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Academic year: 2018

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MANUAL DE

COMUNICAÇÃO COMUNITÁRIA

COM1245 - 2004.1

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DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO

DISCIPLINA: COMUNICAÇÃO COMUNITÁRIA – COM1245 - 2004.1 PROFA.: LUCIA THEREZA LESSA CARREGAL

PROGRAMA DO CURSO

1. OBJETIVOS: percepção do que é uma comunidade e de seu processo de comunicação, bem como da influência da mídia sobre ela, por meio de pesquisa sobre questões, modos e experiências de comunicação comunitária, com ênfase na internet. Prática de participação no processo de comunicação de uma

comunidade, visando à ampliação da formação profissional do aluno e a um possível serviço à comunidade escolhida.

2. PROGRAMA:

A. A partir dos autores dados e de pesquisa de conteúdos na internet, elaborar uma reflexão sobre a) a identidade comunitária; b) relação entre a internet e o usuário inserido em comunidade: sujeito ou objeto de comunicação? c) Brasil: lugar de exclusão ou de inclusão digital? (G1).

B. Serviço de comunicação para/com uma comunidade: propor e elaborar, em uma comunidade, e junto com ela, um serviço de comunicação de dupla via, utilizando técnicas de produção alternativa (G2).

Linhas de trabalho prático:

• Comunidade específica (na PUC ou outra);

• Democratização da comunicação: divulgação, para comunidades em geral, de conhecimentos sobre

saúde, educação, cidadania, saneamento, ecologia etc.

3. AVALIAÇÃO - Categoria: 3; Elementos de avaliação: G1: Trabalhos produzidos + Participação em debates e seminários; G2: Proposta, Projeto e Execução de um Serviço de Comunicação para/com a Comunidade + Participação nos Relatos e no Serviço de Comunicação.

4 . REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS (atualizadas em 20/2/2004)

BOCC - Biblioteca On-line de Ciências da Comunicação – Disponível na Internet via bocc.ubi.pt/index2.html – consultada em 18/02/2004.

CARREGAL, L.T.L. – Manual de Comunicação Comunitária. Fev. 2004. Mimeo.

FERNANDES, Florestan. (organizador) Comunidade e Sociedade. Companhia Editora Nacional e Editora da Universidade de São Paulo. São Paulo, 1973.

LÈVY, Pierre. O que é o Virtual? Editora 34. São Paulo, 1997.

RECUERO, Raquel da Cunha. Comunidades virtuais - Uma abordagem teórica. Biblioteca On-line de Ciências da Comunicação. www.bocc.ubi.pt (publicado em 18/2/2004).

TURKLE, Sherry – Excertos e resumos. Discover Dialogue. Entrevista publicada em 6/6/2003 em http://www.discover.com/issues/jun-03/rd/breakdialogue.html/. At heart of a Cyberstudy, the Human Essence. Entrevista publicada em 18/6/1998, em http://web.mit.edu/sturkle/www/nytimes.html - Life on the Screen: Identity in the Age of the Internet.

VENTURA, Zuenir. Cidade partida. 1994.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO: O CONTEXTO...4

1 A COMUNIDADE ...8

1.1A ENTRADA EM UMA COMUNIDADE...8

TREINANDO A OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE (FOOTE-WHITE)...8

1.2O OLHAR DE ONTEM E O DE HOJE...13

Fatores que caracterizam a comunidade ...14

Comunidade é classe?...15

Tamanho é documento? ...16

2. A COMUNICAÇÃO EM COMUNIDADE ...20

2.1QUEM DEVE FAZER COMUNICAÇÃO NA COMUNIDADE?(PALÁCIOS) ...20

Só a comunidade sabe das coisas? ...20

2.2COMUNICAÇÃO E CULTURA (BARBERO)...21

Do popular ao massivo ...21

Do massivo ao popular ...21

Os usos populares do massivo...22

2.3UNIVERSIDADE E COMUNICAÇÃO EM COMUNIDADE...23

A EXTENSÃO, EM UMA UNIVERSIDADE CONSCIENTE (DEMO)...23

O mito da comunicação comunitária na universidade (Palácios) ...26

Universidades e ONGs: SOS aos comunicadores ...26

Comunicação em comunidade: quadro teórico ...27

3 O COMUNICADOR...28

3.1O ESPÍRITO DA COISA (OU, NO TEATRO TAMBÉM É ASSIM) ...28

3.2OUTRO MODO DE VER COMUNICAÇÃO E COMUNICADOR(KAPLUN) ...29

3.3A ATUAÇÃO DO COMUNICADOR NA COMUNIDADE...31

Dois modelos de comunicação (Gimenez) ...31

Vale lembrar...32

3.4MERGULHO NA COMUNICAÇÃO...33

4 A CIDADE E A COMUNICAÇÃO EM COMUNIDADE ...40

4.1QUESTÃO URBANA E COMUNICAÇÃO COMUNITÁRIA...40

A cidade, o que é? ...40

A questão urbana ...41

Instrumentos da Política Urbana ...42

A cidade que queremos ...42

4.2A CIDADANIA PERMANENTE...43

4.3OS NOVOS ATORES SOCIAIS E A COMUNICAÇÃO: A CIDADANIA DOS EXCLUÍDOS...44

Reciclado: lixo ...44

Mulher e homem constroem uma nova sociedade...44

Alguma coisa acontece na periferia...51

Ecologia: nova visão da Terra...53

ONGs que trabalham com os novos atores ...54

5 METODOLOGIA ...55

5.1O PROCESSO DA G1...55

5.2O PROCESSO DA G2...55

Possibilidades de serviço ...56

Projeto...56

Veículo comunitário (boletim, folder, HQ, cartazete etc.) ...57

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INTRODUÇÃO: O CONTEXTO

É difícil mapear, em 2004, comunicação e identidade cultural. Vivemos uma época caracterizada pela ambigüidade e a fluidez. Ao mesmo tempo, surge, com força, uma nova ordem mundial, transnacional, em que, apesar das guerras localizadas (e até das mais amplas, como a atual, entre os EUA e o Iraque), as estratégias não são mais de luta e sim de negociação. A intensa migração cultural tende a eliminar as barreiras entre cultura erudita e popular. A primeira, letrada, é específica da modernidade ocidental e tem criado e gerido o espaço público. Na cultura popular, pós-letrada, consolidam-se produtos da indústria cultural recebidos por um público iletrado, que os amadurece e "aprende lendo", criando assim, um espaço público "plebiscitário", na análise de H. B. Hollanda1.

A cidade, por sua vez, ganha novo sentido, com um discurso e identidade próprios (antes falava-se de países ou estados). Hoje, além das reivindicações de melhorias urbanas, sonha-se em construir um direito de cidadania para usufruir um novo espaço da cidade, em que as diversidades culturais possam se identificar e representar. Esse direito de cidadania inclui-se na questão ética, antes bandeira latente e hoje exigência estendida à vida cotidiana. Portanto, a cidade é categoria obrigatória de análise, quando se fala em comunidade e comunicação.

Por outro lado, a sociedade brasileira é caracterizada por contrastes e desigualdades que a tornam uma das mais injustas do mundo: setores privilegiados da população detêm conhecimento e tecnologia avançados, enquanto as massas populares não conseguem se desenvolver, muito por falta de informação básica. É desafiante para nós, comunicadores, saber que, apesar do poderio da mídia, a falta de informação é uma das principais causas da miséria e das desigualdades (no Brasil e, principalmente, no Rio, apesar da fama desta cidade de politicamente mais consciente e informada).

Perguntamos, então: de que modo um comunicador pode tornar a informação útil e mais acessível às comunidades que o rodeiam, no caso, as cariocas?

A comunidade, por sua vez, é categoria pouco estudada na área dos estudos da comunicação. Muitos a vêem como impossível de se realizar em ambiente capitalista, mas no entanto, se servem do termo para nomear segmentos sociais os mais diversos: comunidade favelada, de informações, esportiva, científica etc.

A comunicação em comunidade surge como uma possibilidade, num universo regido pela comunicação de massas, de inserção no micro-universo de uma comunidade existente na cidade do Rio de Janeiro, em 2004f, com seus valores e desafios. Trabalhar a serviço

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dessa comunidade, como observadores participantes e como comunicadores comunitários exigirá uma dupla qualificação. Na hora do ver, o olhar antropológico vai se juntar à perspectiva do repórter investigativo. Na hora do fazer, a técnica de comunicação vai se unir à sensibilidade humana e cultural, para que o trabalho final agrade e seja útil à comunidade e aos alunos, trazendo benefícios a todos.

O QUE É COMUNICAÇÃO COMUNITÁRIA?

A comunicação comunitária pode ser entendida como uma via de mão dupla, multidirecional, um processo não-autoritário, no qual a seleção e a elaboração de conteúdos, linguagem e forma, a geração dos recursos e o uso dos veículos estão ao alcance dos destinatários da comunicação. Para que estes se tornem elementos ativos da comunicação e não seu objeto, deve haver troca efetiva entre emissor e receptor (indivíduos ou grupos, organizados ou não), o que torna possível diminuir a diferença e o distanciamento entre os dois pólos.

A comunicação comunitária resulta da investigação e do exercício de uma forma de comunicação diferente da tradicional. Ela não se coloca, ingenuamente, contra a mídia (MCM e indústria cultural), mas sabe que estes não são os únicos veículos com poder de comunicar, a única fonte da comunicação. Embora dominantes, eles são de fato interlocutores, em um mundo em que a comunicação, além de ser um dos elementos, está em constante e expansivo processo. Além disso, um comunicador comunitário pode usar a mídia para se comunicar com a comunidade e, nela trabalhando, fazê-o de modo comunitário.

A comunicação comunitária exige criatividade para desenvolver suas múltiplas formas (escritas, faladas, visuais etc), não contando em geral com muitos recursos. Não exclui, no entanto, avanços - como a informática e as técnicas avançadas, a serviço da comunicação - desde que democratizados. Não há, portanto, limites quanto ao número de receptores ou usuários, embora seja praticada comumente em pequenos grupos.

Por que outros nomes ela é também chamada?

Comunicação em comunidade, popular, das classes populares, alternativa, participativa, de pequenos grupos, pequenos meios, interativa etc.

Quais as principais ferramentas comunicacionais?

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a) meios alternativos tradicionais: cartaz, mural, serigrafia, boletim, jornal, cassete, rádio e tv comunitárias.

b) meios alternativos contemporâneos, baseados em:

- expressão e sensibilização: corporal (gestos, dança); teatral; plástica (arte conceitual, popular etc) ; eventos, moda (modo de se vestir, de se "produzir"), merchandising (crítico, educativo e de interesse público);

- tecnologia: recicláveis (objetos, serviços); informática e telemática (produção e edição domésticos, a casa "inteligente", meios interativos etc).

Como a comunicação comunitária atua em uma comunidade?

R – Após um processo de entrada na comunidade, no qual esta é absolutamente respeitada como sujeito de pesquisa e intercâmbio, o objetivo da comunicação comunitária é levar as pessoas à mobilização e à participação na comunidade ou, caso já participem, a uma consciência maior desse estágio, podendo aperfeiçoar seus recursos de expressão, num ganho cultural inestimável para a sua comunidade. Ao objetivar suas reivindicações de maneira mais organizada, elas se tornam também politicamente capazes de articulação. Surge daí uma consciência de comunidade. Ampliando-se o processo de comunicação e de resgate da memória, diminuem os efeitos da massificação e desumanização da grande cidade. No uso dos pequenos meios, as pessoas começam a questionar o mito do corporativismo, percebendo que não só os profissionais exercem comunicação. Democratizar e gerenciar meios ensina também a projetar e desenvolver outros trabalhos profissionais e a reduzir seus custos.

Como a comunicação comunitária pode desenvolver os alunos?

Eles podem se realizar profissionalmente como comunicadores comunitários (ex: criam mercado de trabalho a imprensa sindical e a de bairros - que em São Paulo, por exemplo, é muito ativa). A prática comunitária leva os profissionais comunicadores a se aprimorarem mais rapidamente a a menor custo que em cursos convencionais. Além disso, o aluno assume, com o trabalho prático, um duplo papel: o de pesquisador do estado da comunicação na comunidade, e o de agente de comunicação, que realiza um trabalho de interesse dessa comunidade. Há oportunidade também de conhecer os mecanismos de organização popular e alguns problemas que as comunidades enfrentam, em nossa cidade.

Qual o papel do professor na comunicação comunitária?

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Como escolher uma comunidade?

O tempo é curto. O ideal é procurar uma comunidade da qual v. já tem algum conhecimento, dentro de seus interesses e possibilidades. Lá, contate alguém que se torne um elo de ligação, apresentando pessoas e informando sobre as principais características da comunicação dessa comunidade.

Como nossa postura no trabalho influi no resultado final?

Não seremos cientistas ao microscópio, nem técnicos que ensinam comunicação, mas observadores participantes. O outro, pertencente à comunidade, não é um ignorante ou um objeto de pesquisa. Ele é um sujeito de comunicação, com quem vamos trocar conhecimento e experiências.

O que é mais importante na avaliação do curso?

Interessa mais o "como" é feito o trabalho que o resultado final. Portanto, presenças, conceitos, notas, tudo está em função desse processo, da motivação e participação do aluno.

Em síntese, quais os objetivos da comunicação em comunidade?

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A COMUNIDADE

A entrada em uma comunidade:

TREINANDO A OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE

William Foote-White2

Muitos acham difícil a entrada em uma comunidade e, mais ainda, em uma atitude de observador participante. O antropólogo William Foote-White, sociólogo americano da Escola de Chicago conta a experiência de sua adaptação a uma comunidade de irlandeses e italianos de Chicago, em 1936. A importância do elo de ligação com a comunidade fica evidenciada na descrição do relacionamento do autor com Doc, um rapaz do bairro, com 15 anos de idade. Também o estranhamento necessário ao trabalho é um dos principais aspectos deste texto introdutório.

“Lembro-me da primeira vez que saí com Doc e fomos a uma casa de jogo. Ansiosamente, segui-o por um beco escuro. Não estava preocupado com uma "batida" policial, e sim em como me adaptar e ser aceito. Entramos em uma cozinha pequena, a pintura descascando, quase sem móveis, onde uns homens conversavam. Tirei o chapéu e procurei um lugar para pendurá-lo. Não havia. Neste momento, aprendi a primeira lição, como observador participante em Cornerville: não se tira o chapéu dentro de casa, pelo menos entre homens.

Doc apresentou-me a Shichi - que dirigia o negócio - e a seus amigos e clientes, como "meu amigo Bill". Fiquei com Doc na cozinha e depois fui para outro cômodo, assistir a um jogo de dados. Falava-se sobre jogo, corrida de cavalos, sexo etc. Eu ouvia e tentava ser amável. Os caras se cotizaram para pagar as bebidas, vinho e café com licor de anis. Doc não me deixou pagar. Ninguém perguntou sobre mim, mas ele me disse depois que, quando fui ao banheiro, os homens ficaram inquietos, conversando em italiano, até ele convencê-los de que eu era seu amigo e não um policial federal. Fomos muitas vezes ao estabelecimento de Shichi, até que me atrevi a ir sozinho, sendo recebido amigavelmente. Senti então que começava a ocupar um lugar em Cornerville.

Quando Doc não ia à casa de jogo, passava o tempo na rua Norton. À medida em que conhecia os rapazes, eu me integrava na turma da rua. Quando foi fundado o Clube da Comunidade Italiana da rua Norton, Doc foi convidado para sócio. Ele trabalhou minha aceitação no Clube e fiquei satisfeito em associar-me, por este ser diferente das turmas de rua que eu freqüentava.

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namorada?" Isso me abriu os olhos. Aprendi que só se faz esse programa com uma garota quando se quer casar com ela. Felizmente, ela e sua família viram que eu não conhecia os costumes locais e, portanto, não pensaram em compromisso de minha parte. Apesar de achar umas garotas de Cornerville excepcionalmente atraentes, não mais saí com elas, a não ser em grupo e em visitas.

Observei também que a vida das moças era menos agradável que a dos rapazes. Estes eram livres para perambular pela rua. Já as moças se limitavam às casas de amigas e parentes e ao trabalho. Muitas sonhavam com um rapaz de fora de Cornerville, educado, com algum dinheiro e um bom emprego, que viesse cortejá-las e tirá-las dali. Eu não podia dar-me ao luxo de assumir este papel.

A primavera de 1937 deu-me um curso intensivo de observação participante. Fui aprendendo a lidar com vários grupos, especialmente com os da Norton. À medida em que fazia ponto em Cornerville, vi que precisava de uma explicação para mim e para meu estudo. Enquanto estava apoiado por Doc, ninguém perguntava quem eu era e o que fazia. Quando circulei sem ele, ficou claro que os grupos queriam saber sobre mim. Comecei com uma explicação um tanto elaborada. Estaria estudando a história social de Cornerville, do presente para o passado. Das duas vezes em que dei este esclarecimento, houve um silêncio embaraçoso. A explicação parecia encobrir o que eu fazia no bairro, mas nada significava para o pessoal de lá. Logo as pessoas criaram uma versão: eu estaria escrevendo um livro sobre Cornerville, o que parecia vago; mas foi suficiente. Descobri que minha aceitação no bairro dependia mais das relações pessoais que desenvolvesse do que de explicações. Escrever um livro sobre Cornerville valeria ou não, dependendo das opiniões sobre mim. Se fossem boas, o projeto era bom; se não, nada poderia convencê-los. É claro que as pessoas não satisfaziam sua curiosidade só me fazendo perguntas. Recorriam a Doc e ele restabelecia a confiança de todos.

Aprendi a importância do apoio de pessoas-chave nos grupos que estudava. Ao invés de explicar minha presença a cada um, descobri que era melhor informar líderes como Doc do que rapazes da rua. Meu relacionamento com Doc mudou rapidamente. A princípio, ele era meu maior informante e protetor. Aos poucos, deixou de ser uma fonte passiva: começamos a discutir ações, problemas, observações etc. Doc tornou-se, no verdadeiro sentido do termo, um colaborador da pesquisa. O fato de ele ter noção da natureza de meu estudo estimulou-o a fazer sugestões. Muitas vezes me dizia: "Bill, você devia ter vindo ontem à noite, teria ficado interessado". E fazia relatórios sempre relevantes para a pesquisa. Doc achava divertida a experiência, embora visse desvantagens: "desde que você

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apareceu, tenho me cansado muito. Agora, quando faço qualquer coisa, penso: o que Bill gostaria de saber a respeito? Antes, eu agia por instinto". Mas isso não parecia incomodá-lo muito. Na verdade, sem qualquer treino, era um observador tão perspicaz, que a qualquer estímulo explicitava muito da organização social de Cornerville. Devo dizer que algumas das interpretações do estudo são mais dele do que minhas. Embora trabalhasse mais de perto com Doc, sempre procurei o apoio e a colaboração do líder do grupo que estava estudando. Esses líderes eram mais perspicazes que seus seguidores, na observação da comunidade.

Eu havia sido treinado, nos métodos de entrevista, a não discutir com as pessoas ou julgá-las - o que correspondia a minhas inclinações pessoais - e sim a aceitá-las (e a ser aceito por elas). Por isso, fiz poucas entrevistas formais.

Aprendi a participar de discussões de rua, do beisebol ao sexo, o que não requeria treino especial, pois estes temas parecem ser de interesse quase universal. Não estava apto a entrar no assunto corrida de cavalo, que comecei a acompanhar como amador. Hoje estou certo de que deveria ter lido mais jornais de turfe. Ainda assim, meu conhecimento sobre beisebol me garantia lugar nas conversas de esquina.

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começaram a chegar sem grande esforço. Esporadicamente, quando lidava com um problema específico e queria saber mais sobre uma pessoa, buscava encontrá-la a sós e entrevistá-la formalmente.

A princípio, minha preocupação foi integrar-me em Cornerville, mas depois tive de avaliar minha inserção na vida do bairro. Uma noite, quando passeava na rua com a turma da Norton, querendo entrar no espírito de uma conversa trivial, deixei escapar algumas obscenidades e palavrões. Todos pararam e me olharam surpreendidos. Doc balançou a cabeça e comentou: "Bill, você não devia falar desse modo. Não combina com você". Expliquei que empregara termos usuais da rua. Doc, no entanto, insistiu em que eu era diferente e que desejava que eu continuasse assim.

Esta lição teve um alcance maior que a possível identidade no falar. Descobri que as pessoas não esperavam que eu fosse igual a elas. Na verdade, sentiam-se atraídas e satisfeitas por eu ser diferente, contanto que eu tivesse amizade por elas. Daí ter parado de me esforçar por uma integração completa.

Ainda assim, meu comportamento foi afetado pela vida na rua. Quando Howard veio de Harvard para colaborar na pesquisa, notou logo que eu falava em Cornerville de modo diferente do usual na Universidade. O problema não era o emprego de palavras, obscenidades ou expressões gramaticais incorretas, mas sim que eu me expressava do modo que me parecia natural. Porém, o que era natural em Cornerville, não o era em Harvard.

No bairro eu falava com mais entusiasmo, engolindo os finais das palavras e gesticulando muito. Havia também diferenças no vocabulário. Enquanto estive envolvido em Cornerville, ficava de língua travada nas visitas a Harvard. Simplesmente não conseguia discutir relações internacionais, natureza da ciência e outros temas em que antes me sentia à vontade.

À medida em que fui sendo aceito pelos grupos, queria que as pessoas ficassem satisfeitas comigo. Ao mesmo tempo, procurava não influenciá-las, uma vez que desejava estudar a situação, afetando-a o menos possível com minha presença. Por isso, evitei aceitar posições de liderança nos grupos, com uma única exceção. Fui nomeado secretário do Clube Italiano. Meu primeiro impulso foi recusar o convite, mas depois refleti que podia escrever sobre as reuniões enquanto estas ocorriam, ao fazer anotações para as atas.

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ajude sempre seus amigos e, quando possível, em dinheiro. Sempre que emprestava algum, ficava apreensivo. Naturalmente o amigo era grato no momento do empréstimo. Mas, se não pudesse pagá-lo, ficava embaraçado e fugia de mim. Eu o tranqüilizava para que esquecesse a dívida, mas o mal-estar permanecia. Aprendi que emprestar dinheiro a um amigo podia prejudicar nossas relações. Não sei de solução fácil para este problema. Há momentos em que é imprudente para um pesquisador negar um empréstimo pessoal. E outros em que, mesmo com recursos, não deve emprestar dinheiro, recusando-se de modo cordial.

Quando o pesquisador participa de mais de um grupo na comunidade, seu trabalho de campo se complica se houver conflito entre grupos e estes pedirem uma definição ao pesquisador. Isto ocorreu na primavera de 1937, quando os rapazes organizaram uma partida de boliche entre os da Norton e o Clube Italiano. Doc, naturalmente, era Norton. Eu, por sorte, não tinha treinado o bastante para ser escalado por nenhum time e pude ficar como espectador. Tentei aplaudir imparcialmente mas temo que tenha ficado evidente minha torcida pelo Norton.

Enquanto estava com os membros do Clube, não tive necessidade de defendê-los de comentários depreciativos. Ocorreu, no entanto, uma situação embaraçosa: eu estava com os rapazes na rua e um estudante parou para falar comigo. Houve uma discussão e ele disse: "Bill, estes camaradas não podem entender o que digo, mas você pode". Senti que precisava responder que ele subestimava os rapazes e que universitários não eram as únicas pessoas sabidas. Embora eu tivesse dito exatamente o que pensava, isto não destruiu meu relacionamento com o rapaz nem abalou seu sentimento de superioridade. Por outro lado, tornou-se evidente - logo que ele nos deixou - o quanto sua afirmação havia atingido os rapazes. Eles fizeram comentários negativos sobre ele, apreciando eu ser diferente e dizendo que eu sabia muito mais do que ele, embora não o demonstrasse.

Meu primeiro ano em Cornerville deu-me uma sólida posição no bairro. Doc resumiu: "você está tão ligado a esta rua quanto este poste de luz". Provavelmente, o que me deu maior aceitação na rua Norton foi o jogo de beisebol, organizado por Mike Giovani, entre os gloriosos veteranos e os adolescentes que despontavam na rua. Mike escalou-me para uma posição sem importância no time, mas pelo menos eu estava entre eles. Quase no fim da partida, era minha vez de jogar e o escore estava empatado. Assim que me coloquei para rebater, ouvi alguém sugerir a Mike minha substituição. Este gritou: "não, confio no Bill Whyte". Tomei impulso, errei duas rebatidas e aí golpeei firme, rasteiro, tão preocupado em chegar à primeira base que não sei se consegui alcançá-la por equívoco ou sorte.

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âmbar, com a brasa de um cigarro. Prometi aos amigos guardar o anel para sempre. Tive a sensação maravilhosa de ter correspondido à expectativa, o que me fez sentir ainda mais parte da rua Norton.

O olhar de ontem e o de hoje

MARCONDES3 e PÁLACIOS4 são postos aqui a dialogar sobre as principais linhas do pensamento teórico sobre comunidade, enfatizando aspectos e contradições que devemos conhecer, para melhor realizarmos nosso trabalho. Ao final, acrescentamos algumas informações sobre o tema, para complementar este painel.

Segundo MARCONDES, a comunidade é tão antiga como a história do homem sobre a Terra. O debate, porém, sobre "comunidade como forma de organização social" só se intensifica com o surgimento da sociedade industrial capitalista5. Em fins do século XIX, a

Sociologia (principalmente a alemã) discute comunidade e sociedade. A primeira é ingenuamente vista como espaço pré-capitalista de relações humanitárias e não contaminadas pela ideologia do capital6, enquanto a segunda é classificada, negativamente,

como burguesa e industrial. A utopia orientada para o passado é retomada, na prática, por reflexões e até experiências sociais e políticas.

PALÁCIOS, por sua vez, nega que a consolidação do capitalismo industrial no século XIX marque o fim da idéia de comunidade. Para ele, essa época redescobriu o conceito de comunidade, um dos grandes temas sociais nos pensamentos sociológico, filosófico, histórico e teológico (com destaque para Comte, Owen, Durkheim, Proudhon e Weber). Comunidade, tradição e status substituíram as idéias abstratas de livre vontade, racionalidade e contrato, dominantes no século XVIII.

Já o senso comum acredita que, na sociedade capitalista de classes, a comunidade é uma forma de resistência à lógica dominante e um instrumento de avanço para formas mais progressistas e humanas de organização social. PALÁCIOS vê aqui dois enganos: um, o de que as idéias de comunidade e de comunicação comunitária correspondam, necessariamente, a uma visão de mundo voltada para a transformação; outro, o de que elas derivam dos esforços somente dos pensadores ditos progressistas.

Na verdade, entre os que redescobriram a idéia de comunidade, estavam pensadores conservadores (De Bonald e Maistres, na França, Burke, Carlyle e Disraeli, na Inglaterra).

3 MARCONDES FILHO, C. Jornal comunitário e mobilização popular, in Quem manipula quem?. Petrópolis: Vozes, 1987. p.155-162 (res.).

4 PALÁCIOS, Marcos. Sete teses equivocadas sobre comunidade e comunicação comunitária. In: Comunidade e comunicação comunitária [s.n.ed.] (mimeo) (res.).

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Eles se opunham, é fato, às transformações do capitalismo industrial, mas não queriam avançar para novas formas de organização social. Sua idéia de restauração da comunidade baseava-se no modelo feudal de sociedade e era uma estratégia para deter o avanço de novas formas de organização.

Por seu turno, lembra Palácios, os progressistas e os socialistas utópicos (Owen, Fourier, Proudhon) se apropriam, das idéias sobre comunidade e as orientam para a transformação. As experiências por eles inspiradas, ao longo do século XIX, embora tivessem espírito transformador, foram de curta duração.

No início do século XX, continua MARCONDES, a ideologia do retorno à comunidade (que ele também considera uma fórmula romântica e anacrônica de reação à expansão industrial capitalista), reaparece no fascismo alemão. Nos anos 60, essa inspiração retorna nos movimentos da "Revolução Rural".

Comunidade, nessa perspectiva, é um conceito retrógrado, uma visão idealista de "recuperação" de um mundo imune às contradições capitalistas, na utopia da "comunidade comunista", só existente no imaginário das esquerdas. E MARCONDES insiste: comunidade não é alternativa à sociedade capitalista. É parte dela, e sua lógica funciona como a da sociedade maior, despersonalizada, anônima etc. O que é, então, para este autor, comunidade?

Fatores que caracterizam a comunidade

Em nossa sociedade, o indivíduo é desagregado e despersonalizado pelo caráter de mercadoria que assumem as relações sociais: o capital reduz tudo a abstrações, como ocorre nas trocas operadas no mercado, em que bens são permutados por valores, corporificados no dinheiro. Em oposição às relações sociais genuínas (aproximação física, afeto etc.), dominam relações abstratas (imagem, mercadorias, mídia, fliperamas etc.). Estas isolam o homem, mediando seu convívio com objetos inanimados mas reificados, que substituem as pessoas. A sociedade, portanto, cria relações abstratas e vazias. A comunidade seria, então, uma forma de organização que reúne as pessoas e resgata a sociabilidade perdida. O fenômeno comunidade, para MARCONDES, tem um sentido produtivo, determinado pelos seguintes fatores:

a) estrutura, ou seja, base comum e forma própria de comunicação que ligue seus

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componentes. O autor cita WEBER7: o fator biológico não basta para caracterizar

comunidade. Ser negro, judeu, japonês etc., não define comunidade "negra", "judia", "japonesa", que são somente grupos diferentes na sociedade. Uma "característica básica comum" é apenas o laço de união, e não o sentido da ligação. Este é dado pela comunicação.

b) dinâmica interna própria. há sentimento de comunidade quando indivíduos se sentem parte de um todo claramente limitado e cujas dimensões são concretamente perceptíveis. No interior de uma comunidade, há cooperação e representatividade entre seus membros. Estes aspectos "weberianos" não podem ser descartados no trabalho com comunidades. Se não há dedicação dos membros, o comunicador atua impondo normas, como "vanguarda" de movimentos sociais. Para HELLER8, "qualquer grupo pode vir a ser

comunidade", dependendo da ação organizada de indivíduos, sob condições comuns.

c) centralização no indivíduo. Neste está a negação da sociedade de massa e seus mecanismos de despersonalização, anonimato, desorientação, reações isoladas, desarticulação, ambição de status etc. Pela formação e ativação de comunidades, é possível enfrentar o processo de anulação do indivíduo pelo capitalismo, não na busca ingênua da vida pré-capitalista (como o imaginário produzido em série pela indústria da consciência e difundido pela comunicação massificada). Para WEBER9, o aspecto mais decisivo da

comunidade está na consciência de seus participantes, mesmo que a comunidade se situe na economia de mercado. O sentimento subjetivo de constituir um todo caracteriza a comunidade, cujo sentido essencial é a humanização, a realização do sujeito, em uma opção individual. "Na medida em que minha individualidade 'constrói' o grupo a que pertenço, 'meus' grupos convertem-se, paulatinamente, em comunidades"10. Em uma sociedade que

nivela e generaliza, a comunidade é um espaço de realização de valores comuns e da própria individualidade.

Comunidade é classe?

MARCONDES discute a submissão do conceito de comunidade ao de classe. Esse é um ponto para ele fundamental. Exigir o aval de uma classe para legitimar a constituição e a atuação de uma comunidade é tirar desta a possibilidade de atuar politicamente. Comunidade não é classe social, mas tem suas leis próprias e, talvez, mais condições de entrosamento e de auto-realização que a classe. Em nossa sociedade complexa, confirma

7 WEBER, Max. Comunidade e sociedade como estruturas de socialização. In. FERNANDES, F., Comunidade e sociedade, p. 43).

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PALÁCIOS, o desafio é repensar este conceito, levando em conta que as comunidades de interesse, ainda que constituídas por representantes de uma mesma classe social, não se diluem ou se confundem com a classe. As especificidades nos grupos sociais são importantes e devem ser preservadas, inclusive pela relação entre comunidade e cidadania plena, que depende, em grande parte, da pluralidade de comunidades.

Tamanho é documento?

Muitos crêem que comunidade é uma unidade social de tamanho reduzido, caracterizada por proximidade física e contatos face a face. Para PALÁCIOS, esta é uma visão estreita e conservadora, que reduz a comunidade a grupos locais vizinhos (bairro, etc.). Ela não é só um lugar no mapa. Pensada de forma tão limitada, não passa do modelo medieval de família extensa ou de vila. O conceito político de comunidade deve, pois, ultrapassar os laços locais. Na verdade, pode-se ter experiência comunitária sem viver perto de outros. Uma categoria profissional unida por um objetivo comum, ou um grupo específico geograficamente disperso, por exemplo, também constituem comunidades extensas e não locais. Comunidade é, então, para PALÁCIOS, toda forma de relação caracterizada por situações de vida, objetivos, problemas e interesses comuns,independentemente do número e situação geográfica das pessoas envolvidas. É também uma identidade coletiva, uma maneira de dizer quem somos nós.

COMUNIDADE E SOCIEDADE VISTAS PELA SOCIOLOGIA11

Três são os autores clássicos que primeiro refletiram sobre as idéias de comunidade e sociedade: Ferdinand Tönies, Franz Weber e Émile Durkheim.

SOCIOLOGIA CLÁSSICA:

Tönies: comunidade x sociedade

Comunidade (Gemeinschaft): caracterizava-se pelo passado, a aldeia, a família, o calor. A motivação era afetiva, orgânica. As relações, locais, com interação. As normas e o controle eram dados por meio de união, hábito, costume, religião. O círculo da comunidade abrangia família, aldeia e cidade. Situações de conflitos e opressão não faziam parte da idéia de comunidade, que era o estado ideal dos grupos humanos. Sociedade(Gesellschaft): frieza e egoísmo e a corrupção dos grupos humanos são fruto da modernidade calculista. A motivação é objetiva, mecânica, as relações são supralocais e complexas. Normas e controle são dados por convenção, lei, opinião pública. O círculo da sociedade abrange metrópole, nação, Estado e Mundo.

(17)

Mudança social: fruto de dois princípios conflitantes: o aristotélico (homem é ser social) e o hobbesiano (homem é de natureza anti-social). A natureza é contraditória: o homem: aspira à união e é contra ela; comunidade supõe conexão x separação; coletivo x individual. O próprio Tönnies resume: “Não conheço nenhum estado de cultura ou sociedade em que elementos de Gemeinschaft e de Gesellschaft não estejam simultaneamente presentes, isto é, misturados"12.

Weber: solidariedade e ligações emocionais

A comunidade é orientação da ação social, ligação emocional, afetiva ou tradicional. Um exemplo básico de comunidade é a relação social baseada no sentido de solidariedade, resultando de ligações emocionais ou tradicionais dos participantes13 Para este autor,

comunidade e sociedade: a) não são alternativas de integração do indivíduo nas estruturas sociais; b) não são conceitos que se excluam mutuamente, que se oponham frontalmente. A maioria das relações sociais tem em parte caráter de comunidade, em parte, de sociedade. Situações de conflitos e opressão, em uma comunidade, só existem quando sobre a base de um sentimento comum e de suas conseqüências está também a ação reciprocamente referida, e essa referência traduz o sentimento de formar um todo.

Durkheim: dicotomia comunidade / sociedade.

A comunidade desenvolve-se primeiro e a sociedade é seu fim derivado. As relações sociais têm caráter tanto de comunidade quanto de sociedade.

Em síntese, estão na sociologia clássica: a) a dicotomia comunidade / sociedade; b) a comunidade como "redentora" e "ideal de convivência humana"; c) a relação familiar.

SOCIOLOGIA MODERNA

A comunidade apóia-se em diferentes princípios de coesão entre seus elementos constituintes (contrastes parentesco x território, sentimentos e interesses, etc). E se identifica com coesão social, conflito e colaboração para um fim comum, não colocando mais tanta ênfase na base territorial.

12 TÖTO, Pertti. Ferdinand Tönies, um Racionalista Romântico . In MIRANDA, Orlando. Para Ler Ferdinand Tönies.

Edusp. São Paulo, 1995.

(18)

Palacios14 caracteriza a comunidade pelos seguintes elementos: sentimento de

pertença, territorialidade, permanência, ligação entre o sentimento de comunidade, caráter corporativo, emergência de um projeto comum e a existência de formas próprias de comunicação.

Esse autor fala do sentimento de pertença como aquele que faz o indivíduo se sentir parte do todo e cooperar para uma finalidade comum com os demais membros (com um caráter corporativo, um sentimento de comunidade e um projeto comum). Para Palácios, no entanto, a territorialidade, o locus da comunidade; a permanência ainda são condições essenciais para o estabelecimento das relações sociais.

Beamish15 já percebe que, além do território, lugar físico, geográfico (vizinhança,

cidade, bairro, com pessoas que vivem em um lugar estabelecendo relações devido à proximidade física e vivendo sob convenções comuns), mais um sentido é comum à comunidade: o interesse comum no interior de um grupo social, de qualquer tamanho, que divide entre si interesses religiosos, sociais, profissionais, etc.

Ray Oldenburg16:considera que as comunidades desaparecem da vida moderna por

falta de lugares ("good places") como o lar, o trabalho e os "terceiros lugares", onde seriam formados os laços sociais geradores das comunidades (igreja, bar, praça etc.). Estes seriam mais propícios à relação social necessária ao "sentimento de comunidade", porque neles existe o "lazer", as pessoas se encontram de modo desinteressado para se divertirem ("lugares de vida pública 'informal'). Como esses lugares estão desaparecendo da vida moderna pelas atribulações do dia-a-dia, as pessoas estariam sentindo que o "sentimento de comunidade" estaria em falta. Na maior parte das cidades da América e do Ocidente está havendo um declínio desses "terceiros lugares".

As razões desse desaparecimento seriam, para Oldenburg (id.), as construções padronizadas, típicas do modernismo, jogando as pessoas para os subúrbios e hostilizando o espaço com suas estruturas.

Osurgimento das comunidades virtuais é detectado por Rheingold17, que aponta, como

uma causa, a ausência do "sentimento de comunidade" causada pelos fatores acima.

14 Apud Raquel Recuero, citado em http://facom.ufba.br/cyberpesquisa/palacios/cotidiano.html (19/11/1998)1998,

online.

15 Apud R. Recuero, citado em http://albertimit.edu/arch/4.207/anneb/thesis/toc.html consultado em 6/10/98. 16 In The Great Good Place (apud R. Recuero, p. 18).

(19)

A decadência do senso de comunidade deve-se, para Sennet18, ao surgimento e

consolidação do individualismo e ao culto à personalidade. Para este autor, a noção de comunidade passa da Gemeinschaft de Tönnies para a Gesselschaft quando se associa a ação pública à expressão da psique individual. Com o avanço da industrialização e da `sociedade de massas', as pessoas tornam-se atomizadas, e a ordem social caracteriza-se pela anomia. A idéia de comunidade como território limitado foi substituída pela noção de comunidade com "mentes iguais" ou pensamentos semelhantes. O mais importante traço na definição de comunidade vai ser, então, o senso de traço comum, característica, identidade ou interesses.

Resumindo, o conceito "comunidade" evolui - com a modernidade e a urbanização - de um sentido "ideal", rural, de família, para um maior conjunto de grupos humanos, as grandes cidades. A Idéia de "comunidade" como a sociologia clássica a concebia (rural, ligada por laços de parentesco em oposição à idéia de sociedade), parece não desaparecer totalmente da teoria, mas sim da realidade prática.

FASES DO DESENVOLVIMENTO DE UM GRUPO

Todo grupo humano, ao se desenvolver para criar ou aumentar sua sociabilidade e a possibilidade de uma ação política, passa por pelo menos 4 estágios19:

1) Mobilização: estímulo a entrar em movimento, sair da inércia, da rotina, mobilizar-se. Deslocar-se para ver ou ouvir algo que acontece, assistir a um evento, sair de seu caminho para ligar-se a algo novo, são formas de mobilização.

2) Participação: perceber pontos em comum com alguma coisa, comunicar-se com os que participam e decidir associar-se a estes, de forma ativa, por palavras, atitudes e apoios concretos. Este processo faz com que as pessoas percebam, na prática, que elas têm interesses comuns, o que cria uma identidade grupal.

3) Organização: o grupo percebe que suas ações podem se tornar mais objetivas e eficazes se realizadas de certo modo e em uma certa ordem, para preencher determinadas funções. Criam-se, ainda que informalmente, normas de comportamentos; estabelecem-se as bases de um consenso social sobre as atitudes do grupo. Avaliam-se acertos e produtos obtidos. A experiência, se sistematizada, origina descobertas e inovações. A organização do trabalho tende a criar padrões de comportamento também organizados. Mas há um risco: burocratização por excesso de organização!

4) Articulação: O grupo organizado percebe que suas ações ficam no âmbito restrito se não tiverem apoio de outros grupos também organizados. Estabelece então entendimentos com outros grupos para realizar objetivos comuns. O apoio mútuo traduz-se em ação ordenada pela articulação e os resultados têm muito maior eficácia.

18 Ib.

(20)

A COMUNICAÇÃO EM COMUNIDADE

Quem deve fazer comunicação na comunidade?

A comunicação comunitária, para PALÁCIOS, pode transformar a comunidade quando a leva a se mobilizar e participar, visando a um interesse. Nem sempre a comunicação obtém o que reivindicou, mas culturalmente a comunidade sempre ganha, em consciência de si e expressão própria, tornando-se inclusive politicamente capaz de organização e articulação. Ao se ampliar o processo de comunicação interativa e o resgate da memória, diminuem os efeitos da massificação e desumanização da grande cidade. No uso de mídia alternativa, diz o autor, a comunidade começa a questionar o mito do corporativismo, percebendo que não só profissionais exercem comunicação. Democratizar e gerenciar meios ensina também a projetar e desenvolver outros trabalhos profissionais e a reduzir seus custos.

Por outro lado, há quem pense que a comunicação comunitária só deve ser exercida por membros das comunidades, sem a participação de profissionais. PALÁCIOS discorda e explica: por falta de recursos financeiros, elas são obrigadas a improvisar, produzindo jornaizinhos de má qualidade, cartazes caseiros etc. Daí se achar que comunicação em comunidade tem de ser improvisada, pobre, precária, realizada amadoristicamente pelos membros da comunidade. O autor vê aqui a "síndrome do participacionismo" e lembra: as comunidades estão inseridas numa sociedade mais ampla e, como esta, sujeitas ao processo de divisão social do trabalho. É claro que a participação é essencial quando se pensa em trabalho comunitário, o que não exclui especialização de funções e contratação de profissionais (médicos, dentistas e até comunicadores), treinando-se os membros da comunidade em tarefas específicas.

Só a comunidade sabe das coisas?

(21)

Comunicação e cultura (

Barbero)

Para BARBERO20, a cultura de massa não se identifica com os meios massivos e nem

pode ser a eles reduzida. Não é só um "conjunto de objetos" e sim um "princípio de compreensão" dos novos comportamentos, ou seja, é um modelo cultural. Para estudar esse modelo, é preciso um deslocamento, abandonando-se a ótica tradicional para investigar a cultura de massas a partir de outro modelo, o popular. Não se trata de voltar a uma comunicação interpessoal, que ilusoriamente faça frente à complexidade tecnológica e à abstração da comunicação massiva, mas sim de analisar os conflitos que se articulam com a cultura. No mesmo movimento em que se redescobre o popular, revaloriza-se o cultural. Este se caracteriza por uma existência múltipla e ativa, pela conflitividade e criatividade. A "não-contemporaneidade" do popular não é mero atraso. Ele transita no "agora", em uma brecha aberta na modernidade e na lógica, com as quais o capitalismo finge esgotar a realidade e o tempo atual.

Vista a partir do popular, a cultura massiva, embora o negue, revela seu caráter de classe. A cultura popular não é só a produzida e consumida pelas classes populares, mas resulta dos processos, conflitos e contradições da dominação. Já a cultura culta tem vocação para ser pensada ou lembrada como "a cultura". No entanto, a popular é totalmente vinculada com a culta, que a nega. Ambas estão em luta desigual e, com freqüência, ambígua. Surgem daí, para BARBERO, três linhas de investigação complementares:

Do popular ao massivo

Há uma nostalgia do "autenticamente popular". Entretanto, o massivo não surgiu como algo exterior, que invadiu e corrompeu o popular e sim, a partir de potencialidades da cultura popular. Só um enorme estrabismo histórico e, como diz Bourdieu, um profundo "etnocentrismo de classe", explicam a negação do popular como cultura e a visão da cultura massiva como vulgarização e decadência da cultura culta.

Do massivo ao popular

Investigue-se, na cultura de massa, a negação dos conflitos pelos quais as classes populares constroem sua identidade e também os dispositivos de massificação, despolitização, controle e desmobilização da mídia.

Em seguida, veja-se a mediação, isto é, a presença, na cultura massiva, de códigos populares de percepção e do reconhecimento de suas memórias narrativa e iconográfica.

(22)

Repetição e esquematismo, na mídia, perdem aí seu sentido simplista ou degradado e anunciam um modo de comunicação que não é o da cultura letrada, mas o das massas urbanas e rurais, que aprenderam a ler mas não a "escrever": para estas, um livro é uma "experiência", uma "história", e nunca um texto ou informação. Para os grupos populares, fotos e filmes não falam de planos ou composição, e sim das lembranças e do que representam, de uma arte que se comunica com a vida, sem mediações.

Os usos populares do massivo

As medições de audiência e as enquetes de mercado reproduzem o modelo da recepção / consumo passivos, limitando-se à análise da reação, da resposta ao estímulo. Em vez disso, investiguemos, na comunicação, o que os grupos populares fazem, vêem, acreditam, compram e consomem, ou seja, suas gramáticas de recepção e decodificação (lembrar que popular não é homogêneo e sim plural).

Se o produto ou a pauta para consumo são o ponto de chegada de um processo de produção, são também o ponto de partida e a matéria-prima de outro processo, silencioso e disperso, que é também de produção, oculto no uso que lhe dá o receptor.21

Pesquisar o que Michel de Certeau chama de "táticas" - i. é, as astúcias, estratagemas e engenhosidades do fraco, contra as "estratégias" do forte - é descobrir onde se encarna outra lógica de ação: a da resistência e a da réplica à dominação. É entender a luta subterrânea contra a entropia22 cultural produzida pela homogeneização compulsiva e

generalizada das estruturas de produção, remodeladas pela transnacionalização (vista aqui não como simples invasão de produtos do exterior).

Os estudos sobre comunicação na América Latina têm ampliado nosso campo de estudos, incorporando, com interesse cada vez maior, a questão da cultura popular. Estão em pauta processos sociais e políticos que colocam a comunicação em outro eixo - e não só no plano teórico - e a convertem em espaço estratégico para se pensar os problemas da cultura.

21 Como exemplo, o uso que grupos indígenas e camponeses deste continente têm feito dos ritos religiosos impostos pelos colonizadores: embora não rejeitados, são subvertidos e usados em referências e para fins diversos do sistema original. Ou ainda, a forma como, na urbanização popular, os moradores interferem naquilo que lhes é imposto, redistribuindo, reciclando ou refazendo o sentido e a função do espaço.

(23)

2.3 Universidade e comunicação em comunidade

A EXTENSÃO, EM UMA UNIVERSIDADE CONSCIENTE

(DEMO)

23

Qual o papel de uma universidade consciente, nesse novo enfoque sobre comunicação e educação? O sociólogo Pedro DEMO responde: a universidade compõe-se de elementos universais e confunde-se com nosso anseio de qualidade de vida. Mas como não somos uma ilha e nosso contexto é de subdesenvolvimento, a Universidade brasileira reproduz modelos internacionais de poder, já que nela se gera uma elite, vital para qualquer país. De sua parte, o povo brasileiro, que desejaria uma Universidade criativa, percebe, perplexo, os riscos da alienação de um grupo forte, fechado e defendido, que ignora as reais funções da Universidade (pesquisa, ensino e extensão), produzindo, ao invés de qualidade, formas aviltadas de seleção e proteção. A instituição, que poderia formar consciência social, porque lida com o saber, manipula-o, porém, para influência e privilégios. O autor defende um compromisso social da Universidade, através de suas principais dimensões: pesquisa, ensino e extensão.

Pesquisa é produção de conhecimento original, atividade-fim da Universidade. Dela surge a inovação. Será científica se tornar a ciência um jogo aberto, a serviço mais do saber que da ideologia, captando a realidade sem deturpar os fatos, por meio de reflexão própria e de tradução contextuada do conhecimento alheio. Daí que pesquisador não é só o que domina instrumentos experimentais mas sim o que se coloca diante das coisas em postura de indagação, sem respostas preconcebidas, questionando teorias a partir da realidade e até da "sabedoria popular", ou seja, em atitude científica.24

Ensino é a transmissão de conhecimentos. Só ensina quem fez sua personalidade científica pela pesquisa. É atividade essencial, porque o saber - histórica e universalmente acumulado - precisa ser passado de geração em geração, até para sua inovação. O mero ensino, porém, parasitário do saber alheio e desligado da pesquisa e da extensão - não qualifica uma Universidade. Há outras instituições, como a mídia, também capazes de fazê-lo - e até melhor. Ensinar bem, de forma atraente, é uma arte que supõe o dom de saber expor, explicar, argumentar. O professor-educador forma pesquisadores autônomos e não discípulos repetidores do mestre. Esta a grande tragédia da Universidade, que explica sua baixa qualidade e alienação social e cultural. Se o professor não pesquisa, seu saber é de segunda mão e o do aluno, de terceira. Enfim, só é professor quem "traduz" uma linguagem e produz conhecimento próprio, inovando em sua especialidade.

23 DEMO, P. Pesquisa, ensino, extensão, in: Neves, Consuelo, A casa do mágico, Rio de Janeiro: Agir, p.14-25, 1986 (res.).

(24)

Extensão é aplicação do conhecimento e intervenção na realidade. O termo pode não ser o melhor, denominando tarefas que, apesar de importantes, são consideradas colaterais, fora do contexto pesquisa-ensino (atendimento a comunidades populares, promoção cultural, editoração, aplicações tecnológicas etc.), mas é atividade de grande relevo para a Universidade, não só por ações de caráter social, mas principalmente porque nela se prova a qualidade das outras dimensões essenciais da Universidade, pesquisa e ensino.

O primeiro passo da extensãoé conhecer a realidade pela pesquisa. Quanto ao ensino, a extensão aprimora sua qualidade ao evitar o alheamento teórico e o academicismo discursivo. Além disso, ativa a consciência social do estudante e do professor, que descobrem, na atuação comunitária, utilidade para o país, a região e a sociedade local. A extensão deveria, portanto, ser atividade acadêmica regular, na esfera da pesquisa e do ensino, tendo como um de seus instrumentos o estágio curricular.

Consciência e compromisso sociais

Todo comunicador deve ter uma consciência social, que se transforme, com o tempo, em compromisso social. Para desenvolver seu processo de consciência, precisa ter percepção teórica e prática dos condicionamentos sócio-econômico-políticos que marcam as instituições.

A reflexão sobre consciência social se inicia com a Universidade, instituição na qual estamos inseridos e que se funda em: a) privilégio e poder dados pela formação superior; b) pobreza da maioria da população; c) interdependência entre os dois aspectos. Destes pressupostos, decorrem os seguintes enfoques:

• Ao integrar a política social do país, a Universidade deve se preocupar com a

desigualdade, vendo o desenvolvimento local, regional e nacional como problema da docência e da pesquisa, embora, é claro, não se esgote aí o sentido da Universidade.

• Os que têm formação superior estão em dívida social para com toda a sociedade. Mesmo

que o diploma hoje não garanta um bom emprego, é um privilégio pago pela sociedade inteira. Muitos dos que fizeram o 3o grau se esquecem de que venceram a seleção educacional e se distanciam do resto da sociedade. Vêem neste privilégio um mérito pessoal. Mesmo se o fosse, estariam em dívida social: para que poucos tenham tanto, é preciso que muitos tenham tido muito pouco.

• A Universidade deveria, como compromisso cultural, contribuir para a expressão da

(25)

• Além de sua função estratégica de formar a elite intelectual, a Universidade não pode se

alienar da realidade porque o compromisso social é básico para a formação da cidadania do estudante. É em confronto com os problemas sociais que o estudante elabora sua personalidade política, como cidadão e responsável pelo desenvolvimento do país.

Distorções da consciência social

A questão da consciência social é complexa, porque fere ideologias e incomoda a elite universitária. Na prática, ocorrem as seguintes distorções:

Consciência embotada: A elite universitária, em termos sócio-econômicos, não detém meios de produção, mas vive à sombra da classe alta. Tem consciência de sua situação, daí se desconfiar das "boas intenções" sociais da Universidade, que investe em sua defesa mesmo sabendo-se privilegiada.

Falta de conhecimento social: na Universidade não se discutem as desigualdades, a posição do país no quadro das forças internacionais, o privilégio da formação superior, a qualidade de vida da maioria. Não se elabora uma política direcionada ao país, à região, à comunidade. A Universidade se limita a emitir diplomas para empregos lucrativos. Rejeitam-se como ineficazes as idéias de democracia, bem-estar comum, igualdade de oportunidades etc.

Uso teórico e incoerente da consciência social, o que está na lógica do poder: Como estratégia para obter privilégios, um discurso social “favorável” aos dominados, encobrindo práticas opostas. Exemplos: denunciar a concentração de renda sem admitir que a Universidade participa ativamente deste jogo, pois integra a estrutura dominante; lecionar em tom de contestação social, com imagem avançada, sem traduzir esta perspectiva no concreto e sim consumindo e se alienando. Estas incoerências não sucedem só na Universidade. Outros grupos também esquecem seus privilégios e os consideram mérito próprio, como os "tecnocratas", com suas políticas sociais teóricas; a Igreja, que usa a imagem da justiça social mas é conivente ou discrimina; as entidades beneficentes e pessoas ilustres, que querem "reformar" a realidade "ajudando" os carentes com esmolas etc.

Prática da consciência social

O fiel da balança está na prática, porque só é coerente quem faz o que diz. Nossa tendência é colaborar com a opressão; não por má vontade, mas porque fazemos parte da elite. Tenhamos consciência de que não há privilegiados sem desprivilegiados, para que possamos colaborar com estes.

(26)

viáveis, destruindo mitos e construindo alternativas. Lança-se sobre a Universidade este desafio porque, entre as elites, é a que tem mais condições de autoconsciência. É capaz de apontar não só a exploração dos outros, mas principalmente a que ela mesma pratica na sociedade. Este reconhecimento talvez seja o grau mais elevado de consciência social e a garantia de que, apesar de ser elite, a Universidade sabe de democracia.

O mito da comunicação comunitária na universidade

(Palácios

25

)

Quando se critica a universidade por formar profissionais para os MCM e não para a comunicação comunitária, PALÁCIOS vê aí uma distorção da academia e de suas funções. Ela deve apenas oferecer cursos, indicar caminhos, habilitar profissionais e legitimar a inserção no mercado de trabalho. Nada garante que, pelo fato de um aluno passar pela Universidade - mesmo a melhor - tenha completado sua formação e seja um bom profissional. Ao contrário, ela foi apenas iniciada. O processo de formação depende da motivação. O professor universitário conhece o variado aproveitamento de cada aluno. É óbvio que os docentes devem ser competentes, os equipamentos e laboratórios adequados etc. No entanto, para este autor, é fundamental insistir no caráter reflexivo do verbo formar-se:

O estudante de comunicação que se interesse por comunidade pode vir a ser um competente profissional comunitário. Inversamente, um estudante desinteressado jamais será competente em área alguma, apesar de seu diploma.

O equívoco está na dicotomia comunicação de massa/comunicação comunitária. Ser treinado para trabalhar na mídia não é problema para um profissional de comunicação comunitária. Um bom radialista pode fazer programas para uma emissora grande e para uma prefeitura, sindicato ou associação cultural. A comunicação comunitária não justifica uma habilitação específica. O enfoque e a linguagem comunitários é que seriam dados em um curso de especialização. Os cursos de comunicação devem preparar profissionais competentes em comunicação, como os de arquitetura devem preparar arquitetos capazes. Se, uma vez graduados, eles vão se dedicar, no primeiro caso, à comunicação de massa ou comunitária, e, no segundo, à construção de mansões ou de casas populares, depende da escolha e do projeto político de cada um.

Universidades e ONGs: SOS aos comunicadores

Dentro e fora da Universidade, já se assume que ela não pode mais se ausentar do debate nacional. Agora que você já tem um background sobre Universidade e sociedade, saiba como usar a comunicação comunitária para se integrar ao esforço emergente na sociedade para resgatar a dívida social das elites pensantes para com a maioria da população brasileira, vítima de desigualdades seculares e que, até hoje, não tem contado

(27)

com a Universidade para modificar esta situação.

Um grupo de 10 Universidades federais, 13 ONGs e movimentos sociais para meio ambiente e desenvolvimento estão convocando os comunicadores para tornar público e regionalizar o debate nacional sintetizado na Carta de Brasília26, que sugere saídas para os

impasses em que se encontra a sociedade brasileira. A Carta afirma que, nos últimos anos, a sociedade civil brasileira se reorganiza para cobrar coerência e ética na prática política. Seus principais temas, a serem divulgados pelos comunicadores à sociedade, são:

• colapso do modelo de desenvolvimento e crise dos paradigmas; • exclusão social causadora da desigualdade sócio-econômica;

• identificação dos atores sociais que podem promover mudanças na sociedade;

• reformas sociais estruturais, do Estado e das políticas públicas, tendo em vista as

desigualdades internas e o quadro internacional;

• papéis da sociedade civil, dos consensos e dos conflitos no processo de mudança; • construção de direitos como fundamento da cidadania e da democratização; • pluralidade e pluralismo como valores estratégicos para um novo projeto nacional; • nova ética para o desenvolvimento nacional

• novas relações estado-sociedade e do público-privado (desprivatização da coisa pública)

no combate à corrupção e à miséria;

• priorização das ações sócio-ambientais, com ênfase na educação; • discussão da centralização do poder

• reterritorialização urbano-rural com aliança entre incluídos/excluídos;

• inserção do Brasil na nova ordem mundial, tendo em vista as transformações

internacionais do contexto pós-"guerra-fria".

Comunicação em comunidade: quadro teórico

Comunidade

Ideologia do Desenvolvimento de Comunidade; Comunidade e Sociedade Autores: Sofia Amman, Florestan Fernandes

Cultura Popular:

A cultura popular na Idade Média como cultura única - Intercâmbios - Mediações

Autores: Bakthin, Carlo Ginzburg (O queijo e os vermes), Peter Burke, Castoriadis, Felix Guattari, Gillles Deleuze, Walter Benjamin, Lyotard, Habermas.

Metodologia de pesquisa participante Autores: Orlando Fals Borda, Carlos Brandão

(28)

Comunicação Comunitária

Autores: Regina Festa, João Bosco Pinto, Carlos Eduardo Lins da Silva (Muito Além do Jardim Botânico, Brechas da Indústria Cultura Brasileira), João Luis van Tilburg.

O COMUNICADOR

3.1 O espírito da coisa (ou, no teatro também é assim)

"Comunicador popular é quem dá forma, organiza, recria artística e literariamente, sistematiza e dá concepção crítica à mensagem" (Kaplun).

O espírito que marca outras formas de atividade - como o teatro, por exemplo, na concepção da diretora Bia Lessa27 - pode também estar presente na comunicação

comunitária:

JL - Como você define seu trabalho no teatro?

BL - Acho que hoje não há mais rótulos. Definir seria rotular, pensar o mundo de um modo já antigo. Não tenho fórmulas nem uma cara para o ator. Para cada trabalho, penso num método, num código.

JL - E seu processo de elaboração de uma peça? você a visualiza antes?

BL - Não. As coisas acontecem a partir do momento em que texto, atores, objetos, vão dando sugestões. É uma adaptação ligada a todos os elementos. Quero fazer peças em que ator, diretor, música vão juntos crescendo, sendo esculpidos. Meu trabalho não é montar espetáculos, mas discutir e rediscutir questões. Neste sentido, acho que é um trabalho radical.

JL - Suas últimas peças foram dirigidas por seus assistentes. Comente o trabalho deles. BL - Foi interessante e frustrante. Tudo tem que ser conquistado e quando achei que estava liderando demais, que era preciso uma discussão mais cênica e menos teórica, falei: "este ano cada um dirige seu exercício". Só não sei se eles estavam amadurecidos para isso. Mas estamos sempre procurando algo (e não é ser vanguarda, que eu acho uma besteira), mas sim tentar um caminho novo. O espetáculo que gosto de fazer começa uma coisa e termina outra, completamente diferente. Não imagino como ele ficará no final."

.A experiência de comunicação comunitária é enriquecida com o enfoque de Bia, que nos sugere: ausência de rótulo; criação contínua, planejamento de conteúdos e técnicas de comunicação nas contribuições do grupo e da comunidade; percepção do ritmo de cada um e de suas limitações em relação à resposta solicitada. Finalmente, a descoberta de que você pode conceber o começo de uma forma de comunicação comunitária, mas não o final - que

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