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História do Direito Português

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História do Direito Português

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Regência: Profª. Drª, Miriam Afonso Brigas Laura Garção

2018/2019

(2)

PERIODIFICAÇÃO laksdalmd

1. A problemática da periodificação

● periodificar = estabelecer datas-barreiras em matéria histórica, separando em função de certos eventos históricos delimitadores de épocas → os factos históricos

○ mas periodificação contém um grau de subjetivismo → dividimos as épocas em função do que queremos estudar e analisar

● diferentes critérios de periodificação do direito:

○ fatores políticos​: divide-se de acordo com a evolução das formas de Estado

■ 1) período pré-romano; 2) período romano; 3) período da reconquista;

4) período da monarquia limitada; 5) período da monarquia absoluta;

6) período da monarquia liberal-constitucional; 7) período republicano

■ mas: reduz história a factos políticos; os factos sociais, culturais e económicos também influenciam a evolução do direito

○ predomínio das fontes sobre as instituições:

■ 1) período de formação jurídica consuetudinária (séc XI →D. Afonso III); 2) período de grande predomínio da legislação geral e escrita (ordenações); 3) período moderno de “predomínio despótico e exclusivo da lei como fonte de direito” (codificações científicas)

■ tenta ligar factos políticos a fenómenos sociais; mas é uma perspetiva unilateral, visto que está subordinado a uma perspetiva institucional

○ sistemas jurídicos

■ 1) sistema primitivo (tempos mais remotos → constituição de Caracala de 211); 2) sistema de direito romano vulgar (211 → lex visigothorum recesvindiana); 3) sistema romano-gótico (LVR → séc XI); 4) sistema germânico (séc XI → reinado de D. Afonso III em meados do séc XII ); 5) sistema germânico do romanismo de Justiniano (D. Afonso III → primeiras tentativas de codificação em XVIII); 6) sistema de direito natural e individualismo crítico (séc XVIII

→ dias de hoje)

■ factos exclusivamente jurídicos que analisa fatores externo, não estando subordinada a uma perspetiva institucional; mas está estanque aos factos sociais

1.1 Periodificação (Ruy e Martim de Albuquerque)

● podemos dividir a História do direito português em ​dois​ períodos, que se subdividem em diferentes épocas

○ 1º → corresponde a uma ordem jurídica essencialmente pluralista

○ 2º → ordem jurídica essencialmente monista

■ transição da primeira para a segunda: devido à concentração nas mão do Estado das fontes de produção jurídica, de forma quase exclusiva

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2. Especificidade do fenómeno jurídico no primeiro período

● No primeiro período:

○ heterogeneidade de fontes de origens diversas → romana, germânica, canónica, etc

■ costume, direito prudencial, direito supra-estatal (definição moderna), direito estatal-legal e direitos locais

○ não há um domínio do direito emanado do poder central; direito provém de uma pluralidade de instituições, personalizadas ou não

○ não existe a figura de Estado, mas sim do ​regnum, da respublica, do status rei publica​ (estado da coisa pública, o povo como um todo), do ​dominum

■ condicionados pelo pluralismo jurídico, que constitui a forma de assegurar a ​libertas

○ juristas são ​prudentes​, são cultores de direito sem fronteiras, nem sempre politicamente promulgado mas utilizado pelas comunidades

● No segundo período:

○ Estado transfere para si o monopólio da produção legislativa, reduzindo o Direito apenas às leis por ele produzidas; cria uma espécie de totalitarismo

○ jurista deixa de ser prudente e passa a jurista burocrático e totalitário

○ Estado disciplina o valor do costume, do direito prudencial e do direito supra-estatal → o Direito são os factos jurídicos promulgados pelo Estado

■ aparece a ideia de promulgação política efetiva como elemento necessário à própria noção de direito

○ direito passa a ter valor que Estado lhe assina → Estado teme um direito baseado na interpretação criadora de Direito

lei como a única fonte de direito 2.1 Continuação

● no primeiro período (pluralista) o direito corresponde a uma conceção de mundo bem marcada

● homem tem fim metafísico, tudo possui uma dimensão espiritual

○ assim sendo, a comunidade política encontra-se delimitada em função dos próprios fins e da estrutura da república cristã

○ comunidade política é apenas mais um estrutra entre as demais → não pode reivindicar nenhuma primazia hierárquica ou suprimir os direitos das

estruturas que com ela coexistem

● república cristã​ → é a unidade na qual o homem encontra a máxima realização

○ doutrinas defendiam que não existia verdadeiro poder fora da república cristã, tudo estava subordinado à mesma

○ não há nenhum verdadeiro reino (​dominium​) para além dela

○ a própria personalidade jurídica corresponde à integração do homem na ordem simultaneamente religiosa, moral e jurídica

● Europa era, de facto, um todo hierarquizado

○ está rodeada de inimigos, alguns com ideias expansionistas (como o Islão), e outros inimigos naturais (como os pagãos e os hereges)

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○ a guerra era então um processo político, económico, militar e religioso ⇒ tem valor ético que se traduz na ​guerra justa

● Europa deixa de ser uma unidade hierarquizada em torno da república cristã com os Descobrimentos

○ Descobrimentos, ao incorporarem no convívio europeu uma série de povos diferentes, colocam a questão da ​laicização do direito internacional

● Em Portugal, os Descobrimentos foram um dos motivos da ​centralização e do desenvolvimento​ do Estado

○ ⇒ fortalecimento do poder da Coroa perante o clero 3. Segundo Período - Termo inicial

● Como separar os dois períodos?

○ 1415 → Conquista de Ceuta

● a conquista de Ceuta inaugurou a Idade Oceânica na história universal, que constituiu o marco inicial dos Descobrimentos

○ os Descobrimentos foram, por sua vez, o facto com maior importância na vida nacional e de maiores consequências para o nosso direito

● mas é preciso compreender que os dois períodos não são estanques e isolados ⇒ há sempre uma continuidade histórica

● RUY E MARTIM DE ALBUQUERQUE: escolhem facto não jurídico para estabelecer a periodificação do direito

○ no entanto, outros professores, escolhem factos jurídicos para diferenciar os períodos

○ para esta fação doutrinária, a data que separa os períodos é 1446: primeiras ordenações do reino

● mas a escolha de um facto não jurídico atende também às mutações da conceção do mundo e às modificações estruturais da sociedade

○ tais modificações implicam também modificações na ordem jurídica 3.1 Subdivisão do segundo período

● elemento da continuidade do segundo período é expresso pela dialética da concentração do direito nas mãos do Estado

○ no entanto, existem fatores de diversidade a atentar, ligados aos elementos pré e pós-revolução de 1820, que nos levam a estabelecer dentro do segundo período ​duas sub-épocas​, separadas pela data de 1820

● até 1820:

○ há uma manutenção de uma linha de desenvolvimento progressivo e simultâneo dos diferentes elementos da experiência jurídica:

■ construção do Estado, configuração do direito público, construção do direito privado, o desenvolvimento e importância da atuação da doutrina

● a partir da Revolução Liberal de 1820:

○ deixa de haver uma sincronia perfeita no desenvolvimento dos elementos da ordem jurídica

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○ há, a partir de 1820, uma mutação no direito público, que dá o papel preponderante ao mesmo

○ é o impacto do direito público que irá levar à consagração de um novo direito privado em 1867, com o aparecimento do primeiro Código Civil

○ é nesta altura que se dá uma unificação do direito nacional, defendido pelas ideias liberais

3.2 Elementos comuns às duas épocas do segundo período

● elementos característicos do segundo período:

○ conquista das fontes de Direito por parte do Estado

■ fá-lo por via da implantação progressiva de reformas administrativas uniformizantes

■ centralização do poder do Estado através de uma fiscalização constante e uma burocratização minuciosa

○ direito encarado numa perspetiva voluntarista, ou seja, como um produto da vontade do Estado

3.3 Primeira época do segundo período - Elementos específicos

● elementos específicos da primeira época do segundo período:

○ estabilidade do direito público e um desenvolvimento progressivo das doutrinas políticas

○ a permanência das linhas mestras do direito privado

○ o caráter translatício do trabalho dos juristas

3.4 Segunda época do segundo período - Características específicas

● ideias sobre o Estado e o indivíduo adquirem nova força

○ estas duas ideias são erigidas em sistema e são conjugadas entre si, apresentado então um dinamismo “revolucionário”

● ordem jurídica passa a ser concebida também como sistema

○ aparece a ideia de constituição escrita, que traduz de forma completa e metódica a estrutura política e jurídica da nação

■ isto leva à exigência de conformação de todos os atos normativos à constituição, e também à exaltação da lei relativamente a todas as outras fontes de direito

● lei deveria conter em si a resolução de todos os casos

○ dos comandos expressos poder-se-iam descobrir, através de operações lógicas, as soluções aplicadas aos casos sem uma formulação específica

■ ⇒ existência de lacunas

● ordem jurídica passa de estrutura legislativa lacunar a uma estrutura legislativa à qual o caráter sistemático dos diferentes códigos tendia a emprestar plenitude

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A JUSTIÇA E O DIREITO SUPRAPOSITIVO lakjsdlakdm

1. A Justiça como condição da sociedade - a Justiça Universal

● na Idade Média, o direito não foi teorizado como sendo um complexo autónomo, sendo este concebido enquanto função da justiça

● para os homens da Idade Média, a justiça era o fundamento da vida social, sendo sem ela impossível uma convivência organizada, a manutenção da comunidade e a conceção como povo de um grupo humano

● a sociedade, ao manifestar-se de formas diferentes ao longo da história, demonstra que ela não é produto de uma ordem pré-estabelecida por Deus, mas sim o

resultado do trabalho humano que tenta realizar a perfeição individual

○ ordem social é a projeção comunitária da condição dos seus membros ⇒ se homens são justos, então a sociedade também o será

○ sociedade será perfeita se for justa → para alcançar a perfeição e a justiça, já Platão defendia uma sociedade governada pelos filósofos

○ ⇒ ​perfeição identifica-se necessariamente com a justiça

● para o homem atingir a perfeição e a justiça na vida coletiva, é necessário que ele viva de acordo com a lei divina e natural

● justiça traduz-se numa ​virtude​: elemento da habitualidade na justiça, é preciso orientar as ações de acordo com a justiça

○ habitus operativus bonus​ → o bom hábito orientado para a ação

○ virtude forma-se pela repetição de atos livres praticados a partir de propensões nobres

○ homem justo como homem perfeito → conceção da justiça como ​virtude universal​, a síntese de todas as virtudes

● a conceção da justiça como virtude universal e causa da perfeição do homem levava à observação voluntária do direito

2. A justiça particular: Conceito

● ideia de justiça como sendo o complexo de todas as virtudes coexiste com a conceção de justiça como virtude específica

● justiça particular​: justiça como virtude específica

justiça universal​ → considera o mundo intra-subjetivo (dentro da pessoa)

■ virtudes específicas que regulam a conduta do próprio agente para consigo, como a paciência e a temperança

○ justiça particular​ → considera o campo das relações intersubjetivas (entre pessoas

■ outras virtudes regulam a nossa conduta em relação aos demais, como a caridade e a gratidão

● Aristóteles​ → justiça como vontade permanente de dar a cada um o seu

influenciou várias gerações de filósofos com a sua filosofia da justiça

● Santo Agostinho​: justiça é a virtude de dar a cada um o que lhe é devido

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● Ulpiano​: justiça é a constante e perpétua vontade de dar a cada um o seu direito

2.1 A justiça particular: a determinação do seu

● a definição de justiça particular precisa de ser reportada à definição do seu

● justiça particular não pode representar uma mera noção abstrata e, consequentemente, inservível para fundamentar o direito

● como é que se determina o ​seu​ a respeitar pela justiça?

○ primeiro Cícero e Séneca ligaram a justiça à natureza, como sendo um princípio ordenador e fundida à racionalidade do homem

○ depois, com a cristianização do pensamento de Cícero por alguns autores, os mesmos ensinam que o ​seu​ é determinado pelo ​direito natural

○ ⇒ há quem defenda que a ideia medieval de justiça tem uma natureza derivada, visto que deriva do direito natural

● eram os jurisprudentes que decidiam qual era o ​seu​ que pertencia a ​quem, tendo estes o papel de distinguir entre o bem e o mal, o devido e o indevido

○ ⇒ para a determinação do seu conteúdo, a justiça pressupõe um ato deliberativo → é necessário fazer um “juízo reto” para atribuir a cada um o que é devidamente seu

● segundo S. Tomás de Aquino: o ​seu​ deve ser algo adequado aos fins de alguém; é necessário ter em consideração os fins do sujeito e o facto de haver múltiplas pessoas com interesses próprios

○ ninguém pode ser privado daquilo que necessita para a realização do seu fim ditado pela natureza, mas o que é seu é-lhe apenas devido enquanto não prejudicar os demais

3. As modalidades da justiça

● há diferentes tentativas de delimitar modalidades de justiça

● conceções subjetivistas:

○ Álvaro Pais:

■ justiça para com Deus (​latria)

■ justiça para com as criaturas merecedoras de honra e consideração (​dulia)

■ justiça para com os inferiores (​disciplina)

■ justiça para com os iguais (​equidade)

○ filosofia escolástica​, seguindo ​Aristóteles​, distingue entre dois tipos de justiça particular:

justiça comutativa

● relações entre iguais (entre privados)

● objeto típico da justiça comutativa é a troca

● exige-se absoluta igualdade (​igualdade aritmética​) entre o que se dá e o que se recebe

● justiça comutativa significa igualdade, tem matriz quantitativo

justiça distributiva

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● relações da comunidade com os seus membros

● campo de aplicação da justiça distributiva é o das relações do conjunto político com as pessoas individualmente

consideradas

● representantes da comunidade devem repartir os cargos segundo a capacidade de cada um, e devem repartir os bens públicos e prémios de acordo com o respetivo mérito

● não exige igualdade absoluta, mas sim uma ​igualdade geométrica

⇒​justiça é tratar igual o que é igual e desigual na medida da sua desigualdade

3.1 A justiça objetiva

● juristas da época desenvolvem também a ideia de uma justiça objetiva, como modelo de conduta e como forma de retidão plena e normativa

○ ideia ligada à patrística clássica

● ao se ligar a justiça à vontade, surge a consideração da justiça divina

○ vontade de Deus é perfeita e constitui em si mesma um cânone

○ vontade de Deus junta em si o elemento subjetivo e objetivo da justiça, tal como o elemento volitivo e deliberativo

○ ⇒ ​justiça na sua forma pura identifica-se com o próprio Deus, que por sua vez se identifica com o direito natural

● como os homens são feitos à imagem de Deus, a justiça humana é também objetiva e é apenas reflexo da justiça divina

● enquanto justiça subjetiva tem variações, justiça objetiva deve permanecer inalterada

○ justiça subjetiva:​ justiça é subjetiva, na medida que é necessário avaliar cada caso concreto; justiça particular

○ justiça objetiva:​ paradigma de conduta justa que se possa impor

objetivamente na vida em sociedade; conteúdo da justiça humana objetiva é é determinado com recurso à ideia do homem médio (​bonus pater familias) 4. Justiça e Direito

● pensamento medieval concebeu a justiça como causa do direito

● visto que o direito decorre da justiça, ambos terão a mesma natureza

○ preceitos do direito enunciados por Ulpiano (viver honestamente, não prejudicar o outro, dar a cada um o seu) são comuns à própria Justiça

● diferença entre justiça e direito:

○ direito traduz a justiça mediante preceitos autoritariamente fixados

○ o direito é um instrumento de revelação da justiça

○ lei injusta não é direito

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DIREITO SUPRAPOSITIVO E O DIREITO HUMANO LKSMLKA

1. O direito divino

● para o homem medieval, há uma pluralidade normativa

● direito não se situa apenas no plano humano, decorre de uma realidade que ultrapassa o homem → vem de Deus

○ fala-se então de ​direito divino

● confunde-se, por vezes, direito divino com direito natural

○ São Tomás de Aquino vem distinguir os dois:

■ direito divino​ provém de Deus, e é-nos revelado através das Sagradas Escrituras

■ direito natural​ é o que está inscrito nos corações dos Homens e que lhes permite distinguir o bem do mal, sendo isto um reflexo da razão e vontade de Deus (lei eterna)

1.2 Da lei eterna ao direito natural

● para Santo Agostinho:

○ lei eterna é a razão e vontade de Deus que manda conservar a ordem natural e proíbe que ela seja perturbada

○ lei natural foi inscrita no coração dos homens por Deus

● segundo São Tomás de Aquino:

○ existem quatro tipos de leis → lei eterna, lei natural, lei divina e lei humana

○ lei eterna​ é a própria razão de Deus, governadora de todas as coisas

■ da lei eterna procedem a lei natural e a lei divina

■ lei natural​: é uma participação da lei eterna na criatura racional que lhe permite distinguir entre o bem e o mal

■ lei divina​: é também uma participação da lei eterna, é constituída pelo Velho e Novo Testamento e foi por Deus expressamente revelada para que o Homem pudesse ordenar-se em relação ao seu fim sobrenatural, que é a bem-aventurança eterna

2. Pluralidade de entendimentos quanto ao direito natural

● direito natural não é um conceito unívoco

● discussão em torno do caráter racional do direito natural:

○ Gaio concebe direito natural como sendo eminentemente racional

○ Ulpiano defende que o direito natural tem como base o instinto, comum a seres racionais e irracionais

● debates entre racionalistas e voluntaristas:

○ racionalistas → direito natural deriva da lei eterna, que vem da razão (​ratio) de Deus

○ voluntaristas → conceção da lei eterna como vontade (​voluntas) de Deus

● origem do direito natural:

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conceção sacral ​→ lei natural (ou lei divina positiva) funde-se e confunde-se com o Evangelho e com a lei contida no Antigo Testamento

■ direito natural vem de Deus para o homem

○ conceção profana​ → direito natural deriva da natureza, conceito este que acaba ligado a Deus

■ direito natural provém da realidade das coisas, e adquire depois conotação moral, visto que a natureza é a força agente de Deus

■ a natureza é o agente primário e Deus é apenas causa remota 3. Importância da lei divina e da lei natural no quadro normativo medieval

● lei divina e lei natural assumem um valor no pensamento medieval que irá condicionar todo o setor jurídico e político

● governantes estavam subordinados à lei divina e à lei natural

○ o Decreto de Graciano afirma a supremacia da lei divina e natural sobre o costume e as constituições terrenas

● direito natural é algo transcendente em relação aos titulares do poder e configura-se como verdadeira ordem normativa, obrigatória e vinculativa

○ sobrepõe-se à vontade dos governantes e dos súbditos, de qualquer membro de uma comunidade, visto que é anterior ao próprio poder político e à

coletividade

● a justiça e o direito natural e divino são critérios da própria legislação dos governantes

4. Valor jurídico dos atos contra a lei divina e natural

● qual a consequência se uma norma de direito humano não respeitar o preceito divino ou natural?

○ norma não possui qualquer valor jurídico

○ leis humanas e costume só podem subsistir e obter o nome de direito se se articularem segundo as regras divinas e naturais

● o mesmo vem a ser reforçado pelo próprio monarca, por exemplo D. Afonso IV, que declara que a vingança pessoal não era direito, por ser contrária à lei de Deus

● a partir daqui entra-se no campo das relações entre o dever de obediência e o direito de resistência

○ será que se deve obedecer a uma lei injusta?

5. Princípio da imutabilidade e inderrogabilidade do direito divino e do direito natural

● a imobilidade e eternidade, e ,consequentemente, a irrevogabilidade do direito divino e natural constam já no Decreto de Graciano

○ no entanto, estas mesmas características conduziram a uma estagnação do direito divino e natural, pelo que os intérpretes procuraram maneiras de o tornar mais flexível

● distinção entre preceitos móveis e imóveis, e normas que ditam, proíbem ou aconselham e permite

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6. Direito suprapositivo e supralegal - O ius gentium

● havia quem qualificasse o direito natural como​ direito comum

● direito das gentes (​ius gentium​) → situa-se entre dois planos: é consequência do direito natural, mas já é também direito humano

DIREITO POSITIVO SUPRA REGNA - DIREITO CANÓNICO E DIREITO ROMANO akjsks

1. Direito Canónico

● Pode-se designar o direito canónico como um direito ​supra regna​, no sentido de algo que se encontra num plano superior ao dos reinos ou áreas políticas diferenciadas então existentes

● definição genérica → conjunto de normas jurídicas relativas à Igreja

○ complexo de cânones ou leis estabelecidas, propugnadas ou aprovadas pela autoridade eclesiástica, para reta instituição da sociedade eclesiástica

○ cânone​ → em sentido amplo significa norma ou regra, quer em sentido físico ou moral; hoje em dia há uma grande separação entre o conceito de cânone e o de leis civis ou seculares

■ em sentido estrito: ​cânones conciliares

■ mas, na Idade Média → os cânones eram os decretos do Sumo Pontífice e as estatuições dos concílios (segundo o Tratado de Graciano)

● complexo normativo pode também ser designado por direito divino (​ius divinum);

direito pontifício (​ius pontificium​) por oposição ao direito imperial (​ius caesareum)

● direito canónico anterior ao século XII

○ período de direito canónico antigo (​ius vetus​) → desde o seu aparecimento até meados do séc XII

○ primeira fase: caracterizada pela quase exclusividade das fontes de direito divino

■ segue-se depois o progresso do costume e das outras fontes de direito humano

○ primeiro movimento de criação de coletâneas que sistematizassem e organizassem estas normas

● movimento renovador do direito canónico após séc XII

○ após séc XII → grande renovação na esfera do direito canónico, paralelamente ao estudo do direito romano

○ há uma renovação da canonística → realização de coletâneas mais perfeitas em substituição das anteriores; reelaboração científica do direito canónico baseada nesses corpos legais

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2. Fontes do direito canónico

● fontes como modo de formação e revelação deste direito

● formação​ → trata da origem e da autoria das normas

● revelação​ → conhecimento e monumentos de que consta o direito

○ conhecimento: fontes ​essendi, existendi ou materiales

○ monumentos: fontes ​cognoscendi, notitiae ou formales

● fontes de direito divino → Sagradas Escrituras e Tradição

○ Igreja apenas propõe ou interpreta declarativamente 2.1 Sagrada escritura, tradição e costume

● são ​fontes de direito divino

● Sagradas Escrituras:

○ abrangem Antigo e Novo Testamento

○ Antigo Testamento:

■ baseado na Bíblia hebraica, acreditam ser a sagrada ​Palavra de Deus​ (consequentemente, era direito)

■ abrange os escritos religiosos antes do nascimento e vida de Jesus

■ Cristãos dividem em 4 partes: Leis, história, poesia e profecia

■ conteúdo basilar para direito canónico:

■ contém preceitos cerimoniais (respeitantes ao culto)

■ preceitos judiciais ou ​revelatio mosaica​ (concernentes ao povo de Israel enquanto sociedade ​qua talli)

■ preceitos morais

○ Novo Testamento:

■ depois do nascimento de Cristo, recontam a sua vida e morte

■ compostos pelas epístolas paulinas, os evangelhos, os atos dos apóstolos e algumas epístolas católicas menores

■ conteúdo basilar para o direito canónico:

● há preceitos de direito divino (estatuições obrigatórias dos Evangelhos)

● preceitos de direito divino-apostólico (desenvolvimento dos preceitos de direito divino levados a cabo pelos apóstolos)

● direito apostólico (ditados pelos apóstolos na sua atividade evangelizadora)

tradição​:

○ fonte de direito divino

○ é o conhecimento transmitido, escrito ou oral, de um ato de autoridade;

ensinamentos e preceitos de Jesus Cristo não consignados por escrito, mas só transmitidos oralmente

■ conhecemo-los através das obras dos Santos Padres (autores eclesiásticos dos primeiros tempos da Igreja)

○ diversas classificações:

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■ inhesiva → reporta a matérias explicitamente versadas pelas Sagradas Escrituras

■ interpretativa → matérias implicitamente versadas

■ constitutiva → matérias não constantes nas Escrituras

⇒ o direito do Novo Testamento (​ius Novi Testamenti) é revelado pelas Sagradas Escrituras e pela tradição, constituindo a fonte principal de direito (fons primarius iuris) da Igreja Católica

costume​:

○ norma resultante dos usos da própria comunidade e acompanhada de convicção e obrigatoriedade

○ nos tempos da Igreja primitiva (primeiros três séculos depois de Cristo), o costume era um modo de suprimento de lacunas da legislação (​cum deficit lex)

○ segundo alguns pontífices, como Gregório VII → o costume estava subordinado à razão, à fé e à verdade, visto que no caso de conflito, não prevalecia contra elas

○ problemas com o costume aparecem depois do renascimento do direito romano nos séculos XII e seguintes → coloca-se a questão da articulação do costume com a lei, especialmente nos casos do costume ​contra legem

■ Graciano rejeita costume contrário à lei, mas os decretistas posteriores admitem-no, desde que consentido pelo Papa

● alguns papas aceitam o costume ​contra legem​, desde que cumprissem os requisitos da antiguidade, racionalidade e consensualidade (aceitação na comunidade)

2.2 Cânones e decretais

● fontes canónicas de direito humano → costume, cânones, decretais, doutrina e as concórdias (ou concordatas)

○ fontes de origem eclesiástica e mista

○ há quem fale também de fontes civis (de direito humano canónico), a propósito das disposições sobre matéria eclesiástica contidas nas grandes compilações jurídicas seculares → ex.: Código de Justiniano, etc

cânones​ → neste caso, a palavra é utilizada em sentido estrito: são as determinações conciliares

Concílio

○ → assembleia eminentemente religiosa, uma reunião do clero;

○ podem ser de âmbito mais ou menos amplo: à escala universal (​concílios ecuménicos​), nacional ou regional

○ autoridade conciliar tinha um grande peso; os seus partidários, os

conciliaristas​, chegaram a declarar o poder do Concílio superior ao do Papa

■ contraposição: os ​curialistas​ sustentam a supremacia da Cúria ou do Papa sobre o Concílio

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○ Papa exerce poder legislativo → poder de fazer leis em prol da Igreja Universal (​potestas iura condendi pro Ecclesiae universali)

■ pode fazê-lo só (​vel solum​), ou em concílio ecuménico (​vel in concilio oecumenico)

○ Importantes concílios celebrados:

■ celebraram-se os seguintes concílios ecuménicos no Oriente:

○ Lateranense​ I, II, III, IV (1123, 1139, 1179, 1215), ​Lugdunense I e II (1245 e 1274), ​Vienense​ (1311-1312) e ​Constantiense (1414-1418)

■ na Península Ibérica → concílios nacionais de Toledo, sob domínio visigótico, e os concílios de Braga, no tempo dos Suevos (séculos V a VII)

■ concílios da monarquia visigótica adquirem especial importância:

● tiveram uma grande influência no desenvolvimento do direito público → irá, em parte, constituir o fundamento das

instituições políticas portuguesas iniciais

● as assembleias conciliares visigóticas tentaram uma

ordenação jurídico-política → definem caráter da monarquia, as regras de sucessão, os poderes dos monarcas, os direitos e deveres dos súbditos

■ ⇒ o Título Primeiro do ​Código Visigótico​ serve de testemunho da maneira pela qual os concílios legislaram estas matérias

■ as várias Cúrias ou Concílios de Leão (1017-1020 a 1091), de Coiança (1055) e de Oviedo (1115)

● os preceitos normativos destes concílios obtiveram projeção no nosso país;

● leis gerais do Concílio de Leão (1017) refletem-se no ​Fuero de Léon

○ ⇒ as determinações conciliares receberam outras designações para além de cânones (mais vulgar):

■ constitutio synodalis, statutum, edictum, sanctio

■ leis disciplinares dos Concílios surgem também com o nome de decreti

decretos ou cartas decretais​→ legislação do Pontífice romano, normas

jurídico-canónicas da direta iniciativa dos Papas; aparece-nos frente aos cânones

■ Graciano chama ​decretos​ aos atos do Papa, por oposição aos estatutos conciliares (​status conciliorum)

■ na Glosa ao decreto de Graciano, separa-se o conceito de ​decretum e de decretal

● decretum​ → o que o Papa estatui por conselho dos seus cardeais sem consulta de ninguém (​quod Papa statuit de consilio cardinalium suorum ad nullius consultationem)

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● decretal​ → o que o Papa estatui sozinho ou com os cardeais a consulta de alguém (​quam statuit Papa vel solus vel cum cardinalibus ad consultationem alicuius)

■ normas pontifícias → também, por vezes, denominadas de ​constitutiones;

■ Importantes coleções de decretos e cânones:

● mais importantes que apareceram no Ocidente:

Coleção de Dionísio, o Exíguo (séc VI)

■ objeto de revisão pelo Papa Adriano I para

corresponder a um pedido de Carlos Magno; mudou então o nome para ​Hadriana

Coleção Hispana​ (séc VI/VII)

■ origem visigótica, com matérias relativas ao sistema hispânico

○ Decretais Pseudo-Isidorianas (séc IX)

■ mistura de textos verdadeiros com cânones falsos

● com o renascimento do direito romano, a partir do século XII, desenvolve-se largamente a atividade compilatória dos cânones e decretais

○ Decretum

■ constitui o direito novo (​ius novum)

■ obra doutrinária em que Graciano procura harmonizar textos ou regras discordantes

■ é de produção particular, mas passa a ter força de lei

○ As cinco compilações antigas (​Quinque Compilationes Antiquae)

■ 1ª contém decretais de papas que regeram a Igreja durante a segunda metade do séc XII

■ 2ª contém decretais do início do séc XII

■ 3ª tem decretais de apenas 1210

■ 4ª contém cânones do Concílio de Latrão 1215

■ 5ª tem decretais cujo objetivo era ser objeto do ensino

○ ⇒ as cinco compilações foram origem d’​As Decretais de Gregório IX

■ juntou-se mais um livro às decretais, que foram também alvo de posteriores compilações

■ adicionou-se ainda decretais dispersas na forma de textos extravagantes

○ A este conjunto de textos dá-se depois o nome de ​Corpus Iuris Canonici

● Corpus Iuris Canonici​ é composto por:

○ o Decreto de Graciano de 1140 (​Concordia Discordantium Canonum)

○ as Decretais (1234) → conjunto de decretos pontifícios dos séculos XII a XIII, reunidas sob o pontificado de Gregório I

○ o Sexto Livro das Decretais → coleções de decretais posteriores a 1234 e promulgadas por Bonifácio VIII

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○ as Clementinas → recolha de decretais subsequentes, publicadas em 1313 por Clemente V

○ as Extravagantes 2.3 Doutrina

● → opinião e obra científica dos juristas; assume papel da mais alta importância, especialmente após a aliança da lei canónica e da lei secular, através do renascimento do direito romano, após o séc XII

● aliança entre os dois direitos → ​Utrumque Ius​; constitui o superamento da rivalidade das duas grandes ordens jurídicas medievais, a sua simbiose ⇒ direito comum

○ ⇒ leva ao florescimento da canonística

● divisão dos canonistas:

○ decretistas​ → escrevem sobre o Decreto de Graciano

○ decretalistas​ → escrevem sobre as Decretais

● duas grandes escolas distinguem-se no campo do direito canónico

○ glosadores​ →

○ comentadores​ →

● direito canónico tem uma grande influência na formação do direito moderno

○ certas zonas do sistema jurídico recebem importantes contributos da Igreja no respetivo ordenamento, por exemplo o direito da família, as obrigações, etc, tal como conceitos fundamentais como o da boa fé

● esta ligação entre os dois direitos leva a uma mútua subsidiariedade (​gegenseitiges Subsidiaritätsprinzip​) ⇒ aplicação subsidiária do direito romano pelos tribunais eclesiásticos, e vice-versa com os princípios gerais do direito canónico

○ “direito canónico e civil estão tão interligados, que é impossível compreender um sem o outro”

2.4 Concórdias e concordatas

● acordos entre o rei e o clero, tentando definir direitos e deveres recíprocos das duas partes

○ primeiros acordos conhecidos → tempo de Afonso II

○ principais concordatas → de D. Dinis, D. Afonso IV e de D. Pedro I

● concordata​: tratado ratificado pelo Papa e pelo rei

● concórdia:​ acordo negociado (?)

3.Penetração do direito canónico na Península - A ciência canonística portuguesa

● direito canónico foi recebido na Península Ibérica desde os seus primeiros tempos

● é possível verificar a existência de documentos em que se refere ao direito canónico já antes da “fundação da nacionalidade”

○ documentos de doações, etc, fazem referência aos “​cânones” ou ao “livro dos cânones”, “decretos canónicos”, etc

● várias bibliotecas tinham também exemplares de coleções de cânones antes da fundação da nacionalidade

(17)

○ sabemos isto através de testamentos, entre outros

● a partir daí há várias menções ao longo dos anos aos livros de direito canónico

○ no séc XIV já há obras ligadas às decretais que eram traduzidas para português

● na Cúria alargada de Coimbra de 1211

○ há uma necessidade de hierarquizar o direito canónico em relação ao direito régio

○ ainda havia aqui uma certa prevalência do direito canónico →

reconhecimento da supremacia eclesiástica, traduzida na superioridade das normas jurídicas da Igreja sobre os vários monarcas

○ governo temporal permanece subserviente da Ordem Eclesiástica 4. Restrições à receção do direito canónico

● houve, contudo, tentativas de restrições à penetração do direito canónico, especialmente à medida que o poder dos monarcas se consolida

● beneplácito régio​ → instituto pelo qual os reis se atribuíram a si próprios o direito de controlar a publicação das letras apostólicas no reino

○ ligado às denegações da ​auctoritas​ pontifícia

○ liberdade da Igreja e tradições

5. Aplicação do direito canónico nos tribunais aikdsnksm

5.1 Aplicação nos tribunais eclesiásticos em razão da matéria e em razão da pessoa

● direito canónico foi aplicado em Portugal, não só em tribunais eclesiásticos, mas também nos tribunais civis ou seculares

● havia uma organização judiciária eclesiástica (ou seja, tribunais da Igreja) paralelamente com a organização judiciária

● tribunais eclesiásticos → conhecem causas em ​função da matéria​ ou em ​função da pessoa

○ matéria​ → certas matérias eram consideradas competência especial da jurisdição eclesiástica

○ pessoa​ → entendia-se que certas pessoas apenas podiam ser julgadas pelos tribunais da Igreja

■ havia um costume que se havia desenvolvido, que ditava que o clero não podia ser levado perante tribunal civil → privilégio já proveniente do direito romano

5.2 Aplicação nos tribunais civis enquanto direito preferencial ou subsidiário - Critério do pecado

● direito canónico também se aplicou nos tribunais civis, primeiramente, como direito preferencial → aplicava-se de preferência o direito canónico

● Cúria de Coimbra de 1211

(18)

○ D. Afonso II decide que as suas leis não valem se feitas ou estabelecidas contra os direitos (ou direito?) da Santa Igreja de Roma (Lei II)

■ Prof. Braga da Cruz interpreta isto de forma restritiva → esta lei não significa uma subordinação ao direito da Igreja (ou seja, ao direito canónico), mas sim aos direitos (ou seja, ​regalias ou privilégios​)

■ ⇒ leis régias só não valeriam contra os cânones que estabelecem especiais privilégios em favor da Igreja

● mais tarde: direito canónico assume posição de direito subsidiário → apenas aplicável quando faltasse o direito nacional

○ nestes casos, entraria em concorrência com o direito romano

○ só em casos de pecado é que se aplicaria o direito canónico em vez do romano

6. Direito comum (ALMEIDA COSTA)

● direito comum​ → sistema normativo de fundo romano que se consolidou com os comentadores e constituiu a base da experiência jurídica europeia até finais do séc XVIII

○ também designado de ​direito comum romano-canónico​ → salienta a importância do elemento do direito canónico

● ao direito comum contrapõe-se os ​direitos próprios​ → ordenamentos jurídicos particulares

○ face ao direito comum geral, assumem relevância os direitos locais e dos vários Estados, formados por normas legislativas e consuetudinárias

● Comentadores, para além de tratarem as relações entre o direito canónico e o direito romano, tratavam também as que aconteciam entre o ​ius commune e o ius proprium

● relação entre ​ius commune e ius proprium

○ sécs XII e XIII → supremacia do direito comum face às demais fontes

○ séc XIV e XV → relativo equilíbrio; direitos próprios começam a afirmar-se como fonte primária de direito, enquanto o direito comum começa a assumir um papel subsidiário

○ séc XVI → independência plena do ​ius proprium​, passagem do ​ius commune a fonte subsidiária à mercê da autoridade do Estado

IUS REGNI - DIREITO LEGISLADO lksmlas

1. Ordenamentos jurídicos anteriores à constituição da nacionalidade portuguesa

● é importante aludir ao direito dos povos que se estabeleceram na Península Ibérica antes da fundação da nacionalidade portuguesa no séc XII

● têm especial relevância para o desenvolvimento do direito português os chamados direitos germânicos

○ leis visigóticas​ são das mais importantes, visto que os Visigodos dominaram a Península durante séculos, antes das invasões muçulmanas

● monumentos jurídicos visigóticos mais importantes são:

(19)

Código de Eurico

■ já é possível verificar influência jurídica de Roma;

■ certos autores qualificam-no como “direito romano vulgar”

○ Breviário de Alarico

■ tem por fontes constituições imperiais romanas, novelas e escritos de juristas romanos

○ Código de Leovigildo

○ Código Visigótico

● duas teses quanto à aplicação do Código de Eurico:

○ a ​doutrina da dualidade legislativa​ sustentava que o Código de Eurico tinha aplicação territorial e que seria aplicado às populações visigodas, enquanto as populações romanas se regeriam pelo Breviário de Alarico

■ ensinava-se também que as diferenças entre o direito visigótico e romano se tinham esbatido, e que as leis promulgadas se aplicavam aos dois grupos

○ outra tese defende que o Código de Eurico foi revogado pelo Breviário de Alarico

■ tese sustenta-se no facto de não haver qualquer afirmação expressa da vigência simultânea dos dois ordenamentos jurídicos, e no facto do Breviário derrogar normas romanas

○ ⇒ seja como for, a legislação visigótica era de aplicação territorial 2. O Código Visigótico

● também denominado por ​Lex Visigothorum​; publicado em 654 pelo Rei Recesvindo

● representa o ​terminus​ a evolução legislativa do reino visigodo

● estrutura:

○ cerca de ⅗ do código são leis ​antiquae​, que faziam parte dos anteriores códigos

○ após Recesvindo, Ervígio submete o Código a uma revisão oficial, de que foi encarregue o XIII Concílio de Toledo

■ texto assim fixado é conhecido por ​Fórmula Ervigiana

■ encontra-se distribuído por doze livros, que se repartem em títulos e estes em leis

○ após uma revisão não oficial formou-se um título introdutório denominado por Forma Vulgata​, composta por:

■ uma novela de Ervígio

■ quinze ou dezasseis leis posteriores de Egica

■ leis de Vitiza

■ ⇒ representou a base fundamental do direito vulgar espanhol; nos séc XII e XIV constitui fonte do ​Forum Iudicium​ e teve influência sobre a formação dos foros e costumes locais

(20)

2.1 Aplicação do Código Visigótico - A sua vigência no território português

● há testemunhos da vigência do Código Visigótico no início da monarquia portuguesa, mas esses testemunhos vão-se esbatendo progressivamente

● BRAGA DA CRUZ: o Código Visigótico continua a ser citado em alguns documentos portugueses do séc XII, mas sob a forma de uma vaga reminiscência, não

correspondia a uma verdadeira força legislativa

○ no séc XIII essas citações desaparecem, devido ao crescimento da legislação nacional e a redescoberta do direito justinianeu

○ o renascimento do Código Visigótico em Castela não tem repercussões diretas em Portugal

3. Leis gerais portuguesas - Noção, nomenclatura e desenvolvimento

● no primeiro período, as leis gerais começam por ocupar um lugar modesto

○ sabe-se apenas da existência de poucos diplomas com normas gerais e abstratas de imposição coativa

● neste período, a lei aparece com várias denominações:

○ decreto, ordenação, carta, constituição, etc

● rei começa a legislar aos poucos, até haver uma monopolização do direito positivo pelo príncipe

○ função legislativa do rei torna-se normal

○ função legislativa também será exercida na cúria ou pelas cortes juntamente com o rei

● o poder legislativo do monarca encontra-se limitado em certos casos,

nomeadamente em relação ao direito natural, etc, mas lentamente começa a tornar-se o centro legislativo por excelência

○ reclama para si o monopólio legislativo e o papel de árbitro entre as diversas ordens jurídicas em presença ⇒ torna-se fonte do poder e do direito

● a crescente produção de legislação régia corresponde ao ​fortalecimento do poder real

○ intensificação da função legislativa leva à compilação das respetivas normas 4. Fundamento da força vinculante da lei - a sua natureza, finalidade e requisitos

● como fundamento da força vinculante da lei aparecem fórmulas reveladoras do sentido autoritário da vontade régia, de um conselho ou das cortes

○ quanto ao conselho, por vezes são eles que deliberam com o acordo e autoridade do monarca

● outras vezes, a força dos decretos régios aparece baseada na ​razoabilidade e antiguidade​ dos mesmos

● natureza da lei​:

○ leis são estabelecimentos para que os homens saibam viver bem e ordenadamente segundo o prazer de Deus

○ leis devem ser cumpridas segundo Deus e a justiça

○ devem ajudar os homens a alcançar o objetivo da ​salvação das almas

(21)

● requisitos​:

○ leis devem ser cumpridas e cuidadas

○ devem ser feitas com razão e segundo o direito natural

○ as suas palavras devem ser boas e declaradas de modo a que todos a entendam e a que fique na memória

○ leis devem ser feitas em serviço de Deus, em louvor e honra dos senhores que as mandaram fazer e em prol e bem daqueles que serão julgados por elas

5. Ignorância e conhecimento da lei - Publicidade, registo e entrada em vigor

● já neste período se verifica a existência do princípio segundo o qual o

desconhecimento da lei não beneficia ninguém ou justifica o seu incumprimento

● mas o problema da ignorância da lei está ligado ao problema da sua publicidade

○ só se pode exigir o conhecimento da lei se esse mesmo conhecimento for viável

● não havia um princípio fixo quanto à publicação das normas; geralmente, havia uma leitura pública semanal das normas aos domingos, após a missa

DIREITO OUTORGADO E PACTUADO AKSKMAL

1. Cartas de privilégio - Características gerais

● ​cartas de privilégio

○ em sentido lato​ → documentos que atribuem prerrogativas, liberdades, franquias e isenções de qualquer ordem

○ em sentido estrito → ​documentos que, embora de índole muito diversa, têm como característica comum a circunstância de traçarem um regime jurídico específico para certo território ou comunidade

● diferentes tipos de cartas de privilégio, mas as mais importantes são as ​cartas de povoação, os forais e os foros

2. Cartas de povoação

● as ​cartas de povoação​ visavam atrair habitantes para certas zonas, escassamente povoadas ou despovoadas

● origem:

○ o monarca, um senhor ou a entidade que exercia autoridade sobre um território fixava nessa carta um conjunto de normas

● conteúdo:

○ nelas definia o estatuto dos futuros colonos, especialmente quanto aos direitos de exploração das terras, visto que as cartas tinham uma ​expressão essencialmente económica

(22)

○ há quem defenda que as cartas tinham ​caráter contratual​, mas em geral, as cartas constituíam um ​ato unilateral ou outorgado unilateralmente​; revestiam até ​forma imperativa

○ ⇒ no entanto, ainda nos podemos referir às mesmas como sendo uma relação pactuada

● não havia liberdade de estipulação, mas sim de celebração → poderíamos então comparar as cartas de povoação a ​contratos de adesão e a contratos normativos 3. Forais

● por vezes, a distinção entre forais e cartas de povoação não é muito clara

● conteúdo:

○ em regra, os forais são mais ​extensos​ que as cartas de povoação e abrangem também ​maior número de matérias

○ enquanto o cerne das cartas de cartas de povoação se restringe às

condições, os forais contêm ​disposições de direito processual, militar, fiscal, penal e administrativo​, tal como ​regras de direito privado

○ normas dos forais têm ​origens muito heterogéneas​, podendo ter origem nos costumes, nas cartas de povoação, no direito prudencial, etc

● origem:

○ forais eram outorgados pelo monarca, ou, em certos casos, por um senhor eclesiástico ou um senhor secular

● categorias:

○ forais régios ou particulares

■ régios → terra é cedida com a simples reserva de certa pensão ou prestação periódica saída dos seus frutos ou rendimentos

■ particulares → dá-se o desmembramento do domínio direto e útil da terra

○ segundo o respetivo molde ou matriz

■ tem-se em conta a circunstância de existirem famílias de forais, resultantes de alguns terem servido de padrão ou tipo

○ segundo a maior ou menor complexidade das estruturas locais

■ classificação dos forais em rudimentares, imperfeitos e perfeitos, ou rurais, urbanos e distritais, conforme a simplicidade ou complexidade das estruturas locais

○ grau de originalidade

■ desdobram-se em originários, ampliativos ou confirmativos 4. Foros, costumes ou estatutos municipais

● conteúdo:

○ foros contêm um ​acervo de normas muito superior em quantidade relativamente aos forais

○ podem alinhar-se em centenas de rubricas e capítulos, o que revela uma grande ​sistematização e um intuito abrangente

(23)

○ tendência abarcante é visível na circunstância de se inserirem nos estatutos um ​maior número de disposições de direito privado​, que abrangem mais áreas

○ estatutos municipais podem ser vistos como ​cadernos de leis civis, criminais, políticas, administrativas e processuais

● origem:

○ são outorgadas aos municípios para sua constituição e governo

○ no entanto, há estatutos que não foram outorgados e que resultam da reunião de diferentes fontes de direito local​, empreendida pelo próprio concelho

○ nos costumes pode haver regras derivadas de direito consuetudinário, de deliberações de assembleias populares do concelho, etc

COSTUME E DIREITO PRUDENCIAL laksdlsa

1. Costume: conceito e amplitude da noção medieval

● costume​: prática reiterada (elemento objetivo) com convicção de juridicidade (elemento subjetivo)

○ costume surge já nas fontes romanas e visigóticas

○ fontes registam-no também no sentido de direito não reduzido a escrito

● segundo BRAGA DA CRUZ, costume designa:

○ tudo quanto representa uma formação espontânea de direito

○ toda a norma jurídica formada por qualquer modo que não o processo legislativo

● quatro elementos:

○ antiguidade

○ consensualidade

○ não positivação

○ espontaneidade

1.2 Causas do prestígio do direito consuetudinário - Âmbito de aplicação

● no período da fundação da nacionalidade e nos tempos diretamente subsequentes, o costume era a ​fonte jurídica por excelência

● costume surge como a fonte mais antiga, que corresponde aos estádios de civilização material mais lineares

○ só adquire força onde não exista um aparelho de autoridade relativamente forte e desenvolvido

● costume resulta de uma prática reiterada e criada espontaneamente pelos membros da comunidade, correspondendo então ao ​sentimento natural de direito desta

○ costume tem frequentemente por base a tradição

● sendo o costume um processo de formação jurídica oral, era preciso prová-lo

○ procurava-se, muitas vezes, fixá-lo por escrito

(24)

● no entanto, ao ser reduzido a escrito, o costume perdia o seu caráter específico e vai adquirindo uma ​generalização crescente

○ ao reduzir o costume a escrito, o rei apenas reconhecia aqueles com que concordava → daí vêm os “bons costumes”

1.3 Requisitos do costume

● antiguidade​ → costume tem de ser observado há vários anos

● racionalidade →​ costume tem de se conformar com a razão

● consensualidade na comunidade → ​povo tem de introduzir o costume, sendo o consenso a causa eficiente do costume

1.4 Valor jurídico do costume

● coloca-se a questão da relação entre o costume e o direito legislado

● segundo o Decreto de Graciano → costume vale como lei na falta desta

● no entanto, havia quem defendesse que o valor do costume dependia da sua aprovação por lei

○ ⇒ monarca reduz o costume a escrito de modo a afirmar a ​supremacia da lei face às outras fontes de direito​: centralização e fortalecimento do poder do rei 2. Direito costumeiro e direito judicial

● qual a relação entre o direito costumeiro e a ação criativa de direito pelos tribunais, ou seja, a jurisprudência?

● BRAGA DA CRUZ:

○ direito judicial não pode ser visto como fonte de direito autónomo, visto que as sentenças judiciais eram sempre tidas como uma definição autorizada de costumes anteriormente vigentes, e não como um modo autónomo de criar direito novo

● discute-se se as decisões judiciais são, ou não, elemento indispensável para o estabelecimento de um direito consuetudinário

○ esta opinião parte da ideia de que a norma jurídica só existe na medida em que se efetiva pelo aparelho de coerção

3. Estilo

● costume judicial autonomiza-se conceptualmente, assumindo o nome de ​estilo

● estilo era direito não escrito, cujo fundamento se identificava com a prática de um tribunal, distinguindo-se então do costume

● doutrina divergia quanto aos requisitos necessários do estilo, e quanto ao seu valor

○ será que quem não tem poder legislativo pode consagrar um estilo, e será que este pode dispor em contrário da lei?

■ em Portugal: rei podia determinar que um ato valia, sem prejuízo do estilo contrário

(25)

● estilo passou a ocupar lugar no quadro das fontes, sendo tal consagrado nas diferentes Ordenações

4. Façanhas

● façanhas:​ designa vulgarmente ação heróica e singular;

○ neste contexto, as façanhas são juízos sobre ações notáveis que ficaram como padrão normativo para o futuro, por virtude da autoridade que o praticou ou aprovou

○ valem não só para o respetivo processo onde são enunciadas, mas também para todos os outros semelhantes, por:

■ serem decisões régias → no entanto, podiam derivar de outras pessoa que não o monarca

■ se tratar de casos duvidosos ou omissos na legislação pátria 5. Alvidros

● alvidros:​ decisões dos juízes arbitrais

○ alvedrio corresponde à faculdade do juiz integrar uma lacuna ou criar uma norma para suprir o defeito de um estatuto

○ mas tal não significava possibilidade ilimitada de atuação (livre arbítrio), mas sim uma decisão por outros valores, como o costume e a equidade

● características:

1. em Portugal, os ​alvidros​ eram juízes livremente escolhidos pelas partes, os quais deviam julgar nos termos dos poderes por elas conferidos

2. de tais juízes apelava-se para os ​sobrejuízes

3. as sentenças dos juízes ​alvidros​ eram suscetíveis de serem utilizadas em composições

DIREITO PRUDENCIAL - INTRODUÇÃO E ENQUADRAMENTO GERAL akakka

1. Direito prudencial - Noção

● sendo uma das fontes de direito na primeira época da história do direito português, o direito prudencial encontra-se fora da esfera de ​ação criativa do poder

○ o costume tende a ser dominado pelo governante ao limitar o seu valor à conformidade do mesmo às normas emanadas pelo poder, mas o direito prudencial resiste, por vezes, a essa limitação

● o direito prudencial chega mesmo a sobrepor-se ao espírito e letra da lei mediante uma função criadora de normas jurídicas e através de um papel interpretativo e integrador da lei

○ a interpretação da lei pode até ultrapassar o dado legal, pela sua capacidade de invenção (​inventio​) do prudente

(26)

● direito prudencial:​ ordem normativa criada pelos prudentes, ou seja, por aqueles que conhecem o direito, e cuja autoridade (​auctoritas​) lhes permitia declarar a verdade jurídica nos casos concretos

○ jurisprudência baseia-se na ​autoridade​, ou seja, no saber socialmente reconhecido, mas desprovido de ​poder.

● o direito prudencial afasta-se da nossa aceção moderna da jurisprudência

○ hoje, a jurisprudência é o resultado da atividade do juiz enquanto magistrado que dita a solução dos casos litigiosos munido do direito de império do Estado

○ juiz atual é funcionário de poder, enquanto os juízes romanos eram privados

→ juízes romanos não eram magistrados ou funcionários

2. Direito prudencial medieval - ius romanum medieval como direito prudencial

● o direito prudencial conheceu na Idade Média um grande desenvolvimento, sendo possível designar esta época como o ​reinado do juristas

● vários fatores contribuíram para a evolução e importância do direito prudencial:

○ a deficiência do direito existente (legislação régia desenvolvia-se lentamente)

○ o caráter fragmentário e localista do costume

○ ⇒ havia então uma necessidade de ​colmatar as lacunas​ de um ordenamento jurídico escasso, e era necessário construir um ordenamento que

respondesse às exigências de uma sociedade em desenvolvimento

● trabalho de desenvolvimento do rudimentar ordenamento jurídico coube aos prudentes

○ no entanto, este trabalho pertence a um fenómeno perene, devido à constante luta entre o pluralismo jurídico e a afirmação da lei como única fonte de direito

3. Vulgarização do direito romano

● com a expansão de Roma, estendeu-se também a aplicação do direito romano

● expansão e implantação do direito romano foi processada lentamente, devido a conceção personalista que os romanos tinham do seu direito

○ ⇒ o direito civil romano era criado para os cidadãos de Roma, enquanto os estrangeiros se regiam pelo seu próprio direito

● com a expansão do Império, essa conceção personalista começa a mudar e aparecem tendências para a ​generalização e uniformização

○ por exemplo, através do direito das gentes (​ius gentium​), que é o direito comum aplicável a relações de vários tipo, e através da concessão do estatuto pessoal dos romanos a não-romanos

● problemas da aplicação do direito romano único e oficial no Império:

○ existência de direitos particulares ainda em vigor

○ resistência dos mesmos ao seu desaparecimento

○ impossibilidade prática de uma total aplicação do direito romano

○ ⇒ dá-se então lugar a outras soluções, como o aparecimento do ​direito romano vulgar

(27)

● direito romano vulgar:​ direito romano aplicado nas províncias, distinto do direito romano puro, por ter sido contaminado pelos direitos indígenas e pela correção e adaptação levada a cabo na prática

● assim sendo, o processo evolutivo da penetração do direito romano nesta primeira fase apresenta duas etapas:

romanismo direto​ → tentativa de aplicação direta do direito romano único e oficial

vulgarização​ → produto da criação popular e da prática

● divisão do Império Romano em duas partes vai criar duas ordens jurídicas distintas:

○ no Oriente​ → o desenvolvimento do direito romano faz-se com altos padrões de técnica jurídica, vindo então a culminar na produção do ​Corpus Iuris Civilis​, pelo imperador Justiniano

○ no Ocidente​ → a vulgarização vai aumentando até à queda de Roma 3.1 Processo de “renascença” do direito romano

● redescoberta do direito romano justinianeu em Itália é o objeto de adaptação e criação por parte dos juristas medievais

● fatores que levaram à redescoberta do direito romano:

○ renovação do Império na pessoa de Carlos Magno e a sua transferência para os Germanos, com consequente aproveitamento do direito imperial pelos novos imperadores

○ desenvolvimento da estrutura eclesial e do direito canónico, que encontra no direito justinianeu novas técnicas de compilação

○ emergência de cidades-estados em Itália que necessitavam de estruturas normativas e constitucionais, que os direitos locais não conseguiam fornecer só por si

○ movimento geral da cultura no sentido de um alargamento de horizontes

● nas edições medievais, o Digesto encontrava-se disposto da seguinte maneira, correspondendo à ordem de elaboração e de estabelecimento:

Digesto Velho​ → Digesto como apareceu primeiro

Digesto Novo​ → Digesto que foi separado novamente e por último dos outros livros do Digesto

Digesto Esforçado​ → Digest que foi separado dos outros antes do Digesto Novo

4. Escolas jurisprudenciais na Idade Média

● é costume apresentar a jurisprudência medieval como duas escolas sucessivas

○ glosadores​ → inicia-se nos princípios do séc XII, terminando com Acúrsio e a sua obra ​Magna Glosa​, no início do séc XIII

○ comentadores​ → teria começado após os glosadores, atingindo o seu apogeu no séc XIV e entrando em declínio com as críticas dos humanistas, nos séculos XV e XVI

(28)

● no entanto, esta visão é demasiado esquemática e é necessário ter em

consideração que as duas escolas não se encontram separadas e isoladas, tendo vários pontos de contacto entre elas

● a obra ​Magna Glosa​ é muitas vezes usada como ponto de separação entre as duas escolas, no entanto, será mais correto vê-la como um elemento de continuidade

● RUY E MARTIM DE ALBUQUERQUE: deveríamos separar as escolas em glosadores, pós-acursianos e comentadores

● o objeto de trabalho das escolas era o ​direito romano justinianeu​, embora o tratassem de diferentes formas

● porquê o direito romano?

○ havia uma necessidade de tratar um direito que fosse duradouro, como era o caso do direito romano

○ cumpria os requisitos de rigor quanto aos regimes e conceitos jurídicos

○ provém também de uma necessidade de compreender melhor o direito canónico, que, em vários aspetos e conceitos, tem por base o direito romano

● objetivo:

○ tentativa de análise das diferentes componentes do ​Corpus Iuris Civilis; no entanto, com a análise vinha também uma interpretação das passagens

○ preocupação em olhar para os textos de forma completa, procurando então diferentes significados em cada passagem

5. Ligação da jurisprudência à Universidade - Aspetos comuns e específicos das correntes

● maioria dos juristas pertencentes às diferentes escolas são professores

○ ⇒ fenómeno do renascimento do direito romano constitui um processo essencialmente universitário, do ponto de vista dos agentes da sua elaboração

○ Bolonha tornou-se o principal palco da redescoberta do direito romano justinianeu

● as Universidades tinham professores e alunos de várias nacionalidades, havendo portanto um grande universalismo, sendo este um fator decisivo na expansão do direito romano e na unidade cultural da Europa

6. Os géneros literários nas escolas jurisprudenciais

● Glosa:

○ caracteriza a escola dos glosadores

○ glosa → explicação singular de termos, conceitos ou passos de um escrito

○ estrutura mais rudimentar da glosa: substituição de um vocábulo por outro

○ no entanto, as glosas podem ter maior complexidade, relativamente à matéria que tratam, aos problemas que visam ou às formas literárias co-envolvidas

○ glosas de tipo ​discursivo​ são também frequentes

○ aspetos externos:

glosas interlineares​: escritas entre as linhas do texto

glosas marginais:​ escritas nas margens das páginas

(29)

○ aspetos materiais:

■ glosas técnicas:​ têm conteúdo jurídico

■ glosas de índole filológica, histórica ou retórica-dialética

○ argumentação:

■ glosas declarativas​: apenas explicam o texto

■ glosas discursivas:​ tentam também interpretar as passagens

● Quaestio:

○ corresponde a uma forma dialogada

○ pode reportar-se a um facto (​quaestio facti​), estando em causa a existência de um evento, como um caso prático, que não seria possível responder apenas com recurso às ​leges

○ podiam também dizer respeito à interpretação do direito (​quaestio iuris), o que implicava uma disputa intelectual solúvel com recurso a ​leges, rationes e auctoritates

○ a ​quaestio​ era então um elemento de atualização do direto

○ podiam dizer respeito a um conflito real de interesses ou a um exercício académico

● Commentarius:

○ caracteriza a escola dos comentadores

○ trabalhos elaborados com o intento de estabelecer uma visão sintética de um instituto pela consideração exaustiva de todos os seus aspetos, feita sobre uma base lógica e não exegética

○ características:

■ índole extensamente discursiva

■ independência formal face à ordem dos textos romanos

■ conjugação dos preceitos justinianeus com os de outras ordens jurídicas

7. “Ars inveniendi” - Metodologia das escolas medievais

● a metodologia dos glosadores e pós-acursianos é predominantemente analítico-problemática

● elemento analítico:

○ jurista medieval aproxima-se dos textos com o intuito de determinar os preceitos, não através da consideração da globalidade do ordenamento jurídico, mas sim vendo nestes algo de imediato e dotado de individualidade

○ processos de correlação dos conceitos não é algo a atentar à partida, mas sim um simples instrumento para fixar o preceito

○ tentavam compreender o âmbito de aplicação da norma e tentavam densificar o conceito, decompondo o conteúdo da norma

● elemento problemático:

○ para o jurista medieval, a solução não se encontrava através da subsunção de um facto a uma norma legal, mas sim pela ponderação das soluções possíveis

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