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Vogais Altas e Glides no Português Brasileiro e no Inglês Britânico

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Academic year: 2021

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Luci Kikuchi

Vogais Altas e Glides no Português Brasileiro e no

Inglês Britânico

Belo Horizonte 2001

Universidade Federal de Minas Gerais

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Vogais Altas e Glides no Português Brasileiro e no

Inglês Britânico

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Letras: Estudos Lingüísticos como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Lingüística, na linha de pesquisa Estrutura Sonora da Linguagem.

Área de concentração: Lingüística

Orientadora: Profa. Dra. Thaïs Cristófaro Silva UFMG

Belo Horizonte

Faculdade de Letras da UFMG 2001

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Kikuchi, Luci

K62v Vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico [manuscrito] / Luci Kikuchi. - 2001.

Xiii, 156 f. , enc. : il., color, graf. Tab. Orientadora : Thaïs Cristófaro Silva

Dissertação (mestrado) – Universidade Federal de Minas Gerais, Faculdade de Letras.

Bibliografia : f. 147-156

1. Gramática comparada e geral – Fonologia – Teses. 2. Língua portuguesa – Fonética – Teses. 3. Língua inglesa – Fonética – Teses. 4. Língua portuguesa – Vogais – Teses. 5. Língua inglesa – Vogais – Teses. 6. Língua portuguesa – Gramática comparada – Inglês – Grã-Bretanha – Teses. 7. Língua inglesa – Gramática comparada – Português – Brasil – Teses. 8. Aquisição da segunda linguagem – Teses. 9. Nasalidade (Fonética) – Teses.

I. Silva, Thaïs Cristófaro. II. Universidade Federal de Minas Gerais. Faculdade de Letras. III. Título.

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Profa. Dra. Thaïs Cristófaro Silva (orientadora) Universidade Federal de Minas Gerais

Prof. Dr. César Reis

Universidade Federal de Minas Gerais

Prof. Dra. Carmen Lúcia Matzenauer Hernandorena Universidade Católica de Pelotas

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AGRADECIMENTOS

Este trabalho é fruto de muito esforço meu e de minha orientadora, Thaïs. Sem ela, este fruto não teria brotado, crescido e amadurecido. Com ela, além de realizar este sonho que é esta dissertação, cresci como profissional, pessoa, lingüista. Foi ela que me ensinou que “aluno aprende melhor com carinho”, “quando aluno procura o professor, é porque precisa de ajuda”, mudando minha postura como profissional. Não tenho palavras para agradecê-la.

Aos meus pais por terem me proporcionado esta educação e este incentivo. Sou o que sou graças a eles. O alto investimento e o exemplo impecável do papai. Tenho certeza que ele está em algum lugar desta eternidade feliz e orgulhoso. Mamãe, que me criou guerreira através de seu exemplo e educação. Ao Boya e ao Eidi, meus discretos e equilibrados irmãos.

Ao Ubiratan que compartilhou todos os meus problemas, ou nossos. Obrigada por seu apoio e por me ter dado esta criatura linda chamada Renata, que me deu o título de mãe durante o mestrado.

Um agradecimento especial aos meus alunos e colegas da Unimontes por todo o apoio que me foi dado em todos os sentidos. E principalmente aos meus alunos do 4o. e 6o. período que se preocuparam comigo e meu estado de saúde. Agradeço a FAPEMIG e à UNIMONTES pelo apoio financeiro e moral.

Agradeço meus chefes, colegas e os alunos do CCAA. Aos meus amigos, Ju, Andréia, Andrey, Carmen, Aloísio, Edu, Marina, Beth, Helena, enfim todos que me escutaram, apoiaram durante estes anos de luta. Aprender é uma luta árdua.

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perdida. E claro, à guerreira número 2 da casa, Helena, que vem lutando comigo há sete anos. E que durante este mestrado, ficou com Rê dia e noite para eu finalizar esta obra. Helena é um exemplo de amizade, fidelidade e dignidade.

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“When he aims straight, he shoots higher than man can see - past the stars – to the place where all dreams are really born.”

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LISTA DE FIGURAS... LISTA DE TABELAS... RESUMO... 1 INTRODUÇÃO... 1.1 Objeto de estudo... 1.2 Justificativa... 1.3 Organização do trabalho... 1.4 Objetivos e Hipótese... 2 FONÉTICA... 2.1 Introdução... 2.2 A Produção dos sons da fala... 2.3 As Vogais... 2.4 Propriedades articulatórias... 2.4.1 Altura do corpo da língua... 2.4.2 Grau de anterioridade/posterioridade da língua... 2.4.3 Arredondamento dos lábios...

2.5 Propriedades articulatórias das vogais... 2.5.1 Vozeamento... 2.5.2 Qualidade vocálica... 2.5.3 Nasalização... 2.5.4 Duração... 2.5.5 Tensão...

2.5.5 Notação dos segmentos vocálicos... 2.6 O Método das vogais cardeais... 2.7 As Propriedades acústicas... 2.8 Os Correlatos acústicos das propriedades articulatórias...

2.9 A

Sílaba... 2.10 Acento... 2.11.1 Vogais altas e glides no português brasileiro...

10 11 12 13 13 14 18 20 21 21 22 25 26 27 28 29 30 30 32 33 34 35 36 37 42 50 52 54 57 57

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2.12.1 Vogais altas e glides no inglês britânico... 65

2.12.2 As Vogais altas no inglês britânico... 65

2.12.3 Os Ditongos do inglês britânico... 69

2.12.3 Os Glides /j, w/ no inglês britânico... 72

2.13 Conclusão... 73 3 FONOLOGIA... 76 3.1 Introdução... 76 3.2 O Modelo fonêmico... 77 3.2.1 Introdução... 77 3.2.2 Fonemas... 78 3.2.3 Distribuição complementar... 79 3.2.4 Variação livre... 80

3.2.5 Princípio de pressão estrutural... 80

3.2.6 A Análise fonêmica das vogais altas e dos glides no português brasileiro... 82

3.2.6.1 A Alofonia de /i/ no português brasileiro... 83

3.2.6.2 A Alofonia de /u/ no português brasileiro... 88

3.2.6.3 Conclusão... 91

3.2.7 A Análise fonêmica das vogais altas e dos glides no inglês britânico... 92

3.2.7.1 Os Fonemas /i, u, , /... 92

3.2.7.2 Os Ditongos no inglês britânico... 95

3.2.7.3 Os Glides [j, w] no inglês britânico... 97

3.2.7.4 Conclusão... 99

3.2.7.5 Conclusão geral de fonêmica... 99

3.3 O Modelo gerativo padrão... 102

3.3.1 Introdução... 102

3.3.2 Os Traços distintivos... 103

3.3.3 Traços de classes principais... 104

3.3.4 Traços de corpo da língua... 105

3.3.5 Traços relacionados com o formato dos lábios... 105

3.3.6 Traços prosódicos... 106

3.3.7 As Vogais altas e os glides no português brasileiro... 107

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3.3.8 As Vogais altas e glides no inglês britânico... 113

3.3.8.1 Introdução... 113

3.3.8.2 Processos fonológicos no inglês britânico... 114

3.3.83 Conclusão... 116

3.3.8.4 Conclusão geral do modelo gerativo padrão... 116

3.4 O Modelo da fonologia autossegmental... 117

3.4.1 As Vogais altas e os glides no português brasileiro... 121

3.4.1.1 Os Glides pré-vocálicos... 123

3.4.1.2 Os Glides pós-vocálicos... 128

3.4.1.3 A Vogal alta longa... 130

3.4.1.4 Conclusão... 131

3.4.2 As Vogais altas e os glides no inglês britânico ... 131

3.4.2.1 Conclusão... 136

3.4.2.2 Conclusão do modelo autossegmental... 136

3.5 O Modelo teórico da otimalidade... 137

3.5.1 Introdução... 137

3.5.2 Formalismo da teoria da otimalidade... 140

3.5.3 Análise das vogais altas e glides no português brasileiro pela teoria da otimalidade... 142

3.5.4 Análise das vogais altas e glides no inglês britânico pela teoria da otimalidade... 145

3.5.5 Conclusão geral... 147

4 CONCLUSÃO... 148

(12)

LISTA DE FIGURAS

1 O Sistema respiratório e fonatório... 23

2 O Trato vocal... 24

3 O Limite vocálico... 25

4 Posição da língua na produção das vogais cardeais... 28

5 Tipos de arredondamento dos lábios... 30

6 As Oito vogais cardeais... 38

7 Vogal alta falada por um homem a uma freqüência fundamental de 120 hz... 44

8 Gráfico de freqüência de formantes vogais... 50

9 Esquema do esforço muscular e da curva da força silábica ... 52

10 As Vogais altas do português de Belo Horizonte... 59

11 F1 e F2 no português europeu, português brasileiro e as vogais cardeais... 60

12 Os Ditongos[ai] e [aυ] no português brasileiro... 61

13 As Vogais altas do inglês RP... 65

14 Espectrogramas das vogais altas do inglês... 67

15 Os Ditongos do RP... 69

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LISTA DE TABELAS

1 As VC1 a VC8... 39

2 As VC9 a VC16... 40

3 As VC17 a VC22... 40

4 Resultados de J.C. Wells obtidos em 1962... 46

5 Alofones das vogais altas no português brasileiro... 58

6 Valores das F1 e F2 das vogais altas, medidos em Hz... 60

7 Ocorrência de vogais altas, ditongos e glides do português brasileiro e no inglês britânico... 75

8 Os Alofones do fonema /i/ no português brasileiro. Sendo que V=vogal, C=consoante... 87

9 Os Alofones do fonema /u/ no português brasileiro ... 91

8 Tabela comparativa de vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico... 99

9 Traços distintivos para as vogais altas no português brasileiro... 107

10 Traços utilizados na caracterização de /i,u,j,w/ no português brasileiro... 108

11 Traços distintivos dos alofones das vogais altas e glides no português brasileiro... 108

12 Traços distintivos das vogais altas e glides no inglês britânico... 113

13 Tableau da língua hipotética... 141

14 Tableau da representação de "lua"... 143

15 Tableau da representação de "pai"... 144

16 Tableau da representação de "see"... 146

17 Inventários fonéticos e fonológicos das vogais altas no português brasileiro e no inglês britânico... 149

(14)

RESUMO

Este trabalho faz uma análise fonética e fonológica das vogais altas /i, u/ e glides /j, w/ no português brasileiro e no inglês britânico RP (Received Pronunciation). O RP

foi escolhido por considerado modelo de pronúncia no ensino do inglês britânico aos aprendizes de inglês como segunda língua (MCARTHUR, 1992). Esta pesquisa apontará semelhanças e diferenças nas vogais altas /i, u/ e os glides /j, w/ nos dois sistemas sonoros. Estes sons foram escolhidos pela alta ocorrência nas línguas naturais. Este trabalho também pretende descrever os traços articulatórios e acústicos desses sons e pretende contribuir para o estudo fonético e fonológico das vogais altas e glides.Também pretende mostrar e entender melhor a distribuição complementar destes sons para pesquisas futuras em lingüística e em lingüística aplicada.

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ABSTRACT

The present work analyses the high vowels /i, u/ and the glides /j, w/ in Brazilian Portuguese and British English (RP). This particular English dialect was chosen for being considered a model of pronunciation for the teaching of English as a second language. (MACARTHUR, 1992). This study will show similarities and differences among the high vowels /i, u/ and the glides /j, w/ in the sound systems of the two languages. These sounds have been chosen due to its high occurrence in the natural languages. This research also describes articulatory and acoustic features of these sounds and intends to contribute for the phonetic and phonological study of the high vowels and glides of the natural languages. It also shows the complementary distribution of these sounds in order to contribute to future researches in linguistics and applied linguistics.

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1. INTRODUÇÃO

1.1 O Objeto de estudo

As línguas do mundo alternam segmentos vocálicos e consonantais na constituição de enunciados. Foneticamente, os segmentos consonantais são produzidos com algum tipo de obstrução no fluxo de ar nas cavidades acima da glote, no trato oral, podendo haver fricção ou não. Na produção dos segmentos vocálicos, em oposição, não ocorre obstrução ou fricção no trato oral. A categorização dicotômica de consoantes e vogais é explícita foneticamente a partir da obstrução ou não da passagem da corrente de ar pelo trato vocal. No entanto, alguns segmentos podem não ter interpretação fonológica tão explícita quanto ao seu estatuto como vogal ou como consoante. Estes segmentos serão denominados glides neste trabalho1.

Os glides são segmentos que podem ser fonologicamente interpretados em algumas línguas como vogais e em outras línguas como consoantes (Trask, 1996). Foneticamente, tanto os glides quanto as vogais, são sons produzidos continuamente e sem fricção. Neste trabalho, trataremos dos glides palatais e velares.2 Glides palatais podem ser transcritos

como /j, y, , /. Glides velares podem ser transcritos como /w, j, /.

Alguns sons da fala são ditos universais devido a sua ocorrência em todas ou em quase todas as línguas naturais. As vogais altas [i,u] e a vogal baixa [a] fazem parte

1 “A palavra glide, de que também nos valemos, já se encontra documentada da Literatura Lingüística

(17)

deste inventário universal. De acordo com Picket (1999), há três vogais correspondentes aos três extremos de constrição no trato oral. Picket denomina estas vogais como “vogais de ponta” que em princípio ocorrem em todas as línguas naturais e podem ser classificadas como:

Vogais de ponta

. [i] – posição anterior e alta da língua, lábios estendidos . [u] – posição posterior e alta da língua, lábios arredondados . [a] – posição baixa e central da língua, lábios estendidos

Estas três vogais fazem parte de um sistema vocálico triangular e simétrico considerado básico nas línguas naturais (Roca/Johnson, 1999). Elas são tão comuns que são referidas como o padrão das três vogais básicas. Jakobson afirmou que [i,a,u] são universalmente os três primeiros fonemas vocálicos que se manifestam na fala da criança (Schane, 1973).

As vogais altas e os glides foram escolhidos como tema de pesquisa devido a sua alta ocorrência nas línguas naturais, pela alternância possível entre os glides e as vogais altas e pelo estatuto fonológico variável destes sons, ora como vogais, ora como consoantes.

1.2 Justificativa

2 Alguns autores consideram [r] como glide na análise do inglês (O'CONNOR, 1980). Os argumentos para

(18)

Pretendemos demonstrar nesta seção, que as vogais altas /i, u/ podem ser agrupadas como pertencendo a uma classe natural. Dizemos que dois segmentos pertencem a uma classe natural quando um ou mais dos requisitos relacionados a seguir, são preenchidos (Hyman, 1975):

• Os dois segmentos submetem-se a mesma regra fonológica; • Os dois segmentos juntos mudam em ambientes específicos;

• Um segmento é transformado em outro segmento através de uma regra fonológica; • Um segmento é derivado no ambiente de outro segmento.

Essencialmente, todos os elementos pertencentes a uma certa classe natural apresentam comportamento semelhante. Os segmentos da classe natural condicionam ou são submetidos a um processo fonológico devido a alguma característica fonética que é compartilhada por estes segmentos.

Por exemplo, é comum o fato de ocorrer a palatalização de consoantes no contexto de vogais altas. Dizemos que ocorre um processo de palatalização. Este processo é motivado pelo fato da vogal alta anterior [i] ser produzida pela aproximação da língua ao palato duro. Este fenômeno de palatalização ocorre em várias línguas, dentre elas o papago, o kongo do sul e o português do Brasil. Vamos discutir cada um destes casos a seguir. Considere em (1) os dados do papago (Halle & Clements, 1994).3

(1) a. [bidZim] virar-se

b. [tapan] repartir

c. [hidod] cozinheiro

d. [tkid] vacinar

(19)

e. [atwid] atirar

f. [tuku] tornar-se preto

g. [dasp] pressionar com a mão

h. [toha] tornar-se branco

i. [duki] chuva j. [hwid] cheiro k. [tiha] contratar l. [toi] esquentar m. [widut] ritmo n. [tatad] pés

o. [kitud] construir uma casa para

p. [dodom] copular

q. [tatam] tocar

No papago, as oclusivas [t, d] estão em distribuição complementar com as africadas [t, d]. Estes grupos de segmentos ocorrem em ambientes exclusivos. Precedendo a vogal alta e suas variantes ocorrem as africadas alveopalatais [t, d]. Nos demais ambientes, ou seja, antes de outras vogais ocorrem as oclusivas alveolares [t, d]. Examine os dados abaixo, que são do congo do sul (Halle & Clements, 1994).4

(2) a.[tobola] ter um buraco

b.[tina] cortar

c.[kesoka] ser cortado

d. [nkoi] leão e. [zena] cortar f. [ima] esticar g. [kasu] emagrecer h. [tiba] banana i. [nselele] cupim j. [loloni] lavar k. [zevo] então l. [aimola] esmola

(20)

m. [nzwetu] nossa casa

n. [kunezulu] para o céu

o. [tanu] cinco

No kongo do sul, os segmentos consonantais alveolares [t, s, z] encontram-se em distribuição complementar com as consoantes palatais [t, , ]. Podemos perceber que as consoantes alveolares tornam-se palatais quando precedem as vogais altas anteriores. Precedendo as outras vogais, as consoantes alveolares ocorrem.

Em alguns dialetos do português brasileiro, como por exemplo o de Belo Horizonte, as oclusivas alveolares [t, d] são palatalizadas quando seguidas da vogal alta anterior. Considere os dados abaixo:

(3) a. [tatu] “tatu” b. [tu] “tua” c. [ti] “tia” d. [tt] “teto” e. [dat] “data” f. [di] “dia” g. [dus] “duas” h. [atls] “atlas” i. [tres] “três”

Os exemplos acima demonstram que as consoantes africadas [t, d] ocorrem seguidas da vogal alta anterior [i]. Nos demais ambientes, ou seja, antes das demais vogais e seguidas de consoante na mesma sílaba, ocorrem as consoantes [t, d].

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Podemos concluir pelos exemplos apresentados em (1-3) que as vogais altas anteriores podem desencadear o fenômeno fonológico conhecido como palatalização. Ou seja, quando uma consoante oclusiva alveolar precede uma vogal alta anterior é transformada em consoante africada através do fenômeno fonológico da palatalização.

As vogais altas numa mesma classe natural, em várias línguas naturais, apresentam a alternância entre vogais altas e os glides correspondentes. Por exemplo, no francês há três semivogais correspondentes às vogais altas, havendo alternância entre as três vogais altas e seus respectivos glides, (Schane,1973). A alternância (e/ou variação) entre vogais altas e

glides é atestada também em espanhol e em italiano.

Considerando-se que as vogais altas são segmentos tidos como universais e considerando-se também que estes segmentos podem ser agrupados numa mesma classe natural, optamos em investigar o comportamento das vogais altas e dos glides no português brasileiro e no inglês britânico. Na próxima seção, apresentamos a organização geral desta dissertação.

1.3 Organização do trabalho

Este trabalho está dividido em duas partes principais: “Fonética” (capítulo 2) e “Fonologia” (capítulo 3). Os dados desta pesquisa são oriundos de fontes secundárias que descrevem e analisam vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico. Os dados do português brasileiro são do dialeto padrão de Belo Horizonte. Os dados do inglês

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são do inglês britânico, o R.P. (Received Pronunciation).5 Quando pertinente, avaliamos dados adicionais para corroborar ou refutar uma proposta de análise.

O capítulo 2, ''Fonética'', discute inicialmente a relação entre a fonética e a fonologia. Procede-se então a descrição fonética articulatória e a caracterização acústica das vogais altas e glides. As descrições fonéticas baseiam-se nos estudos de Pike (1943); Abercrombie (1967); Jones (1969); Câmara Júnior (1970); Bisol (1989); Callou & Leite (1990); Ladefoged (1996); Cagliari (1998) e Cristófaro Silva (1999a). Além da descrição articulatória, as vogais são descritas pelo método das vogais cardeais e este método considera parâmetros articulatórios e auditivos na descrição dos segmentos vocálicos. Discute-se ainda, a noção de sílaba e de acento, pois tais noções são importantes para a descrição e análise apresentadas para as vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico.

O capítulo de ''Fonologia'' discute análises fonológicas potenciais das vogais altas e

glides no português brasileiro e no inglês britânico em quatro modelos fonológicos: O

Modelo Fonêmico, o Modelo da Fonologia Gerativa Padrão, o Modelo Autossegmental e o Modelo da Otimalidade. Cada uma destas análises pretende indicar os pontos positivos de cada modelo e indicar aspetos a serem aprimorados nas propostas teóricas subseqüentes. O Modelo Estrutural ou a Fonêmica foi escolhido por ser um modelo fonológico pioneiro. O Modelo da Fonologia Gerativa Padrão proposto por Chomsky & Halle (1968), influenciou todas as teorias fonológicas que o seguiram. O Modelo da Fonologia Autossegmental de Goldsmith (1990), salienta-se por dar um estatuto teórico à sílaba (que passa a operar como

5 Received Pronunciation (RP) é a forma de pronúncia mais descrita em livros de fonética de inglês britânico

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constituinte). O último modelo a ser discutido, o da Otimalidade, é o modelo dos anos 90, o modelo corrente.

1.4 Objetivos e Hipótese

O objetivo deste trabalho é apresentar um estudo fonético e fonológico das vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico. Tal estudo é relevante pelo fato de não contarmos com trabalhos anteriores, cujo objetivo específico seja o de analisar as vogais altas e glides em profundidade nestas duas línguas. Os objetivos específicos deste trabalho são:

• Descrever foneticamente as vogais altas e glides no português brasileiro e inglês britânico em termos articulatórios e acústicos, explicitando seus ambientes de ocorrência e identificando o comportamento destes segmentos na estrutura silábica.

• Descrever e avaliar o comportamento fonológico das vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico.

• Analisar a pertinência e adequação de quatro modelos fonológicos para a análise das vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico.

Tomamos como hipótese básica que as vogais altas e os glides operam de maneira diferente na estrutura sonora do português brasileiro e no inglês britânico. Portanto, esta é a hipótese a ser investigada nesta pesquisa. Acreditamos que se compreendermos o comportamento destes sons nas duas línguas, contribuiremos também para a discussão teórica do ensino e aprendizado de inglês ou português como segunda língua. Portanto,

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como objetivo final, este trabalho pretende servir como orientação para pesquisas futuras tanto na área de concentração da lingüística como na área da lingüística aplicada.

2. FONÉTICA

2.1 Introdução

A lingüística é a ciência que estuda os fenômenos ligados à linguagem humana, que procura explicar os princípios e características que regulam as estruturas da língua. É dividida em áreas, entre as quais, a fonética e a fonologia, (Cagliari, 1997). Ambas as ciências estudam os sons usados na fala ou o sistema sonoro de uma língua, sendo a fonética a base para a fonologia.

A fonética é a ciência que apresenta métodos de descrição fisiológica, física e classificação dos sons das línguas naturais (Cristófaro Silva, 1999a). A fonética permite-nos descrever os mecanismos e os processos que estão envolvidos na produção da fala. O papel principal do foneticista é descrever o que acontece tanto com o falante durante sua fala, quanto com o ouvinte quando a capta (Ladefoged, 1982). Numa perspectiva mais ampla, podemos dizer que a fonética baseia-se na produção, percepção e transmissão dos sons da fala. A fonética pode ser dividida em áreas de interesse que são:

• Fonética articulatória: É a área de investigação mais antiga, conseqüentemente a mais sólida dentro da fonética lingüística (Cagliari & Massini-Cagliari, 2001). A fonética articulatória consiste no estudo da produção da fala do ponto de vista fisiológico e articulatório. Os sons da fala são descritos a partir dos movimentos atestados no aparelho fonador que estão envolvidos na articulação.

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• Fonética auditiva: Estudo da percepção da fala. Ou seja, como as ondas sonoras da fala são analisadas e identificadas pelo ouvido e o cérebro humano (Crystal, 1997).

• Fonética acústica: Estudo das propriedades físicas dos sons da fala a partir de sua transmissão do falante ao ouvinte. Descreve como estes sons são transmitidos a partir das propriedades físicas ou acústicas. (Cagliari & Massini-Cagliari, 2001).

• Fonética instrumental: Estudo das propriedades físicas da fala, com o suporte de instrumentos laboratoriais. Existem muitos instrumentos disponíveis atualmente para o estudo da produção da fala, como equipamento para gravar a fala, ou para analisar as propriedades acústicas da fala ou para investigar a fisiologia das cordas vocais.

A fonética investiga também os sons em relação uns aos outros, analisa a organização dos segmentos em unidades maiores (como sílabas, por exemplo) e avalia a organização do acento e de estruturas supra-segmentais (como o ritmo e a entoação). Neste trabalho, limitaremos à avaliação segmental das vogais altas e glides. A descrição fonética apresentada é baseada em propriedades articulatórios, auditivos e acústicos.

2.2 A Produção dos sons da fala

Os sons da fala são produzidos com algum tipo de interferência em uma corrente de ar em movimento no trato vocal. A corrente de ar é a fonte de energia dos sons da fala. A interferência na corrente de ar usada para a produção dos sons da fala é denominada

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mecanismo de corrente de ar. A FIG.1 a seguir representa o sistema respiratório e o fonatório.

FIGURA 1 O Sistema respiratório e fonatório.

FONTE - CRYSTAL, 1997. p. 124.

O sistema respiratório compreende os pulmões que são órgãos esponjosos contidos dentro de uma cavidade formada pela caixa torácica e o diafragma. No sistema respiratório tem-se ainda os músculos pulmonares, os tubos brônquios e a traquéia. Quando o diafragma, que é um músculo, move-se para cima, há compressão da caixa torácica, fazendo a corrente de ar fluir em direção oposta aos pulmões. Este é o mecanismo de corrente de ar mais comum nas línguas do mundo - o mecanismo de corrente de ar pulmonar egressivo. Neste mecanismo, o ar expelido dos pulmões em direção à boca e/ou ao nariz. No português e no inglês, as línguas em estudo, todos os segmentos são produzidos com o mecanismo de corrente de ar pulmonar egressiva.

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Há também o sistema fonatório que se localiza na laringe. Neste sistema ocorre o vozeamento (ou sua ausência) na produção dos sons. As cordas vocais são responsáveis pelo vozeamento.

O sistema articulatório compreende a faringe, a língua, o nariz, os dentes e os lábios. O sistema articulatório é responsável pela modificação na estrutura da cavidade oral através do movimento dos articuladores indicados acima. Considere a FIG. 2 abaixo, que representa o trato vocal com os articuladores passivos e ativos envolvidos na produção dos sons da fala.

FIGURA 2 O Trato vocal FONTE - SMALL, 1999, p. 42.

Os sons da fala são articulados com a modificação do trato vocal, a ação dos articuladores ativos e passivos, e com a passagem da corrente de ar. Assim são produzidos os segmentos vocálicos e consonantais. No caso das vogais, ocorre primordialmente a modificação da posição da língua. Uma pequena alteração na configuração da língua causa efeitos articulatórios, auditivos e acústicos significativos. Na próxima seção, definimos o

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conceito de segmento vocálico e procedemos à descrição dos segmentos a serem investigados nessa dissertação.

2.3 As Vogais

Segmentos ou fones são os sons da fala que compõem um enunciado. Estes segmentos podem ser arranjados em padrões diferentes para formar sílabas, que por sua vez formam palavras, que finalmente formam um enunciado. Os segmentos podem ser divididos em duas categorias: vogais e consoantes. As vogais são produzidas sem obstrução no trato vocal e na articulação das consoantes há obstrução no trato vocal. Estas categorias – vogais e consoantes - são definidas por este critério fonético básico que se relaciona à obstrução (ou não) do trato vocal.

Jones (1969), estabeleceu uma linha vocálica na altura do palato na boca, simbolizada pela linha pontilhada que aparece na FIG. 3 abaixo.

FIGURA 3 O Limite vocálico FONTE - JONES, 1969. p. 13

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Durante a articulação de um som, se a língua ultrapassar a linha vocálica ocorre um som friccional que caracteriza um segmento consonantal. Por outro lado, se a língua não ultrapassar a linha vocálica (e, portanto, se não ocorrer fricção audível), teremos a produção de um segmento vocálico.

Contudo, durante a produção da fala, há uma constrição ou estreitamento em alguma parte do trato vocal tanto na produção dos segmentos vocálicos, quanto nos consonantais (Picket, 1999). Os segmentos vocálicos, em termos fisiológicos, são sons tipicamente produzidos com a aproximação ou constrição dos articuladores, mas com ausência de obstrução ou fricção no trato vocal. Os segmentos consonantais, por outro lado, são produzidos com estritura6. A produção dos segmentos consonantais envolve um contato ou aproximação de áreas dos articuladores ativo e passivo relativamente maior, ultrapassando a linha vocálica proposta por Daniel Jones. (cf. FIG. 3).

Entendemos como segmento vocálico qualquer som que seja produzido com a língua abaixo da linha que define o limite vocálico. Ao ingressar na linha do limite vocálico ocorre a fricção, que caracteriza um segmento consonantal.

2.4 Propriedades articulatórias

As propriedades articulatórias descritas nesta seção, que são utilizadas para a classificação dos segmentos vocálicos são baseados em Cagliari (1981); Ladefoged (1982); Cristófaro Silva (1999a) e Cagliari & Massini-Cagliari (2001). Os segmentos vocálicos

6 Estritura é a posição assumida pelo articulador ativo em relação ao passivo, indicando como e em que grau

a passagem da corrente de ar através do aparelho fonador (ou trato vocal) é limitada neste ponto (ABERCROMBIE, 1967. p. 44). A partir da natureza da estritura, classificamos os segmentos consonantais quanto à maneira ou modo de articulação (CRISTÓFARO SILVA, 1999a).

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podem ser classificados ou descritos por três traços articulatórios básicos mencionados abaixo.

1. Altura do corpo da língua;

2. Grau de anterioridade/posterioridade da língua; 3. Arredondamento ou não dos lábios.

A seguir cada um destes traços articulatórios será considerado separadamente.

2.4.1 Altura do corpo da língua

Os segmentos vocálicos podem ser classificados como altos, médios ou baixos, quanto a altura da língua na cavidade oral no eixo vertical. Quando, na produção de um segmento vocálico, a língua encontra-se na parte superior da cavidade oral em um ponto alto, estes segmentos vocálicos produzidos são chamados vogais altas.

Os segmentos /i/ e o /u/, objetos desta pesquisa, são classificados como vogais altas, pois durante sua produção, a língua encontra-se elevada dentro da cavidade oral. Os segmentos vocálicos produzidos quando o corpo da língua encontra-se em um ponto baixo em oposição ao ponto alto, são denominados vogais baixas, por exemplo, o /a/. Quando a posição da língua é intermediária, temos vogais médias.

Dependendo da língua, pode haver alturas intermediárias, quanto à caracterização das vogais médias. Na descrição do português, há quatro níveis de altura: alta, média-alta, média-baixa e baixa (Cristófaro Silva, 1999a). Na descrição do inglês, Ladefoged (1982) considera três níveis de altura: alta, média e baixa.

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FIGURA 4 Posição da língua na produção das vogais cardeais. FONTE – JONES, 1969. p. 19 - 20.

A FIG. 4 acima, indica a posição da altura da língua durante a articulação dos segmentos vocálicos. No diagrama da esquerda, o segmento /i/ é classificado como alto. Os segmentos /e, / são classificados como médios e o segmento /a/ é classificado como baixo. Já no diagrama da direita, o segmento /u/ é classificado como alto, os segmentos /o, / classificados como médios. E o segmento // é classificado como baixo. A diferença entre o diagrama da esquerda é da direita está no grau de anterioridade e posterioridade da língua, que será discutido a seguir.

2.4.2 Grau de anterioridade/posterioridade da língua

Os segmentos vocálicos podem ser classificados também pelo grau de anterioridade e posterioridade da língua. Neste caso, é considerada a posição da língua no eixo horizontal da cavidade bucal, dividindo-a em três partes. Se, na produção da vogal, o corpo da língua estiver na parte da frente da cavidade bucal, a vogal é classificada como anterior. Se o corpo da língua estiver na parte média da cavidade bucal, a vogal é classificada como

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central e, finalmente, se o corpo da língua estiver na parte de trás da cavidade bucal, a vogal é classificada como posterior.

Na FIG. 4, as vogais do diagrama da esquerda são classificadas como vogais anteriores /i, e, , a/. As vogais do diagrama da direita são classificadas como vogais posteriores: /u, o, , /. Dos segmentos a serem analisados neste trabalho, podemos, portanto, classificar a vogal /i/ como anterior e a vogal /u/ como posterior.

2.4.3 Arredondamento dos lábios

O terceiro parâmetro articulatório envolvendo os segmentos vocálicos é a posição assumida pelos lábios. Durante a produção de um segmento vocálico os lábios podem estar arredondados ou estendidos. O arredondamento nos lábios resulta no alongamento da caixa de ressonância.

Na maioria das línguas do mundo, há uma relação previsível entre as dimensões fonéticas de grau de posterioridade da língua e arredondamento dos lábios. As vogais anteriores são, em geral, produzidas com os lábios estendidos e as vogais posteriores são produzidas com os lábios arredondados. No entanto, podem ser encontradas vogais posteriores estendidas e vogais anteriores arredondadas, (Ladefoged, 1996). No francês, a vogal simbolizada por [y], é alta, anterior e arredondada. No japonês, a vogal alta posterior, [], é produzida com os lábios estendidos.

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No português, o segmento [u] é produzido com os lábios arredondados e o segmento [i] é produzido com os lábios estendidos. Este padrão que é apresentado no português ocorre na maioria das línguas naturais. A Fig. 5 abaixo apresenta as posições dos lábios quanto ao arredondamento, sugerida por Jones (1969).

FIGURA 5 Tipos de arredondamento dos lábios FONTE - JONES, 1969. P. 17

(a) Lábios estendidos (b) Posição neutra (c) Arredondamento aberto (d) Arredondamento fechado

Na Fig. 5 acima, os lábiosencontram-se estendidos em (a), na posição neutra em (b), em posição de arredondamento aberto em (c) e finalmente em posição de arredondamento fechado em (d) (Jones, 1969).

2.5 Propriedades articulatórias das vogais

Nesta seção, trataremos da noção de vozeamento e de qualidade vocálica. Estas duas noções são muito importantes para a compreensão dos segmentos vocálicos.

2.5.1 Vozeamento

O ar que sai dos pulmões para a produção dos sons da fala, sobe pela traquéia, laringe e neste ponto, passa entre dois pequenos músculos denominados cordas vocais. Se as cordas vocais estiverem separadas, como geralmente estão quando respiramos

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normalmente, a corrente de ar que sai dos pulmões passará livremente em direção à boca. Porém, se as cordas vocais estiverem se aproximando, deixando apenas uma abertura estreita para a passagem da corrente de ar, esta corrente de ar causará vibração das cordas vocais.

Os sons produzidos com a vibração das cordas vocais são chamados de sons vozeados. Por sua vez, os sons produzidos com as cordas vocais abertas, (quando não ocorre vibração das cordas vocais) são denominados sons desvozeados. O grau de vozeamento dos segmentos é, em geral, importante para a distinção dos sons nas línguas naturais. Por exemplo, em português, temos as palavras “faca” /faka/ e “vaca” /vaka/ sendo que o que basicamente distingue estas palavras é o som inicial. O som /f/ é desvozeado e o som /v/ é vozeado.

As vogais produzidas isoladamente são tipicamente vozeadas, ou seja, produzidas com a vibração das cordas vocais. No entanto, dependendo do contexto, os segmentos vocálicos podem ser desvozeados. Ou seja, se pode ter segmentos vocálicos produzidos com ausência de vozeamento. Em certos contextos, quando os segmentos adquirem uma característica fonética de sons vizinhos, uma vogal tende a se tornar desvozeada. Por exemplo, no português brasileiro, o som // final que antecede o /t/ em ‘pato’ /pat/, pode ser classificado como desvozeado. Isso se deve ao fato da vogal final // assimilar a propriedade de desvozeamento do som anterior /t/, que é um segmento desvozeado. Utiliza-se o símbolo de um círculo colocado abaixo da vogal para indicar o desvozeamento. A ausência deste diacrítico expressa que a vogal é vozeada.

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2.5.2 Qualidade vocálica

Todos os sons ou segmentos vocálicos e consonantais de uma língua possuem uma qualidade de som distintiva e única associada a um único formato do trato vocal e um padrão vibratório correspondente ou ressonância. Cada som da fala tem uma única característica de ressonância que não o deixa ser confundido com outro som. A qualidade transforma cada som em uma entidade única (Small, 1999).

Durante a articulação dos sons da fala, a língua e outros articuladores modificam a sua posição no trato vocal. Esta mudança de posição dos articuladores modifica, portanto, o espaço de ressonância ou freqüências naturais de vibração da corrente de ar no trato vocal, para produzir os sons vocálicos e consonantais diferentes. Os três traços articulatórios das vogais expostos acima – ou seja, altura do corpo da língua, grau de anterioridade/posterioridade da língua e arredondamento dos lábios - contribuem para a determinação da qualidade vocálica ou timbre de um segmento vocálico.

A qualidade de um som vocálico depende do formato da caixa de ressonância (a cavidade pulmonar, a cavidade bucal e a cavidade nasal) no trato vocal. Portanto, a posição assumida pela língua no eixo da cavidade bucal (no sentido vertical e horizontal) associados ao formato dos lábios, caracteriza a qualidade de uma vogal (Abercrombie, 1967). Por exemplo, a vogal [i] representa a vogal alta anterior não-arredondada oral, com qualidade diferente da vogal [] que também é vogal alta anterior não-arredondada oral.

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2.5.3 Nasalização

Qualquer segmento – consoante ou vogal - pode ser oral ou nasal. Um segmento é nasal quando o mesmo é produzido com o abaixamento do véu palatino, permitindo que a corrente de ar ou parte desta escape pelo nariz. Este abaixamento do véu palatino altera a área de circulação da corrente de ar no trato vocal (nas cavidades oral e nasal) e altera a qualidade vocálica. No entanto, a nasalização altera muito pouco a qualidade vocálica, por isso, ao transcrever os segmentos vocálicos nasais, a maioria dos autores usa os mesmos símbolos vocálicos, com o acréscimo de um “til” (~) colocado acima da vogal oral. Por exemplo, [a] oral e [a], sua correspondente nasal.

Em algumas línguas há o contraste entre vogais orais e nasais (Ladefoged, 1982). Por exemplo, em português, “vi” [vi] e “vim [vi]. Contudo, as vogais nasais são segmentos marcados que ocorrem em poucas línguas naturais. Os segmentos orais são não-marcados e ocorrem em todas as línguas naturais.

A nasalização é a articulação secundária vocálica mais comum, sendo as vogais nasais [i,a,u] as mais freqüentes nas línguas naturais (Maddieson, 1984a apud Ladefoged, 1996). Isso é decorrente do fato de suas correspondentes orais [i,a,u] serem as vogais mais freqüentes nas línguas do mundo (Ladefoged, 1996).

A nasalidade e a altura da língua na articulação das vogais estão intimamente relacionadas. Para que uma vogal alta [i] ou [u] seja nasalizada, é necessário apenas um

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pequeno abaixamento do véu palatino, permitindo então, o acesso do fluxo de ar à cavidade nasal. Por outro lado, uma vogal baixa como [a] necessita de um abaixamento relativamente bem maior em relação às vogais altas, para que seja percebida como uma vogal nasal, pois a configuração do trato vocal é bem diferente durante a produção da vogal nasal [a] e a vogal oral [a].

Apesar de ser uma articulação vocálica muito comum, não analisaremos os segmentos vocálicos nasais neste trabalho. Nosso objetivo é descrever e analisar os segmentos orais vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico. Como vogais nasais ocorrem no português brasileiro, mas não no inglês britânico, restringimos ao estudo das vogais orais.

2.5.4 Duração

A duração ou quantidade vocálica de um segmento é um traço de descrição importante e relevante, em particular, para este estudo. Muitas línguas do mundo têm a distinção contrastiva de vogais breves e longas. (Ladefoged, 1996). Por exemplo, no japonês, as palavras [odi:san] “avô” e [odisan] “tio” diferem quanto à duração da vogal alta [i]. No primeiro exemplo, a vogal [i] é longa e no segundo exemplo a vogal [i] é breve. Observe que a vogal longa é indicada pelo uso do diacrítico []. A ausência deste diacrítico indica que a vogal é breve.

A quantidade é uma medida comparativa: sempre em relação a uma vogal longa, necessariamente há uma vogal breve. Observe o contraste entre vogais longas e breves em

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inglês: [li:v] ''leave'' viver e [lv] ''live'' morar. Nesta língua, além do parâmetro vogal longa-breve ser relevante se observa que ocorre concomitantemente a mudança de qualidade vocálica: [i:] e [].

2.5.5 Tensão

Os segmentos vocálicos podem também ser classificados como tensos e frouxos. Os segmentos frouxos são aqueles segmentos produzidos com menor esforço muscular em relação a um segmento tenso. Por exemplo, no português brasileiro, os segmentos vocálicos frouxos tendem a ocorrer em posição átona final, como em “sapo” [sap], “táxi” [taks]. Já os segmentos tensos, em português, ocorrem em posição tônica e pretônica como em “jacu” [aku] e “Paris” [paris]. Podemos concluir que no português do Brasil a relação entre segmentos vocálicos tensos e frouxos é intimamente associada à proeminência acentual ou tonicidade.

No inglês, a relação entre os segmentos vocálicos tensos e frouxos está relacionada à estrutura silábica. As vogais tensas podem ocorrer no final de palavras e sílabas, como em “he” [hi:] ou “too” [tu:]. Por outro lado, os segmentos vocálicos frouxos não ocorrem em final de palavra e de sílabas, e devem obrigatoriamente ser seguidos de uma consoante como em “had” [hæd], “look” [lk].

Tipicamente, a oposição entre vogais tensas e frouxas é expressa pela adoção de símbolos diferentes. Em inglês, temos uma série de pares de vogais com qualidades

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diferentes (que também se distinguem por serem longas e breves) e muitos autores adotam símbolos diferentes para identificá-las: i,  , u, , , æ, etc.

2.5.6 Classificação dos segmentos vocálicos

A notação dos segmentos vocálicos diz respeito à maneira ou à ordem de apresentação das propriedades articulatórias. Deve-se apresentar as informações na seguinte ordem:

• Altura da língua na cavidade oral

• Anterioridade ou posterioridade da língua na cavidade oral • Posição de arredondamento dos lábios

A vogal [i] é classificada como ''vogal alta anterior não-arredondada''. A vogal [u] é classificada como ''vogal alta posterior arredondada''. Informações referentes às propriedades articulatórias secundárias devem seguir na parte final das informações classificatórias. A vogal [i] classificada como ''vogal alta anterior não-arredondada nasal'' e a vogal [] é classificada como ''vogal alta posterior arredondada frouxa''.

Tipicamente, não se indica o grau de vozeamento. Contudo, caso este fator seja relevante para a classificação do segmento, a informação classificatória deve vir ao final. Tem-se para []: ''vogal alta posterior arredondada nasal desvozeada''.

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Na próxima seção, descreveremos o Método das Vogais Cardeais. Tal Método tem um caráter complementar à descrição articulatória apresentada nas páginas precedentes.

2.6 O Método das vogais cardeais

O método das Vogais Cardeais oferece um instrumental que permite a descrição e interpretação dos segmentos vocálicos que ocorrem nas línguas naturais cujas qualidades vocálicas são variadas (Jones, 1969). Este método é até hoje muito utilizado, pois relaciona os correlatos articulatórios, auditivos e acústicos (Cristófaro Silva, 1999a). O método das Vogais Cardeais será utilizado neste trabalho para descrever e interpretar os segmentos vocálicos do inglês e do português. Tal método permite descrever e representar as vogais simples, ditongos e tritongos.

A idéia de adotar um sistema de pontos de referência para a classificação de vogais foi proposta por A. J. Ellis em 1844. A nomenclatura “cardeal” foi usada pela primeira vez por A.M. Bell em 1867, inspirando-se nos pontos cardeais. Daniel Jones reapresentou o método em 1917, em número de oito vogais cardeais, classificando as vogais do inglês a partir deste, tornando-o amplamente usado desde então. Abercrombie (1967) desenvolveu a proposta de Jones até o ponto que se encontra hoje (Cristófaro Silva, 1999b).

Oito vogais cardeais, distribuídas de forma eqüidistante numa figura em forma de um trapézio, formam a base do sistema de Daniel Jones, (FIG. 6 a seguir). As vogais cardeais de 1 a 8 são articuladas com o ponto mais alto da língua no limite da linha periférica da área vocálica. A área vocálica é parte da área da cavidade bucal onde a língua assume posições diferentes para a articulação de vogais sem causar contato, fricção ou

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obstrução. Isto caracterizaria a produção de um segmento consonantal. A área vocálica é delimitada pela linha periférica que, se ultrapassada, há fricção ou obstrução, produzindo um segmento consonantal (Cristófaro-Silva, 1999b).

FIGURA 6 As Oito vogais cardeais

FONTE: LADEFOGED & MADDIESON, 1996. p. 285.

As vogais cardeais de 1 à 8 são chamadas vogais periféricas por Jones (1969) e estas vogais são pontos de referência para todas as vogais das línguas naturais. É importante salientar que estas oito vogais foram selecionadas de forma arbitrária, ou seja, não correspondem ao sistema vocálico de nenhuma língua natural. Por coincidência, pode acontecer de alguma língua conter uma ou mais vogais das oito vogais cardeais.

O método propõe um recurso de descrição de vogais a partir de propriedades auditivas que caracterizam uma vogal dentro da área vocálica, que é representada por uma figura em forma de trapézio, muitas vezes chamado de quadrilátero. O ponto da linha periférica para a posição mais avançada e mais alta da língua na cavidade bucal, é a vogal cardeal no. 1, ou VC1. A VC1 é representada pelo símbolo i.

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O mesmo procedimento pode ser adotado para definir os outros pontos na linha periférica, ou seja, a articulação do ponto mais baixo e mais posterior possível antes de haver contato entre a língua e a úvula, corresponde à vogal [a], a VC5. As três vogais logo abaixo da VC1 no trapézio, correspondem aos pontos das vogais cardeais VC2 = e, VC3 =  VC4 = a. As vogais cardeais restantes, que ficam no trapézio em direção ascendente em

relação à VC5, são a VC6 = , VC7 = o e VC8 = u. Estas vogais podem ser descritas em termos de categorias de classificação vocálica, como:

TABELA 1 As VC1 a VC8

As vogais de 1 a 5 não são arredondadas e de 6 a 8 são arredondadas.

Anterior Posterior Alta VC1 i VC8 u Média-alta VC2 e VC7 o Média-baixa VC3  VC6 Baixa VC4 a VC5 FONTE - ABERCROMBIE, 1967. p. 154

A aplicação deste método consiste em primeiramente, aprender a pronunciar as oito vogais cardeais, e para classificar uma vogal de uma língua natural, deve-se pedir a um nativo desta que a pronuncie. A partir daí, comparar a postura da língua durante a produção desta, com a da vogal ou vogais cardeais mais próximas, até que se possa determinar a posição específica da língua durante a articulação do segmento em questão. A identificação de uma vogal baseia-se em critérios articulatórios e auditivos.

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A princípio, as oito vogais cardeais são suficientes para a descrição de qualquer segmento vocálico de qualquer língua natural. Porém, foram estabelecidas catorze vogais cardeais secundárias, relacionadas com as vogais cardeais primárias. O quadro abaixo ilustra os segmentos correspondentes aos pontos VC9 a VC16. As VC9 a VC16 que também são pontos fixos, de qualidade invariável.

TABELA 2 As VC 9 a VC16

VC9 y VC11 œ VC13  VC15

VC10 ø VC12  VC14  VC16

FONTE - ABERCROMBIE, 1967. p. 161

A TAB. 3 abaixo ilustra os símbolos correspondentes aos segmentos vocálicos correspondentes aos pontos VC17 a VC22.

TABELA 3 As VC17 a VC22

VC17  VC19  VC21 

VC18  VC20  VC22

FONTE - ABERCROMBIE, 1967. P. 161.

As vogais cardeais de secundárias de 9 à 18 estão localizadas na linha periférica do trapézio e as vogais cardeais de 19 a 22 são centrais. Das VC9 a VC16 têm-se a mesma posição de língua que nas vogais primárias VC1 a VC8. A diferença está na posição dos lábios, as VC9 a VC13 são arredondadas e as VC14 a VC16 não são arredondadas. As vogais cardeais secundárias restantes, VC17 a VC22 localizam-se na parte central da área vocálica. Sendo as vogais cardeais VC18, VC20 e VC22, produzidas com labialização e as VC17, VC19 e VC21 sem labialização.

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Tomando como referência as 22 vogais cardeais mencionadas anteriormente, pode-se identificar qualquer pode-segmento vocálico de qualquer língua natural. O procedimento de descrição é o mencionado na página 39 e se baseia em critérios articulatórios e auditivos. Para indicar alteração na qualidade vocálica do segmento analisado em relação a uma vogal cardeal, podemos usar os seguintes diacríticos:

levantado – qualidade mais alta abaixado – qualidade mais baixa retraída – qualidade mais posterior avançada – qualidade mais anterior

Os ditongos também podem ser identificados no diagrama das vogais cardeais. Estes sons, os ditongos, são sons que consistem de um movimento articulatório ou deslize da língua de uma vogal a outra (Clark & Yallop, 1990). Os ditongos são também tratados como uma seqüência de segmentos, sendo um dos segmentos interpretados como uma vogal e o outro interpretado como um glide. O glide refere-se aos segmentos vocálicos sem proeminência acentual nos ditongos (Cristófaro Silva, 1999b). Glides são segmentos assilábicos que co-ocorrem com um segmento vocálico. Um ditongo pode ser composto de (vogal e glide) ou (glide e vogal). A seqüência (vogal e glide) é denominada ditongo decrescente. A seqüência (glide e vogal) é denominada ditongo crescente.

Os glides em um ditongo podem ser representados por vários símbolos fonéticos.

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como /w, , /. A transcrição diferente dos glides depende da interpretação fonológica dada ao segmento no sistema sonoro.

Tipicamente, quando o glide é simbolizado por [j, y], ele é interpretado fonologicamente como consoante e quando o glide é simbolizado por [, ], ele é tipicamente interpretado como vogal. Este trabalho adota o símbolo [j] para o glide interpretado fonologicamente como consoante e o símbolo [] para o glide interpretado como vogal. Em ambos os casos, o símbolo adotado para o glide será adjacente a uma vogal. Argumentos que sustentem a interpretação do segmento em questão como vogal ou consoante, serão apresentados na segunda parte, a de fonologia.

No diagrama das vogais cardeais, os ditongos são indicados por uma flecha que marca o ponto inicial e o ponto final do ditongo. Um destes pontos não terá proeminência acentual e indicará o glide. Diagramas expressando a representação dos ditongos serão apresentados quando da descrição das vogais altas e glides em cada uma das línguas em questão. Na próxima seção, avaliamos as propriedades acústicas relacionadas aos segmentos vocálicos.

2.7 As Propriedades acústicas

Ao utilizar os órgãos da fala, movimentamos as moléculas de ar próximas de nossa boca e as deslocamos. Quando uma molécula de ar colide em outra e oscila para frente e para trás em relação ao seu ponto de repouso, produz o som, no caso, o som da fala. Estas moléculas no trato vocal são postas em movimento pela ação das cordas vocais. Toda vez

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que as cordas vocais abrem e fecham, produz-se um pulso de ar e estes pulsos vibram o ar no trato vocal, produzindo um número de freqüências distintas.

O movimento máximo das moléculas de ar para longe do ponto de repouso é chamada de amplitude de vibração. Um ciclo completo a partir deste ponto à amplitude máxima em uma direção e novamente de volta é denominado um ciclo. O período de tempo que a molécula leva para fazer o ciclo é denominado período do ciclo e freqüência de vibração é o número de ciclos – movimento das moléculas de ar para frente e para trás – a cada segundo. É também o número de aberturas e fechamentos das cordas vocais em um segundo. Sua unidade de medida é o Hertz (Hz). Por exemplo, se as cordas vocais fazem 100 movimentos em um segundo, dizemos que a freqüência deste som é de 100 Hz.

A altura melódica (“pitch”) está relacionada à freqüência de vibração, ou seja, quanto mais alta a freqüência, mais alto o tom, (O’Connor, 1973). As vogais são acusticamente definidas por dois ou três tons característicos ou formantes, podendo ser visualizados no padrão de espectro de um som da fala. (Ladefoged, 1982). Entendemos como formante, a concentração de energia acústica, ou a ressonância do trato vocal na produção de um som da fala, (Picket, 1999). Os formantes que caracterizam as vogais são resultantes dos formatos diferentes da língua no trato vocal.

Usamos o espectrógrafo para ter a representação visual dos traços acústicos dos sons da fala, na forma do espectrograma. Este é uma representação visual dos traços acústicos dos sons da fala e mostra o espectro de um som. Por sua vez, espectro é a gama de freqüências que compõem uma onda sonora. Ao analisar uma vogal no espectrograma, a intensidade de cada freqüência é mostrada pelos traços mais escuros da marca. As barras

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horizontais escuras são os formantes (O’Connor, 1973). Em uma análise espectrográfica, o eixo horizontal representa a freqüência e o vertical representa a amplitude. Por exemplo, os componentes acústicos da vogal alta longa [i:] representando as ressonâncias no trato vocal durante sua produção, podem ser mostrados no espectro de freqüência abaixo:

FIGURA 7 Vogal alta falada por um homem a uma freqüência fundamental7 de 120 Hz.

FONTE - CRYSTAL,1997. P. 135.

Cada pico ou amplitude de algumas freqüências demonstrados na ilustração acima, representa um formante. O primeiro formante é representado por F1, o segundo por F2 e o terceiro por F3, todos caracterizam a vogal alta anterior longa [i].

Todas as vogais e algumas consoantes têm formantes e a disposição dos formantes, principalmente os dois primeiros é que possibilita diferenciar vogais, ou reconhecê-las na fala de dois ou mais falantes distintos (Crystal, 1997).

Trataremos aqui, da caracterização acústica de vogais e glides. Vimos que glides correspondem a segmentos vocálicos sem proeminência acentual (cf. seção 5.7). Sendo

7 Freqüência fundamental é a freqüência básica na qual um som vibra, geralmente abreviado como F0

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assim, a discussão que se segue menciona a categoria vogal, porém na prática, engloba tanto as vogais quanto os glides.

Os segmentos vocálicos são caracterizados, em geral, por três formantes e os demais formantes (F4, F5, etc.) não são necessários para a especificação lingüística de um segmento vocálico, (O’Connor, 1973). Os formantes são numerados de acordo com a ordem de suas freqüências, do mais baixo ao mais alto. São chamados de primeiro formante (F1), segundo formante (F2), terceiro formante (F3) e assim por diante. O primeiro e o segundo formantes estão intimamente ligados ao formato do trato vocal, ou seja, ao movimento dos lábios, língua, faringe e mandíbula, na articulação das vogais e consoantes. É importante primeiramente, concentrar-se nos dois primeiros formantes na produção de segmentos vocálicos. A freqüência dos formantes é determinada por três fatores, (Picket, 1999): o comprimento do trato orofaríngeo, o local de constrição no trato e o grau de estreitamento das constrições. E de acordo com estes fatores, Picket delineou regras a seguir.

O comprimento do trato orofaríngeo depende do tamanho físico do falante. Este afeta os locais de freqüência de todos os formantes do segmento vocálico, permitindo prever onde estará o pico do formante no caso de crianças, mulheres ou homens. As freqüências médias dos formantes da vogal estão inversamente proporcionais ao comprimento do trato orofaríngeo.

As formas articulatórias diferentes do trato orofaríngeo afetam os locais dos formantes. Para tal, devemos considerar os pontos de constrição na articulação das vogais, ou seja, a primeira regra é que a freqüência de F1 diminui por qualquer constrição na

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metade frontal da parte oral do trato vocal. Quanto maior a constrição, menor o F1. Portanto, se a parte mais alta da língua estiver próxima ao meio do palato ou à frente deste, o F1 é mais baixo em freqüência que 500 Hz, que é a medida neutra. (Picket, 1999).

A vogal alta anterior [i] é um exemplo disso. Na TAB. 4 abaixo, as vogais [i] e [] têm a freqüência do F1 mais baixa que 500 Hz, que são 300 Hz e 360 Hz respectivamente. Como a constrição desta vogal é grande e é feita na parte frontal do trato vocal, a freqüência de F1 diminui. Quanto maior a constrição, menor a freqüência do F1.

TABELA 4

Resultados de J.C. Wells, obtidos em 1962

F1 F2 i: heed 300 Hz 2300 Hz  hid 360 Hz 2100 Hz  hood 380 Hz 950 Hz u: who 300 Hz 940 Hz FONTE: GIMSON, 1970. p.98

A segunda regra de Picket (1999), relaciona o F2 com a constrição da parte traseira da língua. A freqüência de F2 tende a abaixar devido a uma constrição na parte traseira da língua e quanto maior a constrição, menor o F2. A vogal alta [u], por exemplo, é articulada com a língua elevada na parte traseira do palato. O efeito é abaixar a freqüência de F2. De fato, esta vogal é formada por um estreitamento grande, a parte traseira da língua fica muito próxima ao palato mole, portanto freqüência de F2 é baixa por causa desta constrição pequena. Nos dados abaixo, em relação às F2 das vogais altas anteriores, as

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posteriores [] e [u], têm as freqüências de F2 mais baixas, ou seja, 950 Hz e 940 Hz em relação a 2300 Hz e 2100 Hz.

A terceira regra apresentada em Picket (1999), relaciona a constrição anterior da língua com o F2. Ou seja, a freqüência de F2 aumenta em uma constrição anterior da língua. E quanto maior a constrição na parte anterior da língua, maior a freqüência do F2. (Picket, 1999). A constrição da vogal alta [i] é a maior, portanto, sua freqüência no F2 é mais alta. Podemos observar este fato nos dados de Wells (1962), apud Gimson (1970), que são apresentados na TAB. 4, na página anterior. Também podemos observar nesta tabela, que o F1 da vogal alta anterior [i] é mais afastado que o F2 em comparação à vogal alta posterior [u], (Cagliari, 1997).

A regra final proposta por Picket (1999), relaciona os efeitos do arredondamento dos lábios nos formantes. As freqüências de todos os formantes abaixam com o arredondamento dos lábios. Portanto, quanto mais arredondada a vogal, maior a constrição e mais baixos são os formantes. Nos dados de Wells da TAB. 4, a vogal [u] é a mais arredondada e suas freqüências de formantes são as mais baixas.

Os glides [w] e [j] possuem os traços acústicos das vogais altas [u] e [i]

respectivamente, por isso são chamados com freqüência de semi-vogais. (Crystal, 1997). Ou seja, a estrutura dos dois ou três primeiros formantes do [i] é semelhante ao do [j]. E de maneira análoga a estrutura dos dois ou três primeiros formantes do [u] é semelhante ao do [w]. O primeiro formante, F1, pode ser aproximadamente 240 Hz para os dois glides e

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o F2 pode variar de 2.280 a 3.600 Hz para [j]. Já para o [w], o segundo formante pode variar de 360 a 840 Hz (Gimson,1970, p. 213). Os formantes dos glides podem também variar de acordo com as vogais adjacentes, por exemplo em [aja], o primeiro formante desce e o segundo sobe à medida que a língua movimenta de [a] para [j]. Então, o primeiro formante sobe e o segundo desce novamente, à medida que a língua volta à sua posição original da vogal [a].

Contudo, o glide [w] difere da vogal [u] em três aspectos. Primeiramente, há uma

constrição maior nos lábios no [w] em relação à vogal, isto abaixa a intensidade dos formantes F1 e F2 e causa uma maior redução no F3 e nos formantes mais altos. O segundo aspecto que difere o glide [w] da vogal [u], é que a posição da língua na produção do glide pode variar de acordo com as vogais adjacentes. Uma constrição levemente posterior da língua pode acompanhar a constrição do [w] nos lábios. Por outro lado, o segmento vocálico [u] precisa ter uma constrição na parte posterior da língua junto com a constrição nos lábios.

O terceiro aspecto que diferencia o glide [w] da vogal [u] está na velocidade do movimento do trato oral na produção de cada segmento. Esta é maior na produção do [w]

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nos movimentos entre duas vogais. Por exemplo, a transição de F1 na abertura de [w] para [a] é mais rápida que na transição de [w] para [i]8.

Podemos perceber através de análise espectrográfica, que um ditongo é realmente um movimento, um deslize entre dois elementos vocálicos, (além de envolver um movimento articulatório perceptível), pois o espectrograma mostra a transição de formantes a partir de posições típicas de uma vogal para posições características de outra vogal, (Gimson, 1970). Os ditongos são semelhantes às vogais longas, ou seja, sua duração é maior.

Nesta seção, apresentamos a descrição das propriedades acústicas das vogais altas e os glides. Vimos que as vogais podem ser especificadas pela freqüência dos dois primeiros formantes, F1 e F2. Quanto maior a constrição da língua em relação ao palato na articulação das vogais, menor o valor de F1. E quanto maior a constrição na parte traseira da língua, menor o valor de F2. Portanto, na articulação da vogal alta anterior [i], o valor de F1 é baixo e o valor de F2 é alto.

Na vogal alta posterior [u], o valor de F1 e o de F2 são baixos (TAB. 4), os ditongos têm a duração de uma vogal longa, visível no espectrograma. É também possível visualizar a mudança de posição da freqüência do primeiro para o segundo formante, durante a modificação do formato do trato vocal na configuração de uma vogal para a outra. Os glides [j,w] quando combinados com vogais têm as freqüências semelhantes aos

8 Não encontramos como correlato articulatório a comparação entre [i] e [j]. Contudo, evidências

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ditongos. A diferença é que a constrição no trato oral na articulação dos glides é maior em relação às suas vogais altas correspondentes [i, u].

2.8 Os Correlatos acústicos das propriedades articulatórias

As freqüências dos formantes são inversamente relacionadas às propriedades articulatórias tradicionais e quando analisamos um gráfico de freqüência de formantes de vogais, constatamos que o arranjo no gráfico é o mesmo que o que estamos acostumados a ver nas descrições articulatórias tradicionais. Atualmente, os gráficos de formantes são geralmente usados para representar as qualidades vocálicas, pois a qualidade vocálica depende das freqüências dos formantes (Ladefoged, 1982). Considere a FIG. 8 abaixo:

FIGURA 8. Gráfico de freqüência de formantes de vogais FONTE - CRYSTAL, 1997. p. 135.

O gráfico de freqüência de formantes ilustrado na FIG. 8 mostra que o padrão resultante é muito semelhante à descrição articulatória das vogais através do método das vogais cardeais. Se compararmos a posição dos segmentos vocálicos no diagrama das vogais cardeais com as mesmas vogais no gráfico da FIG. 5, constatamos uma semelhança

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bastante grande. No entanto, a relação entre a informação articulatória e a informação acústica não é maior porque as propriedades articulatórias baseiam-se apenas no ponto de constrição maior da língua, enquanto que as propriedades acústicas derivam das ressonâncias do trato vocal integral (Crystal, 1997).

Os espectrogramas são indicadores confiáveis da qualidade relativa de um segmento vocálico. E também, é clara a relação dos formantes no espectrograma e a sua relação com a articulação dos segmentos vocálicos, ou seja, a freqüência do primeiro formante mostra a altura vocálica com precisão. A distância entre o primeiro e o segundo formantes reflete o grau de posterioridade da língua. No entanto, o grau de arredondamento dos lábios não é demonstrado claramente, podendo haver confusão em sua interpretação, (Ladefoged, 1982).

Podemos concluir que as duas propriedades acústicas e articulatórias complementam-se, não devemos afirmar que os métodos da fonética acústica sejam superiores em relação aos da fonética articulatória. Pode haver maior precisão visual no caso da análise acústica. Porém, um método não elimina a importância do outro, na verdade, um complementa o outro. Uma outra evidência a favor da fonética articulatória é citada por Ladefoged, onde os espectrogramas não medem graus de nasalização. Para identificá-la com maior precisão, técnicas como a palatografia é muito mais eficiente. Isto justifica a interação entre abordagens distintas para descrever os segmentos.

Antes de procedermos à descrição fonética das vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico vamos apresentar duas noções muito importantes para este trabalho. Estas noções são de ''sílaba'' e de ''acento''.

Referências

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