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A previdência social como instrumento de redução da desiguldade de renda

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS

CURSO DE GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS ECONÔMICAS

LORENA DE OLIVEIRA FONSECA

A PREVIDÊNCIA SOCIAL COMO INSTRUMENTO DE REDUÇÃO DA DESIGUALDADE DE RENDA

SALVADOR 2010

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LORENA DE OLIVEIRA FONSECA

A PREVIDÊNCIA SOCIAL COMO INSTRUMENTO DE REDUÇÃO DA DESIGUALDADE DE RENDA

Trabalho de conclusão de curso apresentado no curso de Ciências Econômicas da Universidade Federal da Bahia como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Ciências Econômicas

Orientador: Prof. Dr. Bouzid Izerrougene.

SALVADOR 2010

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LORENA DE OLIVEIRA FONSECA

A PREVIDÊNCIA SOCIAL COMO INSTRUMENTO DE REDUÇÃO DA

DESIGUALDADE DE RENDA

Aprovada em dezembro de 2010.

Orientador: ______________________________________________________________ Prof. Dr. Bouzid Izerrougene

Faculdade de Economia da UFBA

_______________________________________________________________ Prof. Dr. Luiz Antônio Mattos Filgueiras

Faculdade de Economia da UFBA

______________________________________________________________ Profª. Drª. Celeste Maria Pedreira Philigret

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AGRADECIMENTOS

A minha fé incondicional, que permitiu que mesmo nos momentos mais adversos eu não desistisse. A minha paixão pelos livros, desde criança, que trouxe boa parte do conhecimento que levo comigo. Aos meus ideais, que ainda permitem que eu veja o mundo com olhos de quem ainda acredita.

Aos meus pais, por ter sacrificado a maioria dos seus sonhos em nome dos meus. Sem eles eu não seria metade do que sou. As palavras de minha mãe nas horas que eu perdia o fôlego e desanimava foram essenciais na minha caminhada, ela me ensinou a nunca desistir. Meu pai pela sua boa vontade inestimável. Ao meu irmão, Danilo, por ser aquele que sempre estará ao meu lado.

A Universidade Federal da Bahia, por ter sido um sonho que carreguei desde o meu Ensino Fundamental e que se concretizou, sendo motivo de orgulho na minha vida. Aos professores da época de colégio, que sempre acreditaram em mim. Aos professores da UFBA que me ajudaram a desenvolver meu senso crítico e sempre exigiram que eu oferecesse o melhor, sendo a prova concreta que é necessário lutar para se chegar onde se quer.

À todos meus amigos, por terem tornado minha caminhada na Universidade muito mais prazerosa e por terem me ajudado tanto, sem eles talvez eu não tivesse conseguido. Apesar de correr o risco de ser injusta, não poderia deixar de citar alguns nomes: Ana Carolina, Itana, Ainara, Marina e Yuri. Estes, sem dúvida, serão para sempre. A Evelin pelo incentivo ao entrar na UFBA. E a Gabriel também, por sempre me tranqüilizar nos momentos de preocupação.

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“Aquele que constrói a casa da felicidade futura edifica o cárcere do presente”.

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RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo central estudar o uso da Previdência Social como um possível mecanismo de redução da desigualdade de renda no Brasil, de forma a contribuir com a construção de um cenário menos injusto para a população brasileira. Para tal tarefa, é realizada uma análise da evolução da desigualdade de renda na segunda metade do século XX e a melhora nos indicadores na década de 2000. Uma vez exposta a trilha da desigualdade, parte-se para o âmbito da Previdência Social como uma possível amenizadora dessa realidade, colocando-se a controvérsia teórica em que está fundamentada essa questão.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Gráfico 1 – Distribuição de renda... ...22

Gráfico 2 – Evolução do índice de Gini nos anos 2000...23

Gráfico 3 – Evolução do índice de Theil nos anos 2000...23

Gráfico 4 – Índice de Gini e redução percentual da desigualdade antes

e depois do pagamento de aposentadoria e pensões...32

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Distribuição do rendimento da população economicamente ativa.

Brasil. 1960-1999... 17

Tabela 2 – Evolução temporal da pobreza no Brasil... 18

Tabela 3 – Evolução temporal dos indicadores de desigualdade de renda... 19

Tabela 4 – Parcelas do índice de Gini e o respectivo percentual, na formação do índice de Gini global dos componentes do

rendimento domiciliar per capita... 39

Tabela 5 – Razão de concentração na decomposição do índice de Gini no

rendimento domiciliar per capita. Brasil, de 1981 a 2001... 40

Tabela 6 – Decomposição do índice de Gini considerando apenas a parcela do rendimento domiciliar proveniente de aposentadorias,

pensões e benefícios assistenciais – Brasil e regiões

demográficas – 2007... 48

Tabela 7 – Contribuição do rendimento de aposentadoria e pensão para o rendimento familiar segundo situação do domicílio e

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ...9

2 DISTRIBUIÇÃO DE RENDA...11

2.1 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ...12

2.2 HISTÓRICO...15

2.3 A DESIGUALDADE NA DÉCADA DE 2000 E O POSSÍVEL INÍCIO DE UMA REVERSÃO...21

2.4 OS GASTOS REFERENTES A REDUÇÃO DA POBREZA NO BRASIL...24

3 PREVIDÊNCIA SOCIAL...28

3.1 PREVIDÊNCIA SOCIAL: A CONSTITUIÇÃO DE 1988 E A SEGURIDADE SOCIAL...28

3.2 CONTROVÉRSIA TEÓRICA...35

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...52

REFERÊNCIAS...54

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1 INTRODUÇÃO

O objetivo deste trabalho é traçar um cenário da desigualdade brasileira e a partir disso discutir a possibilidade da Previdência Social ser instrumento de redução das disparidades de renda no Brasil.

Após a introdução, discute-se no segundo capítulo o alto patamar estável da desigualdade de renda no país. Inicia-se com uma apresentação da fundamentação teórica que alguns autores elaboram para explicar essa desigualdade exacerbada no Brasil, seja no contexto de crescimento do início da década de 70 ou no contexto instável da década de 80. Enfim, independente das flutuações do período, a desigualdade se mantém com um vigor altivo. Entre as contribuições de autores, apresentam-se brevemente as idéias de Fishlow, Langoni e Bacha. Importante notar a escassez de estudos sobre as disparidades de renda para a década de 1980, dado o contexto de instabilidade do período e que resultou num desvio de atenção da análise sobre a concentração de renda.

Ainda no segundo capítulo é exposto o histórico da desigualdade social na segunda metade do século XX, herança de uma sociedade colonial, estratificada e escravocrata. Os fatores que vão influenciar significativamente na amenização desse cenário são raros. A renda concentrada na mão de poucos, dessa forma, torna-se um estigma da realidade social brasileira e dá ao país o status internacional de uma nação conhecida por seu cenário de paz e iniqüidade social. O presente trabalho concentra seu apanhado histórico na segunda metade do século XX. Logo após, discute-se a mudança que ocorre na década de 2000. Depois de sua ascensão durante a segunda metade do século XX, a desigualdade, no início do século XXI vem sendo marcada por uma melhora dos índices, como o índice de Gini e o de Theil. Essa melhora pode ser considerada uma nova trilha a ser construída na realidade social do Brasil. Segundo dados do IPEADATA (2010), de 0,596 em 2000, o índice de Gini passa para 0,543 em 2009.

O terceiro capítulo expõe a noção de seguridade social na qual a Previdência está inclusa. Inicialmente, apresenta-se um embasamento teórico e logo depois se expõe a controvérsia teórica que envolve a utilização da Previdência para fins distributivos. São contrapostos diversos estudos a respeito do uso da Previdência Social para fins de distribuição de renda, tornando-a um mecanismo apaziguador do cenário desigual do Brasil. Entre os que defendem

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o uso da mesma para tal fim argumenta-se que: a Previdência é uma forma de defesa contra as relações de trabalho precárias; promove o crescimento econômico na medida em que garante um consumo mínimo a uma parte considerável das famílias; reduz a pobreza ao considerar que o beneficiado divide os recursos com o restante da família. Por outro lado, os teóricos que são contra o uso da Previdência para tal fim, argumentam que: o intuito da Previdência Social deve ser atuar como um seguro, em que o benefício deve ser proporcional à contribuição, senão surgem fortes desequilíbrios das contas públicas; existem outras políticas as quais se os recursos da Previdência fossem canalizados para as mesmas, surtiriam maior efeito no âmbito da redução da desigualdade e pobreza.

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2 DISTRIBUIÇÃO DE RENDA

Neste capítulo o objetivo é discutir a extensão da desigualdade no Brasil como tendência confirmada nas últimas décadas, e seus impactos sobre a população. Abordam-se aspectos da situação social brasileira, para que a partir disso se discuta a adoção e a eficiência da política redistributiva que utiliza a Previdência Social como instrumento.

Internacionalmente, o Brasil não é conhecido como um país pobre, considerando-se que mais de 75% da população mundial sobrevive com uma renda per capita inferior a brasileira. No entanto, seu perfil distributivo encontra-se entre os piores do mundo e compara-se a países com PIB bem inferior ao brasileiro. Dessa forma, o Brasil não é um país pobre, mas um país que possui uma parte considerável de sua população vivendo abaixo da linha de pobreza. (BARROS; FOGUEL, 2000). Esse panorama brasileiro contraria a realidade de outros países, em que a pobreza é determinada pela escassez de recursos. No Brasil, a desigualdade é um dos maiores determinantes do nível de pobreza. Dado este cenário, se fazem necessárias políticas de combate à pobreza, considerando-se que estas no Brasil são muito interligadas a políticas de promoção do crescimento. No entanto, o que se constata é que a redução da pobreza é muito mais sensível a políticas redistributivas do que a políticas de crescimento econômico (BARROS et al, 2001). O crescimento econômico deve vir acompanhado de benefícios sociais, como redução da desigualdade social, a fim de promover o desenvolvimento de uma sociedade.

O significado de pobreza para Barros e outros (2001) é que “pobreza não pode ser definida de forma única e universal, contudo, podemos afirmar que a pobreza refere-se a situações de carência em que os indivíduos não conseguem manter um padrão mínimo de vida condizente com as referências socialmente estabelecidas em cada contexto histórico.” Assim, a pobreza brasileira advém das condições desiguais que prevalecem entre as classes, privando uma parte considerável da população das condições mínimas de sobrevivência.

O enfoque, neste capítulo, é expor um histórico de injustiça social que exclui uma parte significativa da população do acesso à dignidade e cidadania, mostrando a evolução desse cenário durante as décadas e estabelecendo relações causais entres os fatores determinantes que promovem a desigualdade social no país. Inicialmente, já se tem como certeza que o Brasil não é um país pobre, associando-se a pobreza predominante no país às condições

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desiguais de distribuição de renda. A forma mais eficiente de se combater a pobreza seria através da promoção do crescimento econômico e de políticas sociais que visam redistribuição de renda. O enfoque nesse trabalho seria a possível utilização da Previdência como uma política social para tal fim.

2.1 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

O propósito é oferecer um embasamento teórico para as discussões relativas à desigualdade de renda, expondo pontos de vistas distintos quanto à evolução da desigualdade no Brasil na segunda metade do século XX. Considerando que diversas observações chegaram à mesma conclusão – que houve um aumento considerável da desigualdade de renda – surgem diversas interpretações sobre a origem da desigualdade de renda no Brasil.

O aumento da concentração de renda na década de 60 ocasionou o surgimento de diversas explicações que fundamentassem essa realidade. Assim surge a chamada Controvérsia de 70, em que três principais teses explicariam esse aumento: a de Fishlow que culpou a compressão salarial ocorrida no Governo Castelo Branco entre 1964 e 1967; a de Langoni que mostrou como o crescimento acelerado acabou causando uma defasagem da oferta de mão-de-obra qualificada diante da sua demanda crescente; e a de Bacha que acusou a abertura do leque salarial dos gerentes das firmas diante de lucros crescentes (GANDRA, 2004).

Fishlow atentou para o fato de que o crescimento não era uma medida de desempenho social e econômico satisfatória, já que se deveria levar em conta a maneira pela qual o PIB é distribuído pela população. A principal causa do aumento da desigualdade para Fishlow concentrava-se nos efeitos nefastos que o Programa de Ação Econômica do Governo (PAEG)

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exerceu sobre o salário mínimo real e sobre o valor médio entre 1964 e 1967. As políticas governamentais que restringiam o salário nominal e aplicavam a inflação corretiva fizeram o salário mínimo declinar. Para ele, o principal responsável pela perda de participação relativa dos trabalhadores na renda total era a subestimação da inflação prevista definida pela regra de reajustes salariais o que corroía os salários. O não-repasse da produtividade integral dos salários, depois de 1964, favorecia a participação da parcela mais rica da população na renda total (GANDRA, 2004).

1 Para o PAEG a raiz do processo inflacionário estava na inconsistência distributiva da renda. (ALMEIDA, Niemeyer, 2001)

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Outra explicação que concerne ao aumento da desigualdade de renda no Brasil é a abordagem realizada por Langoni. O modelo de Langoni foi adotado pelo governo militar e neste modelo o autor defendia que o aumento da desigualdade de renda entre 1960 e 1970 esteve associado à rápida expansão da economia, de tal forma que o desenvolvimento econômico do Brasil teria levado à maior concentração de renda através da complementaridade dos seguintes mecanismos: o “Efeito Kuznets2 e a corrida tecnológica versus a defasagem na qualificação da força de trabalho. Embora estes mecanismos fossem distintos, eles tinham o mesmo gatilho: o processo de crescimento econômico acelerado disparado pelo processo estrutural de industrialização (GANDRA, 2004).

Em relação ao aumento da desigualdade, Langoni considera que o desenvolvimento econômico gera um processo de desequilíbrios, caracterizado por uma contínua transformação dos setores tradicionais (de baixa produtividade) em setores modernos (de alta produtividade). Esses desequilíbrios que se exacerbariam em fases de crescimento acelerado (decorrentes dos altos investimentos do processo de desenvolvimento econômico), faziam com que a demanda de novos fatores se deslocasse sobre uma oferta relativamente inelástica a curto e médio prazo, cuja conseqüência é o aparecimento de quase-rendas, tanto para o capital humano como para o capital físico. Ou seja, o fato da força de trabalho do setor primário migrar para o setor moderno aumentaria a concentração de renda como um todo. Mas este efeito seria temporário, pois uma vez que a renda média aumentasse e que a taxa de crescimento se estabilizasse, a desigualdade cairia (GANDRA, 2004).

Langoni montou um modelo em que o aumento da concentração pessoal da renda estava baseado numa corrida entre a expansão tecnológica dos novos setores modernos, que acelerava a demanda por mão-de-obra qualificada, e o atraso do sistema educacional do país que tornava inelástica a sua oferta no curto prazo. O modelo de Langoni se tornou o modelo oficial, adotado pelo governo militar, para explicar a causa do aumento da desigualdade de renda.

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Langoni é influenciado pelo trabalho de Kuznets e dado que o Brasil estava passando por um processo de mudança estrutural e de elevado crescimento econômico, Langoni assume a hipótese de que a relação entre crescimento econômico e distribuição de renda assumiria um formato de U-invertido. A concentração

aumentaria na fase inicial do desenvolvimento econômico, até o momento em que a população migraria para os setores mais produtivos. A desigualdade cairia no ponto em que a economia tivesse setores predominantemente de alta produtividade e um aumento da renda per capita. (GANDRA, 2004)

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Outra abordagem é a de Bacha, que estabeleceu uma relação entre a posição gerencial ocupada e o salário diferenciado que é oferecido. A atenção foi focada na distribuição funcional e na distribuição pessoal da renda. O aumento da escala das firmas (impulsionado pelo processo de desenvolvimento industrial) exigiu sistemas gerenciais mais amplos e complexos, o que fez elevar relativamente o peso dos trabalhadores white-collars na economia como um todo. Como, teoricamente, a remuneração deste tipo de trabalhadores é vinculada aos lucros e como os capitalistas, nessa época, possuíam maior poder de barganha frente aos outros trabalhadores (pouco qualificados), os donos do capital e os white-collars foram os que mais ganharam relativamente na década de 60. Também, o aumento da complexidade das firmas e das relações hierárquicas fez elevar o leque salarial dos

white-collars. De um modo geral, Bacha mostrou que a posição na ocupação interferia na

desigualdade de renda, algo que é inerente a lógica da acumulação capitalista. Adicionalmente, ele aceitava a tese de Fishlow. Além do aumento da desigualdade ser lógico ao sistema capitalista, o governo teve sua parcela de culpa no processo no que concerne ao cenário econômico (BONELLI; RAMOS, 1993).

Dessa forma, o debate que tem lugar no Brasil nos anos 70 acerca das razões do aumento da concentração de renda reproduziu dois conjuntos de idéias: a teoria do capital humano (TCH) e os efeitos da política econômica.

A TCH assumiu a explicação do aumento na desigualdade de renda num contexto de desenvolvimento industrial e oferta de trabalho inelástica. Quanto às explicações alternativas à TCH, são enfatizados os efeitos da política econômica para o aumento observado na desigualdade, em que se destacou: o papel da política salarial sob condições inflacionárias como as dos anos 60 e a não-neutralidade da política econômica em geral no período; a importância do lucro das empresas para os salários gerenciais; fatores relacionados à evolução cíclica da atividade econômica; variáveis relacionadas ao funcionamento de mercados imperfeitos (BONELLI; RAMOS, 1993).

Qualquer teoria que tenha deixado de considerar que a renda do indivíduo foi resultado de um processo complexo e multifacetado, determinado pela sua dotação inicial de riqueza, preferências, decisões de investimento e posição social levou a uma explicação parcial da concentração de renda e sua evolução (BONELLI; RAMOS, 1993).

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Diferentemente da década de 60, que teve sua desigualdade interpretada pela “Controvérsia de 70”, a explicação para a desigualdade na década de 90 foi marcada por apenas um grande modelo estrutural.3 Proposto por Ricardo Paes de Barros, este modelo de entendimento da desigualdade pessoal da renda do trabalho inseriu um cunho langoniano (com a educação desempenhando um papel crucial na desigualdade de renda) e absorveu parte da “Controvérsia de 70” ao tentar captar os efeitos de variáveis ocupacionais.

Autores como Barros e Mendonça são adeptos da TCH, no entanto eles consideram que esta não explica totalmente as origens da desigualdade de renda no mercado de trabalho, em que há variáveis como discriminação e segmentação, e dessa forma, amplia-se o modelo langoniano. Nesse aspecto, destaca-se a preocupação com diversas variáveis que concernem e influenciam na distribuição de renda e se tenta evitar limitações na explicação do cenário desigual que até os dias atuais predomina no país

2.2 HISTÓRICO

Segundo Cacciamali (2002), o histórico da desigualdade social foi herança da sociedade colonial, estratificada e escravocrata brasileira. A concentração da terra na mão de poucos, desde a divisão em capitanias hereditárias, iniciou um processo de concentração da renda que se tornou marcante na evolução social do país. Formou-se um Estado que concentra a renda e o poder na mão de poucos e configurou um cenário de abismo social que se manteve durante séculos, atravessando regimes militares, governos democraticamente eleitos, variadas políticas econômicas, crises políticas, econômicas e internacionais (BARROS et al, 2001).

Outro aspecto que favoreceu a renda na mão de poucos foi a concentração de capital humano e a limitação em termos de políticas sociais. O enfoque deste trabalho se concentrou nessa limitação e buscou retratar o papel da Previdência como uma possível amenizadora, ou não, desse cenário desigual.

O Brasil apresentou um crescimento acelerado a partir da década de 50 quando o seu setor industrial desenvolveu-se de forma acentuada e seguiu essa tendência até a década de 80,

3 É chamada atenção para a possível ausência da década de 80 no que tange às explicações para a desigualdade do período, já que este foi marcado por um cenário acentuadamente desigual. Dadas as flutuações macroeconômicas do período, num cenário de crise, a explicação para a desigualdade ficou em segundo plano. A maior preocupação da época concentrou-se no esforço de conter os altos índices inflacionários e manter a estabilidade econômica.

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quando o país é atingido pela crise da dívida externa e cessa sua capacidade de financiar-se internacionalmente. No entanto, o crescimento econômico do período não é acompanhado por uma evolução dos indicadores sociais. Esse quadro se manteve durante toda a segunda metade do século XX, em que se alternaram períodos de estabilidade e variações nos indicadores sociais. Segundo Cacciamali, “o país apresenta um perfil distributivo da renda extremamente desigual, entre os piores do mundo, sendo notado no cenário internacional do último século como um paradigma de simultaneidade entre paz política e iniqüidade”. (CACCIAMALI, 2002).

Apesar da crescente desigualdade na segunda metade do século XX, esse processo não teve a mesma intensidade em todas as décadas, sendo mais intenso nas décadas de 60 e 80, mas consideravelmente menor na década de 70. Outro aspecto importante ficou em torno da diferença da natureza da desigualdade entre as décadas: Nos anos 60, os grupos mais atingidos foram aqueles situados na parte central da distribuição de renda, enquanto nos anos 80 os grupos mais atingidos foram àqueles situados no extrato inferior da distribuição. Enquanto o coeficiente de Gini varia mais nos anos 60 do que nos anos 80, a razão 10+/10- varia mais nos anos 80 do que nos anos 60, confirmando que as mudanças no meio da distribuição foram mais importantes durante a década de 60 e as mudanças no extrato inferior da distribuição foram mais presentes na década de 80. Dessa forma, o aumento da desigualdade causou maior impacto sobre a pobreza na década de 80. Enquanto a camada mais pobre foi a que mais sofreu com o aumento da desigualdade nos anos 80, na década de 60 a classe média foi a mais atingida (BARROS; MENDONÇA, 1995).

A distribuição de renda no Brasil se agravou ao longo das décadas, tendo como determinantes os fatores estruturais e a inexistência de políticas distributivas contínuas e consistentes (CACCIAMALI, 2002). A tabela 1 diagnostica a evolução do perfil distributivo ao longo da segunda metade do século XX. Observa-se um crescimento acentuado do índice de Gini até o fim da década de 80, e uma queda durante a década de 90. Uma possível explicação para esta queda foi a redução do índice inflacionário, o qual reduziu as perdas salariais através da estabilização da economia. Na mesma década, houve também queda da renda apropriada pelos 10% mais ricos da população.

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Tabela 1 – Distribuição do Rendimento da População Economicamente Ativa. Brasil. 1960-19994 Percentis 1960 1970 1980 1985 1990 1995 1999 10% mais Pobres 1,9 1,2 1,2 0,9 0,8 1,1 1,2 30% mais Pobres 5,9 6,2 6,2 5,3 4,6 5,6 6,2 50% mais Pobres 17,4 15,1 14,1 13,1 11,2 13,0 13,9 30% mais Ricos 66,1 71,7 73,2 74,6 76,4 74,5 73,1 10% mais Ricos 39,6 46,5 47,9 47,7 49,7 48,2 46,8 1% mais Ricos 12,11 14,51 13,5 13,3 13,9 13,4 13,0 Índice de Gini 0,497 0,565 0,592 0,660 0,620 0,592 0,576 Fonte: CACCIAMALI, 2002, p.13

Da década de 70 para a de 80 ocorreu uma queda no ritmo da concentração de renda, em que o índice de Gini passou de 0,565 para 0,592, ou seja, houve um aumento relativamente reduzido do índice de Gini quando comparado ao dos outros anos. Essa queda se justificou pelo crescimento econômico ocorrido na década de 70, no aumento nas taxas de emprego e na reivindicação do movimento sindical por melhores salários. Apesar de tudo, os segmentos ricos da sociedade se apropriaram de taxas de crescimento da renda superiores aos demais. No final dessa década, o cenário brasileiro de estabilização, crescimento do emprego e eminência de uma democratização política trazia perspectivas animadoras quanto à futura distribuição de renda (CACCIAMALI, 2002).

No entanto, o cenário da década de 80 foi marcado pela crise da dívida externa, e a década ficou conhecida como a década perdida. O índice de Gini aumentou de 0,592 para 0,660 e reduziu-se apenas no primeiro ano da década de 90 para 0,620. O contexto socioeconômico do período foi caracterizado pelas altas taxas de inflação, instabilidade das instituições e aumento da dívida pública. Já a década de 90 foi marcada pela introdução dos ideais neoliberais, êxito no controle da inflação e maior abertura ao mercado externo (CACCIAMALI, 2002).

Ao longo das décadas de 70 e 80, a desigualdade permaneceu acentuada. Os distúrbios macroeconômicos como a inflação, a indexação e a instabilidade institucional favoreceram

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esse panorama, na medida em que se configuraram como mecanismos de transferência de renda aos estratos superiores e corroboraram com a limitação para implantar políticas sociais redistributivas que atingissem áreas estratégicas da concentração de renda, como a estrutura fundiária, a educação e o acesso ao crédito e à tecnologia. A implantação do Plano Real, em 1994, trouxe estabilidade de preços à economia e propiciou uma amenização do cenário desigual da sociedade brasileira, de forma que aumentou o poder de compra da população. A iniciativa de abertura comercial que foi introduzida na década de 90, contrapondo-se à substituição de importações das décadas anteriores, teve um papel importante no combate à inflação. Por outro lado, essa abertura ocasionou invasão de produtos importados e falência de várias empresas, o que caracterizou aumento do desemprego. A alta taxa de juros a fim de manter o fluxo de capital internacional para o país também inibiu as atividades de empresas brasileiras. Nesse contexto, percebeu-se uma redução da ocupação formal e aumento das atividades informais, deteriorando o mercado de trabalho brasileiro.

Nas décadas de 1980 e 1990, os níveis de pobreza mantiveram um comportamento estável. Os valores mais exacerbados da pobreza nesse período estiveram na década de 80, em que estes estavam ancorados na recessão do período. As quedas nos indicadores da pobreza nessas duas décadas foram pontuais e registradas através dos impactos do Plano Cruzado e do Plano Real, nos anos de 1986 e 1994, respectivamente. A tabela 2 demonstra que ao longo das duas décadas a pobreza reduziu-se, passando, em termos percentuais, de 39,6% para 34,1% (BARROS et al, 2000). No entanto, com o aumento da população também houve aumento do número de pobres no país. O novo patamar foi atribuído aos benefícios do pós Plano Real, a partir de 1995.

Tabela 2 – Evolução Temporal da Pobreza no Brasil

Ano Percentual de Pobres

Número de Pobres (em milhões)

1977 39,6 40,7 1978 42,6 45,2 1979 38,8 42,0 1980 43,2 50,7 1982 43,2 52,0 1983 51,1 62,8 1984 50,5 63,6 1985 43,6 56,9 Continua

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Conclusão

Tabela 2 – Evolução Temporal da Pobreza no Brasil

1986 28,2 37,6 1987 40,9 55,4 1988 45,3 62,6 1989 42,9 60,7 1990 43,8 63,0 1992 40,8 57,3 1993 41,7 59,4 1995 33,9 50,2 1996 33,5 50,1 1997 33,9 51,5 1998 32,8 50,3 1999 34,1 53,1

Fonte: PNADs de 1977 a 1999 apud BARROS, HENRIQUES E MEDONÇA, 2001, p.3

A pobreza no Brasil não deve ser associada à ausência de recursos, dado que a renda per capita do país é superior a de 2/3 do resto do mundo. Cerca de 64% dos países tem renda per capita inferior à brasileira e cerca de 77% da população mundial vive nesses países. Pode-se dizer que o Brasil é um dos países que tem melhores condições de enfrentar a pobreza, dado que não possui escassez de recursos. A renda per capita brasileira é superior à linha de pobreza nacional, sendo assim, a pobreza brasileira está associada à concentração de renda. (BARROS et al, 2001). Quando se utiliza a razão entre a proporção da renda apropriada pelos 10% mas ricos e a proporção da renda apropriada pelos 40% mais pobres, comparando-se 55 países, constata-se que a razão para o Brasil fica em 30, ou seja, os 10% mais ricos no país tem cerca de 30 vezes mais renda do que os 40% mais pobres. Dessa forma, o Brasil possui uma posição de destaque, no cenário internacional, no que tange à desigualdade (BARROS; MENDONÇA, 1995).

Tabela 3 – Evolução Temporal dos Indicadores de Desigualdade de Renda

Ano Coeficiente de Gini

Razão entre a Renda Média dos 20% mais Ricos e dos 20% mais

Pobres

Razão entre a Renda Média dos 10% mais Ricos e a dos

40% mais Pobres 1977 0,62 27,5 26,8 1978 0,60 31,3 25 1979 0,60 32,9 25,2 1981 0,59 24 21,8 1982 0.59 25,6 23 Continua

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Conclusão

Tabela 3 – Evolução Temporal dos Indicadores de Desigualdade de Renda

1983 0,60 25,7 23,5 1984 0,59 23,6 22,4 1985 0,60 25,5 23,6 1986 0,59 24 22,1 1987 0,60 27,6 24,4 1988 0,62 30,9 27,2 1989 0,64 34,3 30,4 1990 0,62 31,2 26,9 1992 0,58 26,7 21,8 1993 0,60 28,8 24,5 1995 0,60 28 24,1 1996 0,60 29,8 24,6 1997 0,60 29,2 24,5 1998 0,60 28,6 24,2 1999 0,60 27,2 23,3

Fonte: BARROS, HENRIQUES E MENDONÇA, 2001, p.16

Na Tabela 3 se constata a relativa estabilidade da desigualdade nas três décadas, em que o índice de Gini se manteve constante – observou-se nos dados a constância dos indicadores em um patamar elevado – apesar de todo o contexto macroeconômico instável do período analisado. O período de 1977 até 1981 caracterizou-se pelo aumento da renda per capita, redução da desigualdade e aceleração inflacionária no fim da década de 70. Os anos de 1981 a 1985 foram marcados basicamente pela recessão e elevação da desigualdade num contexto inflacionário. Já o período 1985 a 1989 registrou um aumento adicional da concentração em um meio alternado por momentos de crescimento e recessão, hiperinflação e congelamento de preços e salários (BONELLI; RAMOS, 1993). Essa relativa estabilidade seria benéfica caso o índice de Gini não demonstrasse que o patamar no qual se estabilizou foi reflexo de uma sociedade extremamente desigual e que essa desigualdade, quando contraposta com políticas econômicas, encontrava-se em segundo plano pelas autoridades.

O Brasil chega ao século XX ostentando um dos piores índices de desigualdade na distribuição de rendimentos do mundo. A desigualdade parece ter aumentado independentemente do contexto macroeconômico. Tanto os anos 60 como os anos 70 foram períodos de crescimento acelerado da renda e do emprego. O contraste desses períodos com os anos 80 é gritante. No entanto, o aumento da desigualdade conforme indica o índice de Gini foi aproximadamente da mesma magnitude nas décadas de 70 e 80 (BONELLI;

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RAMOS, 1993). Dessa forma, colocam-se os dois lados, representados pelo crescimento econômico e distribuição de renda, que configuram fenômenos distintos.

No contexto da evolução da desigualdade, em que não há reversão da situação na segunda metade do século XX, Cacciamali destaca:

Altos índices de desigualdade encontram-se associados a uma pior qualidade de vida, inclusive para os mais ricos. Caracterizam-se como sociedades mais violentas, restritas em suas possibilidades de constituir ambientes com elevada produtividade sistêmica e que apresentam multifacetados e elevados índices de desperdício no uso de recursos, seja na conservação do meio ambiente; na depredação urbana; na qualidade dos bens e serviços produzidos; na instabilidade dos contratos e negócios; nos valores oportunistas de conduta social etc. (CACCIAMALI, 2002, p.23).

Para a autora os principais elementos que se realimentavam e que impediam um quadro redistributivo no país eram: 1) a elevada concentração de riquezas no país tanto em termos de capital físico como em capital humano - nesse aspecto repensa-se Langoni -, a qual impedia um sistema social melhor distribuído e com alta produtividade, dado a reprodução sistemática da situação desigual; 2) o interesse das classes dominantes para que houvesse manutenção de privilégios; 3) a ausência histórica de políticas públicas que visassem mudanças estruturais e distributivas, e; 4) o baixo nível de educação formal brasileiro, que impossibilitava os trabalhadores auferirem maiores ganhos e concomitantemente concentrava a renda na minoria que possuía acesso a educação, desarticulando o sistema organizacional político e social (CACCIAMALI, 2002).

2.3 A DESIGUALDADE NA DÉCADA DE 2000 E O POSSÍVEL INÍCIO DE UMA REVERSÃO

Depois de sua ascensão durante a segunda metade do século XX, o início do século XXI foi marcado por uma melhora significativa nos índices que retratavam a desigualdade no país. Essa melhora não representou, num primeiro momento, grandes mudanças no panorama social brasileiro. No entanto, dado o histórico brasileiro marcado pela concentração de renda, visto desde a concentração de terras no início da colonização, essa mudança no índice de desigualdade poderia estar construindo uma nova trilha para a evolução da sociedade brasileira. Segundo Dedecca e outros (2008), a queda que aconteceu tem um caráter mais longo e está inserida num contexto de recuperação econômica.

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Os sinais de queda da desigualdade, que se manteve estagnada desde a década de 70, começaram a se manifestar no começo do milênio, como exposto no Gráfico 1. A parcela dos 50% mais pobres quanto à apropriação da renda era de 12,5% em 2001, 13,9% em 2004 e 14,1% em 2005, como é demonstrado no gráfico abaixo. Enquanto a participação dos 50% mais pobres cresceu no início do século XXI, os 10% mais ricos perderam participação nesse período passando de 47,2% do total da renda apropriada em 2001 para 45,1% em 2005 (NERI, 2006).

Gráfico 1 – Distribuição de Renda

Fonte: NERI, 2006, p.11

O índice de Gini apontou para uma queda da desigualdade a partir de 2001, passando de 0,596, neste ano, para 0,569 em 2005, chegando em 2009 a 0,543 (ver gráfico 2). Essa evolução, apesar de importante, não retirou do Brasil a posição de destaque no cenário internacional relacionado à desigualdade social, com o status de um dos países com maior índice de desigualdade de renda do mundo. Segundo informações de Barros e outros (2007), dos 74 países para os quais existiam informações sobre a evolução do coeficiente de Gini ao longo da década de 90, menos de ¼ foram capazes de reduzir a desigualdade a uma velocidade superior à alcançada pelo Brasil entre 2001-2005. No entanto, apesar desse contexto, a desigualdade brasileira permaneceu elevada: A parcela apropriada pelo 1% mais rico da população (que abrange a elite proprietária da renda no país) foi da mesma magnitude que a apropriada pelos 50% mais pobres. Também, é interessante notar que 64% dos países tinham, no momento da análise, renda per capita inferior à brasileira e 43% dos países tinham a renda per capita dos 20% mais pobres menor que dos 20% mais pobres brasileiros (BARROS et al, 2007).

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Gráfico 2 – Evolução do Índice de Gini nos Anos 2000.

Índice de Gini - Anos 2000

0,596 0,589 0,583 0,572 0,569 0,563 0,556 0,548 0,543 0,51 0,52 0,53 0,54 0,55 0,56 0,57 0,58 0,59 0,6 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 Ano Ín d ic e d e G in i

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IPEADATA

Gráfico 3 – Evolução do Índice de Theil nos Anos 2000.

Índice de Theil Anos 2000

0,727 0,710 0,686 0,665 0,659 0,644 0,624 0,608 0,597 0,00 0,10 0,20 0,30 0,40 0,50 0,60 0,70 0,80 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 Ano Ín d ic e d e T h e il

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IPEADATA

Apesar dessa visível evolução, houve controvérsias teóricas no que se referem aos efeitos dessa redução sobre o bem-estar social. As abordagens principais se resumiam a três: Barros et al (2006) e Hoffmann (2006) que acreditavam que a queda da pobreza aconteceu de forma intensa, resultado da redução da desigualdade social. Já Dedecca (2006) considerou que a queda é significativa, mas não promoveu grandes mudanças na estrutura social do Brasil, dado que o aumento do rendimento médio da população – indicador do bem-estar da população - só recentemente acompanhou a queda da desigualdade. Salm (apud

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CACCIAMALI, 2009) considerou que as reduções de pobreza e desigualdade que ocorreram nos últimos anos não tem efeitos sobre o bem-estar social. Apesar de ter discordado dos dois discursos extremistas – Barros e Hoffman; e Salm – Cacciamali, ao analisá-los, expôs a seguinte visão:

A magnitude da queda da desigualdade de renda nacional e regional não foi capaz, como era de se esperar nesse curto prazo analisado, de alterar significativamente o padrão de bem-estar social brasileiro medido pelo consumo familiar. Políticas sociais com impactos no curto prazo sobre a distribuição podem ser combinadas com políticas macroeconômicas de longo prazo, tais como a expansão da produtividade do trabalho e o crescimento do rendimento médio dos mercados de trabalho nacional e regional. Naturalmente que essas políticas sociais e macroeconômicas se potencializam num ambiente de crescimento econômico mais acelerado. (CACCIAMALI; CAMILLO, 2009, p.18).

Mesmo com essa importante evolução nos últimos dez anos, como visto nos gráficos 1 e 2, é essencial que o país mantenha o caminho e continue adotando estratégias de manutenção dessa tendência. Essa evolução somente pode ser consolidada e constituir em reflexos visíveis para a sociedade no longo prazo. Segundo Barros e outros (2007), cerca de 90% dos países ainda apresentam distribuições menos concentradas que a do Brasil.

2.4 OS GASTOS REFERENTES A REDUÇÃO DA POBREZA NO BRASIL

Mesmo com as mudanças relativas que ocorreram nos índices de desigualdade no início do século XXI, Neri (2006) constata que:

A alta desigualdade de renda talvez seja a nossa principal chaga e, ao mesmo tempo, essa mesma desigualdade abre espaço para a implementação de um espectro mais amplo de ações contra a miséria. Alta desigualdade significa que a pobreza pode ser reduzida por meio de transferências de renda. Por exemplo, na Índia, país muito pobre, mas razoavelmente igualitário (índice de Gini de 0,29, ou seja, metade do brasileiro) não há solução para a erradicação da miséria a não ser o crescimento. No caso brasileiro, políticas contra a desigualdade são um importante aliado na redução da pobreza. (NERI, 2006, p.14).

É nesse ambiente que o presente trabalho se propôs a analisar a política social referente à Previdência Social como uma possível amenizadora desses distúrbios na medida em que tem englobado em sua estrutura a possibilidade de canalizar recursos para as camadas pobres da sociedade, podendo corroborar – ou não – para a mudança desse quadro.

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A estratégia mais eficiente para redução da pobreza seria a combinação de políticas que promovessem o crescimento econômico e políticas de redistribuição da renda. E sabe-se que a redução da pobreza é mais sensível a variações na distribuição de renda. Haveria possibilidade de sintonizar crescimento e distribuição de renda através do uso de políticas sociais, em que se utilizaria o recurso proveniente do crescimento econômico e o dirigiria para as camadas pobres da população, em que os resultados trariam redução da pobreza.

No Brasil, a proporção de miseráveis (indivíduos que vivem com menos de R$121,00 por mês – a preços da Grande São Paulo em Outubro de 2005 –, quantia necessária para suprir apenas as suas necessidades alimentares básicas) cairá dos 22,77%, de 2005, para 21,94% em 2006, uma queda de 3,62%, se a renda per capita nacional crescer 3% ao ano em termos per capita. A redução seria ainda maior caso esse crescimento viesse de mãos dadas com alguma redução da desigualdade. Se a expansão de 3% fosse combinada com uma queda de 0,007 ponto de porcentagem do índice de Gini (de 0,568 para 0,561), que, grosso modo, corresponde à queda observada entre 2002 e 2003, a miséria brasileira cairia cerca de 8,44%. A proporção de miseráveis passaria para 20,85%. Ou seja: os 41 milhões de pobres iniciais se reduziriam em 3,5 milhões. Vale assinalar que a queda mencionada apenas levaria a desigualdade brasileira, medida pelo índice de Gini, de 0,568 para o nível de 0,561 [...] Considerando-se um período mais longo, a pobreza poderia ainda recuar substantivamente mesmo que o País deixasse de crescer. Se, nos próximos quatro anos, a desigualdade brasileira repetir a trajetória do último triênio (queda de 0,02 no índice de Gini), a proporção de miseráveis cairá em 20,33% contra os 13,28% daquela obtida no cenário de crescimento de 3% ao ano puro (ou 4,5% de crescimento, ao ano, do PIB total). Reduzir a desigualdade num contexto de crescimento econômico parece mais factível em termos de economia política do que em períodos de recessão, quando perdas estão sendo repartidas. (NERI, 2006, p. 15-16).

Os gastos sociais são de extrema importância para reduzir a pobreza no país, a partir do momento que o país possui recursos o suficiente para combater a pobreza nacional. O problema da ineficiência no combate à pobreza pode estar atrelado ao mau uso das políticas sociais.

No Brasil, existem quatro setores onde os gastos sociais mais se concentram: Previdência Social, Benefícios a Servidores Públicos, Educação e Saúde. Dado que os servidores públicos não constituem a parcela mais pobre da população, esse gasto não é considerado como uma política social de assistência aos pobres. É importante ressaltar que a questão dos dispêndios em políticas sociais está ancorada à duas magnitudes: acesso e gastos. Assim, os mais pobres podem ter maior acesso aos programas, mas não receberem os maiores benefícios. É nesse aspecto que se evidencia o caráter progressivo da Previdência, em que quem contribuiu mais,

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receberá mais. Sendo assim, o uso da Previdência para com os mais pobres é questionada e abre-se espaço para o debate entre diversos autores em que uns defendem o uso da mesma para redução da pobreza, e outros questionam seu uso para tal fim.

É possível reduzir a pobreza sem aumentar qualquer nível de gastos na área social. O redesenho de programas públicos adequados é uma tarefa complexa. Essa conclusão parece auspiciosa na medida em que aponta para uma solução do problema da pobreza que depende mais do aperfeiçoamento das políticas públicas do que da elevação dos gastos. Isso se torna relevante em momentos de ajuste fiscal (BARROS; FOGUEL, 2000).

No dilema entre equidade e crescimento, observa-se que a adoção de políticas baseadas em transferência de renda sem o devido controle pode levar a um aumento das despesas públicas, que por sua vez leva ao incremento da carga tributária e da taxa de juros, contribuindo para o aumento da dívida pública e travando o crescimento econômico, conseqüentemente restringindo a possibilidade de redução da desigualdade (NERI, 2006).

Uma forma eficiente de constatar a contribuição de diferentes tipos de renda é não só medir suas taxas de crescimento, mas também as suas ponderações na renda total e na renda dos pobres. Seria medir a elasticidade da contribuição de uma transferência pública específica para a melhora do bem-estar a respeito do seu custo fiscal, obtendo uma dimensão de sua eficiência quanto a atingir as classes menos favorecidas e orientando as políticas sociais. É com esse argumento que muitos defendem a efetividade de outras políticas sociais em detrimento da seguridade social, dizendo que a Previdência não possui um efeito tão eficiente na distribuição (NERI, 2006).

No próximo capítulo, discute-se o uso da Previdência Social como uma política que tem por objetivo reduzir a pobreza na sociedade brasileira. Inserida no conceito de proteção social, afirmando-se na Constituição de 1988, a Previdência assume um compromisso de universalização de seus benefícios a fim de garantir bem-estar a parcela da população que estaria desprotegida e a margem social caso a mesma não existisse. Ela estaria inserida num contexto de política de combate a pobreza e promoção da redução da desigualdade. Mais a frente discute-se o surgimento da Previdência Social, os princípios os quais ela se ancora e as controvérsias teóricas que a envolvem.

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3 A PREVIDÊNCIA SOCIAL

3.1 PREVIDÊNCIA SOCIAL: A CONSTITUIÇÃO DE 1988 E A SEGURIDADE SOCIAL

Depois de exposto o quadro da desigualdade social brasileira no capítulo anterior, em que se mostrou a necessidade de medidas que venham a solver esse cenário, neste capítulo colocam-se em contraposição teórica autores que divergem entre si sobre a manutenção dos ideais solidários e universais da Previdência e a racionalização dos seus gastos. Antes disso, é exposta a essência da Previdência – enquadrada no contexto de seguridade social e consolidada na Constituição de 1988 – como forma de esclarecer de que forma ela sofre as variações de ordem teórica que a envolve.

Historicamente, a seguridade social começou a emergir com o advento da Revolução Industrial, num momento em que houve aumento considerável dos infortúnios relacionados a acidentes de trabalho, o que tornou a questão social mais complexa. Nesse contexto, na maioria das vezes, a culpa era atribuída ao trabalhador e o ônus da perda da capacidade de trabalho recaía sobre a família. No entanto, dado que a situação não estava atribuída a um caso isolado e era observada no âmbito coletivo, passou a ser vista sob a ótica do direito social5. A solução encontrada organizou-se em um sistema baseado na técnica do seguro, em que todos contribuíam a fim de cobrir os segurados e constituiu um sistema de solidariedade intra e intergeracional. A seguridade social estaria presente para todos aqueles que não podiam ou não conseguiam encontrar meios de sustento pelo trabalho, o que a tornava um meio de evitar que esses indivíduos tivessem um padrão de consumo abaixo do necessário à sobrevivência. No Brasil, esse conceito foi inserido tardiamente, uma vez que a proteção social já era uma visão bem conhecida no mundo. Ela se consolidou na Constituição de 1988, apesar do contexto mundial de expansão do ideal neoliberal.

5 O direito à Previdência Social está dentre os Direitos Sociais estabelecidos na Constituição Federal, no Título II – Dos Direitos e Garantias Fundamentais, Capítulo II, Artigo 6º:

“São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”.

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Apesar do contexto tardio em que o Brasil se encaixou no sistema de proteção social6, este não era um conceito recente. Após a crise de 1929, que veio a arrasar diversos segmentos sociais, se fez necessária uma política que alavancasse o contexto econômico e social da época. Foi nesse momento de fragilidade que surgiu a teoria keynesiana7, pregando a intervenção estatal na economia como forma de estímulo aos diversos setores da sociedade. Assim, segundo definição de Vianna apud Gentil (2006)

(...) a sociedade se solidariza com o indivíduo quando o mercado o coloca em dificuldades. Mais precisamente, o risco a que qualquer cidadão, em princípio está sujeito – de não conseguir prover seu próprio sustento e cair na miséria – deixa de ser problema meramente individual, dele cidadão, e passa a constituir uma responsabilidade social, pública. O Estado de bem-estar assume a proteção social como direito de todos os cidadãos porque a coletividade decidiu pela incompatibilidade entre destituição e desenvolvimento. (p.77).

A Previdência Social faz parte de um arranjo institucional que inclui também a saúde e a assistência, em que a finalidade primordial é assegurar o trabalhador em momentos de infortúnios relacionados à sua vida laboral e velhice. Esse arranjo institucional define-se como seguridade social e tem por objetivo dar suporte aos cidadãos que estão fora do mercado de trabalho por motivos alheios a sua vontade ou envelhecimento. No Brasil, a Constituição de 1988 manifesta os preceitos referentes à proteção social, com fins de aumento da cobertura previdenciária e vinculação do piso do benefício ao salário mínimo. Esses dois aspectos configuram a tentativa, na Constituição de 1988, de trazer ampliação das garantias sociais ao cidadão brasileiro.

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) na Convenção nº 102, expressa que a seguridade social é:

A proteção que a sociedade proporciona a seus membros, mediante uma série de medidas públicas contra as privações econômicas e sociais que, de outra forma, derivam do desaparecimento ou em forte redução de sua subsistência como conseqüência de enfermidade, maternidade, acidente de trabalho ou

6

A Constituição de 1988, onde se afirma a Seguridade Social, já surge num momento em que

começavam a emergir movimentos de distanciamento do antigo Estado de bem-estar social. A década de 1990 já estava marcada por políticas de cunho neoliberal. (APOLLO, 2010, p.55)

7

A teoria keynesiana parte, em sua análise, da constatação de que o pleno emprego, em uma economia capitalista, não é uma situação permanente ou única de equilíbrio. Ao contrário, o desemprego involuntário não só pode existir como pode ser uma condição persistente, que se estenda ao longo do tempo, o que o caracterizaria como sendo de equilíbrio. Este fato implica que o livre mercado pode não levar automaticamente ao pleno emprego, pelo menos no curto prazo, e, portanto, justifica políticas econômicas contra o desemprego. (DATHEIN, 2000)

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enfermidade profissional, desemprego, invalidez, velhice e também a proteção em forma de assistência médica e ajuda às famílias com filhos.

Por outro lado, a seguridade social é um ingrediente necessário, mas insuficiente para retirar da base da escala social uma parcela numerosa da população. Restaria a injustiça social que deriva da desigualdade de oportunidades e da sobrevida com desesperança – marcos de um capitalismo construtor de exclusão política e econômica – mesmo que houvesse educação e saúde gratuitas, salário-desemprego, Previdência Social e outras formas de amparo nas proporções necessárias para atender a grande parte dos trabalhadores carentes espalhados pelo país (GENTIL, 2006). Dessa forma, a seguridade social é importante na medida em que atua como uma apaziguadora da realidade desigual.

A Previdência Social está inclusa no conceito de seguridade social, no entanto, é aquela se diferencia por guardar consigo o aspecto contributivo – exceto em caso de Previdência Rural – enquanto que a seguridade social está preocupada em suprir todos àqueles que se encontram em necessidade. Dessa forma, como cita Vianna

O conceito de Seguridade Social, com efeito, tem um significado diverso do conceito de Previdência Social. Previdência é um sistema de cobertura dos efeitos de contingências associadas ao trabalho, resultante de imposição legal e lastreado nas contribuições dos afiliados para seu custeio; tem por objetivo ofertar benefícios aos contribuintes – previdentes – quando, em ocasião futura, ocorrer perda ou redução da capacidade laborativa dos mesmos. Já a Seguridade é um sistema de cobertura de contingências sociais destinado a todos os que se encontram em estado de necessidade, não restringindo os benefícios nem aos contribuintes nem à perda da capacidade laborativa; auxílios a famílias numerosas, pensões não-contributivas, complementações de renda, constituem benefícios de seguridade porque ou não resultam de perda/redução da capacidade laborativa ou dispensam a contribuição pretérita. (VIANNA, 2005, p.2-3).

A universalização da cobertura com uniformidade de tratamento dos trabalhadores somente se consolida com a Constituição de 1988. Os que defendem as medidas estabelecidas na Constituição consideram que seu alcance seria efetivo para redistribuir renda e reduzir as desigualdades que sempre marcaram o Brasil (O PERÍODO... 2006). Na medida em que associa as ações de Previdência, assistência, e saúde num corpo integrado e se estrutura com base no princípio da universalidade da cobertura e atendimento, o sistema de proteção social definido na Constituição Federal prevê garantias contra contingências sociais que ameacem a sobrevivência do indivíduo. Na Seguridade prepondera o contrato social e os direitos sociais, em que a necessidade do cidadão prima sobre suas eventuais contribuições para o sistema. A

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Seguridade Social brasileira, conforme concebida é, portanto, promotora de uma distribuição menos desigual de renda e acesso a bens (DIEESE, 2007).

Segundo a Constituição de 1988, artigo 193, “a ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais”. Dessa forma, por estar inclusa no contexto da seguridade social, entende-se a Previdência Social como uma responsabilidade para com a sociedade, ou seja, uma responsabilidade que engloba aqueles indivíduos que de alguma forma contribuíram para o desenvolvimento econômico8, cita-se:

É fundamental se reconhecer que a Previdência Social é uma conquista social essencial, que se consolidou após a 2ª Guerra Mundial com a constituição do Bem-Estar Social na Europa. É o reconhecimento de que o trabalho é um custo inevitável para a produção capitalista e a reprodução do capital. E é um custo tanto quando os trabalhadores estão na ativa tanto quando se aposentam. Portanto, a Previdência é um direito social, que juntamente com muitos outros, limitou a tendência, que é inerente a lógica de funcionamento do capitalismo, de exploração sem limites da força de trabalho. É um avanço extraordinário conquistado pela sociedade; é a defesa das condições de vida das pessoas quando elas não podem mais trabalhar, ou não têm a mesma capacidade de exercer a atividade produtiva. (FILGUEIRAS; LOBO, 2003, p.733).

Ao considerar que o sistema previdenciário brasileiro está consolidado na Constituição de 1988, em que esta se inspira nos ideais do welfare state9, sabe-se que um das suas metas é abranger a maior parte da população do país, dado seu caráter de lei e direito social. O sistema previdenciário brasileiro conta com aproximadamente 59,6% da população economicamente ativa (PEA), na condição de segurado. Isto corresponde a 55,9 milhões de pessoas, distribuídos entre aposentadorias e pensões do Regime Geral de Previdência Social (RPGS) e os regimes próprios do funcionalismo público de todas as esferas do Governo, além dos segurados especiais. A cobertura previdenciária brasileira é, atualmente, a segunda maior da América Latina (IPEA, 2009 apud MIRANDA, p.52). Em 1970, havia 7,6 milhões de segurados; em 1980, 23 milhões. Nesse aspecto, destaque para os segurados rurais, que aumentou seu contingente entre 1991 e 1994, e chegou a 40% do total dos benefícios

8 Nesse aspecto, não se está referenciando a questão da contribuição do trabalhador para com a Previdência, mas somente sua contribuição socioeconômica.

9

O welfare state foi uma construção da sociedade européia do pós-Segunda Guerra Mundial e correspondeu ao estabelecimento de um pacto social que implicou na acentuada participação do Estado na promoção de benefícios sociais de forma a proporcionar padrões de vida mínimos à população. O Estado passou a promover a integração social, garantindo tipos mínimos de renda (seguro contra doença, velhice, invalidez, acidente de trabalho, desemprego e morte) e também subsídios alimentares, saúde, educação, habitação, que foram assegurados a todo cidadão não mais como caridade, mas como direito de cidadania (VIANNA, 1998).

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emitidos. Nesse âmbito, destaque para a vinculação ao salário mínimo – “61% da quantidade de aposentadorias e pensões e 31% do valor total pago estavam associados a pagamentos a indivíduos que recebiam exatamente 1 SM em 2003.” O sistema previdenciário pode ser utilizado como um poderoso instrumento de combate a pobreza, principalmente quando se trata de sua vinculação ao salário mínimo – apesar de argumentos contrários, que dizem que esse piso do beneficio não promove a redução da desigualdade e a camada mais pobre da população não está localizada entre os idosos (Giambiagi et al., 2004). Em 2008, os gastos previdenciários foram responsáveis por uma queda de 7,1% no índice de Gini. O percentual de pobres aumentaria em quase 21 milhões, ou seja, de 11,38% para 29,18% da população caso a Previdência não existisse. (MIRANDA, 2010, p.69-70).

Gráfico 4 – Índice de Gini e Redução Percentual da Desigualdade Antes e Depois do Pagamento de Aposentadorias e Pensões

Fonte: Disoc/IPEA com base nos microdados das PNADS. Elaboração: IPEA (2009) apud MIRANDA, 2010, p.70

Estruturando-se em um sistema de repartição simples – em que a geração atual através de contribuições garante a renda dos atuais aposentados –, de caráter universal e ancorado no salário mínimo a Previdência Social brasileira se coloca como uma matriz de recursos a uma parcela considerável da população brasileira. O caráter universalista garante uma possível desvinculação do aspecto contributivo que um sistema de seguro tem intrínseco e a vinculação com o salário mínimo coloca o indivíduo em um patamar mínimo de sobrevivência. O cidadão deve receber benefícios conforme suas necessidades, em que o caráter contributivo passa a ocupar uma posição secundária e a meta é a redução da pobreza. É exatamente neste ponto que vários estudiosos do assunto entram em discordância.

Quanto a seu caráter contributivo, é estabelecido no Artigo 195 da Constituição Federal de 1988 que toda a sociedade é responsável pelo financiamento da Seguridade Social, de forma

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direta e indireta, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, e das seguintes contribuições sociais: I) dos empregadores, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei sobre a folha de salários, faturamento ou lucro; II) trabalhadores e demais segurados da Previdência Social; III) receitas de concursos, e; IV) importador de bens e serviços do exterior. Entre as contribuições que financiam a seguridade, incluem-se a COFINS, PIS/PASEP, CPMF (até 2007), CSLL. Para o subsistema previdenciário, foram criadas contribuições específicas, incidentes diretamente sobre a remuneração ou a renda dos trabalhadores e sobre a folha de pagamentos, incidente, neste caso, sobre o empregador (TAFNER, 2007).

A idéia subjacente ao orçamento da Seguridade Social encontra paralelo em uma proposta feita por Myles (2002) apud Miranda (2010): todos os benefícios de caráter assistencialista devem ser financiados não somente através de contribuições específicas sobre aqueles que trabalham, mas através de general revenue – advinda de impostos sobre a renda, consumo e outras taxas – ou seja, um financiamento compartilhado de maneira mais ampla entre a sociedade – no caso da Previdência, recaindo sobre os trabalhadores e também sobre os aposentados. Entretanto, Myles tem cuidado de explicar que tais receitas devem ser geradas levando em consideração o princípio da capacidade de pagamento – o que, certamente, excluiria os mais pobres de arcar com esse ônus.

O sistema de seguridade social brasileiro, ao garantir uma pensão mínima para os beneficiários – através do salário mínimo e universalização no artigo 194, inciso I – tem efeito muito poderoso como redutor da pobreza nas famílias brasileiras. Em síntese, a seguridade social é considerada por muitos analistas como um programa social de transferência de renda que impacta a vida familiar, reduzindo efetivamente o grau de pobreza no país, ainda que o mesmo resultado pudesse ser obtido com custos menores, caso houvesse maior flexibilidade na fixação do valor de benefícios e maior rigor na sua concessão. No entanto, devem-se estabelecer limites à concessão de benefícios, sobretudo em um país caracterizado por elevado grau de pobreza e desigualdade. Um país que conta com muitos pobres e tem um elevado grau de desigualdade tem que ser seletivo com os recursos destinados às políticas sociais e monitorá-las, sob pena de reforçar as iniqüidades existentes (O PERÍODO... 2006).

Considerando este último argumento, o ponto de vista defendido por alguns autores é que, apesar da Constituição de 1988 ter iniciado um intenso processo de reformas na legislação, ao

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longo dos anos o que se tem visto é que a política de combate à desigualdade via sistema de seguridade estaria com seus dias contados. Os argumentos utilizados são que sua potência quanto redutor das desigualdades é limitada. Aumentos no valor dos benefícios são limitados quanto aos aspectos de financiamento, por outro lado a cobertura é quase universal e a relação de contribuintes seria restrita. Assim, apesar de ter estendido o sistema de proteção a praticamente toda a população idosa e portadores de necessidade especiais que viviam com renda per capita inferior a 25% do salário mínimo, a proteção social teria apresentado sinais de esgotamento fiscal. Este último argumento é discutido por vários autores, em que se questiona o real esgotamento dos recursos concernentes a Previdência.

Partindo da controvérsia do uso da Previdência Social como possível instrumento redutor das desigualdades, a partir de seus preceitos de renda mínima e universalização, é exposto o debate da eficiência da mesma como tal. Sabe-se que a essência da Previdência Social se ancora na assistência aos cidadãos. Segundo Miranda (2010, p.48):

Todo sistema previdenciário, independente da forma como é organizado, possui um importante objetivo: a suavização do consumo ao longo do tempo, de forma que o indivíduo, ao atingir o fim de sua vida laboral, possa continuar obtendo rendimentos que permitam a continuidade de seu consumo, de maneira a satisfazer suas necessidades.

No entanto, as diversas mudanças ocorridas durante a década de 90 – conhecida como de cunho neoliberal – abriu o debate da Previdência quanto ao seu uso para fins de distribuição de renda. Por sorte, ao contrário do outros países da América Latina, o Estado brasileiro manteve sob sua custódia o sistema previdenciário, e dessa forma, preservou o aspecto solidário da Previdência Social brasileira consolidado na Constituição de 1988. No entanto, o debate é mantido: de um lado, colocaram-se os fiscalistas defendendo o equilíbrio das contas previdenciárias; do outro, os universalistas que viam a Previdência como um meio de prover recursos aos setores mais necessitados.

A Previdência “organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados os critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial”, ao impor rígidos critérios de equilíbrio, limitaria a finalidade redistributiva da seguridade social e poderia vir a colocar em risco alguns tipos de aposentadorias, em especial aquelas cujos valores de beneficio não guardam relação direta com contribuições acumuladas. A lógica de equilíbrio financeiro e atuarial é muito mais adequada ao conceito de “seguro” previdenciário

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como direito individual e, portanto, em última instância, está em contradição com a concepção dos benefícios da Seguridade como direitos de cidadania (DIEESE, 2007). É nesse aspecto que se sustenta a controvérsia teórica que envolve o sistema previdenciário e coloca em debate a eficiência da mesma para fins distributivos e sua capacidade de sustentar-se financeiramente.

3.2 CONTROVÉRSIA TEÓRICA

O tema Previdência Social oferece opiniões divergentes quanto ao seu uso para fins de distribuição de renda e, possível redução das desigualdades. Neste capítulo essas divergências são objetos de estudo, de forma que se procura ver diferentes pontos de vista de autores sobre o tema. O propósito aqui não é chegar a uma verdade absoluta, mas compartilhar de opiniões distintas dos autores e ver em que medida as suas opiniões se justificam. Dessa forma, coloca-se a questão: a Previdência coloca-seria um instrumento eficiente da redução das desigualdades sociais?

Existem vários argumentos que destacam o caráter redistributivo da Previdência, entre eles citam-se: A Previdência como um instrumento de redução da pobreza e desigualdade social; Sua atuação como forma de defesa contra as precarização das relações de trabalho, e; A redução da desigualdade traz ganhos em termos de crescimento econômico. Observa-se que só pelo fato de se enquadrar no conceito de seguridade social, a Previdência já tem um caráter intrinsecamente social na medida em que garante uma renda mínima e tem caráter universal. Sendo que, sistemas previdenciários que têm como característica mais relevante o funcionamento como um seguro é considerado Bismarckiano10. Já um sistema que priorize as funções distributivas, tendo como objetivo redução da desigualdade e da pobreza é considerado como Beveridgiano11.

Segundo diversos autores, a Previdência é um instrumento poderoso de distribuição de renda, de forma que, por estar inclusa no conceito de seguridade social, ela compartilha do aspecto

10 Por enfatizar o aspecto de seguro , pode-se dizer que a preocupação maior aqui é com o aspecto contributivo. Ou seja, de acordo com este princípio, só quem contribui financeiramente tem direito à cobertura dos riscos sociais como: doenças, invalidez, maternidade, velhice, morte e acidentes e doenças ligados ao trabalho.

11 Propunha aumento das despesas com proteção social e combate à pobreza, preconizando direito universal de todos os cidadãos. Pode-se dizer que foi o embasamento para a seguridade social no mundo. (APOLLO, 2010, p.44)

Referências

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