PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
APELAÇÃO CÍVEL 0030805-31.2011.4.01.3800/MG Processo na Origem: 308053120114013800
RELATOR(A) : DESEMBARGADOR FEDERAL NOVÉLY VILANOVA APELANTE : OURO PRETO TRANSPORTES RODOVIARIO LTDA ME ADVOGADO : ERNESTO KOHNERT VIEIRA E OUTRO(A)
APELADO : UNIÃO (PFN)
PROCURADOR : CRISTINA LUISA HEDLER
TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. PRESCRIÇÃO. EXCLUSÃO DO
ICMS E ISS DA BASE DE CÁLCULO DO PIS/COFINS, IRPJ E CSLL.
1. A 4ª Seção desta Corte, no julgamento da Questão de Ordem nos Embargos
Infringentes 0016794-43.2005.4.01.3400-DF, e-DJF1 de 1º/6/2012, da minha
relatoria, por decisão majoritária, manteve a orientação de que se deve
prosseguir no julgamento dos feitos relativos à inclusão do ICMS na base de
cálculo do PIS e da COFINS, diante do escoamento do prazo da medida cautelar
na ADC 18 (r. Des. Federal Maria do Carmo Cardoso).
2. Impetrado o mandado de segurança depois da vigência da LC 118/2005, a
prescrição é qüinqüenal.
3. O ICMS e o ISS são despesas do contribuinte, que não podem ser incluídos na
base de cálculo da Cofins e do Pis
– contribuições sociais incidentes sobre o
“faturamento” (Lei 9.718/1998, art. 3º). Despesa não é faturamento (Constituição,
art. 195/I, alínea “b”). “Faturamento” é a receita decorrente da venda de serviços
e/ou mercadorias.
4. A escrituração dos créditos de ICMS caracteriza a "aquisição da disponibilidade
econômica ou jurídica de acréscimos patrimoniais", muito embora possa não
significar aquisição de disponibilidade financeira quando há restrições ao uso dos
créditos adquiridos, e, portanto, permite a tributação pelo IRPJ e pela CSLL.
Precedente do STJ.
5. A compensação será realizada de acordo com a lei vigente na época de sua
efetivação, vedada antes do trânsito em julgado (REsp 1.164.452-MG,
representativo da controvérsia, r. Ministro Teori Albino Zavaski, 1ª Seção)
ACÓRDÃO
A 8ª Turma, por unanimidade, deu parcial provimento à apelação da impetrante.
Brasília, 21.03.2014
NOVÉLY VILANOVA DA SILVA REIS
Desembargador Federal Relator
RELATÓRIO
A impetrante apelou da sentença denegatória do mandado de segurança
ajuizado para excluir o ICMS e o ISS da base de cálculo do PIS, da COFINS, do
IRPJ e da CSLL, bem como compensar os valores indevidamente recolhidos nos
últimos 10 anos (fls. 48-52).
Pediu a reforma do julgado argüindo a nulidade da sentença em decorrência
do descumprimento da liminar concedida pelo STF na ADC 18/DF. No mérito,
sustentou (i) a ilegitimidade da inclusão do ICMS e do ISS na base de cálculo do
IRPJ, CSLL, PIS e COFINS, porque são créditos tributários pertencentes aos
Estados e Municípios e, por isso, não se encaixam no conceito de faturamento ou
receita advinda da venda de mercadorias ou da prestação de serviço; (ii) a
compensação dos valores recolhidos indevidamente nos últimos dez anos (fls.
55-64).
O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do recurso (fls.
72-3).
FUNDAMENTOS DO VOTO
Preliminares. A 4ª Seção desta Corte, no julgamento da Questão de Ordem
nos Embargos Infringentes 0016794-43.2005.4.01.3400-DF, e-DJF1 de 1º/6/2012,
da minha relatoria, por decisão majoritária, manteve a orientação de que se deve
prosseguir no julgamento dos feitos relativos à inclusão do ICMS na base de
cálculo do PIS e da COFINS, diante do escoamento do prazo da medida cautelar
na ADC 18 (r. Des. Federal Maria do Carmo Cardoso).
Impetrado o mandado de segurança depois da vigência da LC 118/2005, a
prescrição é qüinqüenal, conforme a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal
–
RE 566.621, r. Ministra Ellen Gracie, Plenário:
...
O prazo de vacatio legis de 120 dias permitiu aos contribuintes não apenas que tomassem ciência do novo prazo, mas também que ajuizassem as ações necessárias à tutela dos
LC 118/08, que pretendeu a aplicação do novo prazo na maior extensão possível, descabida sua aplicação por analogia. Além disso, não se trata de lei geral, tampouco impede iniciativa legislativa em contrário. Reconhecida a inconstitucionalidade art. 4º,
segunda parte, da LC 118/05, considerando-se válida a aplicação do novo prazo de 5 anos tão-somente às ações ajuizadas após o decurso da vacatio legis de 120 dias, ou seja, a partir de 9 de junho de 2005. Aplicação do art. 543-B, § 3º, do CPC aos recursos sobrestados.
Mérito. O ICMS e o ISS são despesas do contribuinte, que não podem ser
incluídos na base de cálculo da Cofins e do Pis
– contribuições sociais incidentes
sobre o “faturamento” (Lei 9.718/1998, art. 3º). Despesa não é faturamento
(Constituição, art. 195/I, alínea “b”). “Faturamento” é a receita decorrente da venda
de serviços e/ou mercadorias.
Embora não concluído o julgamento do RE 240.785-2-MG, adota-se o voto
do relator, Ministro Marco Aurélio, no sentido da inconstitucionalidade da
inclusão do ICMS na base de cálculo da Cofins:
...A tríplice incidência da contribuição para financiamento da previdência social, a cargo do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, foi prevista tendo em conta a folha dos salários, o faturamento e o lucro.
As expressões utilizadas no inciso I do art. 195 em comento hão de ser tomadas no sentido técnico consagrado pela doutrina e jurisprudencialmente. Por isso mesmo, esta Corte glosou a possibilidade de incidência da contribuição, na redação primitiva da Carta, sobre o que pago àqueles que não mantinham vínculo empregatício com a empresa, emprestando, assim, ao vocábulo “salários”, o sentido técnico-jurídico, ou seja, de remuneração feita com base no contrato de trabalho – Recurso Extraordinário nº 128.519-2/DF.
Jamais imaginou-se ter a referência à folha de salários como a apanhar, por exemplo, os acessórios, os encargos ditos trabalhistas resultantes do pagamento efetuado. Óptica diversa não pode ser emprestada ao preceito constitucional, revelador da incidência sobre o faturamento. Este decorre, em si, de um negócio jurídico, de uma operação, importando, por tal motivo, o que percebido por aquele que a realizada, considerada a venda de mercadoria ou mesmo a prestação de serviços.
A base de cálculo da Cofins não pode extravasar, desse modo, sob o ângulo do faturamento, o valor do negócio, ou seja, a parcela percebida com a operação mercantil ou similar.
O conceito de faturamento diz como riqueza própria, quantia que tem ingresso nos cofres de quem procede à venda de mercadorias ou à prestação de serviços, implicando, por isso mesmo, o envolvimento de noções próprias ao que se entende como receita bruta. Descabe assentar que os contribuintes da Cofins faturam, em si, o ICMS. O valor deste revela, isto sim, um desembolso a beneficiar a entidade de direito público que tem a competência para cobrá-lo.
A conclusão a que chegou a Corte de origem, a partir de premissa errônea, importa na incidência do tributo que é a Cofins, não sobre o faturamento, mas sobre outro tributo já agora da competência de unidade da Federação.
No caso dos autos, muito embora com a transferência do ônus para o contribuinte, ter-se-á, a prevalecer o que decidido, a incidência da Cofins sobre o ICMS, ou seja, a incidência de contribuição sobre imposto, quando a própria Lei Complementar nº 70/91, fiel à dicção constitucional, afastou a possibilidade de incluir-se, na base de incidência da Cofins, o valor devido a título de IPI.
Difícil é conceber a existência de tributo sem que se tenha uma vantagem, ainda que mediata, para o contribuinte, o que se dirá quanto a um ônus, como é o ônus fiscal atinente ao ICMS. O valor correspondente a este último não tem a natureza de faturamento. Não pode, então, servir à incidência da Cofins, pois não releva medida de riqueza apanhada pela expressão contida no preceito da alínea “b” do inciso I do art. 195 da Constituição Federal.
Cumpre ter presente a advertência do ministro Luiz Gallotti, em voto proferido no Recurso Extraordinário nº 71.758: “se a lei pudesse chamar de compra e venda o que não é compra, de exportação o que não é exportação, de renda o que não é renda, ruiria todo o sistema tributário inscrito na Constituição – RTJ 66/165. Conforme salientado pela melhor doutrina, “a Cofins só pode incidir sobre o faturamento que, conforme visto, é o
somatório dos valores das operações negociais realizadas”.
A contrário sensu, qualquer valor diverso deste não pode ser inserido na base de cálculo da Cofins. Há de se atentar para o princípio da razoabilidade, pressupondo-se que o texto constitucional mostre-se fiel, no emprego de institutos, de expressões e de vocábulos, ao sentido próprio que eles possuem, tendo em vista o que assentado pela doutrina e pela jurisprudência. Por isso mesmo, o artigo 110 do Código Tributário Nacional conta com regra que, para mim, surge simplesmente pedagógica, com sentido didático, a revelar que:
A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios para definir ou limitar competências tributárias.
Da mesma forma que esta Corte excluiu a possibilidade de ter-se, na expressão “folhas de salários”, a inclusão do que satisfeito a administradores, autônomos e avulsos, não pode, com razão maior, entender que a expressão “faturamento” envolve, em si, ônus fiscal, como é o relativo ao ICMS, sob pena de desprezar-se o modelo constitucional, adentrando-se a seara imprópria da exigência da contribuição, relativamente a valor que não passa a integrar o patrimônio do alienante quer de mercadoria, quer de serviço, como é o relativo ao ICMS.
Se alguém fatura ICMS, esse alguém é o Estado e não o vendedor da mercadoria. Admitir ao contrário é querer, como salientado por Hugo de Brito Machado em artigo publicado sob o título “Cofins – Ampliação da base de cálculo e compensação do aumento de alíquota”, em “CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS – PROBLEMAS JURÍDICOS”, que a lei ordinária redefina conceitos utilizados por norma constitucional, alterando, assim, a Lei Maior e com isso afastando a supremacia que lhe é própria.
Conforme previsto no preceito constitucional em comento, a base de cálculo é única e diz respeito ao que faturado, ao valor da mercadoria ou do serviço, não englobando, por isso mesmo, parcela diversa. Olvidar os parâmetros próprios ao instituto, que é o faturamento, implica manipulação geradora de insegurança e, mais do que isso, a duplicidade de ônus fiscal a um só título, a cobrança da contribuição sem ingresso efetivo de qualquer valor, a cobrança considerado, isso sim, um desembolso.
...
IRPJ e CSLL. É legítima a inclusão do ICMS e do ISS na base de cálculo do
IRPJ e da CSLL, conforme decidiu o Superior Tribunal de Justiça no REsp
859.322-PR, r. Ministro Mauro Campbell Marques, 2ª Turma em 14.09.2010:
...
4. A escrituração dos créditos de ICMS caracteriza a "aquisição da disponibilidade
econômica ou jurídica de acréscimos patrimoniais", muito embora possa não significar
aquisição de disponibilidade financeira quando há restrições ao uso dos créditos adquiridos, e, portanto, permite a tributação pelo IRPJ e pela CSLL.
Compensação. “O mandado de segurança constitui ação adequada para a
declaração do direito à compensação tributária
” (Súmula 213/STJ). A compensação
será realizada de acordo com a lei vigente na época de sua efetivação (limites
percentuais, os tributos compensáveis etc), vedada antes do trânsito em julgado
(CTN, art. 170-A) - REsp 1.164.452-MG, representativo da controvérsia, r.
Ministro Teori Albino Zavaski, 1ª Seção em 25.08.2010:
...
1. A lei que regula a compensação tributária é a vigente à data do encontro de contas entre os recíprocos débito e crédito da Fazenda e do contribuinte. Precedentes.
2. Em se tratando de compensação de crédito objeto de controvérsia judicial, é vedada a sua realização "antes do trânsito em julgado da respectiva decisão judicial", conforme prevê o art. 170-A do CTN, vedação que, todavia, não se aplica a ações judiciais propostas em data anterior à vigência desse dispositivo, introduzido pela LC 104/2001. Precedentes. ...
Correção monetária e juros. Antes da vigência da Lei 9.250/1995, a
correção monetária incidia desde o recolhimento indevido (Súmula 162/STJ); e os
juros moratórios mensais a partir do trânsito em julgado (Súmula 188/STJ). Depois
da vigência da mencionada lei, os juros equivalentes à taxa selic contam-se “a
partir da data do pagamento indevido” (art. 39, § 4º), não podendo ser
cumulados com correção monetária. Nesse sentido: RESp 879.479-SP, r. Ministro
Teori Albino Zavascki, 1ª Turma do STJ:
...4. Nos casos de repetição de indébito tributário, a orientação prevalente no âmbito da 1ª Seção quanto aos juros pode ser sintetizada da seguinte forma:
(a) antes do advento da Lei 9.250/95, incidia a correção monetária desde o pagamento indevido até a restituição ou compensação (Súmula 162/STJ), acrescida de juros de mora a partir do trânsito em julgado (Súmula 188/STJ), nos termos do art. 167, parágrafo único, do CTN;
(b) após a edição da Lei 9.250/95, aplica-se a taxa SELIC desde o recolhimento indevido, ou, se for o caso, a partir de 1º.01.1996, não podendo ser cumulada, porém, com qualquer outro índice, seja de atualização monetária, seja de juros, porque a SELIC inclui, a um só tempo, o índice de inflação do período e a taxa de juros real.
Não se aplica a nova forma de cálculo de correção e de juros moratórios,
estabelecida no art. 1º-F da Lei 9.494/1997, incluído pela Lei 11.960/2009, em
virtude do princípio constitucional da igualdade:
Nas condenações impostas à Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, remuneração do capital e compensação da mora, haverá a incidência uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança.
Lei 8.177/1991:
Art. 12. Em cada período de rendimento, os depósitos de poupança serão remunerados: I - como remuneração básica, por taxa correspondente à acumulação das TRD, no período transcorrido entre o dia do último crédito de rendimento, inclusive, e o dia do crédito de rendimento, exclusive;
II - como adicional, por juros de meio por cento ao mês.