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Direito sucessório na relação homossexual

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA PALMIRA APARECIDA DE FREITAS

DIREITO SUCESSÓRIO NA RELAÇÃO HOMOSSEXUAL

Tubarão 2010

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DIREITO SUCESSÓRIO NA RELAÇÃO HOMOSSEXUAL

Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientadora: Profª. Maria Nilta RickenTenfen, Msc.

Tubarão 2010

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DIREITO SUCESSÓRIO NA RELAÇÃO HOMOSSEXUAL

Esta monografia foi julgada adequada à obtenção do título de Bacharel em Direito e aprovada em sua forma final pelo Curso de graduação em Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina.

Tubarão, 23 de novembro de 2010.

______________________________________________________ Professora e orientadora Maria Nilta Ricken Tenfen, Msc.

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________ Profª. Greyce Ghisi Luciano Cabreira, Esp.

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________ Prof. Tarcisio de Medeiros, Esp.

(4)

Dedico este trabalho primeiramente a minha mãe, ao meu filho razão de minha vida, e a todos que sempre estiveram ao meu lado nesta trajetória.

(5)

Em primeiro lugar, agradeço a Deus pela oportunidade de poder concluir mais esta jornada.

A minha mãe pelo amor incondicional que dedicou a mim durante toda minha vida.

Ao meu filho Arnaldo razão de minha vida e que na sua ingênua sabedoria me encorajou nas horas mais difíceis.

Ao meu primo Helio que é uma importante referencia e exemplo de vida. Ao meu primo Jucelino pelo incentivo e por todas as vezes que parou para ouvir meus desabafos.

Ao meu irmão do coração Anderson que sempre esteve presente nos momentos em que mais precisei e a sua esposa Tânia que em muitos momentos sua calma e tranqüilidade foram essenciais para mim.

A minha orientadora, Maria Nilta, por muitas vezes ter me encorajado, por sua segurança, dedicação e imensa sabedoria.

Aos amigos que conquistei durante este período de vida acadêmica. Aos professores de um modo geral pelos ensinamentos e em especial a minha professora e orientadora Maria Nilta Ricken Tenfen, que não relutou em aceitar em me orientar no presente trabalho. Muito Obrigada!

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A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade. (RUY BARBOSA).

(7)

A presente pesquisa tem por objetivo analisar a possibilidade de reconhecimento do direito sucessório nas uniões homoafetivas. Para tanto, como método de abordagem foi utilizado o dedutivo, uma vez que se partiu de uma proposição geral para atingir uma conclusão particular. Como método de procedimento, foi utilizado o monográfico, pois através desde trabalho, buscou-se, tanto quanto possível, dirimir as controvérsias surgidas no tema sob análise. O método de investigação usado foi o bibliográfico, tendo em vista a utilização de doutrina, legislação e jurisprudência atinentes. A pesquisa possui como ponto de partida a família e sua evolução, os direitos sucessórios regulados pela legislação vigente, para chegar-se ao estudo da sucessão nas relações homossexuais. Diante da falta de previsão legal para o tema analisou-se a possibilidade da aplicação direta dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, igualdade e liberdade para amparar as relações homoafetivas. Assim, com base na pesquisa realizada verificou-se a permissão constitucional para se considerar tais relações como entidades familiares e assim garantir-lhes, mesmo que por analogia, direitos patrimoniais. Concluiu-se que a falta de legislação especifica sobre o tema deixa a mercê muitos casais de homossexuais, o que poderia ser amenizado se houvesse maior interesse do legislador em proteger tais relações.

(8)

This research aims to examine the possibility of recognizing the right of succession to the joints homoafetivas. To do so, as a method of deductive approach was used, since it departed from a general proposition to reach a particular conclusion. As a method of procedure, we used the monograph, since it means work, we sought as much as possible, settle the disputes arising in the subject under review. The research method used was the literature in order to use doctrine, legislation and case law relating thereto. The research has as its starting point the family and its evolution, inheritance rights regulated by law, to come to the study of succession in homosexual relationships. Given the lack of legal provision for the issue analyzed the possibility of direct application of constitutional principles of human dignity, equality and freedom to bolster relations homoafetivas. Thus, based on research carried out there was a constitutional permission to consider such entities as family relationships and so provide them, even by analogy, rights. It was concluded that the lack of specific legislation on the subject leaves the mercy of many gay couples, which could be alleviated if there was greater interest of the legislature to protect such relations.

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1 INTRODUÇÃO ... 9

2 A FAMÍLIA ... 11

2.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA FAMÍLIA ... 11

2.2 CONCEITO ... 16

2.3 NATUREZA JURÍDICA DA FAMÍLIA ... 18

2.4 INSTITUTOS VINCULADOS À ENTIDADE FAMILAR ... 19

2.4.1 Casamento no direito brasileiro ... 19

2.4.2 União estável ... 22

3 DIREITO DAS SUCESSÕES ... 25

3.1 DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DAS SUCESSÕES ... 25

3.2 CONCEITO ... 27

3.3 FUNDAMENTO DO DIREITO SUCESSÓRIO ... 28

3.4 MOMENTO DA ABERTURA DA SUCESSÃO ... 30

3.5 SUCESSÃO LEGÍTIMA ... 32

3.6 ORDEM DE VOCAÇÃO HEREDITÁRIA ... 34

3.6.1 Sucessão dos descendentes ... 36

3.6.2 Sucessão dos ascendentes ... 37

3.6.3 Sucessão do cônjuge... 38

3.6.4 Sucessão dos companheiros ... 39

3.6.5 Sucessão dos colaterais ... 41

3.6.6 Sucessão do Poder Público ... 41

4 A UNIÃO HOMOAFETIVA ... 42

4.1 CONCEITO ... 42

4.1.1 Breve histórico da homossexualidade ... 43

4.2 UNIÃO HOMOAFETIVA – ASPECTOS LEGAIS ... 45

4.3 DIREITO SUCESSÓRIO NAS UNIÕES HOMOAFETIVAS ... 47

5 CONCLUSÃO ... 56

REFERÊNCIAS ... 58

ANEXOS ... 62

ANEXO A - Acórdão do Tribunal de Justiça - Apelação cível n. 70035804772 .. 63 ANEXO B - Acórdão do Tribunal de Justiça - Apelação cível n. 2008.030289-8 75

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1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho monográfico tem por objetivo analisar a possibilidade do reconhecimento da união homoafetiva como entidade familiar proporcionando, assim, todos os efeitos jurídicos, inclusive, o direito sucessório aos homossexuais.

O problema desta espécie de união consiste no fato de não haver legislação especifica que a proteja e a regule, o que tem causado imenso prejuízo para as partes envolvidas. Porém, existem princípios constitucionais que asseguram a dignidade, liberdade e igualdade a todos os seres humanos, independentemente da orientação sexual. Além disso, o conceito de família, ao longo dos tempos, vem sofrendo inúmeras transformações determinadas pelos valores sociais e morais vigentes em cada lugar.

A pesquisa se justifica pelas dificuldades que esta minoria da sociedade vem enfrentando em ver resguardados seus direitos básicos como, por exemplo, a partilha do patrimônio adquirido conjuntamente com o fim do relacionamento, o direito sucessório com a morte de um dos conviventes, assim como muitos outros, embora cada vez mais presentes no mundo atual.

Para alcançar o objetivo da pesquisa tanto, como método de abordagem foi utilizado o dedutivo, uma vez que se partiu de uma proposição geral para atingir uma conclusão particular. Como método de procedimento, foi utilizado o monográfico, pois através desde trabalho, buscou-se, tanto quanto possível, dirimir as controvérsias surgidas no tema sob análise. O método de investigação usado foi o bibliográfico, tendo em vista a utilização de doutrina, legislação e jurisprudência atinentes.

Para melhor compreensão do tema, o trabalho, será estruturado em três capítulos.

No primeiro serão abordados o conceito de família e o seu desenvolvimento histórico ao longo dos tempos, assim como e os institutos vinculados a entidade familiar.

O capítulo seguinte tratará do direito sucessório e o seu avanço ao logo dos tempos, conceitos, fundamentos, momento da abertura da sucessão, vocação hereditária entre outros aspectos.

(11)

No último capítulo serão estudados o conceito e origem das uniões homoafetivas. Diante da falta de previsão legal específica para o tema será analisada a possibilidade da aplicação direta dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, igualdade e liberdade para amparar as relações homoafetivas, especialmente no que se refere ao direito sucessório.

(12)

2 A FAMÍLIA

Para a compreensão do tema que será estudado neste capítulo, inicialmente se faz necessária a apresentação de alguns aspectos acerca da família, tais como evolução histórica, origem, conceito, além de abordar as novas entidades familiares, contempladas pela legislação pátria e aceitas pela sociedade.

2.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA FAMÍLIA

O conceito de família evoluiu com o passar do tempo, principalmente em decorrência das mudanças sociais que não cessam de acontecer. Assim, novas modalidades de grupos familiares que vem se formando, estabelecem novos valores e acepções de vida.

No dizer de Coulanges, na antiguidade, o significado de família ia muito além dos laços sanguíneos ou até laços afetivos. Para o autor,

A antiga língua grega tinha uma palavra bastante significativa para designar a família; chamava-lhe epístion, o que literalmente significa: aquilo que esta junto ao fogo. A família era, pois um grupo de pessoas a quem a religião permitia invocar os mesmos manes e oferecer o banquete fúnebre aos mesmos antepassados.1

Nota-se, então, que nesta época, o que contava para o reconhecimento da família não eram os laços sanguíneos ou afetivos e sim o vínculo que unia aqueles a quem a religião permitia que permanecessem juntos orando pelos antepassados.

Na tentativa de identificar a origem da palavra família, Spengler propõe:

[...] a palavra família surgiu a partir do vocábulo „foemina‟, o que pode ter originado, talvez, a suposição de que a forma primitiva da organização familiar tenha sido a matriarcal, com a prática de poliandria. Mas vale ressaltar que a noção de família tem variado, podendo representar, numa mesma época, concepções diversas. Assim no Direito Romano significava não apenas o grupo de pessoas ligadas pelo sangue ou por estarem sujeitas a uma mesma autoridade como também se confundiam com o patrimônio nas expressões actio familae erciscundae, agnatus proximus familiam habeto.2

1

COULANGES, Fustel de. A cidade antiga. São Paulo: Martim Claret, 2004. p. 46. 2

SPENGLER, Fabiana Marion; SPENGLER NETO, Theobaldo. Inovações em direito e processo

(13)

O que se vê é que o conceito de família atravessou o tempo e o espaço, sempre tentando clarear e demarcar o seu limite, especialmente para fins de direito.

No direito romano a família era organizada sob o princípio da autoridade. O pater famílias exercia sobre os filhos direito de vida e de morte (ius ac necis). Podia, desse modo, vendê-los, impor-lhes castigos e penas corporais e até mesmo tirar-lhes a vida. A mulher era totalmente subordinada à autoridade marital e podia ser repudiada por ato unilateral do marido.3

Sobre a evolução desta entidade discorre Gonçalves:

O pater exercia sua autoridade sobre todos os seus ascendentes não emancipados, sobre a sua esposa e as mulheres casadas com manus com os seus descendentes. A família era, então, simultaneamente, uma unidade econômica, religiosa, política e jurisdicional. O ascendente vivo mais velho era, ao mesmo tempo, chefe político, sacerdote e juiz. Comandava, oficiava o culto dos deuses domésticos e distribuía justiça. Havia inicialmente, um patrimônio familiar, administrado pelo pater. Somente numa fase mais evoluída do direito romano surgiram patrimônios individuais, como os pecúlios, administrados por pessoas que estavam sob a autoridade do pater.4

Neste contexto, a mulher, ao casar-se com um descendente do pater, passava a submeter-se a autoridade deste e não à do marido. Esse poder do pater sobre as noras denominava-se manu.5

No que concerne a especificamente à sua organização, a família romana, durante a Idade Média, passou por duas importantes influências: a do Direito Canônico6 e a do Direito Bárbaro, trazido pelos conquistadores em suas invasões.7

Foi justamente sobre a família, especialmente sobre o matrimônio, que a Igreja, por seus cânones, mais legislou. Para a Igreja, o casamento é um sacramento, ao passo que para o direito romano é apenas a união do marido e da mulher, ou seja, um estado de fato que produz conseqüências jurídicas.8

3

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo. Saraiva, 2005. v. 4. p. 15.

4

Ibid., p. 15. 5

LUZ, Valdemar P. da. Comentários ao código civil: direito de família. Florianópolis: OAB/SC, 2004. p. 12.

6

O Direito Canônico nada mais é que o conjunto de cânones, expressão esta utilizada pela Igreja para denominar as suas normas jurídicas, para efeito de diferenciá-las das leis do Estado. Desse modo, constituíam-se os cânones em normas supletivas, usadas para complementar as leis do Estado sempre que estas fossem omissas. Cf. LUZ, 2004, p. 12.

7

Ibid., p. 12. 8

(14)

O que conclui é que a família evoluiu paralela e automaticamente aos avanços da sociedade provocados pela diversidade de culturas trazidas na maioria das vezes pelos invasores da época.

Venosa salienta que com o passar dos tempos a estrutura familiar foi mudando, não o seu conceito em si, mas a ótica pela qual era vista pela humanidade, já que família foi sempre família, a sociedade é que avança.

A passagem da economia agrária à economia industrial atingiu irremediavelmente a família. A industrialização transforma drasticamente a composição da família, restringindo o número de nascimentos nos países mais desenvolvidos. A família deixa de ser uma unidade de produção na qual todos trabalhavam sob a autoridade de um chefe. O homem vai para a fábrica e a mulher lança-se para o mercado de trabalho. No século XX, o papel da mulher transforma-se profundamente, com sensíveis efeitos no meio familiar. Na maioria das legislações, a mulher, não sem superar enormes resistências, alcança os mesmos direitos do marido. Com isso transfigura-se a convivência entre pais e filhos.

As uniões sem casamento, apesar de serem muito comuns em muitas civilizações do passado, passam a ser regularmente aceitas pela sociedade e pela legislação. A unidade familiar, sob o prisma social e jurídico, não mais tem como baluarte exclusivo o matrimonio. A nova família estrutura-se independente de núpcias.9

Para a compreensão da evolução da estrutura familiar no direito brasileiro, faz-se necessário um estudo de sua abordagem nas Constituições Federais existentes, assim como no Código Civil. Pereira descreve esta evolução da seguinte forma:

A Constituição de 1824, nossa primeira Constituição não fez qualquer menção sobre família ou ao casamento.

A segunda Constituição do Brasil e primeira da República, promulgada em 1891, também não dedicou capítulo especial à família. Entretanto em seu artigo 72, § 4º „A República só reconhece o casamento civil, cuja celebração será gratuita‟.10

Esse artigo ficou inserido nesta constituição em razão da separação Igreja/Estado. A partir do regime republicano, o catolicismo deixou de ser a religião oficial e, com isso, tornou-se necessário mencionar o casamento civil como o vínculo constituinte da família brasileira. Até então era dispensável, pois as famílias constituíam-se pelo vínculo do casamento religioso, que tinha automaticamente efeitos civis, já que não havia a separação dos poderes da Igreja/Estado.11

9

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2008. v. 6. p. 5-6. 10

Artigo 72 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no País a inviolabi-lidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes: § 4º - A República só reconhece o casamento civil, cuja celebração será gratuita. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da república federativa do Brasil. Disponível em: <www.planalto.gov.br/ccivil.../constituicao/Constituicao91.htm>. Acesso em: 7 out. 2010. 11

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito de família uma abordagem psicanalítica. 3. ed. rev. atual. e ampl. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 9-10.

(15)

A família, de acordo com o Código Civil de 1916, caracterizava-se por ser entidade formada exclusivamente pelo matrimônio civil. O patriarcado é uma das principais características do modelo vigente, com a subordinação da mulher e dos filhos ao comando do pai. Havia uma distinção no tocante aos filhos havidos durante o casamento – os chamados filhos legítimos – e os havidos fora do casamento, ou filhos ilegítimos.12

A segunda Constituição da República (1934) dedicou um capítulo à família, onde em quatro artigos (144 a 147)13 estabelecia as regras do casamento indissolúvel. Foi, portanto, a partir dessa Constituição que, seguindo uma tendência internacional e com as modificações sociais, as Constituições passaram a dedicar capítulos à família e a tratá-la separadamente, dando-lhe maior importância.14

Na Constituição de 1934 foi mantido o modelo adotado pelo Código Civil de 1916, onde a família reconhecida e amparada pelo direito era a entidade constituída pelo casamento e dos filhos vindos deste. Nesta época não havia um conceito específico de o que era família, pois não tinha preocupação do legislador a este respeito, apenas especificou-se que tal ato era indissolúvel.15

A Constituição de 1937 alterou importantes conceitos políticos e administrativos da organização do Estado e reduziu alguns dos direitos individuais e políticos, mais manteve a mesma linha que a Constituição anterior defendia, com poucas alterações.16

12

NAHAS, Luciana Faísca. União homossexual: proteção constitucional. Curitiba: Juruá, 2006. p. 68-69.

13

Artigo 144 - A família, constituída pelo casamento indissolúvel, está sob a proteção especial do Estado. Parágrafo único - A lei civil determinará os casos de desquite e de anulação de casamento, havendo sempre recurso ex officio, com efeito suspensivo. Artigo 145 - A lei regulará a

apresentação pelos nubentes de prova de sanidade física e mental, tendo em atenção as condições regionais do País. Artigo 146 - O casamento será civil e gratuita a sua celebração. O casamento perante ministro de qualquer confissão religiosa, cujo rito não contrarie a ordem pública ou os bons costumes, produzirá, todavia, os mesmos efeitos que o casamento civil, desde que, perante a autoridade civil, na habilitação dos nubentes, na verificação dos impedimentos e no processo da oposição sejam observadas as disposições da lei civil e seja ele inscrito no Registro Civil. O registro será gratuito e obrigatório. A lei estabelecerá penalidades para a transgressão dos preceitos legais atinentes à celebração do casamento. Parágrafo único - Será também gratuita a habilitação para o casamento, inclusive os documentos necessários, quando o requisitarem os Juízes Criminais ou de menores, nos casos de sua competência, em favor de pessoas necessitadas. Artigo 147 - O reconhecimento dos filhos naturais será isento de quaisquer selos ou emolumentos, e a herança, que lhes caiba, ficará sujeita, a impostos iguais aos que recaiam sobre a dos filhos legítimos. BRASIL. Loc. cit.

14

PEREIRA, 2003, p. 9. 15

NAHAS, op. cit., p. 74. 16

(16)

A Constituição de 1946 não trouxe mudanças significativas no conceito de família, em relação às anteriores. Manteve a linha em que o casamento era indissolúvel, e retornou a possibilidade, já prevista na Constituição de 1934 e suprimida na de 1937, de registro civil do casamento religioso. Já as Constituições de 1967 e 1969 (Emenda nº 1/69), seguiram a mesma linha em que o casamento era indissolúvel e único modo de constituir uma família.17

Em 29/06/1977, foi promulgada a Emenda Constitucional nº 9, que tornou possível a dissolução do vínculo conjugal através do divórcio, trazendo assim uma mudança significativa na estrutura familiar brasileira. Logo após a Emenda, foi editada a Lei n° 6.515 de 26/12/1977, a Lei do Divórcio, que regulamentou as causas, prazos e procedimentos para a dissolução da sociedade conjugal e do casamento.18

Com tal avanço legislativo, ainda assim não eram reconhecidas outras formas de constituição da entidade familiar, senão aquelas vinculadas ao matrimônio civil ou religioso.

De acordo com Salazar Júnior a evolução do direito de família no Brasil ocorreu basicamente da seguinte forma:

[...] o panorama histórico familiar na esfera constitucional, desde a Constituição de 1891 até a de 1969, revela extrema rigidez do legislador constitucional, e, conseqüentemente, descompasso com as evoluções sociais, na medida em que as diversas Constituições apenas contemplam expressamente a família oriunda do casamento indissolúvel. As demais entidades familiares eram relegadas à condição de sociedades de fato, onde a proteção do Estado era definida somente por alguns autores a partir de uma interpretação aberta do texto constitucional.19

Todavia, a Constituição Federal de 1988 trouxe profundas mudanças em relação à família e as demais Constituições. De acordo com Pereira, a Constituição vigente ampliou a idéia de família anteriormente conhecida pelo direito brasileiro:

[...] a idéia de família para o Direito brasileiro sempre foi a de que ela é constituída de pais e filhos unidos a partir de um casamento regulado e regulamentado pelo Estado. Com a Constituição de 1988 esse conceito ampliou-se, uma vez que o Estado começou a reconhecer „como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, bem como a união estável entre homem e mulher‟. Isto significa uma evolução do conceito de família. Até então, a expressão da lei jurídica só

17 NAHAS, 2006, p. 77. 18 Ibid., p. 83. 19

SALAZAR JUNIOR, João Roberto. Adoção por casais homoafetivos na constituição federal. São Paulo, 2006, 189 fls. Dissertação (Mestrado em Direito Constitucional) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2006. p. 69.

(17)

reconhecia como família aquela entidade constituída pelo casamento. Em outras palavras, o conceito de família se abriu, indo em direção a um conceito mais real, impulsionado pela própria realidade.20

A ampliação da idéia de família trazida pela atual Constituição Federal pode ser percebida pela leitura do artigo 226, n verbis:

Art. 226. A família base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 1º O casamento é civil e gratuita a celebração.

§ 2º O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.

§ 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.

§ 4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.21

Percebe-se que referido dispositivo constitucional, além de manter a proteção da família constituída pelo casamento, reconheceu a união estável como entidade familiar e, tratou expressamente da família monoparental, compreendida como “a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.”

Na interpretação de Nahas houve um alargamento no conceito de família trazido pela Constituição de 1988, voltado muito mais à proteção da dignidade do ser humano, que deixou de ser mero participe da entidade, mas objetivo geral de sua formação. Pode-se observar que o legislador não apresentou um conceito do que será família, apenas, ampliou a abrangência da proteção do Estado ao instituto.22

2.2 CONCEITO

Conforme já dito, no dizer de Coulanges família era uma associação religiosa antes de ser uma associação natural; a antiga língua grega utilizava uma palavra bastante significativa para conceituar família; chamava-se epístion, o que significava: aquilo que esta junto ao fogo.23

20

PEREIRA, 2003, p. 8. 21

ABREU FILHO, Nylson Pain de. Codex: mini vademecum dos códigos. 3. ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2010. p. 78.

22

NAHAS, 2006, p. 76. 23

(18)

Nos ensinamentos de Diniz, inúmeros são os sentidos do termo família, pois a plurivalência semântica é fenômeno normal no vocábulo jurídico. Urge, portanto, delimitar o sentido dessa palavra. Na seara jurídica encontram-se três acepções fundamentais do vocábulo família: a) a amplíssima; b) a lata; c) a restrita.24

No sentido amplíssimo o termo abrange todos os indivíduos que estiverem ligados pelo vinculo da consangüinidade ou da afinidade.

Na acepção “lata”, além dos cônjuges ou companheiros, e de seus filhos, abrange os parentes em linha reta ou colateral, bem como os afins (os parentes do outro cônjuge ou companheiro).

Na significação restrita é a família o conjunto de pessoas unidas pelos laços do matrimonio e da filiação, ou seja, unicamente os cônjuges e a prole.25

Para Gonçalves, família abrange todas as pessoas ligadas por vínculo de sangue e que procedem, portanto, de um tronco ancestral comum, bem como as unidas pela afinidade e pela adoção. Compreende os cônjuges e companheiros, os parentes e os afins. Segundo Josserand, este primeiro sentido é, em princípio, “o único verdadeiramente jurídico, em que a família deve ser entendida: tem o valor de um grupo étnico, intermédio entre indivíduo e o Estado.” Para determinados fins, especialmente sucessórios, o conceito de família limita-se aos parentes consangüíneos em linha reta e aos colaterais até o quarto grau.26

Diniz assevera que, didaticamente, conforme sua fonte seja o matrimonio, o companheirismo ou a adoção, três são as espécies de família:

A família matrimonial é a que tem por base o casamento, sendo o grupo composto pelos cônjuges e prole; A não-matrimonial, oriunda das relações extraconjugais; E a adotiva, estabelecida pela adoção.

A família monoparental ou unilinear desvincula-se da idéia de um casal relacionado com seus filhos, pois estes vivem apenas com um de seus genitores, em razão de viuvez, separação judicial, divórcio unilateral, não reconhecimento de sua filiação pelo outro genitor, “produção independente” etc.27

24

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família, 22. ed. rev. e atual. de acordo com a reforma do CPC. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 9.

25

Ibid., p. 9-10. 26

GONÇALVES, 2005, p. 1-2. 27

(19)

Por fim, além das já mencionadas cita-se a família unipessoal, quando se reconhece como entidade familiar a pessoa que vive sozinha em uma unidade residencial.28

Sob o novo olhar da sociedade surgem, então, famílias como a

monoparental e a unipessoal e também as chamadas famílias homoafetivas, que

ganham destaque por ser um novo modelo de entidade familiar aceito.

2.3 NATUREZA JURÍDICA DA FAMÍLIA

No que diz respeito à natureza jurídica da família, não há consenso entre os doutrinadores, já que contempla normas de direito público, embora integre o direito civil, de natureza predominantemente privada. No dizer de Gonçalves:

Em razão da importância social, predominam no direito de família as normas de ordem pública, impondo antes deveres do que direitos. Daí por que se observa uma intervenção crescente do Estado no campo do direito de família, visando-lhe conceder maior proteção e propiciar melhores condições de vida às gerações novas. Mas essa lição não retira o caráter privado, pois está disciplinado num dos mais importantes setores do direito civil, e não envolve diretamente uma relação entre o Estado e o cidadão.29

Apesar disso é o ramo do direito civil menos individualista pelo limitado papel da vontade, já que as normas jurídicas estabelecem seus efeitos, salvo exceções em que se apresentam como normas permissivas ou supletivas, em matéria de regime de bens, deixando margem à autonomia da vontade.30

Conclui-se que a natureza jurídica da família mesmo sendo de caráter privado o que predomina ainda são as normas de ordem pública, isso devido à intervenção do Estado impondo mais deveres do que direitos. Porém tal imposição não retira seu caráter privado, pois está disciplinado num dos mais importantes setores do direito civil, e não envolve diretamente uma relação entre o Estado e o cidadão.

28

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Síntese de indicadores sociais: uma Análise das condições de vida da população brasileira. Disponível em:

<http://www.ibge.gov.br/ibgeteen/glossario/familia_definicao.html>. Acesso em: 15 out. 2010. 29

GONÇALVES, 2005, p. 11. 30

(20)

2.4 INSTITUTOS VINCULADOS À ENTIDADE FAMILAR

Considerando que este capítulo tem por finalidade analisar a evolução histórica, conceito e natureza jurídica da família, oportuno discorrer sobre os institutos diretamente a ela vinculados e aceitos pela sociedade como entidades familiares.

2.4.1 Casamento no direito brasileiro

Do magistério de Valdemar P. da Luz o casamento é o ato solene pelo qual duas pessoas, de sexo diferente, se unem para sempre, sob a promessa recíproca de fidelidade no amor e da mais estreita comunhão de vida.31

Independente do conceito que ao longo dos tempos foi criado a respeito do casamento, a essência principal das discussões tem girado em torno das suas finalidades atuais, as quais, há séculos, residiram na procreatio et educatio prolis.32

Desde este ponto de vista para o Direito Canônico o matrimônio tem como fim primeiro a procriação e a educação dos filhos e, em segundo, a ajuda mútua e a união sexual.33

A família era assim fundada (imperativamente) no casamento. Esta era a instituição (“pedra”) em que assentava todo o edifício familiar e, através deste, o social.34

Sobre o tema ressalta ainda o autor que, o fruto de um novo contexto social, referendado pela atual Constituição Federal, tem-se, hoje, uma nova realidade, da qual, como explica Pinto, “decorre o fenômeno de o casamento não ser mais a única instituição legítima em torno da qual possa nascer uma família. Há hoje, a entidade familiar que se impôs socialmente pelo direito positivo brasileiro em nível constitucional.”35 31 LUZ, 2004, p. 14. 32 Ibid., p. 14. 33 Ibid., p. 14. 34 Ibid., p. 14. 35 Ibid., p. 14.

(21)

Ainda ao tratar do tema Luz menciona que referida entidade familiar tem sua essência no casamento “por comportamento”, definido por Jussara Ferreira como “a união espontânea, livre, consensual e sexual de um homem e uma mulher; para compartilharem suas próprias vidas.”36

Para Gonçalves, o casamento, como todas as instituições sociais, sofreu variações com o passar dos tempos e as influencias dos povos. Relata ainda que este também é o entendimento de, Monteiro quando afirma não existir, em todo o direito privado instituto mais discutido. Enquanto numerosos filósofos e literatos o defendem, chamando-o de “fundamento da sociedade, base da moralidade pública e privada” ou “a grande escola fundada pelo próprio Deus para a educação do gênero humano.” Outros autores o condenam, reprovando-lhe a constituição e a finalidade, como Schopenhauer, para quem, “em nosso hemisfério monógamo, casar é perder metade de seus direitos e duplicar seus deveres.”37

Para o autor ainda, o casamento constitui assim, “uma grande instituição social, nascendo da vontade dos contratantes, mas pela imposição legal, recebe sua forma, suas normas e seus efeitos. A vontade individual é livre para fazer surgir à relação, mas não pode alterar a disciplina estatuída pela lei.”38

Sobre o tema Gonçalves relata que há autores no Brasil como Lafayette, que demonstrando aversão à corrente contratualista, afirmou que o casamento, “atenta a sua natureza íntima, não é um contrato, antes difere dele profundamente, em sua constituição, no seu modo de ser, na duração e alcance de seus efeitos.”39

No Brasil, segundo Diniz, durante muito tempo a Igreja Católica foi titular quase que absoluta dos direitos matrimoniais; pelo Decreto de 3 de novembro de 1827 os princípios do direito canônico regiam todos os atos núpcias, com base nas disposições do Concílio Tridentino e da Constituição do Arcebispado da Bahia.40

Com a imigração, novas crenças foram introduzidas em nosso país. Assim em 19 de julho de 1858, Diogo de Vasconcelos, Ministro da Justiça, apresentou um projeto de lei, com o objetivo de estabelecer que os casamentos entre pessoas não-católicas fossem realizados de conformidade com as prescrições de sua respectiva religião. Esse projeto, em 1861, transformou-se na Lei número 1.144, regulamentada pelo Decreto de 17 de abril de 1863, dando um grande impulso à instituição do casamento civil. Praticavam-se então, três tipos de ato nupcial: o católico,

36 LUZ, 2004, p. 15. 37 GONÇALVES, 2005, p. 21. 38 Ibid., p. 25. 39 Ibid., p. 25. 40 DINIZ, 2007, p. 49.

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celebrado segundo normas do Codicilo de Trento, de 1563, e das Constituições do Arcebispado baiano; o misto, entre católico e acatólico, sob a égide do direito canônico; e o acatólico, que unia pessoas de seitas dissidentes, de conformidade com os preceitos das respectivas crenças. Em 1889 o Visconde de Ouro Preto anunciou ao Parlamento o breve envio de um projeto de casamento civil facultativo, organizado pelo Barão de Loreto, em seguida aprovado pelo Conselho de Ministros e aceito por D. Pedro II, que não chegou a se converter em Lei, em razão da Revolução de 15 de novembro desse mesmo ano, que derrubou o Império.41

Conforme relata Diniz, com a chegada da República, o poder temporal foi separado do poder espiritual, e o casamento veio a perder seu caráter confessional; com o Decreto n. 181, de 24 de janeiro de 1890, que estabeleceu o casamento civil em nosso país, no seu artigo 108, o casamento religioso não tinha mais qualquer valor jurídico ao matrimonio religioso.42

Uma circular do Ministério da Justiça, de 11 de junho de 1890, chegou até a determinar que „nenhuma solenidade religiosa, ainda que sob a forma de sacramento do matrimônio, celebrada nos Estados Unidos do Brasil, constituiria, perante a lei civil, vínculo conjugal ou impedimento para livremente casarem com outra pessoa os que houverem daquela data em diante recebido esse ou outro sacramento, enquanto não fosse celebrado o casamento civil‟. Houve até um decreto que estatuiu a procedência do casamento civil, punindo com 06 meses de prisão e multa correspondente à metade do tempo o ministro de qualquer religião que celebrasse cerimônia religiosa antes do ato nupcial civil (Dec. n. 521, de 26-6-1890, ora revogado pelo Decreto n. 11, de 1º - 1 – 1991).43

Tratando do tema a mesma autora ressalta que, o Código Civil de 1916 regularizou o casamento, sem fazer qualquer referencia ao casamento religioso, que é inexistente juridicamente na seara jurídica, sendo as relações entre os participantes desse vínculo mero concubinato.44

Relata-se ainda que o casamento religioso, segundo Diniz, a partir da Constituição de 34 passou a ter efeitos civis:

Considerando desaconselháveis as duplas núpcias, a Constituição de 34, em seu art. 146, possibilitou que se atribuísse ao casamento religioso efeitos civis desde que observadas às prescrições legais. A Lei n. 379/37, que regulamentava a matéria, foi mais tarde modificada pelo Decreto n. 3.200/41, artigos 4º e 5º.

A Constituição de 46, no artigo 163, § 1º, com a redemocratização do país, manteve a concessão anterior, condicionando-a à observância dos impedimentos e às prescrições da lei, se assim o requeresse o celebrante ou qualquer interessado, com inscrição do ato no Registro Público. Em seguida a Lei n. 1.110, de 23 de maio de 1950, regulamentou por completo o reconhecimento dos efeitos civis ao casamento religioso, quando os

41 DINIZ, 2007, p. 49-50. 42 Ibid., p. 50. 43 Ibid., p. 50. 44 Ibid., p. 50.

(23)

nubentes requeressem sua inscrição ao Registro após sua realização, revogando a Lei n. 379 por inteiro.

A Constituição de 24 de janeiro de 1964, com a redação da Emenda Constitucional n. 1/69, no artigo 175, §§ 2º e 3º, manteve o casamento religioso com efeitos civis, e pela Emenda Constitucional n. 9/77 quebrou a indissolubilidade do matrimônio (artigo 175, § 1º), prevendo sua dissolução nos casos expressos em lei.45

A Constituição de 1988, no artigo 226, § 1º, estabelece que o casamento é civil e gratuita a celebração, acrescentando, no § 2º, que o religioso tem efeitos civis, nos termos desta lei. A matéria do registro do casamento religioso para efeitos civis estava disciplinada nos artigos 71 a 75 da Lei n. 6.01546, de 31 de dezembro de 1973, regendo-se, hoje, pelos artigos 1.515 e 1.516 do Código Civil.47

Apesar de todo exposto o povo brasileiro insiste em continuar com os dois casamentos, o civil e o religioso, sendo raros, embora crescentes, os casos em que se usa o matrimônio religioso nos dois efeitos: eclesiástico e civil.

2.4.2 União estável

Gonçalves conceitua a união estável como a união entre o homem e a mulher sem que seja celebrado o casamento, relata ainda o entendimento de outros autores acerca do tema:

45

DINIZ, 2007, p. 50. 46

Lei número 6.015, de 31 de dezembro de 1973. Art. 71. Os nubentes habilitados para o casamento poderão pedir ao oficial que lhe forneça a respectiva certidão, para se casarem perante autoridade ou ministro religioso, nela mencionando o prazo legal de validade da habilitação; Art. 72. O termo ou assento do casamento religioso, subscrito pela autoridade ou ministro que o celebrar, pelos nubentes e por duas testemunhas, conterá os requisitos do artigo 71, exceto o 5°; Art. 73. No prazo de trinta dias a contar da realização, o celebrante ou qualquer interessado poderá, apresentando o assento ou termo do casamento religioso, requerer-lhe o registro ao oficial do cartório que expediu a certidão; § 1º O assento ou termo conterá a data da celebração, o lugar, o culto religioso, o nome do celebrante, sua qualidade, o cartório que expediu a habilitação, sua data, os nomes, profissões, residências, nacionalidades das testemunhas que o assinarem e os nomes dos contraentes; § 2º Anotada a entrada do requerimento o oficial fará o registro no prazo de 24 (vinte e quatro) horas; § 3º A autoridade ou ministro celebrante arquivará a certidão de habilitação que lhe foi apresentada, devendo, nela, anotar a data da celebração do casamento; Art. 74. O casamento religioso,

celebrado sem a prévia habilitação, perante o oficial de registro público, poderá ser registrado desde que apresentados pelos nubentes, com o requerimento de registro, a prova do ato religioso e os documentos exigidos pelo Código Civil, suprindo eles eventual falta de requisitos nos termos da celebração; Parágrafo único. Processada a habilitação com a publicação dos editais e certificada a inexistência de impedimentos, o oficial fará o registro do casamento religioso, de acordo com a prova do ato e os dados constantes do processo, observado o disposto no artigo 70; Art. 75. O registro produzirá efeitos jurídicos a contar da celebração do casamento. Cf. BRASIL. Lei n° 6.015, de 31 de dezembro de 1973. Loc. cit.

47

(24)

A união promulgada entre o homem e a mulher, sem casamento, foi chamada, durante longo período histórico, de concubinato. O conceito generalizado do concubinato, também denominado „união livre‟, tem sido invariavelmente, no entender de Washington de Barros Monteiro, o de vida prolongada em comum, sob o mesmo teto, com a aparência de casamento. Edgard Moura Bittencout transcreve a lição de Errazuriz: „A expressão concubinato, que em linguagem corrente é sinônima de união livre, à margem da lei e da moral, tem no campo jurídico mais amplo conteúdo. Para os efeitos legais, não apenas são concubinos os que mantêm vida marital sem serem casados, senão também os que contraíram matrimônio não reconhecido legalmente, por mais respeitável que seja perante a consciência dos contraentes, como sucede com o casamento religioso; os que celebrarem validamente no estrangeiro um matrimonio não reconhecido pelas leis pátrias; e ainda os que vivem sob um casamento posteriormente declarado nulo e que não reunia as condições para ser putativo. Os problemas do concubinato incidem, por conseguinte, inúmeras situações, o que contribui para revesti-los da máxima importância‟.48

Trata ainda, o mesmo autor, que a união estável só foi regulamentada a partir de 1994, que definiu como companheiros o homem e a mulher que mantém união comprovada:

A primeira regulamentação da norma constitucional que trata da união estável adveio com a Lei n. 8.971, de 29 de dezembro de 1994, que definiu como „companheiros‟ o homem e a mulher que mantenham a união comprovada, na qualidade de solteiros, separados judicialmente, divorciados ou viúvos, por mais de cinco anos, ou com prole (concubinato puro).49

Com a entrada em vigor da lei n. 9.278, de 10 de maio de 1996, alterou o conceito e omitiu alguns requisitos de natureza pessoal, como tempo mínimo de convivência e a existência de prole, foi também substituída a expressão “companheiros” pela expressão “conviventes”.50

A questão ainda provocou polemicas, ao Gonçalves, que: a questão que suscitou polêmica, ao tempo do Código de 1916 e a possibilidade de ser promovida a partilha patrimonial, em caso de existência de uma sociedade de fato, estando o concubino ainda casado e apenas separado de fato da legítima esposa.51

Acabou prevalecendo a corrente que a admitia, sendo de se destacar, a propósito, os argumentos do voto vencido do Des. Alexandre Loureiro, no acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo, que colocou as coisas em seus devidos lugares, declarando: „Inescondíveis o concubinato e a formação do patrimônio comum. A partilha dos bens decorre, na verdade, não da existência do concubinato, mas da sociedade de fato, existente desde 1956 e admitida pela co-ré apelante a partir de 1962. Pouco importa

48 GONÇALVES, 2005, p. 530-531. 49 Ibid., p. 534. 50 Ibid., p. 534-535. 51 Ibid., p. 535-536.

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o adultério. A partilha de bens nada tem a ver com o Direito de Família e é indene às suas violações. A divisão dos bens diz respeito mais à dissolução da sociedade do que ao próprio concubinato. Não fosse assim, haveria enriquecimento ilícito de um dos sócios em detrimento do outro‟.52

Diniz relata que o matrimônio contrapõe-se ao companheirismo, pois o companheirismo funda-se numa união livre e estável de pessoas de sexos diferentes, que não estão ligadas pelo casamento civil.53

Acentua ainda a Autora, que a Constituição Federal reconhece a união estável como entidade familiar, desde que não tenha qualquer impedimento para ser transformada em casamento.54

A Constituição Federal ao conservar a família, fundada no casamento, reconhece como entidade familiar a união estável, a convivência pública, continua e duradoura de um homem com uma mulher, vivendo ou não sob o mesmo teto, sem vinculo matrimonial, estabelecida com o objetivo de constituir família, desde que tenha condições de ser convertida em casamento, por não haver impedimento legal para sua convolação.55

Com tantas mudanças na legislação e na doutrina a união estável perdeu o status de união de fato e ganhou o de entidade familiar, sendo ainda possível seu convertimento em casamento.

Vê-se, então, que, atualmente, legislação brasileira, embora tenha ampliado seu conceito de família, ainda reconhece o casamento e a união estável entre um homem e uma mulher como base para a sua constituição, sem contemplar a união homoafetiva neste rol.

Assim, considerando que este trabalho tem por objetivo a análise da possibilidade de conferir direito de herança às uniões homoafetivas, antes de tratar especificamente desta modalidade de vinculo, que será o tema do terceiro capítulo, impõe-se o estudo detalhado acerca do direito das sucessões.

52 GONÇALVES, 2005, p. 536. 53 DINIZ, 2007, p. 353. 54 Ibid., p. 354. 55 Ibid., p. 354.

(26)

3 DIREITO DAS SUCESSÕES

Neste capítulo serão abordados alguns aspectos relacionados ao direito das sucessões, a saber: evolução histórica, momento de abertura da sucessão, sucessão legítima e ordem de vocação hereditária.

3.1 DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DAS SUCESSÕES

A possibilidade de alguém transferir seus bens, por sua morte, é instituição que remonta a antiguidade. Porém, as razões pelas quais a lei acolhe o direito hereditário têm variado no decorrer dos tempos.

Nas palavras de Gama, o direito sucessório não existia nos primórdios da civilização humana, por não haver noção sequer de propriedade individual. O patrimônio que existia pertencia ao grupo ou ao núcleo social. A morte de um membro do grupo não alterava a situação jurídica relacionada ao patrimônio comum.1 Sobre o assunto o Autor assim se manifesta:

Em termos de justificação histórica, costuma-se afirmar que nos primórdios da civilização humana, em que não existia a noção de propriedade individual, não houve campo para o surgimento do Direito das Sucessões, já que como o patrimônio pertencia ao grupo ou ao núcleo social, a morte de um membro do grupo não alterava a situação jurídica relacionada ao patrimônio comum. Posteriormente, diante da evolução e da maior complexidade das relações sociais, e com a individualização da propriedade – além da própria nuclearização da família – abriu-se vasto campo para a introdução e o desenvolvimento da sucessão mortis causa (OLIVEIRA, Arthur Itabaiana de, op.cit., p. 24). (Durante determinado período histórico na Antiguidade, a sucessão hereditária teve íntima relação com a religião, servindo como maneira de cultuar a memória dos antepassados e de perpetuação da religião dos mortos). (RODRIGUES, Silvio, op.cit., p. 4).2

Para relatar esta parte do direito sucessório, busca-se suporte na doutrina de Coulanges:

Duas coisas estavam intimamente ligadas, tanto nas crenças como nas leis dos antigos: o culto e a propriedade da família. Por isso – regra sem exceção, tanto no direito grego como no romano – não se podia adquirir a

1

GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Direito civil: sucessões. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 4.

2

(27)

propriedade separadamente do culto, nem o culto sem a propriedade. [...] a religião doméstica, como já foi visto, era hereditária, de varão para varão, a propriedade também o era. Assim, sendo o filho o natural e necessário continuador do culto, herda também os bens.3

Por esta razão a sucessão neste tempo e durante séculos, se transmitiu apenas pela linha masculina, ou seja, aos agnados, pois, como o filho era o sacerdote da religião doméstica, era ele, e não sua irmã, quem recebia o patrimônio da família. Aí, portanto, a explicação da regra segundo a qual a herança se transmitia ao primogênito varão.4

O direito a primogenitura e varonia, se perpetuou em muitas civilizações, inspirado em outras razões de ordem política e social de considerável relevância. A primeira e principal é o propósito de manter poderosa a família, impedindo a divisão de sua fortuna entre os vários filhos.5

Do magistério de Venosa colhe-se o seguinte ensinamento:

Uma das fundamentais características do direito clássico era de que o herdeiro, na época, substituía o morto em todas as relações jurídicas e, também, nas relações que nada tinha a ver com o patrimônio, mas com a religião. O sucessor causa mortis era o continuador do culto familiar. A continuação da pessoa do morto no culto doméstico era uma conseqüência necessária da condição de „herdeiro‟ (Arrangio-Ruiz, 1973:576).6

No direito Romano, a tônica concentrava-se na idéia de que ao herdeiro cabia a condição de continuador da personalidade do falecido e de continuador do lar. A morte era o retorno à unidade ou ao instante em que a alma passava de um corpo para outro.7

No direito contemporâneo pode-se reconhecer a importante função desempenhada pela sucessão hereditária que com o passar dos tempos foi ganhando sua forma atual. Tais transformações ocorreram principalmente pela influência dos elementos, social, familial e individual, sobre a construção de regras e princípios jurídicos, ora com a prevalência do elemento social e familial, ou seja, pela autonomia da vontade do titular do patrimônio, já que tem maior liberdade na

3

COULANGES, Fustel de. A cidade antiga. São Paulo: Martim Claret, 2004. p. 478. 4

RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito das sucessões. 19. ed. atual.e ampl. São Paulo: Saraiva,1995. v. 7. p. 4.

5

Ibid., p. 5. 6

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito das sucessões. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 2. 7 ALMADA, Ney de Mello. Sucessões: legítima – testamentária – inventários e partilha. São Paulo:

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formulação do testamento, ora com a prevalência do elemento individual, a família integrada pela pessoa que veio a falecer sendo estimulada a sucessão legítima.8

Conclui-se, então, que por um longo período o direito das sucessões permaneceu inerte. Com o passar dos tempos e o avanço da sociedade houve evolução também no campo das sucessões, dando garantias a quem antes não as tinha.

3.2 CONCEITO

Suceder significa transmitir a uma pessoa direitos e obrigações de outra. No dizer de Almada:

Sucessão provém do étimo latino successio, ou seja, colocar-se uma pessoa em lugar de outra, dando seqüência a uma dada situação. Juridicamente, consiste no ingresso de uma pessoa numa relação jurídica na posição de outra, assegurada a mesma identidade do direito ou da obrigação ou, ainda, da relação. Com a inserção do sucessor num de seus pólos, da mesma relação se abstrai o sucedido, processando-se mutação subjetiva.9

Na tentativa de conceituar sucessão Gonçalves afirma que:

A palavra „sucessão‟, em sentido amplo, significa o ato pelo qual uma pessoa assume o lugar de outra, substituindo-a na titularidade de determinados bens. Numa compra e venda, por exemplo, o comprador secede ao vendedor, adquirindo todos os direitos que a este pertenciam. [...] No direito das sucessões, entretanto, o vocábulo é empregado em sentido estrito, para designar tão-somente a decorrente da morte de alguém, ou seja, a sucessão causa mortis. O referido ramo do direito disciplina a transferência do patrimônio, ou seja, do ativo e do passivo do de cujus ou autor da herança a seus sucessores.10

De acordo com os ensinamentos de Diniz, o direito das sucessões vem a ser o conjunto de normas que disciplinam a transferência do patrimônio de alguém, depois de sua morte, ao herdeiro, em virtude de lei ou de testamento. É formado pelo complexo de disposições jurídicas que regem a transmissão de bens ou valores

8 GAMA, 2007, p. 5. 9 ALMADA, 2006, p. 23. 10

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. direito das sucessões. 2. ed. rev., ampl.e atual. São Paulo, 2008. v. 7. p. 1-2.

(29)

e dívidas do falecido, ou seja, a transmissão do ativo e do passivo do de cujus ao herdeiro.11

Por fim, para Venosa:

Suceder é substituir, tomar o lugar de outrem no campo dos fenômenos jurídicos. Na sucessão, existe uma substituição do titular de um direito. Esse é o conceito amplo de sucessão no direito. Quando o conteúdo e o objeto da relação jurídica permanecem os mesmos, mas mudam os titulares da relação jurídica, operando-se uma substituição, diz-se que houve uma transmissão no direito ou uma sucessão.12

Desta maneira, conclui-se que suceder significa o ato ou efeito pelo qual uma pessoa assume o lugar de outra, substituindo-a na propriedade de seus bens ou titularidade de seus direitos, após sua morte.

3.3 FUNDAMENTO DO DIREITO SUCESSÓRIO

É sabido que o fundamento do direito das sucessões existe desde os primórdios onde eram transmitidos não só o patrimônio como também a religião, pois esta era deixada como herança para os varões.

O fundamento da transmissão, ou seja, a razão pela qual se transfere a uma pessoa indicada por lei, ou pela vontade manifestada em vida pelo autor da herança, o acervo de direitos e obrigações que até então a este pertencia, apresenta variações conforme o momento histórico que se esteja a analisar e a corrente de pensamento a que se queira filiar.13 Ao apontar o fundamento basilar do direito sucessório assevera Gonçalves:

O primeiro fundamento da sucessão foi o de ordem religiosa. A propriedade era familiar e a família era chefiada pelo varão mais velho, que tomava o lugar do de cujus na condução do culto doméstico, como já mencionado. Quando, todavia, a propriedade passa a ser individual, o fundamento da sucessão desloca-se para a necessidade de conservar o patrimônio dentro de um grupo, como forma de manter poderosa a família, impedindo a divisão de sua fortuna entre os vários filhos. É então que se desenvolve o período medieval da primogenitura, iniciando-se a discussão filosófica e jurídica a respeito de seu fundamento.14

11

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito das sucessões. 21. ed. rev. e atual. de acordo coma reforma do CPC. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 6. p. 4.

12 VENOSA, 2008, p. 1. 13 GONÇALVES, 2008, p. 7. 14 Ibid., p. 7.

(30)

Para Diniz o fundamento do direito sucessório é a propriedade:

Na verdade poder-se-á dizer que o fundamento do direito sucessório é a propriedade, conjugada ou não com o direito de família; daí as afirmações de Congliolo de que o direito das sucessões tem a sua razão de ser dois institutos combinados: a propriedade e a família; e a de Lacerda de Almeida de que o direito sucessório é o „regime da propriedade na família‟. A possibilidade de transferir bens causa mortis é um dos corolários do direito de propriedade, uma vez que, caso contrário, a propriedade ficaria despida de um dos seus caracteres, ou seja, a perpetuidade. Kipp chega até a afirmar que essa integração da sucessão mortis causa à propriedade é tão necessária que, se assim não fosse, esta última se desfiguraria, convertendo-se em mero usufruto vitalício.15

Ainda, ao tratar do tema, Diniz menciona que há autores, como D‟Aguano, que procuram justificar o fundamento cientifico do direito sucessório nas conclusões da biologia e da antropologia atinentes ao problema da hereditariedade bio-psicológica, segundo a qual os pais transmitem à prole não só os caracteres orgânicos, mas também as qualidades psíquicas, resultando daí que a lei, ao garantir a propriedade pessoal, reconhece que a transmissão hereditária dos bens seja uma continuação biológica e psicológica dos progenitores.16

Hironaka destaca que houve quem procurasse fundamentar o direito sucessório nas pesquisas biológicas, pois demonstrariam uma espécie de continuidade da vida humana por meio da transmissão de ascendentes a descendentes não só das características genéticas como também das características psicológicas, para concluírem que a lei, ao permitir a transmissão patrimonial, homenageava tal continuidade biopsíquica. Salienta a mesma autora que essa é a posição de Carlos Maximiliano, que acresce àquela a afeição e unidade familiar.17

No dizer de Monteiro, que segue o mesmo entendimento de Diniz, o fundamento do direito sucessório é a propriedade, pois esta, pelo fato de ser perpétua, não se extingue, o que se extingue é o mero usufruto. Afirma, ainda, que por essa perpetuidade é que o domínio descansa precisamente na sua transmissibilidade post mortem.18

15 DINIZ, 2007, p. 6. 16 Ibid., p. 5. 17

HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes; PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito das

sucessões. 2. ed. atual. São Paulo: Del Rey, 2007. p. 3.

18

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito das sucessões. 36 ed. rev. atual. por Ana Cristina de Barros Monteiro França Pinto. São Paulo: Saraiva, 2008. v. 6. p. 8.

(31)

O que se conclui é que seja pela expressa vontade do autor da herança, ou por imposição legal a propriedade será transmitida para outra pessoa, e não se extinguirá com a morte.

3.4 MOMENTO DA ABERTURA DA SUCESSÃO

Não há controvérsia na doutrina de que a abertura da sucessão se dá no exato momento da morte do autor da herança.

Tal entendimento decorre da aplicação do princípio saisine (regra pelos quais os bens são transferidos imediatamente aos herdeiros, legítimos ou testamentários).

Assim, pelo princípio da saisine, a propriedade de todos os bens pertencentes ao autor da herança, no segundo posterior a sua morte é transmitida aos herdeiros legítimos ou testamentários, mesmo que eles desconhecem a ocorrência da morte.

O legislador brasileiro previu o princípio da saisine, no Livro V, Parte Especial, do Código Civil, pois no artigo 1784, inseriu regra específica para fixar o momento exato da abertura da sucessão: De acordo com os ensinamentos de Gama:

O artigo 1.784 do novo Código Civil cuida da transmissão da herança, o que normalmente pressupõe a simultaneidade dos três momentos do fenômeno sucessório para que tal ocorra: a abertura da sucessão, a devolução sucessória (ou delação) e a aquisição da herança (ou adição). A morte da pessoa é o fato jurídico que origina o direito de suceder, fazendo com que ocorra simultaneamente a abertura da sucessão, ou seja, „o momento em que nasce o direito hereditário, o „prius‟ necessário à substituição que se encerra no fenômeno sucessório‟ (GOMES, Orlando, op. cit., p. 13). Diante da extinção da personalidade civil do falecido, não há mais como reconhecer direitos e deveres relativamente à pessoa que deixou de existir, fazendo com que o conjunto de bens jurídicos (patrimoniais e extrapatrimoniais) transmissíveis seja destacado do autor da sucessão para integrar a esfera da personalidade (patrimonial ou não) de seus sucessores a título universal ou a título singular.

Diversamente do que se verifica na ausência, que pressupõe a passagem por três etapas para se permitir a transmissão do patrimônio deixado, a morte natural (ou provada) é causa instantânea da abertura da sucessão, daí a preocupação do legislador em estabelecer os efeitos jurídicos decorrentes do evento.19

19

GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Direito civil: sucessões. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 15-16.

(32)

No tocante ao momento da transmissão da herança leciona Rodrigues:

No momento exato do falecimento, o domínio e a posse da herança se transmitem aos herdeiros legítimos e testamentários do de cujus, quer estes tenham ou não ciência daquela circunstância. Isto porque, conforme já foi visto (v.n.15, v.1), a personalidade civil, ou seja, a capacidade da pessoa humana para ser titular de direitos e obrigações na órbita do direito, se extingue com sua morte.20

Assim, pela análise da doutrina citada extrai-se que o exato momento da abertura da sucessão é efeito automático e instantâneo do falecimento da pessoa humana. Neste mesmo sentido aponta Diniz:

A morte natural é o cerne de todo o direito sucessório, pois só ela determina a abertura da sucessão, uma vez que não se compreende sucessão hereditária sem o óbito do de cujus, dado que não há herança de pessoa viva (viventis nulla est heraditas). No momento do falecimento do de cujus abre-se a sucessão, transmitindo-se, sem solução de continuidade, a propriedade e a posse dos bens do defunto aos seus herdeiros sucessíveis, legítimos ou testamentários, que estejam vivos naquele momento, independente de qualquer ato. Essa transmissão é, portanto, automática, operando-se ipso iure. A morte é o fato jurídico que transforma em direito aquilo que era, para o herdeiro, mera expectativa; deveras, não há direito adquirido a herança senão após o óbito do de cujus.21

Também para a professora Hironaka, abre-se a sucessão no exato momento da morte de alguém, nascendo assim o direito hereditário e a substituição do falecido por seus sucessores:

A sucessão considera-se aberta no instante real ou presumido da morte de alguém, fazendo nascer o direito hereditário e operando a substituição do falecido por seus sucessores a título universal nas relações jurídicas em que aquele figurava. Não se confundem, todavia. A morte é antecedente lógico, é pressuposto e causa. A transmissão é conseqüente, é efeito da morte. Por força de ficção legal, coincidem em termos cronológicos, imaginando a lei que o próprio de cujus investiu seus herdeiros no domínio e na posse indireta de seu patrimônio, que este não pode restar acéfalo.22

Tendo em vista a transmissão imediata do acervo aos herdeiros, é de fundamental importância a fixação exata do tempo da morte do autor da herança, já que esta determina a abertura da sucessão, conforme relata Venosa:

Somente a morte pode dar margem à sucessão. A morte física, o desaparecimento da vida do titular. O direito moderno já não conhece a morte civil. Como as conseqüências da morte são inúmeras, a lei fixa preceitos para determinação do momento da morte, bem como sua prova.23

20 RODRIGUES, 1995, p. 11. 21 DINIZ, 2007, p. 22. 22 HIRONAKA; PEREIRA, 2007, p. 6. 23 VENOSA, 2008, p. 11.

(33)

Acerca do tema assevera Pereira:

Com a morte abre-se a sucessão. Torna-se então indispensável a apuração de sua autenticidade. A transmissão hereditária opera-se com a morte, que deve ser provada, no plano biológico pelos meios de que se vale a Medicina Legal, e no plano jurídico, pela certidão passada pelo Oficial do Registro Civil, extraída do registro de óbito.24

Diante de tudo que foi relatado pode-se afirmar que o direito sucessório é o ato de transmissão do patrimônio da pessoa falecida, em decorrência de sua morte, aos seus herdeiros, ocorrendo a abertura da sucessão no exato momento da morte do autor da herança.

3.5 SUCESSÃO LEGÍTIMA

Conforme ensinamentos de Rodrigues a sucessão legítima é aquela decorrente de previsão legal, ocorre quando o autor da herança não deixa testamento, sendo seus bens destinados às pessoas chamadas pela lei:

Sucessão legítima é a que decorre da lei. Se o defunto, por exemplo, deixou de fazer testamento, seu patrimônio, por força da lei, irá a seus descendentes; inexistindo descendentes, aos seus ascendentes; não havendo nem descendentes, nem ascendentes, ao seu cônjuge; à falta daqueles parentes e de cônjuge, aos colaterais até o quarto grau. Note-se que a transmissão da herança aos sucessores se efetua sem manifestação de ultima vontade do falecido, mas decorre de lei. Trata-se de sucessão legítima. Portanto, quando alguém se conforma em que seus bens, por sua morte, passem ao patrimônio das pessoas que a lei chama para recolhê-los, escusa de fazer testamento. Daí a afirmativa, encontradiça em muitos escritores, de que a sucessão legítima é o testamento presumido do de cujus.25

Ocorre à sucessão legítima em caso de inexistência, invalidade ou caducidade de testamento e, também, em relação aos bens nele não compreendidos. Nesses casos a lei concede a herança a pessoas da família do de

cujus e, na falta destas, ao Poder Público.26 Desta maneira, segundo o mesmo

autor:

a herança, consoante todos os códigos, defere-se por dois modos, os quais por nosso Direito se excluem e contradizem: a sucessão testamentária e a

24

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: direito das sucessões. 15. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. v. 6. p. 17.

25

RODRIGUES, 1995, p. 16. 26

(34)

sucessão legítima ou ab intestato. Esta última denominação, com a qual se costuma designar sucessão legítima, está indicando que esta forma de sucessão é subsidiária da sucessão por testamento. O caráter subsidiário da sucessão legítima é estabelecido no artigo 1.788 do Código Civil, verbis: „Morrendo a pessoa sem testamento, transmite a herança aos herdeiros legítimos; o mesmo ocorrerá quanto aos bens que não forem compreendidos no testamento; e subsiste a sucessão legítima se o testamento caducar, ou for julgado nulo‟.27

Na sucessão testamentária quem vem a suceder é o designado no testamento e na sucessão legitima quem designa é a lei. A existência de um testamento não exclui a sucessão legítima. Com efeito, a sucessão testamentária pode com ela conviver, em havendo herdeiro necessário, a quem a lei assegura o direito à legítima, ou quando o testador dispõe apenas de parte de seus bens.28

Acerca da sucessão legítima os ensinamentos de Diniz seguem a linha dos autores já mencionados:

Com a morte de alguém, verificar-se-á, primeiramente, se o de cujus deixou testamento indicando como será partilhado seu patrimônio. Em caso negativo, ou melhor, se faleceu sem que tenha feito qualquer declaração solene de última vontade; se apenas dispôs parte dos bens em testamento válido; se seu testamento caducou ou foi considerado ineficaz ou nulo, ou, ainda, se havia herdeiros necessários, obrigando a redução da disposição testamentária para respeitar a quota reservatória, a lei promoverá a distribuição, convocando certas pessoas para receber a herança, conforme ordem nela estabelecida, que se denomina ordem de vocação hereditária. Em todas essas hipóteses ter-se-á sucessão legítima, que é a deferida por determinação legal. A sucessão legal absorverá a totalidade da herança se o auctor successionis falecer ab testato, ou se nulo ou caduco for o testamento por ele feito, e restringir-se-á à parte não compreendida no testamento, se o testador não dispuser da totalidade da herança e se houver herdeiros necessários, que impõem o respeito à quota que lhe cabe.29

Denomina-se, então, sucessão legítima a que é deferida por determinação legal. Atendendo ao que ocorre quando o sucedendo morre sem testamento (intestado), diz-se também ab intestato. E, tendo em consideração que se proceda sob o império exclusivo da lei, sem a participação da vontade, pode também designar-se como sucessão legal. Em nossos meios, é a mais freqüente, tendo-se em vista a menor difusão do testamento e, portanto, da sucessão testada.30

27 GONÇALVES, 2008, p. 137-138. 28 Ibid., p. 138. 29 DINIZ, 2007, p. 101. 30 PEREIRA, 2004, p. 77.

Referências

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