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Taxa de juros nominal negativa e o caso japonês : teoria, operacionalização e resultados

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ECONOMIA

FELIPE DA ROZ

Taxa de juros nominal negativa e o caso japonês:

teoria, operacionalização e resultados

CAMPINAS 2018

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ECONOMIA

FELIPE DA ROZ

Taxa de juros nominal negativa e o caso japonês:

teoria, operacionalização e resultados

Prof. Dr. Guilherme Santos Mello– orientador

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Teoria Econômica da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do título de Mestre em Ciências Econômicas.

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELO ALUNO FELIPE DA ROZ E ORIENTADA PELO PROF. DR. GUILHERME SANTOS MELLO.

Orientador

CAMPINAS 2018

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DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

FELIPE DA ROZ

Taxa de juros nominais negativas e o Caso

Japonês: teoria, operacionalização e resultados

Defendida em 22/02/2018

COMISSÃO EXAMINADORA

Prof. Dr. Guilherme Santos Mello - Presidente

Instituto de Economia / UNICAMP

Prof. Dr. Olivia Maria Bullio Matos

St. Francis College / NY

Prof. Dr. Lucas Azeredo da Silva Teixeira

Instituto de Economia / UNICAMP

Ata de Defesa, assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta no processo de vida acadêmica do aluno.

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Agradecimentos

A defesa desta dissertação marca um “fim" de um ciclo, tanto profissional, com o fim do mestrado, como pessoal. Não posso deixar de agradecer às pessoas que participaram da minha trajetória até o presente momento, sem as quais não estaria aqui. Desde já peço desculpas àqueles que escapam da minha memória neste momento. Em primeiro lugar, meu orientador e amigo Guilherme Mello, por sugerir um tema tão intrigante e me auxiliar nesta empreitada. Além de acalmar minha ansiedade e angústia frente aos contratempos da pesquisa, nossas conversas sobre os diversos temas de economia e política foram fundamentais para minha formação neste período.

Agradeço também a oportunidade que tive de cursar Economia na Facamp. O empenho e qualidade dos professores durante a graduação foram essenciais para que a curiosidade e o senso crítico despertassem na minha pessoa, com destaque para Olivia Bullio – professora de economia monetária e presente na banca de defesa desta dissertação. Gostaria de agradecer nominalmente aos amigos Rodrigo Sabbatini e Zeca Ruas. Além de ter tido o prazer de ser aluno de ambos, sem a oportunidade que tive de trabalhar como monitor no CEPEF talvez eu não teria migrado do meio profissional para o acadêmico.

Não posso deixar de agradecer todo o Instituto de Economia da Universidade de Campinas. Dentre os professores, tive a oportunidade de ser aluno de Giuliano Contento, Maryse Fahri, Ana Rosa, Adriana Nunes, Simone de Deos, José Carlos Braga, Célio Hiratuka, Paulo Fracalanza, Fernando Sarti, Ricardo Carneiro, Geraldo Biasoto. Agradeço também aos funcionários que com simpatia e empenho contribuem para o ótimo ambiente deste Instituto.

Deixo um agradecimento especial para os membros e professores do Centro de Estudos de Conjuntura e Política Econômica (CECON). Além de ter sido muito bem recebido, encontrei um espaço de amizade, diálogo e debates que enriqueceram (e muito) minha experiência durante o mestrado. Agradeço os professores Pedro Rossi, André Biancareli, Lucas Teixeira, Luis Lopreatto, Marcos Rocha, Pedro Paulo Bastos, Bruno de Conti; os pós-graduandos Ana, Ricardo, Flavio, Gabriel, Renato, Arthur, Nicholas, Ezequiel e Marcelo; e a funcionária do instituto Eliana.

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amizade e companheirismo fizeram com que esta experiência se tornasse muito mais prazerosa. Dentre estes, gostaria de deixar um abraço especial para Murilo, Nikolas, Caio, Tariq, Thiago, Abel, André, Herrera e Enzo.

Registro também meus agradecimentos ao CNPQ pela bolsa concedida durante meu período no mestrado.

No campo pessoal, um “obrigado" não seria suficiente para demonstrar minha gratidão à minha família pelo apoio neste período. Mesmo que com dúvidas, receio e afins, apoiaram e respeitaram minhas decisões, sempre buscando me auxiliar e aconselhar. Ao meu pai Nei, minha mãe Maribele e minhas irmãs, Carolina e Rafaela, um agradecimento com muito amor. Meus avós (Meire, Izaias, Elsa e Wagner), tios, tias e primos, sintam-se abraçados também.

Gostaria de agradecer aos meus amigos de longa data, cuja importância como válvula de escape, apoio e conselhos são indispensáveis para esta longa estrada que seguimos juntos. Dizem que os verdadeiros amigos você pode contar em uma mão. Me recuso. Tenho a alegria de acumular verdadeiras amizades ao longo dos tempos, então um salve para o pessoal de Leme (Renan, Bauer, Thiaguinho, Czar, Tui, Baga); pessoal da graduação na Facamp (Tuiu, Rafa, Biel, Serralha, Victinho, Du, Dani, Ger, Brunão, Lukinha, Picola); e da monitoria no CEPEF da Facamp (Marcinho e Claudio).

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Resumo

Pioneiro na implementação das ditas políticas monetárias não convencionais desde o estopim da Bolha Especulativa ao final dos anos 1990, o Japão passou a implementar uma política de taxa de juros nominais negativas no início de 2016. Esta dissertação tem como intuito compreender as motivações desta medida, além de seus principais resultados e efeitos colaterais. Para tanto, primeiramente busca elucidar sua fundamentação teórica, patrocinada por autores do Novo Consenso Macroeconômico, que defendem medidas ditas não convencionais em meio ao cenário de armadilha da liquidez. Paralelamente, também apresenta-se a visão de autores keynesianos como contraponto. Como a forma de operacionalização e aspectos institucionais são cruciais para que possamos analisar seus efeitos, aprofunda-se a discussão tendo o Japão como estudo de caso. Após apresentar aspectos institucionais do país em questão, passamos para a operacionalização das taxas negativas, efetuada por meio do fracionamento das reservas bancárias, e análise dos mecanismos de transmissão dessas taxas para outros mercados, o que se dá prioritariamente via arbitragem. As variadas características de bancos e instituições financeiras faz com que os impactos destas taxas de diferencie, principalmente pelo fato da facilidade de acesso de grandes bancos a ativos denominados em outras moedas e funding em dólar. Por fim, a atuação do Banco Central japonês em meio ao programa de taxas de juros nominais negativas teria efeitos colaterais sobre os mercado de ações e de títulos públicos. A principal hipótese é de que a economia japonesa vem passando por um processo de exacerbação da inflação do preço de ativos, em uma reafirmação da dinâmica que culminou na Grande Recessão. Em outras palavras, ao invés de superar o ambiente adverso, cria distorções e efeitos colaterais que induzem aos mesmos processos que caracterizaram a década passada, com destaque para o fomento de bolhas e a consequente valorização do estoque de riqueza.

Palavras chave: taxas de juros nominais negativas, política monetária não convencional,

banco central, inflação de ativos, armadilha da liquidez, canais de transmissão, economia japonesa.

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Abstract

Japan was the first country do adopt unconventional monetary policy, after the asset price bouble collapse in the 1990s. Recently, the Bank of Japan implemented a negative nominal interest rate policy in order to overcome the stagnation that last almost to decades. Aiming to understand the concerns that authors and policy makers that proposed this monetary policy and its results and side effects, the beginning of this essay focus on the theoretical aspects of negative nominal interest rate. Counterbalancing new macroeconomic consensus framework, that sponsored this monetary policy, with keynesian authors, we intend to have a better understand of liquidity trap and the proposals to overcome it. Secondly, the Japanese situation is used as case study regarding institutional and operational issues. After exploiting transmissions channels, essentially arbitrage, its possible to verify that major banks are less affected than others, mostly because of international presence and access to dollar funding with lower costs. Finally, the Bank of Japan presence increased in the past years, and aligned with negative nominal interest rates have caused collateral effects in both stock market and government bonds market. The main hypothesis of this essay consists in the intensification of the asset prices valuation, deepening the dynamic that culminated in the financial crisis.

Key words: negative nominal interest rates, unconventional monetary policy, central

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Lista de Figuras e Tabelas

FIGURA 1–PROCESSO CUMULATIVO DE WICKSEL NO MERCADO DE FUNDOS EMPRESTÁVEIS... 28

FIGURA 2–JAPÃO:ESTRUTURA DO SISTEMA FINANCEIRO, MARÇO/2016(% NO TOTAL DE ATIVOS FINANCEIROS) ... 51

FIGURA 3–COMPRA DE JGB POR PARTE DO BOJ, JAN/2010– OUT/2016 ... 53

FIGURA 4–YIELDS DOS JGB DE 10 ANOS, AGO/16– MAR/17 ... 55

FIGURA 5–EXEMPLO DE FOREIGN EXCHANGE SWAP EURO/DÓLAR ... 60

FIGURA 6–EXEMPLO DE TRANSMISSÃO DE TAXA DE JUROS NOMINAIS NEGATIVAS NO MERCADO MONETÁRIO ... 63

FIGURA 7–GAP DE RESERVAS DO MACRO ADD-ON/BASIC BALANCE E MONTANTE SOB POLICY RATE BALANCE (ABRIL/16– MAR/17),¥TRILHÕES ... 65

FIGURA 8–RESERVAS BANCÁRIAS DISCRIMINADAS DE ACORDO COM O THREE TIER SYSTEM, POR INSTITUIÇÃO (FEV/16– JAN/17),¥TRILHÕES ... 66

FIGURA 9–TAXA DE CÂMBIO YEN/DÓLAR À VISTA, FINAL DO PERÍODO (2014-2017) ... 71

FIGURA 10–US$DOLLAR FUNDING PREMIUM:DIFERENÇA ENTRE TAXA DE SWAP CAMBIAL E OPERAÇÃO CAMBIAL NO MERCADO À VISTA (2007-17) ... 73

FIGURA 11–VARIAÇÃO DO VOLUME DE EMPRÉSTIMOS (%) DOMÉSTICOS CONTRA MESMO PERÍODO DO ANO PASSADO ENTRE INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS (ESQUERDA) E POR TIPO DE EMPRESTADOR (DIREITA) ... 78

FIGURA 12–FUSÕES E AQUISIÇÕES (VOLUME E NÚMERO DE OPERAÇÕES),JAPÃO (2011-17),¥ TRILHÕES (ESQUERDA) E NÚMERO DE CASOS (DIREITA) ... 79

FIGURA 13–VARIAÇÃO ANUAL (%) DO VOLUME DE EMPRÉSTIMOS POR SETOR,JAPÃO (2012-17) ... 80

FIGURA 14–EMPRÉSTIMOS DENOMINADOS EM MOEDA EXTERNA E POR FILIAIS NO EXTERIOR,2010-17, (US$ BILHÕES) ... 81

FIGURA 15–JAPÃO:PIB E SEUS COMPONENTES DE DEMANDA, REAL E COM AJUSTE SAZONAL (%, TRIMESTRE CONTRA TRIMESTRE DO ANO ANTERIOR) ... 83

FIGURA 16–JAPÃO:EXPECTATIVAS INFLACIONÁRIAS (%,1 E 3 ANOS) E TAXA DE INFLAÇÃO (%, ÍNDICE CHEIO E EXCETUANDO ALIMENTOS E ENERGIA),MARÇO/14–DEZEMBRO/17) ... 84

FIGURA 17–JAPÃO, ÍNDICE BOLSA DE VALORES,NIKKEI 225(JAN/2000– DEZ/2017) ... 89

FIGURA 18–MONTANTE DE AÇÕES RETIDAS POR INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS,¥TRILHÕES,JAPÃO (2006-16) ... 90

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FIGURA 19–MONTANTE DE AÇÕES DE INVESTMENT TRUSTS RETIDAS POR INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS,¥

TRILHÕES,JAPÃO (20016-16) ... 91

FIGURA 20–GANHOS E PERDAS REALIZADOS COM RETENÇÃO OU VENDA DE TÍTULOS,¥TRILHÃO,JAPÃO (2001-16) ... 92

FIGURA 21–GANHOS E PERDAS REALIZADOS COM RETENÇÃO OU VENDA DE AÇÕES,¥TRILHÃO,JAPÃO (2001-16) ... 92

FIGURA 22–GANHOS E PERDAS NÃO-REALIZADOS COM RETENÇÃO OU VENDA DE AÇÕES, GRANDES BANCOS,¥TRILHÃO,JAPÃO (2010-16)... 93

FIGURA 23–GANHOS E PERDAS NÃO-REALIZADOS COM RETENÇÃO OU VENDA DE AÇÕES, BANCOS REGIONAIS,¥TRILHÃO,JAPÃO (2010-16) ... 94

TABELA 1–SISTEMA THREE-TIER PARA RESERVAS BANCÁRIAS ... 61

TABELA 2–EXEMPLO POLICY RATE HIPOTÉTICO (¥ TRILHÕES) ... 64

Sumário

RESUMO ... 7

ABSTRACT ... 8

LISTA DE FIGURAS E TABELAS ... 9

SUMÁRIO ... 10

PROBLEMATIZAÇÃO ... 12

OBJETIVOS E ESTRUTURA ... 14

CAPÍTULO 1 – ARMADILHA DA LIQUIDEZ, SUAS DIFERENTES CONCEPÇÕES E PROPOSTAS DE SUPERAÇÃO ... 16

INTRODUÇÃO ... 16

1.1 CONCEITO DE ARMADILHA DA LIQUIDEZ ... 17

1.1.1KEYNES E A ARMADILHA DA LIQUIDEZ ... 18

1.1.2HICKS E O MODELO IS-LM ... 25

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1.2 PROPOSTAS DE SUPERAÇÃO ... 31

1.2.1A ABORDAGEM DE KEYNES E DOS PÓS-KEYNESIANOS ... 31

1.2.2MAINSTREAM E AS EXPECTATIVAS INFLACIONÁRIAS... 37

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 42

CAPÍTULO 2 - SISTEMA FINANCEIRO JAPONÊS E AS TAXAS DE JUROS NOMINAIS NEGATIVAS ... 43

INTRODUÇÃO ... 43

2.1 INSTITUCIONALIDADE DO SISTEMA FINANCEIRO JAPONES ... 48

2.2 BOJ E SUAS POLÍTICAS MONETÁRIAS NÃO-CONVENCIONAIS ... 51

2.3 TAXAS DE JUROS NOMINAIS NEGATIVAS: OPERACIONALIZAÇÃO E O AJUSTE DO SISTEMA FINANCEIRO... 56

2.3.1MERCADOS SECUNDÁRIOS - ASPECTOS GERAIS ... 56

2.3.2OPERACIONALIZAÇÃO – O THREE TIER SYSTEM ... 61

2.3.3RESPOSTA DO SISTEMA FINANCEIRO JAPONES ... 65

2.4 TRANSMISSÃO PARA OUTROS MERCADOS ... 68

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 75

CAPÍTULO 3 – EFEITOS MACROECONÔMICOS DA POLÍTICA DE JUROS NOMINAIS NEGATIVOS ... 77

INTRODUÇÃO ... 77

3.1 LUCRATIVIDADE BANCARIA E A EXPANSÃO DO CREDITO ... 77

3.2 TÍTULOS PÚBLICOS, MERCADO ACIONÁRIO E GANHOS DE CAPITAL ... 85

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 96

CONCLUSÃO ... 98

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Introdução

Problematização

Os anos 1990 foram marcados pela elevada turbulência internacional devido à sequência de crises deflagradas nos países em desenvolvimento, com destaque para os episódios na Rússia, Ásia e América Latina. Destoando do agrupamento de países que passaram por situações recessivas, o Japão foi o único país desenvolvido a enfrentar uma profunda crise na década em questão. Após décadas de prosperidade, em meio ao chamado Milagre Japonês (1955-70), o arrefecimento do crescimento nos anos 1980 e questões geopolíticas fizeram com que o país adentrasse em um processo de liberalização financeira. Dentre os efeitos deste movimento, destaca-se a maior presença de investidores externos no mercado financeiro japonês, induzindo a um processo de aumento de preços no mercado de ações, e o acirramento da concorrência no setor bancário do país em questão, visto que a possibilidade de investimento dos residentes se expandiu. Como consequência, os bancos comerciais acabam se voltando para o setor imobiliário, causando um intenso ciclo de aumento de preços neste mercado. Esta dinâmica de inflação do preço de ativos no Japão, chamada Bolha Especulativa, já dava sinais de arrefecimento em 1988, mas apenas no início de 1992 o ciclo se rompe de fato com o estouro da bolha.

A situação do Japão ganhou destaque entre economistas pelo fato de que a crise se deu em um cenário em que a taxa de juros nominal de curto prazo já se encontrava em patamares muito baixos. Dentre estes, destaca-se a corrente teórica do dito Novo Consenso Macroeconômico (NCM), dominante nos corpos técnicos dos Bancos Centrais dos principais países do mundo. Frente a incapacidade de utilização da política monetária “convencional” de redução da taxa de juros de curto prazo, autores do NCM passam a discutir o que caracterizaria uma situação de Armadilha da Liquidez, até então considerada apenas uma possibilidade teórica, e propor políticas para sua superação. Tem início a implementação das ditas políticas monetárias não convencionais.

A eclosão da Grande Recessão em 2008 inaugura um novo período para a teoria monetária, visto que seus impactos e sua profundidade exigiu uma rápida resposta das autoridades monetárias frente ao espraiamento dos efeitos adversos sobre os mais diversos mercados. Tomando como exemplo o caso norte-americano, o Fed reduziu a

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taxa de juros de curto prazo de 5,25% ao ano (setembro de 2007) para 0% (dezembro de 2008). Com a insuficiência da política monetária “convencional”, ou seja, variação da taxa de juros de curto prazo via operações no open market, as das ditas políticas monetárias não convencionais se espraiam pelas principais economias do mundo. Dessa forma, a Grande Recessão fez com que boa parte das propostas de política monetária não-convencional fomentadas a partir do caso japonês se alastrassem mundo afora, sofrendo mutações e se adaptando às especificidades de cada país.

A política monetária que desponta como principal expoente dessa nova onda são os ditos programas de Quantitative Easing (QE) parte de propostas para que o Japão superasse sua armadilha de liquidez. Inicialmente, os QEs visavam a compra de ativos com o objetivo de promover a expansão da base monetária (por isso são chamados de “flexibilização quantitativa”, ou seja, o enfoque era na quantidade de moeda), induzindo o aumento de preços (inflação) e a expansão do crédito para estimular a economia. Antes mesmo da eclosão da Grande Recessão, a timidez da reação da economia japonesa fez com que estes programas já sofressem revisões. Enquanto inicialmente o intuito principal do QE seria a expansão da base monetária, aspectos qualitativos ganham proeminência. Em outras palavras, as caraterísticas do ativo alvo do Banco Central também importaria, afetando de maneira distinta expectativa dos agentes e a curva de juros (Bernanke e Reinhart, 2004). Nesta linha, com intuito de influenciar expectativas dos agentes a influência destes programas na taxa de juros de longo prazo se torna um de seus objetivos declarados.

Após a Grande Recessão, os programas QEs passaram a ser implementados das mais diversas formas em diferentes países, envolvendo títulos públicos e privados de maturidades distintas, com anúncios prévios de montantes mensais ou anuais, chegando ao extremo de envolver a compra ilimitada de ativos para atingir certa taxa de juros pré-determinada (política implementada no Japão em outubro/2016). Além do QE, variadas medidas de política monetária tinham como principal intuito influenciar as expectativas dos agentes quanto a taxa de juros e de inflação no futuro. Chamada de forward guidance por teóricos do NCM, as mais diversas medidas de política monetária (o anúncio de metas de inflação agressivas, a indução de desvalorização cambial, e até mesmo o efeito de programas de QE sobre as expectativas) seriam essenciais para superação da armadilha da liquidez.

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A implementação destas medidas não convencionais de política monetária, impensáveis antes da Grande Recessão, não foram suficientes para que economias desenvolvidas engatassem uma trajetória consistente de recuperação econômica. Frente à ineficácia das ações implementadas, após o Banco Central Europeu e outros países do norte da Europa terem adotado taxas de juros nominais negativas entre 2012 e 2014, o Japão adota esta política no início de 2016. Acreditava-se que ao superar o ZLB, levando as taxas para o âmbito negativo, a política monetária convencional recuperaria sua funcionalidade, permitindo a superação da armadilha da liquidez.

Objetivos e estrutura

Buscando aprofundar a discussão sobre as taxas de juros nominais negativas esta dissertação utiliza a situação do Japão como estudo de caso. Conforme destacado, a economia japonesa já possui um longo histórico de políticas monetárias não convencionais e um sistema financeiro bem desenvolvido e internacionalizado. Portanto, considera-se que além de contribuir para uma melhor compreensão das taxas nominais negativas, um estudo de caso deste país pode contribuir com considerações relevantes quanto às relações deste tipo de política monetária junto ao sistema financeiro internacional.

Dessa forma, para discutir quais foram os efeitos das taxas de juros nominais negativas, este trabalho pretende compreender os componentes teóricos que embasaram esta proposta de política monetária. Além disso, é crucial distinguir as especificidades da forma de operacionalização e, paralelamente, os aspectos institucionais que permeiam seus mecanismos de transmissão.

Visando alcançar estes objetivos, esta dissertação está dividida em três capítulos. No primeiro capítulo, busca-se elucidar as bases teóricas das propostas de taxas de juros nominais negativas. Para isso, fez-se necessário reconstruir o debate que circunda o conceito de armadilha da liquidez, onde se optou por apresentar o que caracterizaria uma situação de armadilha da liquidez nas concepções de keynesianos e do Novo Consenso Macroeconômico acerca do conceito, além das especificidades da incorporação de Hicks (1937) no arcabouço IS-LM. Em seguida aborda-se as diversas propostas de superação da AL para estas escolas de pensamento, com destaque para as taxa de juros nominais negativas.

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No segundo capítulo parte-se para a análise do caso japonês propriamente dito. Após apresentar peculiaridades institucionais quanto ao seu sistema financeiro e reconstituir o histórico de políticas monetárias não convencionais do país, busca-se apresentar a forma de operacionalização das taxas de juros nominais negativas, seus efeitos distintos sobre as principais instituições financeiras e a forma como as taxas se transmitiram para o mercado monetário de curto prazo, mercado cambial e mercado de títulos privados.

Por fim, o terceiro capítulo busca elucidar, além dos mecanismos de transmissão, aspectos da atuação do BoJ nos diferentes mercados de moeda e títulos, assim como efeitos colaterais provocados por tais intervenções. Finalmente, a última sessão compreende uma conclusão e comentários gerais.

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Capítulo 1 – Armadilha da liquidez, suas diferentes

concepções e propostas de superação

Introdução

O estouro da Grande Recessão de 2008 foi um ponto de inflexão para a economia global nos anos subsequentes. Tendo como epicentro nos Estados Unidos, sua capacidade de espraiamento e profundidade podem ser comparados apenas à Crise de 1929, com diversos efeitos adversos: recessão, desemprego, deflação, protecionismo, dentre outros. Considerada inesperada por grande parte dos economistas e governos, a crise exigiu uma resposta rápida e eficaz frente aos seus riscos de aprofundamento. Neste contexto, as discussões acerca de políticas econômicas anticíclicas ganham relevância e dominam o debate público. Economistas do dito mainstream econômico, dominado por correntes teóricas caracterizadas como Novo Consenso Macroeconômico (NCM) desde os anos 1980, já vinham discutindo situações recessivas e de baixas taxas de juros desde o estouro da bolha especulativa no Japão. Apesar de algumas propostas de política fiscal, amplamente defendidas por autores keynesianos, terem sido utilizadas, sua adoção foi marginal e, quando implementadas, muito breves. Foram as ditas políticas monetárias não-convencionais, patrocinadas pelo NCM, que protagonizaram grande parte das políticas econômicas anticíclicas mundo afora.

Com diversas facetas e especificidades, indo desde os Quantitative Easings até a adoção de taxas de juros nominais negativas, estas políticas foram implementadas tendo como pano de fundo comum a dita armadilha da liquidez. Esta situação seria caracterizada por cenários recessivos, sob risco de deflação, em que a taxa nominal de juros de curto prazo perderia sua eficácia de estimular a atividade econômica. Nesse sentido, as políticas monetárias não convencionais defendidas pelo mainstream teriam como condicionante esta armadilha, reconhecida apenas após a crise japonesa dos anos 90. Portanto, para compreendermos o contexto em que as taxas de juros nominais negativas foram defendidas e implementadas, objetivo principal deste trabalho, consideramos essencial o entendimento das especificidades do contexto que teria levados autores do mainstream a defenderem este tipo de política, visto que esta corrente teórica é predominante na direção dos Bancos Centrais dos principais países desenvolvidos. Para tanto, este capítulo visa comparar as visões de keynesianos,

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corrente teórica que propôs o conceito de armadilha da liquidez, e de autores do NCM. A partir das diferentes percepções sobre o que caracterizaria esta situação, permitindo uma percepção mais detalhada sobre o que a caracteriza, aborda-se as distintas propostas de superação, destacando semelhanças e diferenças dentre os autores em questão.

1.1 Conceito de armadilha da liquidez

O debate econômico sobre armadilha da liquidez não é propriamente novo. Keynes, no seu Treatise on Money (1930), já abordava teoricamente a hipótese que foi intitulada “armadilha da liquidez” (AL). Posteriormente, Hicks (1937) adapta o conceito keynesiano ao seu aparato teórico conhecido como IS-LM, subvertendo alguns pressupostos de Keynes, mas criando certamente a versão mais difundida do conceito de AL até o presente momento.

Apesar de teoricamente possível, a armadilha da liquidez só ganhou importância no debate do mainstream na década de 1990, quando a crise japonesa levou as taxas de juros próximas a zero, sem impactar a taxa de inflação e a atividade econômica. Diante deste cenário, Krugman et al (1998) apresenta sua própria leitura sobre o cenário japonês, sugerindo um conceito de AL mais próximo da literatura dos novo-keynesianos, fundada no debate acerca da credibilidade da autoridade monetária. Este texto dá origem ao que ficou conhecido como “Zero Lower Bound Economics” (ZLB), a ideia de que existe um limite inferior da taxa de juros nominais que impediria a saída de uma situação de AL. A promessa era que, uma vez contornada a limitação imposta pela necessidade de taxas nominais positivas de juros, seria possível escapar do cenário de AL em retomar a trajetória de crescimento de longo prazo.

O debate teórico é alçado a um novo patamar quando alguns Bancos Centrais ao redor do mundo passam a adotar taxas nominais negativas de juros sobre as reservas bancárias como forma de tentar superar a crise instaurada em 2008, eliminando parcialmente as barreiras encontradas pelos autores que discutiam a hipótese de ZLB. A partir deste momento, se inicia uma nova discussão acerca dos impactos da política de “Negative Nominal Interest Rates” (NNIR) que, apesar de ainda se encontrar em seus primórdios, já aponta para novos obstáculos para a utilização da política monetária como forma de promover uma recuperação econômica em cenários de AL.

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Visando reconstruir o debate acima descrito, essa seção se divide em duas partes. Na primeira, desenvolve-se o conceito de AL, tanto na versão de Keynes quanto na desenvolvida por Hicks, ilustrando seu embasamento teórico e as propostas para sua superação, até chegarmos na versão de Krugman, que avança para a discussão do ZLB, colocando o limite inferior positivo da taxa de juros como uma “rigidez” que, caso corrigida, retiraria as economias do cenário de AL. Na segunda seção, discute-se as hipóteses sugeridas e adotadas para contornar os cenários de AL e ZLB até se alcançar a NNIR, fazendo-se uma comparação das propostas existentes desde Keynes até as estratégias utilizadas pelos bancos centrais na crise recente.

1.1.1 Keynes e a armadilha da liquidez

Conforma já dito, é a construção teórica de Hicks (1937), a partir do arcabouço do IS-LM, que concentrou a discussão sobre a AL. Ainda que o modelo IS-LM reconheça situações de AL e atribua sua fundamentação ao conceito de preferência pela liquidez, esta construção é radicalmente diferente daquela proposta por Keynes (1936). Portanto, tanto a percepção distorcida do conceito de preferência pela liquidez quanto a incorporação equivocada do que seria a eficiência marginal do capital contribuem para que o conceito original da AL seja mal compreendido no debate acadêmico até os dias atuais.

Entre a passagem do Treatise on money (1930) para a Teoria Geral (1936), Keynes amadureceu estes dois conceitos fundamentais que revolucionariam a teoria monetária: a preferência pela liquidez e a eficiência marginal do capital (Kregel, 2014, p.2). Tais conceitos constituem a base da radical mudança de perspectiva de Keynes em relação ao paradigma neoclássico, em particular acerca das decisões de investimento. A preferência pela liquidez estaria associada à incerteza em relação ao futuro – caso os agentes estejam em um baixo estado de confiança quanto ao futuro, acalmariam suas inquietações ao migrar de ativos menos para mais líquidos. Por outro lado, a eficiência marginal do capital, aspecto central para determinação do investimento, estaria centrada na concepção de expectativas de demanda futura descontadas pela taxa de capitalização. Dessa forma, além da decisão de investimento ser influenciada diretamente pela prospecção de demanda, englobaria também o grau de incerteza

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cristalizado pela taxa de capitalização, que por sua vez seria balizada pela preferência pela liquidez.

Ainda assim, a apresentação de Keynes seria recheada de “detalhes extraviados e ausências conspícuas”, segundo Macedo e Silva (2006). A começar pelas diferentes apresentações quanto a taxa de juros. Em um primeiro momento (capítulos 13 a 15), Keynes teoriza sobra “a” taxa juros como sendo o preço que equilibra o desejo de reter riqueza na forma dinheiro em contraposição com a aquisição de títulos, dada uma quantidade de moeda1. Esta concepção de preferência pela liquidez estaria centrada no

motivo especulação, que sofreria influência direta da expectativa de taxa de juros – caso seja esperada uma redução desta taxa, compro títulos (bulls); caso seja esperada um aumento, vendo títulos (bears). Segundo Macedo e Silva, esta construção estaria presa a uma lógica de fluxo em que um indivíduo representativo não-financeiro (household) sintetiza a tomada de escolha. Portanto, seria um tanto quanto contraditório em meio a uma economia empresarial, monetária e financeira a ausência de instituições financeiras mais desenvolvidas. Esta simplificação seria, segundo este autor, uma estratégia de Keynes para dialogar com os economistas do mainstream da época, além do fato de que, ao não incluir firmas financeiras, a oferta de moeda é mantida constante, visto que pressupõe-se que a oferta de moeda é exógena.

A dualidade entre moeda e títulos também traria um caráter minimalista para a elaboração da TG. Ainda assim, algumas passagens na teoria geral e a construção teórica do Treatise indicam que Keynes tinha em mente as diversas possibilidades de alocação da riqueza, cada qual com atributos específicos.

No capítulo 17 da Teoria Geral a teoria da preferência pela liquidez é analisada sob uma ótica distinta, quando se apresenta o funcionamento de uma economia monetária da produção centrado na escolha de portfólio por parte dos agentes. Todos os ativos possuiriam quatro atributos: quase-renda; variação de preço; custo de carregamento e liquidez. Por exemplo, um bem de capital possuiria o atributo quase renda em destaque, enquanto uma commodity poderia ter como característica principal sua variação de preço. A moeda teria papel especial por cristalizar o atributo liquidez, referencial para todos os outros ativos. Dessa forma, qualquer alocação de portfólio

1 “It is the “price” which equilibrates the desire to hold wealth in the form of cash with the available

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teria estes atributos em vista para tomada de decisões. Ainda assim, mesmo que aquele agente representativo passe a alocar sua riqueza em diversos ativos de acordo com suas características, dando ênfase ao estoque de riqueza, “há uma ausência conspícua: das instituições financeiras e do crédito” (Macedo e Silva, 2006, p.10). Novamente, este autor busca justificar esta escolha tendo em vista a forma de apresentação adotada por Keynes. Os “procedimentos simplificadores e equilibristas” exigiriam a exclusão das instituições financeiras, permitindo uma análise de como se daria a alocação de portfólio com dada oferta de moeda.

Por mais que Keynes tenha simplificado elementos essenciais que caracterizam uma economia monetária da produção, o conceito de preferência pela liquidez já estava inserido como aspecto central dos ciclos econômicos. Ao considerar que vivemos sob incerteza radical, um grau de confiança deteriorado em relação ao futuro faria com que o atributo liquidez adquirisse papel de destaque em detrimento aos outros atributos dos ativos. Tais considerações constituem o cerne da armadilha de liquidez proposta por Keynes. Segundo ele, uma economia se encontraria nesta situação quando, partindo de um cenário recessivo:

“There is the possibility, for reasons discussed above, that, after the rate of interest has fallen to a certain level, liquidity-preference may become virtually absolute in the sense that almost everyone prefers cash to holding a debt which yields so low rate of interest” (Keynes,

1936, p. 207)

É importante destacar que o autor é explícito ao afirmar que a questão chave para tal situação não é tanto o nível em si da taxa de juros, mas “the degree of its divergence from what is considered a fairly safe level” (ibid, p.201). Esse grau de divergência aumentaria a demanda por moeda através de duas frentes. Em primeiro lugar, se a taxa de juros fosse reduzida, mas aquela considerada “segura” não segue o mesmo rumo, a percepção de risco de iliquidez, já poluído pelo cenário recessivo, aumentaria, elevando a demanda por moeda e reduzindo a procura por títulos. Dito de outra forma, os agentes esperam que a taxa irá subir no futuro (taxa de mercado cai, mas expectativa quanto à taxa futura se mantém inalterada), induzindo agentes a venderem títulos – bear market. Em segundo lugar, Keynes aponta que quanto mais baixa a taxa de juros, maior o prêmio de seguro para compensar o risco de perda de capital, apontado como “the difference between the squares of the old rate of interest

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and the new” (ibid, p. 202). Essa questão, conhecida na literatura financeira como a duration2 de um título, é decisiva para compreender o conceito de AL em Keynes, pois

aponta para a centralidade da precificação dos estoques de riqueza como causa do cenário de AL.

O cálculo do duration modificado, que compreende a regra do quadrado da taxa de juros citada por Keynes, explicita a relação inversa entre o capital já investido e o cupom de retorno.3 Paralelamente a um maior rendimento do cupom, o aumento da

taxa de juros promove uma desvalorização no preço do título. Portanto, quanto menor a taxa de juros, maior o duration e mais tempo para recuperar perdas de capital por meio do reinvestimento dos rendimentos (Kregel, 1998). Como o conceito de preferência pela liquidez seria relativo4, a AL dependeria das expectativas quanto ao

preço dos títulos no futuro, fundada na volatilidade recente da taxa de juros. Em cenários de taxas de juros baixas a perspectiva de perda patrimonial decorrente de pequenos aumentos nos juros para o portador de um título pré-fixado faz com que a possibilidade de recuperação dos prejuízos se estenda por vários anos, mesmo com o reinvestimento das receitas de juros. Vale destacar que por mais que esta situação seja mais propensa a ocorrer em baixas taxas de juros, nada impede que uma AL se instale a taxas mais elevadas. Esta concepção é ressaltada por Kregel:

“Thus, the lower the rate of interest, the higher the bond's duration and the longer it takes to recover the fall in capital values from the increased reinvestment earnings (…) However, it should be clear that this does not rule out the existence of a liquidity trap at higher rates” (Kregel, 1998,

p.130, grifo nosso)

Portanto, ainda que a AL seja muito mais factível em cenários com baixas taxas de juros devido aos riscos mais elevados quanto à perda de capital, nada impede que ela ocorra a taxas altas. Tanto a relatividade da discrepância em relação à taxa

2 O exemplo proposto por Keynes indica que uma taxa de juros de longo prazo de 4% ao ano exigiria

que esta não sofresse um aumento maior do que 0,16% ao ano. Considerando taxas menores, essa variação teria que ser muito mais baixa. A uma taxa de 2% ano só compensaria manter recursos ilíquidos se ela aumentasse apenas 0,04% - para qualquer valor acima disso seria melhor reter liquidez.

3 O cupom de retorno, também chamado de yield nominal, consiste na taxa de retorno do título assim que é emitido. Por outro lado, o yield corrente incorpora a variação no preço do ativo em meio às transações no mercado secundário. Por exemplo, um título de $1000 com cupom que paga $70 anualmente tem um cupom ou yield nominal de 7%. Caso seja transacionado por $900, seu yield corrente passa a ser de 7,8% ($70/ $900).

(22)

considerada “segura” quanto a volatilidade do período recente da taxa de juros influenciam o grau de preferência pela liquidez em qualquer nível de taxa de juros.

Por mais que Keynes desenvolva conceitos fundamentais para revolucionar a teoria monetária, sua construção teórica compreenderia simplificações que dificultam a utilização analítica do conceito de AL nos dias atuais. Conforme já destacado acima, Macedo e Silva (2006) enfatiza a ausência das instituições financeiras na análise, a oferta de moeda exógena e a dualidade entre títulos-moeda. Neste sentido, consideramos que a contribuição de Minsky permite uma análise mais profunda das inter-relações em uma situação de AL nos tempos atuais. Sua construção teórica, ao incorporar aspectos financeiros negligenciados por Keynes, se faz essencial para os capítulos subsequentes desta dissertação, quando abordaremos os efeitos das taxas de juros negativas sobre a forma de atuação de instituições financeiras e seus efeitos sobre investimentos produtivos.

Responsável pelo intitulado Wall Street Paradigm, Minsky teve grande contribuição para a teoria keynesiana por destacar a formação de passivos em meio à alocação de portfólio. Portanto, enriquece o modelo minimalista de Keynes do capítulo 17 tendo em vista a criação de passivos: toda aquisição de ativo deve, necessariamente, compreender uma forma de financiamento – seja via recursos próprios, seja emitindo dívidas. Com este movimento Minsky, reintroduz a endogeneidade da moeda já presente no Treatise on Money (1930), recuperando e enfatizando aspectos quanto ao sistema bancário, instituições financeiras e crédito, de modo que a possibilidade de alocação de riqueza se expande muito além da dualidade moeda/títulos. Consequentemente, a compreensão das questões monetárias sob uma ótica pós-keynesiana dos tempos atuais encontra neste autor elementos fundamentais.

Outro aspecto da teoria minskyana que merece destaque tendo em vista a AL é sua teoria de dois preços. Segundo este autor, Keynes estaria preso em uma standard interest-rate terminology (Minsky, 1976, p.98) – o que possivelmente seria um importante fator para interpretações equivocadas de sua teoria. Dessa forma, Minsky propõe substituir a análise via eficiência marginal do capital pelo preço de demanda de

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ativos de capital (Pk5) e o preço de oferta de capital (Pi6). Por mais que a constituição do

Pk seja similar à da eficiência marginal do capital, a taxa de desconto sobre o rendimento

esperado estaria mais explícita7.

A eficiência marginal do capital consistiria na taxa de desconto resultante da expectativa de retorno do investimento (Q’s) trazida a valor presente frente a custo de reposição do capital8 - ou seja, o output seria uma taxa de capitalização. A alternativa

proposta por Minsky consistiria na estimação do preço do ativo em questão, tendo em vista não seu valor de mercado, mas a forma que o investidor individual precifica seu investimento. Para tanto, seria utilizada uma taxa de desconto superior à taxa de juros de mercado, visto que ao investir abre-se mão da liquidez, trazendo a estimativa de retorno a valor presente. Em suma, a partir do Pk, seria mais perceptível a relação entre

a liquidez do ativo e o grau de liquidez da economia como um todo (liquidity premium on money) no período em questão (Michl, 2010).

Enquanto a eficiência marginal do capital seria contraposta à taxa de juros de mercado para que o investidor decida aportar recursos ou reter liquidez, Minsky propõe uma comparação entre Pk e Pi. Caso Pk>Pi, o investidor tende a realizar o investimento.

As expectativas subjetivas em relação ao futuro enfatizadas por Keynes seriam condensadas tanto na prospecção esperada como no grau de liquidez, sujeitas a bruscas variações. Com um sentimento generalizado de queda de risco, o value of liquidity atribuído para cada ativo tende diminuir – este menor grau de incerteza acabaria se revertendo em um aumento do Pk.

“It is preferable to the liquidity-preference function because it quite clearly generates prices for items in the stock of capital assets and financial assets; it also is preferable because, as it has been derived, the

5Pk = K(M, q, c*- c), onde M é a oferta de moeda; q são os retornos esperados; c* são títulos emitidos

e c são as obrigações de pagamento; juntos, (c*-c) é a estrutura de passivo como um todo. Michl (2010) propõe outra forma de formalização: Pk=∑(δQ), onde δ=1/(1+i+η)t; sendo que i é a taxa de juros monetária (de mercado), η é o prêmio de risco (incerteza) e t os períodos em questão.

6 Onde Pi=Q(Kn/Yn)/(1+rn), onde Q é o rendimento esperado (que depende da escassez de capital) e r é a taxa de capitalização do investimento. Segundo Minsky, seus produtores incorporam o custo de financiamento e o custo de oportunidade de outros ativos de mercado para precificar os ativos de capital.

7 “First of all, the Q’s are not submerged, as in the alternative approach; second, the capitalization

factor, which can have a varying ratio to the market rate of interest on secure loans because of the different values placed upon liquidity, is explicitly considered” (Minsky, 1976, p.99)

8 “Given these yields, and given a known supply price for the capital asset, there arises a discount rate

that equates the discounted value of the yields to the supply price that Keynes calls the “marginal efficiency of capital”” (Michl, 2010, p.8)

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Pk function includes in the valuation of assets their ability to generate cash by sale—i.e., their liquidity. Inasmuch as the premium which units will pay for this ability to generate cash will vary, the ability of monetary changes to affect the economy becomes dependent upon what is happening to liquidity premiums” (Minsky, 1976, p.88)

Em suma, Minsky incorpora dois aspectos quanto à incerteza tendo em vista o financiamento do investimento: a fixação das obrigações de pagamento do financiamento antes da maturação do investimento, mesmo quando a expectativa de retornos não é concretizada; o pagamento destas obrigações está em concorrência com outros ativos financeiros (Dymski, 1997). Portanto, fatores que impactam sobre o mercado financeiro afetam tanto determinações dos empreendedores quanto a propensão dos financiadores para conceder recursos. Os mercados financeiros e o investimento produtivo são muito mais correlatos, favorecendo o boom e a crise. Investimentos via ativos reprodutíveis ou mercado mercado acionário9 envolvem tanto

expectativas de retorno quanto a emissão de dívidas ou utilização de recursos próprios, reduzindo o grau de liquidez da instituição. Caso a operação seja bem sucedida, a valorização das ações da empresa em questão por si só já reduz sua iliquidez, visto que os emprestadores veem com bons olhos a operação e não há um aumento do risco do empréstimo.

Por mais que as construções de Keynes e Minsky não se diferenciam tanto em tempos normais10, em meio à AL a análise via Pk permite diferenciações importantes.

Neste cenário, o atributo liquidez alcançaria níveis extremamente elevados, enquanto a liquidez interna dos ativos cairia abruptamente, fazendo com que a habilidade de gerar recursos pela venda de ativos financeiros se deteriore. Dito de outra forma, com a intensificação do desejo de reter moeda os ativos se tornam menos líquidos, visto que a possibilidade de serem transacionados rapidamente sem grandes desvalorizações de preço é corroída. Além do fato de investimentos realizados previamente não terem suas expectativas de retorno concretizadas, efeitos positivos sobre a estrutura de passivo também não ocorrem: “the desired improvement in balance sheets will not be realized,

9“decision to acquire second-hand capital goods - and to acquire control over other corporations”

(Minsky, 1976, p.86)

10 “A stimulative monetary policy will lower the monetary rate of interest. In Keynes’s account, this

will make it economic to invest in more projects that support a lower marginal efficiency of capital. In Minsky’s account, the lower monetary rate will increase the discounted value of future yields and make economic the purchase of more capital assets of given supply price” (Michl, 2010, p.9)

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and a recursive debt-income deflationary process could be triggered” (Minsky, 1976, p.113). Nestas situações, o Pk sofre profunda baixa, com os fundos internos antecipados

sendo utilizados para quitar dívidas. Caso se situe abaixo do preço de oferta de investimento, estabelece-se uma situação de AL. Segundo Minsky, “even if the interest rate on financial assets continues to fall as the supply of money is increased, the

capitalization rate applied to investment assets may not rise by enough to induce investment” (ibid, p.113, grifo nosso).

Em outras palavras, a política monetária é incapaz de induzir o investimento, visto que não consegue influenciar a taxa de desconto dos investidores, poluída pelo grau de incerteza extremado. É importante destacar novamente que esta conceituação de AL não está necessariamente correlacionada com o ZLB, visto que o cerne da questão estaria na expectativa dos agentes e sua preferência pela liquidez, e não propriamente o nível da taxa de juros em si11. Ademais, podemos condensar a AL keynesiana na

situação em que o nível de preferência pela liquidez é tão extremo que os agentes não se desprendem de ativos líquidos. Quanto mais baixa a taxa de juros, maior a expectativa de sua reversão e, seguindo o cálculo do duration, maior a perda de capital devido à variação de preço dos ativos.

1.1.2 Hicks e o modelo IS-LM

O modelo IS-LM teria sido exposto por Hicks em seu texto “Mr. Keynes and the classics” (1937), quando desenvolve a interpretação adotada pelo mainstream até os dias atuais sobre o que seria a teoria keynesiana. Neste texto, o autor negligencia as três principais contribuições de Keynes (princípio da demanda efetiva, teoria da preferência pela liquidez e incerteza radical), considerando que o único aspecto que mereceria destaque seria o cenário de “economia da depressão”. Dessa forma, incorpora o conceito de AL em uma teoria dita “geral”: quando o produto se distancia do ponto ponto de pleno emprego no curto prazo, valeria a concepção de Hicks quanto à teoria

11“Monetary policy will quite possibly be rendered impotent even before it reaches the ZRB, for the

inability to affect the interest rate is not the differentia specifica of a Minskian liquidity trap” (Michl, 2010, p.10).

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keynesiana (LM horizontal e AL) e no longo prazo valeria novamente o “caso clássico” - LM vertical e equilíbrio entre oferta e demanda.

No arcabouço do IS-LM, a taxa de juros real seria determinada pela produtividade do capital (físico) e pela decisão de consumir – curvas de oferta e demanda, respectivamente. A taxa de juros nominal é determinada no mercado de capitais, em um trade off entre liquidez presente e liquidez futura (Carvalho, 1999). Em meio a AL, a política monetária seria inócua pelo fato de que os ajustes do nível de preços por si só não permitem a estabilização da economia no pleno emprego, visto que moeda e títulos se tornam substitutos perfeitos – LM horizontal (Akram, 2016). Portanto, a incapacidade do BC influenciar as taxas de juros de mercado anularia os efeitos esperados para retirar a economia da recessão. Segundo o autor,

“In an extreme case, the shortest short-term rate may perhaps be nearly zero. But if so, the long-term rate must lie above it, for the long rate has to allow for the risk that the short rate may rise during the currency of the loan, and it should be observed that the short rate can only rise, it cannot fall” (Hicks, 1937, p.155, grifo

nosso)

A taxa de juros de longo prazo é vista como a expectativa futura das taxas curtas, que seriam resultantes da oferta e demanda de capital monetário. Como a taxa longa se mantém em um patamar superior à de curto prazo, a expectativa dos agentes é de aumento da taxa curta. Com isso, Hicks também tem em mente o risco de perda de capital apontado por Keynes.

Portanto, podemos notar que a debilidade da política monetária devido ao risco de retenção de títulos frente à expectativa de aumento da taxa de juros de curto prazo é comum nas concepções de AL de Keynes e Hicks. Também é comum a concepção de que a AL seria superada através da política fiscal, com o governo induzindo diretamente o investimento e a renda. No entanto, é crucial notarmos que a incorporação distorcida de Hicks de aspectos essenciais da teoria keynesiana faz com que sua perspectiva acerca do que levaria a uma situação de AL seja radicalmente diferente.

Seguindo o modelo IS-LM, a política fiscal só é indicada de fato pois a política monetária teria perdido sua eficácia devido à perfeita substitutabilidade entre moeda e títulos. Retomando o raciocínio, esta equivalência entre moeda e títulos ocorre pois a taxa de juros de curto prazo estaria próxima de zero e haveria expectativa de que ela aumentasse no futuro, visto que a taxa longa se mantém em um patamar superior.

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Portanto, caso a taxa de juros de curto prazo pudesse ser menor do que zero ou a curva de longo prazo se aproximasse da taxa de curto prazo, a política monetária retomaria sua capacidade de influenciar a demanda agregada, de modo que a política fiscal poderia ser negligenciada em prol da política monetária.

Assistimos nas últimas décadas políticas muito parecidas com esta concepção, em que a redução da curva de juros visava exatamente a equalização entre as taxas de curto e longo prazo. Na sessão seguinte buscaremos ilustrar de que maneira os novos keynesianos, principais nomes propositores das políticas monetárias não convencionais, incorporaram as concepções de Hicks, reafirmando a potencialidade da PM mesmo em situações de AL.

1.1.3 Krugman e o Novo Consenso Macroeconômico

Ainda que o conceito de AL tenha sido apresentado nos anos 1930, economistas do mainstream o tratavam como um caso teórico e ultrapassado, cuja recorrência seria improvável12. No entanto, após a eclosão da crise no Japão ao final dos anos 90 em meio

ao risco deflacionário o debate acerca da AL ganha força dentro desta corrente, cujo texto inicial partiria de Krugman et al (1998). Em um primeiro momento, a conceituação da AL é aparentemente idêntica à proposta por Hicks (1937):

“That awkward condition in which monetary policy loses its grip because the nominal interest rate is essentially zero, in which the quantity of money becomes irrelevant because money and bonds are essentially perfect substitutes” (Krugman et al, 1998, p.137)

Por mais que a concepção da ineficácia da política monetária seja compartilhada, o arcabouço teórico seria distinto - autores do Novo Consenso se baseiam na concepção de taxa natural de juros desenvolvida por Wicksel l(1907). Segundo Milgate (1982), a taxa natural de juros de Wicksell consistiria na taxa que iguala a oferta e demanda de

12Do ponto de vista teórico, no entanto, a hipótese de AL foi bastante discutida entre os “velhos

keynesianos”: Hansen, Lange, Modigliani, Lawrence Klein e Gardner Ackley foram alguns autores que revisitaram o tema, ora se aproximando mais da concepção de Hicks, ora retomando algumas ideias de Keynes. Em geral, a reprodução de Hicks era vista como adequada, mas temas como a inclinação da curva LM (ou a existência de uma parte horizontal da curva) separavam os autores. (Boianovsky, 2004)

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“capital real”13. A taxa natural também pode ser definida como aquela que iguala a

oferta (poupança) e demanda (investimento) de fundos emprestáveis; ou seja, é a taxa que iguala poupança e investimento, conforme apresentado na figura 1.

Figura 1 – Processo Cumulativo de Wicksel no Mercado de Fundos Emprestáveis

Fonte: Castilho(2015)

A taxa natural de juros não é necessariamente igual à taxa monetária de juros determinada pelos bancos (figura 1). É a partir desta distinção que Wicksel teoriza sobre o nível de preços: quando a taxa monetária é inferior à taxa natural há um incentivo ao investimento (“preço” de investimento/custo para investir está baixo), pressionando os custos de produção permanentemente e causando aumento do nível de preços. Caso a taxa de mercado, definida pelos bancos, se iguale à taxa natural, garantindo que os fatores de produção sejam remunerados de acordo com sua produtividade marginal (Castilho, 2015, p.17), a economia se encontraria em seu equilíbrio de longo prazo.

O NCM incorpora a taxa natural de juros, mas assume pressupostos distintos dos apresentados anteriormente. Considera-se que haveria rigidez de salários no curto prazo e, portanto, distinções entre o produto e o produto potencial se refletem no aumento do nível de preços. Caso o Banco Central mantenha a taxa nominal de juros constante, uma menor taxa de juros real induziria a um aumento da demanda agregada, trazendo mais pressões inflacionárias. O inverso também é valido: o BC deve reduzir a

13“mobile capital in its free and uninvested form with which we are concerned” (Wicksel, 1901, vol.II,

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taxa nominal de juros para impedir que uma taxa real mais elevada deprima investimento e demanda (Almeida, 2009, p.47).

Quando a taxa nominal de juros alcança o ZLB, este mecanismo de ajuste se romperia14. Segundo Almeida (2009), o ZLB seria alcançado quando a economia enfrenta

uma taxa de deflação (em módulo) superior à taxa natural de juros, de modo que não há uma taxa nominal positiva que retome a economia para o pleno emprego. Uma segunda possibilidade, mais próxima do que vem sendo discutido desde a crise japonesa, seria uma taxa natural de juros negativa, ou seja, a oferta de capital (poupança) é superior à demanda de capital (investimento) - portanto, o produto potencial (considerado dado) é menor do que o produto no presente (Krugman et al, 1998). Dada a oferta de moeda fixa, visto que o aumento da base monetária seria inócuo, a AL ocorreria se o nível de preços atual fosse considerado muito alto em relação ao nível de preços de longo prazo (dado pelo produto potencial; ou seja, considerado pré-determinado)15. Dessa forma, caso a taxa de juros nominal não pudesse ser

negativa, o BC precisaria encontrar outras maneiras para que a taxa real de juros fosse negativa; ou seja, a única solução seria a indução de expectativas inflacionárias16 (𝑟 =

𝑖 − 𝜋&) de maneira crível. Por este motivo, grande parte das questões em torno da AL

acabam se voltando para credibilidade do BC quando à sua PM:

“Whatever the specifics of the situation, a liquidity trap is always the product of a credibility problem: the public believes that current monetary expansion will not be sustained. Structural factors can explain why an economy needs expected inflation; they can never imply that credibly sustained monetary expansion is ineffective” (Krugman et al,

1998, p.166)

Dito de outra maneira, em meio a questões estruturais que determinam o produto e nível de preços de longo prazo, quando espera-se uma renda menor no futuro há um

14“Therefore it must be that any increase in the money supply beyond the level that would push the

interest rate to zero is simply substituted for zero interest bonds in individual portfolios (…) with no further effect on either the price level or the interest rate” (Krugman et al, 1998, p.146)

15 “The easiest way to think about this is to say that there is an equilibrium real interest rate, which

the economy will deliver whatever the behavior of nominal prices. Meanwhile, since the future price level P* [preço do segundo período] is assumed held fixed, any rise in the current level creates expected deflation; hence higher P [nível de preços] means lower i [taxa de juros nominal]”. (Krugman et al, 1998, p.145, grifo nosso)

16 “The economy ‘needs’ inflation, and an attempt by the central bank to achieve price stability will

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excesso de poupança devido à rigidez imposta pelo ZLB17. De maneira geral, textos

subsequentes do NCM que abordam a AL por meio do ZLB seguem a teorização de Krugman (Krugman, 2000; Svensson, 2003, 2006; Buiter e Panigirtzoglou, 1999). Portanto, a questão das expectativas e da credibilidade do BC permeiam praticamente todas propostas de superação da AL.

Como podemos notar, por mais que a perspectiva de que a AL implicaria na ineficácia da política monetária seja comum entre o NCM e keynesianos, suas construções teóricas são radicalmente diferentes. Por este motivo, ao invés de tratar da teoria do NCM como AL, autores pós-keynesianos passaram a intitular esta construção teórica de ZLB economics (Kregel, 2014; Palley 2016a). Vale destacar que enquanto a taxa natural de juros negativa seria o cerne desta perspectiva quando a economia atingisse o ZLB, pouco se explora qual seria a causa para a ocorrência de uma taxa natural de juros negativa.

Em Krugman et al (1998) a questão é abordada tangencialmente. A principal dificuldade dos autores é justificar uma taxa natural de juros negativa enquanto ainda há investimentos e produtividade marginal do capital positivos: “productive investment can take place and the marginal product of capital, while it can be low, can hardly be negative” (ibid, p.150). Como tentativa de justificar este dilema, o autor propõe que pode haver um equity premium demasiadamente elevado, desestimulando o investimento produtivo mesmo que a taxa de retorno do capital seja elevada. Além disso, aponta que a taxa de retorno do investimento dependeria também do preço dos bens de capital e sua variação esperada. Para tanto, utiliza a teoria do q de Tobin, que relaciona o valor de mercado esperado do ativo de capital em questão no futuro e seu custo de reposição. Dessa forma, caso o q de Tobin for maior que um, o agente realiza o investimento. Dessa forma, se o q de Tobin caia no futuro – no nosso caso, por um valor do ativo de capital esperado menor no futuro, e não por um aumento do custo de reposição - a taxa natural de juros poderia ser negativa mesmo com produto marginal do capital positivo.

17“if people have low expectations about their future incomes, even with a zero interest rate they

may want to save more than the economy can absorb. (In this case, the economy cannot absorb any savings; I address that point below.) And therefore, no matter what the central bank does with the current money supply, it cannot reflate the economy sufficiently to restore full employment” (Krugman et al, 1998, p.150)

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Outra abordagem a respeito da determinação da taxa de juros natural negativa se encontra em Eggertsson e Krugman (2012). Neste artigo os autores buscam avançar na temática por meio de uma abordagem “Fisher-Minsky-Koo”. De maneira geral, incorporam a ideia de instabilidade financeira de Minsky de uma maneira simplista, assumindo como exógeno o aumento do grau de alavancagem18. O choque ocorreria

quando o limite de endividamento fosse reduzido abruptamente, forçando endividados a se desalavancarem rapidamente. Como consequência, “produce a potentially nasty liquidity trap is for the natural rate of interest rs to go negative” (ibid, p.1477).

Em suma, a discussão moderna do que seria a AL se restringe ao ZLB, tendo a rigidez da taxa nominal de juros um papel de destaque. Por mais que a taxa natural de juros considerada pelo NCM tenha tido origens na teoria de Wicksell (1907), foram incorporados elementos adicionais tendo em vista o curto prazo. Segundo Almeida (2009), o NCM faz uso da rigidez de preços e salários no curto prazo para justificar a diferença entre produto e produto potencial, que se expõe por meio da inflação19. Caso

o Banco Central acerte suas previsões, fazendo uso da regra de Taylor, a economia se direcionaria para sua trajetória de longo prazo.

De qualquer maneira, por mais que o que levaria a taxa natural para a níveis negativos seja um tema controverso, há consenso de que para superar um cenário de AL, existe a necessidade de levar a taxa real de juros abaixo de zero via estímulo às expectativas inflacionárias. Ainda que haja alguma discussão sobre política fiscal, é bastante marginal e muitas vezes voltada para estas mesmas expectativas. A próxima sessão apresentará as diferentes propostas para superação da AL.

1.2 Propostas de superação

1.2.1 A abordagem de Keynes e dos pós-keynesianos

Nas sessões anteriores buscamos caracterizar o que consistiria uma situação de AL a partir de três perspectivas teóricas distintas. Poderíamos apontar como ponto de

18“ (…) an extended period of steady economic growth or rising asset prices will encourage relaxed

attitudes toward leverage” (Eggertsson e Krugman, 2012, p.1475)

19 Outra diferença relevante é o próprio conceito da taxa natural de juros: "Por isso, apesar das semelhanças, a taxa natural de juros de Wicksell é aquela que estabiliza o nível de preços, enquanto a taxa natural de juros do novo consenso é aquela que estabiliza a taxa de inflação” (Almeida, 2009, p.76)

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congruência entre elas a perda de funcionalidade da política monetária “convencional”, ou seja, com o BC atuando no mercado secundário de títulos públicos visando reduzir a taxa de juros de curto prazo. Conforme destacado na apresentação do modelo IS-LM, a defesa do uso da política fiscal se prende muito mais ao fato da política monetária perder sua eficiência. Para os keynesianos, ao contrário, frente ao grau extremado de preferência pela liquidez, a política fiscal seria o principal elemento para superação da AL, com a decisão de gasto autônomo partindo do Estado. Potencializado pelo multiplicador, o gasto estatal deve induzir a demanda agregada ao fomentar maiores expectativas de receita no futuro; consequentemente, o grau de incerteza tenderia a se amenizar, trazendo um horizonte propício à retomada do consumo e do investimento privados.

Esta concepção de que a política fiscal seria o mecanismo central de superação de cenários de AL teria sido apresentado por Keynes apenas na Teoria Geral. Explicitamente sobre os programas de QE, Kregel destaca que em contraposição à visão dos Novos Keynesianos:

"Keynes would have gone about the implementation of QE in a much different way. Instead of announcing a given amount of purchases of particular securities and a target for the size of the central bank’s balance sheet, he would have set the bid and ask rate and let the market decide the amounts it wanted to transact.” (Kregel, 2014, p.4)

Nesse sentido, a concepção de que a teoria keynesiana tem como única proposta a política fiscal para a superação da AL é equivocada - a política monetária tem papel essencial para tanto. As medidas propostas por Keynes seriam, no entanto, “multifacetadas”, requerendo ações por parte dos bancos centrais não apenas com intuito de manter taxas de juros de curto prazo em baixos níveis, mas também influenciar toda a curva de juros. Os bancos centrais teriam que adotar medidas complementares à redução da taxa de juros, fazendo esforços para reduzir a volatilidade das taxas e parametrizar sua direção, reduzindo a incerteza (Akraam, 2016). Portanto, “targeting the yield curve and reducing interest rate volatility is a prerequisite for overcoming a liquidity trap” (ibid, p.29). No pós-Crise de 2008, o FED adotou os programas QE da forma defendida pelo mainstream¸ determinando previamente um montante para compra de ativos. Na prática, no entanto, este montante era ajustado tendo em vista a curva de juros de longo prazo. Mais recentemente, o Japão anunciou

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uma política com foco direto sobre a curva de juros tendo em vista a manutenção das taxas de longo prazo próximas a zero20, que será explanada no capítulo seguinte.

De maneira similar, Minsky considera a atuação estatal e da autoridade monetária fundamentais para superação de cenários recessivos, sendo que suas proposições são sintetizadas nos conceitos de Big Government e Big Bank . Tendo como embasamento a atuação estatal pós-Segunda Guerra Mundial, Minsky promulga pela atuação governamental via política fiscal para sustentar o arrefecimento da demanda do setor privado. Deste modo, o déficit estatal garantiria possibilidade de alocação de recursos para os agentes, que visariam seguraça e liquidez. Mais que isso, seria atribuição do Estado “provide floors to the economy that assure minimum levels of liv- ing and service to all” (ibid, p.369). Em relação à autoridade monetária, esta deveria atuar como emprestador de última instância junto ao setor financeiro, limitando a deflação de ativos financeiros e o desencadeamento de um processo de debt-deflation, e, consequentemente, o desenrolar de uma crise sistêmica21. Mas mais que isso, seria

atribuição do Big Bank fiscalizar o sistema, sempre buscando se antecipar a inovações financeiras.

Explicitamente sobre as taxas de juros nominais negativas, com exceção de artigo recente de Palley (2016a), Keynes e os pós keynesianos têm discutido muito pouco sobre a possibilidade real de sua implementação. Kregel apresenta marginalmente esta hipótese, tendo em vista a percepção de Keynes acerca das propostas de Silvio Gessel:

"Keynes’s understanding of liquidity preference provides an alternative explanation of the role of negative interest rates and of his fascination with measures such as Silvio Gesell’s stamped money. (…) In Keynes’s approach, all that would be required to offset the impact of the liquidity trap would be to set the negative interest rate at a value such that it was greater than the loss in capital value associated with holding securities, for then money would provide no protection against capital loss due to the expected rise in rates”. (Kregel, 2014,

p.4)

20Lançado em setembro/2016, intitulado “Quantitative and Qualitative Monetary Easing with Yield

Curve Control”

21To intervene in this way, the central bank must provide as much liquidity as is required to meet

financially fragile cash-flow needs; and of equal importance, market participants must perceive the big bank as being willing to play this role” (Dymski, 1999, p.5)

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