, 2017), theorizations about the pedagogy of interruption (BIESTA, 2012, 2016) and the multiliteracies pedagogical approach (THE NEW LONDON GROUP, 1996; COPE & KALANTZIS, 2012). The results show that tensions emerge more noticeably concerning: curriculum policies and educational perspectives, teaching practices and learning experiences, curricular policies and teaching practices, educational objectives, and teaching practices. Such tensions now lead more strongly to autonomously constructing media literacy as a set of skills for the production of media messages, now to the construction of critical and creative media literacy as a set of engaging practices based on the plurality and the transformation of discourses. For that matter, the final considerations plead in favor of the importance of expanding possibilities for the strategic development of educational projects aimed at strengthening the relationship between the critical and creative potential of media production and literacies in geography. By doing that, geographic teaching (DI PALMA, 2009; MARCUS & STODDARD, 2009) might become more visibly transformative and liberating and, thus, dynamically mobilize the different educational functions, namely qualification, socialization and subjectification (BIESTA, 2012, 2016).

(14)

LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 - AVATAR DA PROFESSORA ROBERTA ... 21

FIGURA 2 - NÚCLEOS DO DESGOVERNO BOLSONARO ... 51

FIGURA 3 - RELAÇÃO DAS TRÊS DIMENSÕES DA EDUCAÇÃO. ... 69

FIGURA 4 - MAPA DAS FILMAGENS NA SALA DE AULA ... 113

FIGURA 5 - COMPOSIÇÃO DOS REGISTROS COLETADOS EM CAMPO ... 121

FIGURA 6 - PLANTA DA ESCOLA ... 124

FIGURA 7 - MINHA PRIMEIRA CONVERSA COM ROBERTA ... 129

FIGURA 8 - GRUPO 1 ... 136

FIGURA 9 - GRUPO 2 ... 138

FIGURA 10 - GRUPO 3 ... 140

FIGURA 11 - GRUPO 4 ... 143

FIGURA 12 - GRUPO 5 ... 144

FIGURA 13 - PROPOSTA DE ORGANIZAÇÃO DO ENSINO ... 153

FIGURA 14 - TRECHO DO PROJETO ... 159

FIGURA 15 - CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO DOS CURTAS ... 163

FIGURA 16 - FOTO DO MATERIAL DO CURRÍCULO ESTADUAL PAULISTA ... 184

FIGURA 17 - TRECHO 1 DO PROJETO ... 204

FIGURA 18 - TRECHO 2 DO PROJETO ... 205

FIGURA 19 - FOTO DO MATERIAL DIDÁTICO DA AULA 16 ... 231

FIGURA 20 - CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO E PESOS ... 268

FIGURA 21 - LINHA DO TEMPO (GRUPO 2) ... 288

FIGURA 22 - CENA DO DOCUMENTÁRIO (GRUPO 2) ... 291

FIGURA 23 - TRECHO DO DOCUMENTÁRIO (GRUPO 2) ... 292

FIGURA 24 - LINHA DO TEMPO (GRUPO 3) ... 300

FIGURA 25 - CENA DO DOCUMENTÁRIO (GRUPO 3) ... 302

(15)

LISTA DE QUADROS

QUADRO 1 - DIMENSÕES E EFEITOS DAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS ... 54

QUADRO 2 - COMPETÊNCIAS E HABILIDADES DO LETRAMENTO MIDIÁTICO ... 86

QUADRO 3 - CONCEITOS E ABORDAGENS EDUCATIVAS DO LETRAMENTO MIDIÁTICO ... 103

QUADRO 4 - DESCRIÇÃO DAS ETAPAS DE PESQUISA POR SEMANA ... 119

QUADRO 5 - PRIMEIRO MODELO DE ROTEIRO ... 161

QUADRO 6 - SEGUNDO MODELO DE ROTEIRO ... 161

QUADRO 7 - ETAPAS DE DESENVOLVIMENTO DO PROJETO DE ENSINO ... 164

QUADRO 8 - ORGANIZAÇÃO E SELEÇÃO DAS EVIDÊNCIAS PARA ANÁLISE ... 167

QUADRO 9 - CRITÉRIOS DE ANÁLISE DOS DADOS ... 175

QUADRO 10 - DESCRIÇÃO DO DOCUMENTÁRIO (GRUPO 2) ... 289

QUADRO 11 - DESCRIÇÃO DO DOCUMENTÁRIO (GRUPO 3) ... 301

(16)

SUMÁRIO

APAGAM-SE AS LUZES ... 18 UM POUCO DE HISTÓRIA ... 19 ABERTURA ... 25 CONSTRUINDO O ARGUMENTO ... 26 A EXPANSÃO DO OLHAR ... 32

O PONTO DE VIRADA: OS OBJETIVOS DA MINHA PESQUISA ... 36

O PORQUÊ DE CONSTRUIR ESSE ROTEIRO ... 39

ATO I ... 44 1. UM LUGAR DE CURA ... 45 1.1 CENA 1: O NAUFRÁGIO ... 46 1.2 CENA 2: O BOTE ... 58 1.3 CENA 3: A PAISAGEM. ... 72 1.4 CENA 4: A SEMENTE ... 82 2. MISE EN SCÈNE ... 104 2.1 O TIPO DE ROTEIRO ... 105 2.2 O PLOT ... 110 2.2.1 OBSERVAR ... 111 2.2.2 ENTREVISTAR ... 115 2.2.3 COLECIONAR ... 117

2.2.4 CRONOGRAMA DE EXECUÇÃO DO TRABALHO DE CAMPO ... 118

2.3 OS ELEMENTOS DA NARRATIVA ... 121

2.3.1 O CENÁRIO ... 122

2.3.2 UMA PERSONAGEM (EM) ESPECIAL ... 129

2.3.3 AS OUTRAS PERSONAGENS, NÃO MENOS PROTAGONISTAS ... 134

3. RUBRICAS DE CENA ... 148

3.1 CENA 1: A ABORDAGEM ... 149

3.2 CENA 2: O PROJETO... 158

3.3 CENA 3: A MONTAGEM ... 165

ATO II ... 177

(17)

4.1 CENA 1: POLÍTICAS CURRICULARES E PERSPECTIVAS EDUCACIONAIS EM

TENSÃO ... 182

4.2 CENA 2: PRÁTICAS E EXPERIÊNCIAS DE ENSINO E APRENDIZAGEM EM TENSÃO ... 200

5. OS CAMINHOS EM INSTRUÇÕES ABERTAS ... 225

5.1 CENA 1 POLÍTICAS CURRICULARES E PRÁTICAS DE ENSINO EM TENSÃO ... 226

5.2 CENA 2: OBJETIVOS EDUCACIONAIS E PRÁTICAS DE ENSINO EM TENSÃO ... 232

5.2.1 O ENSINO DO GÊNERO ROTEIRO ... 233

5.2.2. O ENSINO DO GÊNERO DOCUMENTÁRIO ... 242

5.3 CENA 3: PRÁTICAS DE ENSINO E EXPERIÊNCIAS DE APRENDIZAGEM EM TENSÃO ... 252

5.3.1 O DOMÍNIO DE FERRAMENTAS DE EDIÇÃO ... 253

5.3.2 O MODELO DE AVALIAÇÃO EM TENSÃO ... 260

6. PONTOS DE CHEGADA EM PRÁTICAS TRANSFORMADAS ... 271

6.1 CENA 1: A PLURALIDADE EM TENSÃO ... 272

6.2 CENA 2: A CRIATIVIDADE E A CRITICIDADE (OU VICE-VERSA) EM TENSÃO ... 283

DESFECHOS ... 315

7. NA LUTA, A GENTE SE ENCONTRA ... 316

CENA 1: CONSTRUINDO PONTES COM O ENSINO DE GEOGRAFIA ... 321

CENA 2: REPENSANDO O ENSINO DO LETRAMENTO MIDIÁTICO EM LINGUÍSTICA APLICADA ... 323

CENA 3: CONSIDERAÇÕES PARA UM CONSTANTE DIÁLOGO COM ROBERTA ... 325

CENA 4: SOBRE ME TORNAR PRESENTE ... 326

SOBEM OS CRÉDITOS ... 330

(18)

APAGAM-SE AS LUZES

1

1 Os desenhos que abrem cada uma das partes desta tese são de autoria do aluno

Raí, participante desta pesquisa. A meu pedido, o aluno fez seis ilustrações que contam o processo de produção dos documentários.

(19)

UM POUCO DE HISTÓRIA

2

O filme Em busca do Vale Encantando, um dos filmes que teve grande importância na minha história com os letramentos para além da letra e que fez eu me apaixonar ainda criança pelo cinema, começa com o nascimento da personagem Littlefoot, um filhote de apatossauro (chamado na franquia de “pescoçudo”), que nasce durante uma grande migração dos dinossauros herbívoros para terras com fartura de folhas e sem a presença de predadores carnívoros, o chamado Vale Encantado. A manada de Littlefoot é pequena, composta somente por sua mãe e seus avôs maternos. Talvez, encontra-se aqui o impacto do filme na minha vida: como filho de pais separados, mesmo com a presença constante do meu pai, sempre morei somente com a minha mãe e com meus avôs maternos. Como disse Julianne Moore em seu discurso ao receber o Oscar de Melhor Atriz, contar histórias importa, porque as pessoas se sentem representadas e, assim, se sentem menos sozinhas.

Em outras palavras, histórias podem representar e validar diferentes formas de estar e viver no mundo. Ver nas telas uma família de dinossauros como a minha me fez sentir menos

2 Cena do filme americano Em Busca do Vale Encantado (The Land Before Time,

(20)

estranho e diferente de todos os meus colegas, que jantavam com o pai, a mãe e os irmãos.

Após uma série de acontecimentos desastrosos, Littlefoot é separado de sua família e se vê obrigado a enfrentar sozinho os desafios para encontrar o vale. No entanto, ao longo da jornada, ele encontra amigos, dinossauros de outras espécies, para seguir com ele pelas trilhas tortuosas até encontrar o Vale Encantado. Outra lição importante para mim, já que só fui ter uma irmã com 21 anos de idade: não era um problema não ter irmãos, eles podem vir em forma de amigos.

Com meu olhar infantil, esse filme me aproximou para sempre do cinema. Se sou pesquisador, o sou porque sempre tive interesse em buscar saber mais sobre filmes, sobre a linguagem das telas e, depois de me tornar professor, sobre a relação entre cinema e educação. Nessa busca, a teoria dos multiletramentos (GRUPO DE NOVA LONDRES3, 1996), além de oferecer princípios para

uma pedagogia com filmes em sala de aula, também me deslocou de uma relação menos ingênua para uma mais crítica com o cinema.

Ao defender que mudanças na nossa vida civil, pessoal e laboral exigiam novas práticas que reconhecessem tanto a diversidade cultural quanto a diversidade de linguagens, o GNL (1996) expandia, dessa forma, o conceito de letramento para multiletramentos. O Grupo focalizava o cinema e outras mídias sob uma nova ótica dentro da sala de aula, ou seja, não mais só como instrumentos de ensino, mas objetos de ensino.

Segundo Trier (2006), podem-se encontrar discussões sobre o uso de mídias como ferramentas de ensino desde a década de 20, o que o autor chama de ensino com a mídia. Dentro dessa perspectiva, Brown (2011) entende que os filmes são usados para ilustrar um conteúdo curricular e os alunos são tomados como expectadores passivos.

(21)

Assim como o autor, entendo que essa é uma abordagem limitante e que não dialoga mais com as necessidades que o mundo contemporâneo requer para uma formação cidadã. Portanto, é preciso tomar os filmes como objetos para a análise de expectadores críticos, que devem se perguntar: a quem o filme deseja atingir?; de quem é a história que está sendo contada?; quem se beneficiará com ela?; e, por fim, ela é apresentada sob os interesses de quem?.

Conforme fui me formando como professor de Língua Portuguesa e tendo contato com essas teorias, percebi como minha percepção sobre o cinema foi aos poucos se transformando. Nessa caminhada, fiz iniciação científica e mestrado, no entanto, a minha pergunta inicial de pesquisa eu ainda não tinha tido a oportunidade de responder: como e por que os professores em exercício, aqueles que não tiveram contato com a teoria dos multiletramentos em sua formação, trabalham com a linguagem cinematográfica em sala de aula?

Na busca por, finalmente, revisitar essa pergunta no doutorado, encontrei a Roberta4.

FIGURA 1 - AVATAR DA PROFESSORA ROBERTA

FONTE: ELABORAÇÃO PRÓPRIA.

4Seguindo as diretrizes do Conselho de Ética e Pesquisa da Unicamp, os nomes

(22)

Roberta é uma professora de Geografia que elaborou em 2012 um projeto de ensino que é desenvolvido até hoje e que envolve a produção de documentários curtas-metragens com os seus alunos do Terceiro Ano do Ensino Médio5. No ano de 2017, ela me

acolheu em sua sala de aula e me permitiu acompanhar todo o desenrolar de seu projeto de ensino. Como ela é muito importante para esta tese, não só como participante da pesquisa, mas também como minha interlocutora ao longo de todo o processo de escrita, ela irá nos acompanhar por estas páginas, sendo representada por um avatar, como o da Figura 1.

De abril a novembro daquele ano, estive imerso no trabalho de campo deste estudo, acompanhando de perto as delícias e as dores, como diria Lensmire (1998), da realidade de uma sala de aula. Durante esse período, conversando com a Roberta, escutando os alunos e assistindo às suas produções, meu olhar para aquela realidade foi se transformando.

Depois, ao ler a literatura sobre letramento midiático e produção midiática no ensino de Ciências Sociais, outras reflexões foram surgindo e me vi obrigado a voltar para questões mais basilares: o que eu entendo que seja o papel da Educação?; qual é o papel do ensino de Geografia dentro dessa concepção de Educação?; como a produção midiática, no caso, a produção de cinema, pode contribuir para isso?; como todas essas questões ganham novos contornos no atual cenário político brasileiro?

Novas leituras, novas inquietações. Textos de cientistas políticos, geógrafos, sociólogos, educadores para dialogar com todas as minhas leituras de linguistas aplicados. O cinema, mais especificamente a sua produção em sala de aula, começou a ganhar novas cores. A produção de cinema em sala de aula poderia ser uma forma de liberdade, como nos prega Paulo Freire? Ou poderia ser uma forma de interrupção como defende Gert Biesta? Uma forma

5Como essa pesquisa conta com a participação de humanos, ela passou pela

aprovação do Conselho de Ética e Pesquisa da Unicamp. Número do CAAE: 69679317.2.0000.5404

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criativa de produzir mídia alternativa que desafie e resista aos discursos hegemônicos como nos alerta Kellner Douglas e Jeff Share?

Do olhar apaixonado infantil para o cinema como uma forma de validação da minha existência, do olhar do graduando como um objeto de ensino, agora, do doutorando como uma forma de luta e resistência para a educação me identifiquei com o poetizar de bell hooks (2019). Para hooks (2019), resistir significa interagir, de forma consciente, com os discursos e representações dominantes e normativas em função da criação de espaços de oposição, tanto analíticos quanto culturais. Dessa forma, para a autora, a educação é um ato político, em que a luta se dá pelo discurso acadêmico, mas principalmente pela busca de novas estratégias e práticas.

Nessa ideia de luta e resistência, vinha a minha memória a todo o momento um verso do samba-enredo da escola de samba Estação Primeira de Mangueira, campeão do carnaval carioca de 2019: “na luta é que a gente se encontra”.

Toda a letra do samba é uma poesia, porém gosto particularmente desse verso pela possibilidade de dois dos seus inúmeros sentidos: o primeiro, é que, nos dias atuais, nós nos encontramos, nós estamos, em um momento de luta; o segundo, tão belo como o primeiro, é que são nos momentos de luta que nós nos encontramos, nós nos deparamos, uns com os outros. A situação política pela qual o Brasil está passando desde o golpe político de 2016 já é indicativa o suficiente de que estamos em momento de luta. Debruçar-me sobre a produção de cinema nas aulas de Roberta me fez perceber que os momentos de nos conhecermos e conhecermos aos outros estão nas tensões sociais. Pelos dois sentidos desse verso se articularem com a minha tese, eu o escolhi para nomeá-la.

Confesso que o olhar encantado de menino sobre o cinema ainda reside em mim. O sonho de adolescente em me tornar roteirista, de certa forma, também. Por conta disso, escolhi

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quebrar alguns traços da formatação acadêmica e escrever um pouco da minha tese, meu maior trabalho até o momento, com características de um roteiro. Talvez nunca alguém vá ao cinema assistir um filme baseado em um roteiro que eu venha a escrever. Porém, a leitora ou o leitor desta tese pode se sentar confortavelmente em uma cadeira e ler as páginas desse relato crítico das minhas descobertas ao testemunhar, de forma engajada e interessada, as delícias e as dores dessa passagem da vida da Roberta e de seus alunos.

As luzes já estão apagadas, a sessão já vai começar. Por favor, desligue o celular.

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CONSTRUINDO O ARGUMENTO

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Desde o meu encontro com o filme Em busca do Vale

Encantado, assistir filmes se tornou uma atividade quase

rotineira. Então, posso ousar dizer que tenho um repertório cinematográfico amplo. Dentre tantos títulos e cenas, não consigo pensar em uma mais poética que a do menino Totó se apaixonando pelo cinema em Cinema Paradiso.

O filme italiano conta a história do levado coroinha Totó que, sempre que consegue, escapa para a sala de projeção do cinema de sua cidade após a missa. Na sala de projeção, ele conhece e desenvolve uma relação de amizade com o projecionista Alfredo. Amizade que o ensina a amar o cinema, como também impacta determinantemente sua vida.

Cinema Paradiso possui duas cenas que podem servir de

metáfora para a situação atual brasileira. A primeira cena, logo no início do filme, mostra o padre Adelfio sozinho em uma sala de cinema assistindo aos próximos lançamentos do cinema em busca de cenas que ele considera obscenas. A cada cena de beijo, o padre toca seu sino, indicando a Alfredo que aquele trecho da película deve ser recortado do resto do rolo fílmico. A censura

6Cena do filme italiano Cinema Paradiso (Nuovo Cinema Paradiso, 1988) de

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instalada pelo padre Adelfio, que por meio dos seus critérios religiosos define autoritariamente o que pode ou não ser visto, volta a ser parte da discussão política brasileira, pouco mais de 30 anos depois do fim da ditadura militar.

Tanto a produção audiovisual, com a inviabilização de lançamentos de filmes e estabelecimento de critérios moralistas para o financiamento de projetos pela Agência Nacional do Cinema (ANCINE), quanto a educação, por meio da perseguição à memória de Paulo Freire e o projeto Escola sem Partido, estão sob ataque da censura, em constantes tentativas de silenciar artistas e professores. Esses ataques, a meu ver, fazem parte da luta de um setor conservador e neoliberal da política brasileira contra o chamado marxismo cultural.

Segundo Nacif & Silva Filho (2019), o marxismo cultural é uma teoria formulada pelo setor conservador e neoliberal americano que defende a hipótese de que a luta entre capitalismo e socialismo não está mais no plano econômico, mas sim no plano cultural. Sendo assim, por meio das armas culturais, os grupos minoritários e minorietarizados estariam lutando contra a liberdade. Os autores explicam que, na verdade, o marxismo cultural é uma forma eficaz de o grupo hegemônico lutar contra os avanços políticos e sociais das minorias, mascarando suas ações discriminatórias como defesa da democracia e da liberdade de expressão7.

No entanto, há outra cena de Cinema Paradiso que pode ser lida como uma metáfora de esperança para o violento cenário político que enfrentamos. Já nos últimos momentos do filme, Totó volta a sua cidade natal, agora como o prestigiado diretor de

7Um exemplo claro da manifestação do marxismo cultural foram os protestos

contra a vinda de Judith Butler, uma das maiores pesquisadoras do campo de estudos sobre gênero e sexualidade, ao Brasil em 2017. Em que o Movimento Brasil Livre escreveu uma petição pedindo o cancelamento de sua vinda em um “simpósio comunista”, chamando-a de “idealizadora e promotora nefasta da ideologia de gênero” que “mascara um objetivo político marxista”. Fonte: O

Globo, 2017. Disponível em:

<https://oglobo.globo.com/cultura/livros/polemicas-cercam-segunda-vinda-de-judith-butler-ao-brasil-22032441>. Acesso em 27 abril 2020.

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cinema Salvatore di Vita. Ele recebe um presente deixado pelo recém-falecido Alfredo: um rolo fílmico. Quando o coloca para rodar no projetor, sentado no mesmo lugar que o padre Adelfio ocupava, Salvatore descobre que seu velho amigo guardou todos os trechos censurados pelo padre e os rearranjou em uma única fita. Ao rever os inúmeros trechos de beijo, Salvatore, por um momento, retorna a ser Totó.

Nessa bela cena, encontro uma metáfora de resistência. Para Misoczky, Flores & Böhm (2008), em uma perspectiva gramsciana, podemos entender como resistência o ato de desafiar os significados da ordem social estabelecida.

A organização hegemônica continuamente tenta naturalizar e essencializar a si mesma como a única forma pela qual o organizar pode ser articulado – tornando invisível, não-existente, a multiplicidade de diferentes mundos organizacionais. Portanto, uma das ações políticas básicas e urgentes é desnaturalizar a articulação hegemônica da organização. Este é um ato de exposição que torna possível a imaginação de diferentes mundos e sociedades (MISOCZKY, FLORES & BÖNM, 2008, p.182).

Portanto, o ato de imaginar a possibilidade de um mundo e uma sociedade diferentes já é um ato de resistência. Resistência mais necessária do que nunca para a Educação no Brasil. Não somente no sentido de a Educação resistir, mas de educar para a resistência, para a luta e para a construção de uma sociedade mais justa. Resistência essa que percebo na fala de Roberta – a professora participante de meu estudo, como já comentado - ao me contar sobre o porquê decidiu elaborar seu projeto de ensino com o Terceiro Ano do Ensino Médio, durante a entrevista semiestruturada que tivemos logo do início do meu trabalho de campo (08/05/2017), conforme podemos ver na fala que segue.

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“É despertar mesmo o papel dele enquanto cidadão. Ele observar, ele se enxergar enquanto cidadão. Enxergar o mundo em que ele vive. A cidade em que ele vive e como ele pode interferir, intervir neste espaço. Ele tem que ser um agente transformador.”8

Percebo na fala da professora como é possível pensar em seu projeto de ensino como um ato de resistência, pois, em primeiro lugar, ela deseja que seus alunos enxerguem o mundo em que vivem, ou seja, desnaturalizem os sentidos estabelecidos pela ordem hegemônica, para que, então, eles possam intervir nesse espaço, transformando-o. É interessante que, como geógrafa, Roberta mobiliza em sua fala termos que eu, como linguista aplicado, não estou acostumado a pensar quando se trata de ensino: olhar para a cidade, intervir no espaço.

Também penso que Roberta, assim como eu, possui uma visão esperançosa sobre Educação. Esperança no sentido de Freire (2017), que a entende como um ímpeto natural, possível e necessário para a experiência histórica, ou seja, um impulso contra o determinismo. Em sua fala, a professora enfatiza seu objetivo de propiciar uma oportunidade ao aluno de se perceber enquanto cidadão. Para isso, ela acredita que ele precisa enxergar o espaço em que vive para, então, conseguir intervir nele.

Considero que, para Roberta, a cidadania está intimamente conectada com a possibilidade de ser agente da transformação. Segundo Freire (2017, p.135), educa-se para transformar quando o ato de ensinar é, independentemente se é um saber do torneiro ou do cirurgião, “com vistas à mudança do mundo, à superação das estruturas injustas, jamais com vistas a

8Em todo momento que houver uma fala de um(a) participante da pesquisa, ela

aparecerá acompanhada de um avatar que representa o/a participante. Essa é uma forma de garantir, de fato, o lugar de participantes a Roberta e a seus alunos, não como sujeitos de pesquisa. Sendo assim, é uma forma de representar que não estou analisando suas falas, mas dialogando com elas.

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sua imobilização”. Uma perspectiva sobre cidadania, também defendida por Cope e Kalantzis (2000), como uma forma crítica e protagonista de engajamento social em função de novas formas de se estar no mundo. Um cidadão articulado com a noção de cidadania como emancipação de Freire (2017).

Esta visão emancipatória se opõe à ideologia do discurso neoliberal sobre Educação. Conforme Freire (2017), esta ideologia, fatalista e imobilizante, prega que nada podemos fazer contra a realidade social, sendo papel da Educação adaptar o aluno a essa realidade por meio de práticas educativas bancárias. hooks (2019), interpretando Paulo Freire, afirma que a educação é bancária quando parte do pressuposto que a aquisição de conhecimentos se dá por meio do depósito de informações do professor no aluno, para que este as memorize e, depois, possa regurgitá-las em situações futuras. Dessa forma, é preciso esperança, já que

o mundo não é. O mundo está sendo. Como subjetividade curiosa, inteligente, interferidora na objetividade com que dialeticamente me relaciono, meu papel no mundo não é só o de quem constata o que ocorre, mas também o de quem intervém como sujeito de ocorrências. Não sou apenas objeto da história, mas seu sujeito igualmente (FREIRE, 2017, p. 75).

A partir dos pressupostos apresentados, defendo, também neste trabalho, a Educação geográfica esperançosa como um ato político. Nessa perspectiva, em vez da transmissão de informações e conhecimentos muitas vezes desvinculados das questões de vida e de luta em que o aluno se encontra envolvido, é importante e central que eduquemos para o fortalecimento do potencial agentivo do estudante, para seu empoderamento (FREIRE, 2017). Assim, a educação em geografia que aqui defendo assume-se como um espaço formativo e emancipatório, um espaço em que o trabalho, também com a linguagem, pode transformar o letramento das letras e se entrelaçar com a educação geográfica esperançosa. Em outras palavras, a partir dos projetos didático-pedagógicos

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instaurados no processo educativo, a educação geográfica de cunho formativo e transformador busca viabilizar e potencializar espaços formativos nos quais o aluno possa continuamente reconstituir-se como sujeito e cidadão, tornando-se cada vez mais capaz de resistir à injusta realidade social e de lutar pela sua transformação, enquanto amplia seus repertórios (linguísticos, culturais e identitários) e conhecimentos.

Quando digo espaços para a formação do aluno, me afasto, propositalmente, de uma perspectiva de espaços de aprendizagem como equivalente à mera transmissão de informação, ou seja, a partir de um enfoque reducionista, bancário. Segundo Carvalho (2016), aprendizagem, em uma perspectiva redutora, diz respeito ao ato de conhecer algo novo (um conceito, uma ideia, uma habilidade) que antes não se conhecia. O ato formativo, por sua vez, engloba o ato da aprendizagem necessariamente imbricado a uma ação mais ampla, no sentido de possibilitar a transformação do sujeito que aprende. Nas palavras do próprio autor,

trata-se, pois, de um encontro entre um evento, um objeto da cultura e um sujeito que, ao se aproximar de algo que lhe era exterior, caminha em direção à constituição de sua própria vida interior (CARVALHO, 2016, p.101).

Desse modo, enquanto o ato de aprender pode ser visto como mais controlável e possível de ser medido, é impossível fazer o mesmo com o ato de educar-formar, já que não se pode controlar de que modo o objeto de aprendizagem irá afetar o aprendiz e o capacitará a transformar-se a si mesmo e ao mundo.

No mesmo sentido que Carvalho (2016), hooks (2019) entende que a sala de aula possui limitações, sendo um espaço de possibilidades para a formação dos alunos. Sobre isso, a autora comenta:

Nesse campo de possibilidades, temos a oportunidade de trabalhar pela liberdade, de exigir de nós e dos nossos camaradas uma abertura da mente e do coração

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que nos permita encarar a realidade ao mesmo tempo em que, coletivamente, imaginamos esquemas para cruzar fronteias, para transgredir. Isso é educação como prática de liberdade (hooks, 2019, p.273).

Alinhado com a autora e, assim, com os postulados freireanos, chamarei a concepção de educação (geográfica) defendida nesta tese de educação como prática de liberdade. Entendo que tal conceito abrange tanto o aspecto emancipatório (FREIRE, 2017) quanto o aspecto formativo (CARVALHO, 2016) e transformador com os quais me alinho.

A EXPANSÃO DO OLHAR

Apoiado no pensamento de Roberta e também nos pressupostos da educação como prática de liberdade, considero que a disciplina de Geografia, como parte do conjunto de disciplinas das Ciências Humanas, pode contribuir bastante para essa formação cidadã, ou seja, (trans)formadora.

A partir disso, me coloquei a buscar possíveis modos de recontextualização didática desses pressupostos, que defendem uma educação (geográfica) (trans)formadora – como realizá-los em nossas práticas pedagógicas? Ou seja, como viver, em sala de aula, uma educação geográfica como prática libertária?

Nesse viés, junto-me a Marcus& Stoddard (2009) para asseverar que a disciplina de Geografia pode realizar seu papel (trans)formativo por meio de três grandes pilares: o juízo fundamentado e a visão expandida sobre a humanidade em função da escolha pelo bem comum. Dessa forma, entendo a educação geográfica como uma prática libertária, que funde “escola com vida” (CARVALHO, 2016), ou seja, é importante que a escola esteja intimamente conectada com o mundo por meio de um muro poroso: ela deve formar o aluno para conseguir compreender o mundo, porém com afastamento da ordem social vigente que impõe as demandas econômicas e marginaliza as demandas éticas e políticas, para

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que a escola e a escolarização sejam um espaço e um tempo que permitam pensar e viver um mundo diferente. No caso da educação geográfica, o pensar e o viver o mundo diferentemente pode ser alcançado por meio dos três pilares já citados.

Para Marcus & Stoddard (2009), o juízo fundamentado está relacionado à análise, racional e autônoma, dos significados, às causas e às consequências de eventos históricos e espaciais. Di Palma (2009) esclarece que, para os geógrafos, isso significa, além construir de conhecimentos descritivos sobre o que e onde aconteceu um processo espacial, também e principalmente, construir uma investigação crítica sobre o como e o porquê esse processo aconteceu.

Já a visão expandida da humanidade, conforme Marcus & Stoddard (2009), tem o objetivo de promover a expansão dos horizontes que nos limitam às nossas preocupações e aos nossos modos de pensar na situação presente por meio do contato com as realidades, os modos de pensar e os problemas de pessoas diferentes de nós.

Assim posto, compreendo que o juízo fundamentado e a visão expandida da humanidade são contribuições do ensino de Geografia para a educação como prática da liberdade, pois, como nos ensina Freire (2017), a educação que liberta não se baseia na transferência ou depósito da inteligibilidade dos conceitos e dos fatos. Nos termos de Carvalho (2016), a educação não se constitui de experiências somente de aprendizagem, nas quais, na aula de Geografia, por exemplo, o aluno aprenderia conceitos da área, como relevo, longitude e hidrografia. Ela também se pauta na criação de possibilidades para que o aluno aprenda como transformar sua curiosidade ingênua em epistemológica. Portanto, estamos tratando, segundo Carvalho (2016), de experiências formativas. Para isso, é necessária uma aproximação metódica e crítica dos objetos cognoscíveis que leve o aluno a construir novos conhecimentos que o ajudem a entender de modo mais

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aprofundado o mundo em sua volta e a transformá-lo (FREIRE, 2017).

É na possibilidade da construção do novo que Hannah Arendt, explica Biesta (2016), entende que se funda a liberdade. Carvalho (2016), também com base no imperativo arendtiano, defende que a eclosão do improvável é uma capacidade humana de romper com a reprodução naturalizada do passado, definindo então que

como designo da vida política, a liberdade não é a escolha entre opções já dadas, e sim a capacidade humana de romper com os automatismos do passado e de criar, pela ação em concerto, novas configurações políticas e sociais. Seu exercício se dá, portanto, entre a pluralidade de iguais que marca a existência do espaço público como palco para a política (CARVALHO, 2016, p.172).

No entanto, como destaca Rocha (2019) e Carvalho (2016), para que a educação cidadã esteja orientada para a justiça social, é importante que as práticas educativas sejam pensadas em função da (re)construção do bem comum, a terceira contribuição da educação geográfica segundo Marcus & Stoddard (2009). Ou seja, ao mesmo tempo que a educação libertadora e transformadora nos instrumentaliza, permitindo um maior engajamento na vida social, ela também nos oferece possibilidades de questionar as relações sociais, transformando-as a partir de um viés mais comunal e equânime. Como nos ensina Paulo Freire (2017, p.53), “minha presença no mundo não é a de quem a ele se adapta, mas a de quem nele se insere. É a posição de quem luta para não ser apenas objeto, mas sujeito também da história”.

Em diálogo com Freire (2017), percebo a relevância de uma educação pautada no sujeito e, assim, uma educação pela qual possamos nos tornar sujeitos interessados na reconstrução de um mundo socialmente mais justo. Nessa linha, defendo, portanto, o que Biesta (2012, 2016) caracteriza como uma Educação para a subjetificação. Para o autor, a Educação pode ser entendida a

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partir de três domínios: a qualificação, o ensino de determinados conhecimentos e competências para que se possa construir algo no mundo; a socialização, o ensino de valores, tradições e normas de um grupo social para que faça parte desse grupo; e, por fim, o da subjetificação, que tem a função de tornar o aluno um sujeito, ou seja, possibilitar que o aluno, a partir de sua singularidade e de seu engajamento com uma sociedade plural, possa dar início a algo novo9. Segundo Biesta (2016), quando o

processo educativo tem maior foco na dimensão da subjetificação é possível vislumbrar uma pedagogia da interrupção da ordem vigente. Assim, entendo que essa proposta esteja alinhada à educação geográfica de bases freireanas, ou seja, de cunho formativo, transformador e emancipatório, que vim nomeando neste trabalho, inspirado por bell hooks (2019), de educação como prática de liberdade.

Com base em todas essas reflexões e pressupostos, meu olhar para a sala de aula de geografia começou a se voltar mais para as propostas pedagógicas da professora Roberta e em como esse processo se realizava na relação com os alunos. De modo bastante sucinto, é importante aqui esclarecer que a professora tinha como projeto de ensino o trabalho de produção de documentários curtas-metragens. Por decorrência, entendi que seria bastante interessante e apropriado tomar como foco e objetivo de minha investigação a realização do projeto-pedagógico, analisando-o à luz das teorias que defendo, pelo seu teor educativo e transformador. Em meio, pois, a esses meus movimentos de intensa e transformativa reflexão, acabaram por se delinear, mais claramente, os propósitos de meu estudo.

9Entendo a noção de “novo” no sentido de Carvalho (2016), já tratado

anteriormente, ou seja, como o resultado do exercício da liberdade de engajamento com a pluralidade para o rompimento dos automatismos do passado.

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O PONTO DE VIRADA: OS OBJETIVOS DA MINHA PESQUISA

A partir de tudo o que relatei e argumentei, até o momento, meu interesse de investigação foi se constituindo. Para desenvolver meu trabalho de investigação, voltei-me, então, à análise das experiências educativas vivenciadas pela professora e pelos alunos a partir do projeto proposto. Essa análise buscou, por consequência, descrever o processo educativo instaurado e discutir como esse processo revelava-se potencialmente (trans)formativo para os sujeitos envolvidos.

Uma vez que o projeto didático proposto pela professora Roberta envolvia o uso da linguagem cinematográfica para o desenvolvimento dos documentários, a ideia de letramento geográfico midiático (LUNKIBEAL & CRAINE, 2009) tornou-se também relevante em meu estudo, como explicarei com maiores detalhes mais adiante, ainda neste capítulo. Por ora, é relevante enfatizar que, para uma educação geográfica libertária, ou seja, orientada para a formação pluralista e cidadã, compreendo ser importante que o trabalho com os letramentos midiáticos seja desenvolvido sob uma ótica menos determinística e transmissiva e, consequentemente, mais aberta ao trabalho colaborativo, agentivo e crítico, como defende o GNL (1996) e Cope& Kalantzis (2012).

Diante de todo e exposto e, assim, a partir do enfoque libertário frente à educação (geográfica), tomei como base o projeto de produção de documentário curta-metragem, na disciplina de Geografia, da professora Roberta com a sua turma de Terceiro Ano do Ensino Médio na escola X10e tracei o seguinte

objetivo geral para meu estudo: investigar como são vivenciadas as práticas educativas propostas nesse contexto de ensino e como,

10 Seguindo as recomendações éticas do Conselho de Ética e Pesquisa da Unicamp,

utilizarei somente X para nomear a escola, dessa forma, protegendo a identidade dos participantes.

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nesse processo, é realizada a construção do letramento midiático geográfico.

O intuito, a partir da investigação descrita, é abordar a realização do projeto educativo desenvolvido pela professora-participante, observando, em particular, a mobilização do letramento midiático geográfico e os pontos de tensão emergentes nesse processo de (re)construção de repertórios e conhecimentos. Para tanto, proponho-me a considerar as visões da professora e também a ouvir as vozes dos alunos, a fim de poder discutir de que forma a prática educativa em questão se encontra (ou não) alinhada a uma educação (geográfica) como prática de liberdade e quais aspectos mais visivelmente contribuem ou limitam sua realização.

Cumpre ainda salientar que, conforme defende Vicentin (2018) em seu trabalho com tecnologias em contexto educativo, investigar as práticas educativas, sob o enfoque crítico e transformador descrito, remete à compreensão das instâncias de apropriação de letramentos considerados relevantes ao processo formativo. Para a autora, essa compreensão, particularmente no que diz respeito às mídias digitais, pressupõe observar, entre outros aspectos, como os participantes (discentes ou docentes) lidam com esses recursos, como se relacionam com seus pares na construção de conhecimentos e letramentos, quais os problemas enfrentados, quais as visões e propósitos desses participantes ao se engajarem nas experiências educativas, e como as práticas e produções desenvolvidas ao longo do processo de ensino-aprendizagem revelam-se singulares. Nessa mesma linha, Hibarino (2018), ao investigar práticas de ensino e aprendizagem vivenciados por um grupo de professores e alunos do ProFIS (Programa de Formação Interdisciplinar Superior) da Unicamp salienta a importância de analisarmos os conflitos que emergem nessas experiências educativas. Para a autora, esse é um foco importante, uma vez que as tensões instauradas pelos discursos e práticas mobilizados revelam como o processo educativo é

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singular e agentivamente constituído em meio às visões e às relações travadas pelos participantes

Por consequência, no que se refere ao estudo que me propus a desenvolver, passou a ser relevante observar e compreender todo esse conjunto de elementos frente às experiências de aprendizagem promovidas com base no projeto educativo proposto pela professora Roberta. Assim, meu interesse e foco de investigação foi também delineado levando-se em conta a necessidade de se observar a relação de tensão entre os pontos de vista mobilizados pelos participantes desta pesquisa, a partir das práticas educativas propostas e vivenciadas.

Nesse enfoque e levando-se em conta as especificidades do contexto educativo em questão, foram definidos, então, os objetivos específicos que orientaram meu estudo:

a. Investigaras visões da professora e dos alunos no que se refere à proposta educativa desenvolvida, a fim de analisar os principais pontos de tensão que emergem ao longo de sua realização;

b. Discutir como se construiu o letramento midiático geográfico em meio ao processo educacional instaurado no contexto em foco.

Para alcançar esses objetivos, foram delineadas duas questões de pesquisa, a saber:

1- Quais são e como se caracterizam os principais pontos de tensão instaurados em meio às experiências de aprendizagem promovidas?

2- Em meio às tensões e experiências educativas vivenciadas, como se realizou a construção do letramento midiático geográfico e quais problematizações podem ser tecidas sobre esse conceito e processo educacional?

Após ter indicado os objetivos e questões que nortearam meu trabalho, entendo que seja importante apresentar breves

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reflexões acerca da relevância social e acadêmica de meu problema de pesquisa. Para tanto, sigo também tecendo algumas considerações sobre a noção de letramento midiático geográfico, por entender que essa discussão é ainda lacunar no que diz respeito à interface dos estudos da linguagem e de educação geográfica.

O PORQUÊ DE CONSTRUIR ESSE ROTEIRO

O delineamento desses objetivos e a formulação dessas perguntas de pesquisa se devem ao fato de eu não encontrar na literatura sobre produção midiática no ensino de Geografia discussões que conseguissem me explicar alguns processos que percebi que meus dados apontavam. Por exemplo, determinadas tensões que percebia entre os objetivos da professora e suas práticas ou a visão dela e dos alunos sobre o projeto.

Além disso, nenhuma das pesquisas sobre temas similares estava mais fortemente orientada para a dimensão da subjetificação ou tinha como foco da investigação, simultaneamente, docentes e discentes. Ou seja, os focos das investigações feitas sobre projetos de ensino que envolvem a produção de filmes, ficcionais ou documentais, na disciplina de Geografia levam as análises e os resultados para reflexões que não discutem as proposições dos próprios geógrafos sobre letramento midiático geográfico nem as proposições de subjetivação defendidas aqui para a Educação geográfica.

A noção de letramento midiático geográfico é construída pelos geógrafos Lunkibeal & Craine (2009), em resposta aos desafios que o letramento midiático lançou para a área de Geografia. Conforme os autores, a questão central do letramento midiático geográfico não é expandir a noção de uso de mídia para garantir mais informação ou conhecimento organizado, mas entender como os elementos midiáticos, dentro de contextos específicos, constroem conhecimentos geográficos e qual o efeito

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destes nas massas. No entanto, essas discussões não são levadas para o campo educacional. As pesquisas que discutem a produção midiática no ensino de Geografia seguem dois vieses.

Por um viés, Di Palma (2009), Anderson (2013) e Swan & Hofer (2013), por exemplo, realizaram pesquisas-ação ou participantes em diferentes etapas de ensino (desde o Ensino Fundamental II até o ensino superior), com o objetivo de examinar o modo que a produção midiática auxiliava os alunos a construírem conhecimento geográfico. Os resultados das três pesquisas indicavam como a construção de filmes tornava os alunos mais ativos na aplicação de conceitos e na construção de conhecimentos significativos de Geografia, levando a uma grande melhoria no desempenho acadêmico dos alunos. Sendo assim, os filmes, sejam assistidos ou produzidos, continuam a ser somente um instrumento mais dinâmico e mais participativo de aprender os mesmos conteúdos. Ou seja, um ensino com mídia em um viés determinista, já que os autores defendem que é a introdução da mídia que proporciona um aumento do conhecimento geográfico dos alunos. Além disso, os ganhos para a formação do aluno se restringem ao domínio da qualificação, pois só é analisada a potencialidade da produção midiática para o desenvolvimento acadêmico.

Em uma abordagem menos determinista da mídia como ferramenta pedagógica, outros estudos que acompanharam professores de Geografia produzindo filmes com seus alunos, como Hofer &Swan (2006) e Fehn (2011), focalizaram na mediação do professor como a variável principal dos resultados. Baseados na teoria do TPCK (sigla em inglês de Technological Pedagogical

Content of Knowlegde), os pesquisadores avaliaram quais

conhecimentos de tecnologia, pedagogia, conteúdo e de suas intersecções foram mobilizados pelos professores investigados e de que forma as diferentes mobilizações impactaram a produção discente. A pergunta que esses estudos tentavam responder era: quais conhecimentos em cada uma dessas dimensões e de suas intersecções um professor de Geografia precisa mobilizar para

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que o aluno aprenda de forma mais significativa, aplicando e ampliando seu conhecimento geográfico? Dessa forma, o objetivo do uso da produção de cinema é o mesmo das pesquisas anteriores. A mudança está somente em que instância recaiu a maior parte da responsabilidade para alcançá-lo: na própria mídia ou no professor.

Como linguista aplicado, investigando nas margens entre a Linguística Aplicada e a Geografia, contribuo com os estudos da nossa área para mobilizar o conceito de letramento midiático geográfico para as análises das produções dos alunos. Dessa forma, compreendendo as potencialidades ou não de um projeto pedagógico, como o investigado nesta tese, para práticas formativas em um viés libertário.

Para que isso fosse possível, precisei focalizar meu olhar para o processo de designing. Em seu manifesto da pedagogia dos multiletramentos, o GNL (1996) destacou a noção de aprendizagem por design, em que os alunos são designers de significado. Inspirados em Paulo freire, o GNL (1996) desloca o aluno de uma posição de consumidores de significados para produtores. Sendo assim, a pedagogia dos multiletramentos dialoga com a noção de subjetificação de Biesta (2012, 2016), pois defende um uso agentivo das mídias em função de novos significados e identidades, isto é, de novas formas de estar no e com o mundo.

Para o GNL (1996), o processo de aprendizagem precisa se dar de uma nova forma: os alunos possuem seus recursos disponíveis (availables resources), os modelos de representação de significado em diferentes linguagens que constroem os seus repertórios. A partir deles, em um processo motivado e interessado, chamado de designing, os alunos (re)articulam seus repertórios para a construção de novos significados. O produto final dessa rearticulação é o redesigned, que se transforma em um recurso disponível para novos designings.

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Vincentin (2018) entende que o designing é um processo de apropriação, ou seja, de tomar algo para si, agentivo, já que envolve também a (re)construção de conhecimentos, práticas e discursos. A autora também entende que a apropriação não é um processo fechado e acabado, portanto não é só um designing que forma um redesigned, mas um constante (re)designing. Dessa forma, o processo de apropriação, o (re)designing, não é passível de ser objetivamente controlado e observado, o que leva a autora a defender que o pesquisador pode somente analisar as instâncias de apropriação.

Apesar da importância do impacto que a noção de aprendizagem por design tem para a Educação e para que eu possa analisar as instâncias de apropriação do letramento midiático geográfico pelos alunos, considero que o processo de designing, tal qual descrito pelo GNL (1996), oferece pouca base para investigar a produção midiática em sala de aula. Sendo assim, contribuo para uma discussão mais aprofundada sobre esse processo para que ele possibilite uma análise mais ampla da realidade da sala de aula, permitindo uma compreensão com mais elementos do processo de construção do redesigned do que somente os recursos disponíveis e as motivações dos alunos. É dessa forma que justifico minha busca pelas tensões que emergiram ao longo do processo educativo do projeto proposto por Roberta.

A meu ver, ao conseguir construir as análises ao longo desta tese, posso contribuir para as duas áreas que se hibridizam na aventura desta pesquisa: a Geografia e a Linguística Aplicada. Para a Geografia, ressignificando o conceito de letramento midiático geográfico e entendendo como ele pode contribuir para a análise da produção midiática em sala de aula. Para a Linguística Aplicada, aprofundo as compreensões sobre o

(re)designing de forma a torná-lo um conceito mais efetivo na

análise da realidade da sala de aula e elucidar melhor as tensões que influenciam a construção de novos significados.

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Em síntese, a tese que defendo é que o desenvolvimento do letramento midiático geográfico em sala de aula de forma orientada à subjetificação é uma maneira de promover práticas educativas libertárias no ensino de Geografia, tão necessárias em um contexto político violentamente opressor como o atual.

Ao investigar a caracterização de práticas educativas a partir de um projeto pedagógico que se pretende cidadão e libertário, tive a expectativa de encontrar traços da educação geográfica emancipatória e (trans)formadora nesse processo. Ao analisar os aspectos constitutivos da prática educativa nesse enfoque, almejei ressaltar as vozes dos alunos e da professora, identificar pontos de possível tensão e delinear os pilares que sustentam a construção de letramentos midiáticos geográficos sob o enfoque libertário. Com isso, em parceria com Roberta, penso fazer contribuições para o (re)desenho de práticas e projetos mais plurais e capazes de fomentar a (re)construção de futuros.

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1. UM LUGAR DE CURA

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A produção brasileira Bacurau, a meu ver a maior obra prima do catálogo nacional, se passa em um Brasil de um futuro nem tão distante. Na pequena cidade com nome homônimo ao filme, a matriarca daquele povoado, dona Carmelita, falece aos 94 anos. Após sua morte, acontecimentos anormais começam a acontecer, dentre eles o aparente desaparecimento da cidade do mapa.

São tantos os temas e as reflexões que tomam conta da narrativa, estruturada pela hibridização de gêneros cinematográficos, que seria impossível fazer jus a essa obra em uma pequena introdução. Além do mais, para algum leitor desavisado que ainda não tenha visto, não pretendo “dar nenhum

spoiller”. Bacurau merece ser visto.

No entanto, gostaria de resgatar uma questão fundamental para mim: aquele povo, desamparado pelo Estado que o deveria proteger, consegue alcançar o inesperado, protegendo-se dentro da escola e do museu. As metonímias construídas entre a escola representando a educação e o museu representando a memória podem ser uma das principais mensagens da trama: nos momentos que o Estado ameaça a sua existência, os cidadãos devem recorrer às

11Cena do filme brasileiro Bacurau (2019), de Kleber Mendonça Filho e Juliano

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escolas e aos museus, a educação e a memória, pois ali há a possibilidade de resistência.

Nesse sentido, Bacurau também se torna uma metáfora para o atual cenário político brasileiro. Quando somos “liderados” por um homem que coloca a vida das pessoas em risco em favor da economia, como no atual caso da pandemia do COVID-19, e que tem na base de seu “projeto político” a diminuição do Estado e a retomada de valores conservadores, a educação precisa resistir.

A partir desse imperativo, começo este capítulo talvez de uma forma inusitada, porém que considero crucial: caracterizando o atual cenário político brasileiro, principalmente no que tange à educação, para, a partir do que hoje enfrentamos enquanto sociedade, pensar qual é o papel da educação e quais devem ser as bases e objetivos das práticas educativas. Depois, retomo alguns princípios do ensino de Geografia e do letramento midiático geográfico em diálogo com a concepção de educação defendida. Encerrando o construto teórico, faço uma proposta de como repensar o conceito de letramento midiático geográfico para a análise de experiências educativas que envolvem a produção midiática.

Por mais difícil que seja, preciso, então, começar pela tentativa de compreender o momento histórico-social que hoje vivemos.

1.1 CENA 1: O NAUFRÁGIO

Conforme De Castro (2018), a arquitetura política que se construiu em torno da aprovação das reformas sociais e políticas após o golpe de 2016 levou a uma situação alternativa, não controlada pelos setores tradicionais, o que fortaleceu uma direita conservadora no aspecto social e ultraliberal no aspecto econômico. Nos termos de Apple (2004), poderia afirmar que houve uma coincidência das lutas culturais relacionadas ao gênero e à

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