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II Seminário Brasileiro Livro e História Editorial

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II Seminário Brasileiro Livro e História Editorial

1º livro de leitura (1926), de Antonio Proença, e a disseminação do método analítico para o ensino da leitura no Brasil

Monalisa Renata Gazoli1

Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC) – Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Marília .

Resumo:

Neste texto, apresentam-se resultados de pesquisa de mestrado desenvolvida com o objetivo de contribuir para a compreensão de um importante momento da história do ensino da leitura e escrita e suas relações com a história do livro didático no Brasil. Focaliza-se a proposta para o ensino da leitura pelo método analítico apresentada pelo professor paulista Antonio Firmino de Proença (1880-1946), em 1º livro de leitura (1926), publicado pela Editora Melhoramentos (SP) e integrante da “Série de leitura Proença”, utilizada em diferentes estados brasileiros. Mediante abordagem histórica centrada em pesquisa documental e bibliográfica, desenvolvida por meio de procedimentos de localização, recuperação, reunião, seleção e ordenação de fontes documentais e bibliografia especializada, analisou-se a configuração textual desse livro que consistiu em enfocar os diferentes aspectos constitutivos de seu sentido. Concluiu-se que esse livro, escrito em continuidade ao proposto pelo autor em Cartilha Proença (1926) e em

Leitura do principiante (1926), foi publicado por mais de duas décadas e está diretamente

relacionado com os de outras séries de livros de leitura publicadas nas décadas iniciais do século XX, como decorrência da institucionalização do método analítico no estado de São Paulo, tendo contribuído para a disseminação, no Brasil, desse método de ensino da leitura. Palavras-chave:

Leitura; Ensino da leitura; Método analítico; Livros de leitura; Antonio Firmino de Proença; Companhia Melhoramentos de São Paulo.

Introdução

Neste texto, apresento resultados parciais de pesquisa de mestrado2 em andamento junto ao Programa de Pós-graduação em Educação da Faculdade de Filosofia e Ciência (FFC) –

1 Graduada em Pedagogia pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) – campus de Marília, em 2007 e bolsista de Iniciação Científica (CNPq/PIBIC/UNESP), em 2007; Mestranda em Educação pela Unesp-Marília, com bolsa Fapesp. Desde 2007, integra o Grupo de Pesquisa “História do Ensino de Língua e Literatura no Brasil”, coordenado por Maria do Rosário Longo Mortatti. É autora de textos publicados em anais de eventos e de artigo de periódico. monalisa_gazoli@hotmail.com.

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Universidade Estadual Paulista (Unesp) - campus de Marília – SP, sob a orientação de Maria do Rosário Longo Mortatti. Essa pesquisa está vinculada às linhas “Alfabetização” e “Ensino de língua portuguesa” do GPHELLB — Grupo de Pesquisa “História do ensino de língua e literatura no Brasil”3 — e do PIPHELLB — Projeto Integrado de Pesquisa “História do ensino de língua e literatura no Brasil” —, ambos coordenados pela professora mencionada. Com o objetivo de compreender um importante momento da história do ensino da leitura e escrita no Brasil, apresento, neste texto, resultados de análise da configuração textual de 1º

livro de leitura (1926), de autoria do professor Antonio Firmino de Proença.

Trata-se de abordagem histórica, centrada em pesquisa documental e bibliográfica e desenvolvida mediante utilização de procedimentos de localização, recuperação, reunião e ordenação de fontes documentais de e sobre Antonio Firmino de Proença assim como de bibliografia especializada sobre o tema. Para a análise do 1º livro de leitura (1926), utilizo o método de análise da configuração textual, que consiste em enfocar:

[...] o conjunto de aspectos constitutivos de determinado texto, os quais se referem: às opções temático-conteudísticas (o quê?) e estruturais formais (como?), projetadas por um determinado sujeito (quem?), que se apresenta como autor de um discurso produzido de determinado ponto de vista e lugar social (de onde?) e momento histórico (quando?), movido por certas necessidades (por quê?) e propósitos (para quê), visando a determinado efeito em determinado tipo de leitor (para quem?) e logrando determinado tipo de circulação, utilização e repercussão, que vem ocorrendo

por meio do método de análise da configuração textual. (MORTATTI, 2000, p.31)

Destaco que, neste texto, utilizo “livro de leitura” para me referir a um tipo particular de livro didático que contém “textos” escritos, acompanhados ou não de exercícios, para utilização por alunos e professores, com o objetivo de desenvolvimento de processo de ensino e aprendizagem da leitura, em séries/anos escolares que sucedem à etapa inicial do ensino da leitura e escrita.

Na época de publicação do livro em estudo, era habitual que os livros de leitura fossem publicados em “séries graduadas de leitura” compostas por “[...] três, quatro e até cinco livros (primeiro, segundo, terceiro, quarto e quinto livros de leitura), nos quais estão distribuídos todos os conhecimentos a serem ensinados desde o primeiro até o último ano da escola primária” (OLIVEIRA; SOUZA, 2000, p. 27). Cada um dos livros de leitura “[...] equivale a um ano letivo. Os conteúdos estão divididos por lições ou títulos. As lições são apresentadas com grafias variadas nas formas e nos tamanhos e, geralmente, possuem gravuras.” (OLIVEIRA; SOUZA, 2000, p. 27).

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A Série de Leitura Proença é composta por seis livros (uma cartilha, um livro de leitura intermediária e quatro livros de leitura) indicados para os seguintes anos escolares: Cartilha

Proença e Leitura do principiante, para o primeiro ano; 1º livro de leitura, para o segundo

ano; 2º livro de leitura, para o terceiro ano; 3º livro de leitura e 4º livro de leitura, para o quarto ano.

Destaco que por se tratar de pesquisa histórica, neste texto, mantive a ortografia de época nas citações de títulos e trechos de documentos.

1. Apresentação de Antonio Firmino de Proença 1.1 Dados biográficos4

O sorocabano Antonio Firmino de Proença (1880-1946) formou-se professor na Escola Normal de São Paulo em 1904 e iniciou suas atividades no magistério paulista em 13 de fevereiro de 1905, tendo, a partir de então, exercido diferentes funções: professor na Escola Normal Primária de Piracicaba e na Escola Normal Secundária de São Carlos; diretor da Escola Normal de Pirassununga, do Ginásio do Estado de Campinas e da Escola Normal Secundária de São Carlos. Nesta última escola, foi diretor entre os anos de 1916 e 1927, alternando na direção com o professor Mariano de Oliveira; exonerou-se desse cargo, em 1927, para exercer o cargo de Inspetor Geral do Ensino Secundário, na cidade de São Paulo, em substituição ao professor Benedicto Tolosa.

Em 1939, após 35 anos de atuação no magistério público paulista, aposentou-se e ajudou a fundar o Ginásio “Caetano de Campos”, na cidade de São Paulo, do qual foi professor e diretor. Após um período atuando como diretor desse ginásio, voltou a Sorocaba com (por)

problemas de saúde. Todavia, viajou para a cidade de São Paulo, onde faleceu no dia 4 de abril de 1946, vítima de hipertensão arterial e edema pulmonar.

Após sua morte recebeu várias homenagens, a saber: contemporâneos escreveram textos em jornais e revistas; ruas na cidade de São Paulo e Sorocaba receberam seu nome; e foi eleito patrono de uma escola estadual, na cidade de São Paulo.

1.2 Aspectos da produção escrita de Antonio Firmino de Proença5

Ao longo de sua atuação profissional, Proença escreveu, dentre outros: artigos em revistas pedagógicas; livro sobre educação; cartilha de alfabetização; livros de leitura; e livro de geografia.

4 As informações apresentadas neste tópico foram extraídas, principalmente, de: A. I. (1949), d’Ávila (1946), Melo (1954) e Poliantéia... (1946).

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Dentre seus livros didáticos, foram publicados pela Companhia Melhoramentos de São Paulo (Weiszflog Irmãos Incorporada)6, atualmente Editora Melhoramentos, os seguintes: Cartilha

Proença7 (1926) e os cinco livros de leitura que integram a “Série de Leitura Proença”

(Leitura do principiante (1926); 1º livro de leitura (1926); 2º livro de leitura (1927); 3º livro

de leitura (1928); e 4º livro de leitura (1928)); e Como se ensina Geographia8 (1928).

Há, ainda, dois livros didáticos de sua autoria que foram publicados por outras editoras:

Escreva certo! (1939?), pela Athena Editora (São Paulo); e Palestras pedagogicas (1930)9,

pela Diretoria Geral da Instrução Pública do Estado de São Paulo.

Os artigos de Proença foram publicados em quatro revistas pedagógicas, assim distribuídos: 12, na Revista da Escola Normal de São Carlos10; 2, na revista Excelsior!11; 13, na

revista Educação12; e 4, na Revista do Professor13. Nesses artigos, o autor aborda temas como: metodologia do ensino de geografia, de matemática, de ciências e de língua portuguesa; e homenagem póstuma.

2. Apresentação do 1º livro de leitura

Entre 1926 e 1948, 1º livro de leitura foi editado 48 vezes, totalizando mais de 255.000 exemplares, distribuídos em vários estados do país. O maior número de edições ocorreu entre 1928 e 1934 (25 edições em apenas seis anos). Como se pode constatar, mesmo após a morte

6 Daqui em diante, neste texto, sempre que me referir à Editora Melhoramentos quando sua razão social era Companhia Melhoramentos de São Paulo (Weiszflog Irmãos Incorporada), utilizarei apenas a expressão Companhia Melhoramentos.

7 Essa cartilha foi objeto de análise em meu Trabalho e Conclusão de Curso de Pedagogia (Gazoli, 2007), resultante de atividades de iniciação científica (Bolsa PIBIC/CNPq/UNESP), desenvolvidas no âmbito do GPHELLB e do PIPHELLB, sob orientação de Maria do Rosário Longo Mortatti.

8 O livro Como se ensina geographia, de Proença, integra a Coleção Biblioteca de Educação, organizada por Lourenço Filho para essa editora. Sobre importantes aspectos dessa coleção ver, dentre outros: Carvalho e Toledo (2004).

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Resultados da análise da configuração textual desse livro encontram-se em: Gazoli (2008).

10 A Revista da Escola Normal de São Carlos foi publicada entre 1916 e 1923 por iniciativa de professores da Escola Normal de São Carlos, poucos anos após a inauguração dessa instituição, em 1911. Nessa revista foram publicados somente artigos inéditos escritos por professores e diretores de escolas normais. A respeito dessa revista, ver: Ozelin, 2006.

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A revista Excelsior! foi publicada pelo Grêmio Normalista “Vinte e dois de Março”, da Escola Normal de São Carlos, entre 1911 e 1916. A respeito dessa revista, ver: Silva, 2007.

12 O ciclo de vida da revista Educação pode ser dividido em cinco fases, assim caracterizadas: de outubro de 1927 a agosto de 1930, essa revista pedagógica esteve sob a responsabilidade dupla da Diretoria Geral da Instrução de São Paulo e da Sociedade de Educação de São Paulo; de outubro de 1930 a julho de 1931, foi editado com o título Escola Nova; de agosto de 1931 a dezembro de 1947, suas edições foram marcadas por atrasos e dificuldades, a publicação com o título original Educação e sem a participação da Sociedade de Educação; de dezembro de 1947 a março de 1951, dá-se a interrupção das edições; e de março de 1951 a dezembro de 1952, é novamente publicada, para novamente ser interrompida até 1961, quando dois últimos números são publicados. (CATANI, 1994).

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de Antonio Firmino de Proença, em 1946, o livro analisado continuou a ser editado, ao menos, por mais dois anos, com duas novas edições14.

Analiso um exemplar da 35ª edição (edição mais antiga localizada), o qual mede 19 x 13,5 cm, é composto por 160 páginas e encadernado em capa dura, tendo sido impresso em papel resistente, levemente brilhante.

Na primeira capa, podem-se observar informações sobre a editora que o publicou e o nome de seu autor. As informações da capa se repetem na folha de rosto e acrescenta-se a informação: “Para o 2º ano escolar”. Na quarta capa, na parte superior, encontram-se informações sobre a editora seguidas de uma relação de títulos de livros intitulada “Edições da casa”, em que se encontram títulos de livros dos professores Antonio Firmino de Proença, Octaviano de Mello, Alvaro Guerra, Padre Antonio de Menezes e Ernani Joppert; os títulos são acompanhados dos respectivos preços, que variam entre 1$500 e 4$500 réis.

No prefácio do livro analisado, Antonio Firmino de Proença critica os livros de leitura cujo conteúdo é marcadamente escolar, o que denomina de “literatura didática” ou “pílula dourada”. Tanto esses livros de leitura quanto aqueles que pregam a “cultura do sentimento moral” não são eficientes, segundo Proença, porque, primeiramente “[...] a criança percebe que são lições de moral compostas propositadamente para ela; em segundo lugar preparam o indivíduo para uma vida que absolutamente não é aquela que ele tem que viver mais tarde.” (PROENÇA, [19--], p. IV).

Ainda no prefácio, o autor afirma que o livro de leitura analisado foi elaborado segundo os interesses das crianças “[...] de 8 e 9 anos, isto é, matriculadas no 2º ano do curso primário.” (PROENÇA, [19--], p. V).

2.2 Estampas, quantidade e conteúdo das lições

As 52 lições que compõem o livro analisado são ricamente ilustradas. As estampas variam entre representação de animais, cenas do cotidiano infantil e personagens das narrativas apresentadas em cada lição.

Do conjunto de lições que compõem o livro analisado, 50 correspondem a narrativas, de autoria de Proença, conduzidas por um narrador em terceira pessoa, que conta histórias do cotidiano de dois irmãos chamados Rui e Zizi e outras personagens crianças, identificadas como amigas dos protagonistas.

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São apresentados, nesse livro ainda, dois poemas de outros autores: “A leiteira e a bilha de leite”, de J. I. de Araújo; e “Cromo”, de B. Lopes. 15

Ao final da maior parte das lições encontra-se, em letra cursiva, uma frase que sintetiza o conteúdo da lição. Nessas frases são apresentados, principalmente, conselhos e atitudes consideradas adequadas, tais como: “Sejamos polidos para com todo o mundo.” (lição 1, p. 8); “Devemos querer bem aos bons animais” (lição 14, p. 40); e “O saber é feito de experiências.” (lição 47, p. 143).

3. Aspectos da editora do 1º livro de leitura

Como informei, 1º livro de leitura foi publicado pela Companhia Melhoramentos de São Paulo (Weiszflog Irmãos Incorporada). A Irmãos Weiszflog incorporou-se à Companhia Melhoramentos de São Paulo no final de 1920. A importância e pioneirismo da Irmãos Weiszflog na área educacional datam de 1909 quando

[...] ingressou na área escolar com produtos prontamente tornados indispensáveis: os Mapas Parker para Lições de Aritmética, os cadernos de Caligrafia Americana número de 1 a 6; a Caligrafia Vertical, de Francisco Viana. Ademais de contribuição para o ensino, esses trabalhos fizeram vibrar o sentimento patriótico do professorado. Pela primeira vez chegava às escola material moderno, com alta qualidade gráfica,

criado e produzido no país. (DONATO, 1990, p.44, grifo meu).

A Companhia Melhoramentos foi instalada no Rio de Janeiro no ano de 1890, tendo sido sua sede transferida para São Paulo em 1903, visto que ali se “[...] concentrava dois terços da produção industrial brasileira” (DONATO, 1990, p. 29).

Essa editora publicou grande número de títulos, sendo considerada, segundo Donato (1990), uma das mais respeitadas editoras do Brasil. Como exemplo de sua importância no meio editorial, Donato (1990, p.44) cita o Mapa do sul do Brasil, assinado por Gentil de Moura e impresso em 1908, que chegou a obter repercussão internacional. É também em 1908, que o Presidente da República, Afonso Augusto Moreira Penna (Afonso Penna), escreveu seu agradecimento em manuscrito à editora, pelo álbum de vistas fotográficas dos Portos do Brasil (DONATO, 1990, p.44).

Em meio às disputas apontadas por Mortatti (2000) a respeito dos métodos para o ensino da leitura no início do século XX, a Companhia Melhoramentos publicou livros e materiais didáticos das disciplinas “[...] português, matemática, ciências físicas e naturais, geografia e história” (DONATO, 1990, p.55) e, assim, deu também espaço para a discussão e divulgação em relação a essas disputas. “No ápice da polêmica, os nomes mais em evidência [...] no

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catálogo weiszfloguiano [foram]: Arnaldo de Oliveira Barreto, Mariano de Oliveira, Erasmo Braga, Antonio Firmino de Proença, Lourenço Filho” (DONATO, 1990, p.55, grifo meu). Segundo Donato (1990, p.55), essa “questão do método” fora:

[...] dirimida pela Diretoria Geral da Instrução do Estado ao eleger o método analítico. A Weiszflog participou da discussão desde 1916, ao editar a Nova

Cartilha Analytico-Synthética assinada pelo professor Mariano de Oliveira,

tentativa de conjugar os dois processos. (grifo do autor).

Uma figura de destaque na história da Companhia Melhoramentos foi o professor Manoel Bergström Lourenço Filho, que, a partir de 1925, passou a consultor editorial dessa editora, “[...] emitindo pareceres sobre originais didáticos e para a infância. Ao longo de algumas décadas viria a emitir quase 30.000 pareceres.” (DONATO, 1990, p.82). A atuação desse professor foi decisiva para o período abordado, porque, além de ser autor de centenas de textos nos quais divulgou os pressupostos do que ficou conhecido como movimento escola novista é, uma das figuras de maior destaque no cenário educacional brasileiro.

4. Momento histórico de produção e publicação do 1º livro de leitura

Segundo Mortatti (2000), o “2º momento crucial” na história da alfabetização no Brasil, que se estende de 1890 a meados dos anos 1920, é caracterizado pela “institucionalização do método analítico” 16. Nesse momento, existe uma acirrada discussão em torno do método analítico em oposição aos “tradicionais” métodos sintéticos para o ensino da leitura. As discussões nesse momento histórico envolviam também disputas entre os “modernos” e “mais modernos” defensores do método analítico, ou seja, discutiam-se os diferentes modos de processar esse método: a palavração, a silabação ou a “historieta”.

Ainda nesse “2º momento crucial” da história da alfabetização, de acordo com Mortatti (2000, p. 78) tem-se a atuação de uma geração de professores formados pela Escola Normal de São Paulo, dentre os quais Proença, que passam a ocupar cargos na administração educacional (em substituição ao bacharel em Direito) após a Proclamação da República em 1889, a assessorar autoridades educacionais e a produzir material tanto didático quanto de divulgação das novas idéias, principalmente as referentes ao ensino da leitura.

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Nesse “2º momento”, cresceu significativamente a demanda por livros didáticos escritos por brasileiros e para brasileiros (MORTATTI, 2000; RAZZINI, 2004), porque a institucionalização do método analítico exigia reformulação de cartilhas “tradicionais” (baseadas nos métodos sintéticos) e publicação de outras adequadas ao “novo” método analítico. Surgia, assim, “[...] um tipo específico de escritor didático profissional: o professor normalista; e [...] uma especialidade editorial: a publicação de livros didáticos” (MORTATTI, 2000, p.86), em especial, de cartilhas de alfabetização e de livros de leitura, que se relacionavam diretamente com as disputas em torno do método analítico, características desse “2º momento”.

Ainda segundo Mortatti, com a implementação, no estado de São Paulo, da “Reforma Sampaio Dória” (Lei 1750, de 1920), tais disputas:

[...] tendem a se amenizar [...] – embora continue se apregoando a validade do método analítico – e quando problemas e urgências de outra ordem passam a ser priorizados e outros sujeitos começam a se destacar no cenário educacional, propondo outra forma de intervenção do Estado nas coisas da instrução e outros projetos, centrados em

outras bases para o ensino da leitura e escrita. (MORTATTI, 2000, p.134)

Isso ocorreu, porque:

Aceitando o método analítico como a “verdade cientifica” e “unico correspondente ás leis da percepção infantil”, Sampaio Dória, no entanto, critica sua obrigatoriedade, uma vez que professores mal preparados ou contrários a esse método contribuem para sua derrocada. Propõe, por isso, que o professor não seja obediente executor, mas que se lhe propicie o conhecimento da verdade científica do método analítico até que essa

verdade possa triunfar, sem ser insensatamente imposta. (MORTATTI, 2000,

p.131).

As cartilhas e os livros de leitura escritos nesse “2º momento crucial” são relativamente parecidas no que refere aos passos para aplicação do método analítico, ainda que haja também diferenças decorrentes da forma de processuar esse método, caracterizando as disputas entre “modernos” e “mais modernos” defensores do método analítico, como aponta Mortatti (2000). Quando da publicação da primeira edição do 1º livro de leitura, Proença ocupava o cargo de diretor da Escola Normal de São Carlos, escola de destaque no cenário educacional paulista da época. Isso pode indicar que o cargo ocupado por esse professor lhe conferia certo prestígio junto a seus contemporâneos e que seu nome como autor de um livro didático possa se caracterizar como resultado e garantia de reconhecimento em relação aos demais livros de leitura publicados.

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Erasmo Braga; e “Série Arthur Joviano”. Ou anteriormente a esse momento, como, por exemplo: Série Thomaz Galhardo, Série Puiggari-Barreto17, de Romão Puiggari e Arnaldo de Oliveira Barreto; Série Oliveira e Dordal, de Mariano de Oliveira e Ramon Roca Dordal.18 O conteúdo do 1º livro de leitura, de Proença, sugere que o autor seguiu os passos propostos nos dois documentos oficiais para o ensino da leitura, publicados na década de 1910: Como

ensinar leitura e linguagem nos diversos annos do curso preliminar (DIRECTORIA..., 1911)

e Instrucções praticas para o ensino da leitura pelo methodo analytico – modelos de lições (DIRECTORIA..., 1915)19. Em ambos os documentos são apresentados passos que devem ser seguidos pelo professor para obter êxito no trabalho em sala de aula. As instruções de Proença, tanto no prefácio do livro analisado, quanto no conteúdo e forma das lições nele apresentado, estão próximas das orientações desses documentos, indicando a sintonia de Proença com o clima desse “2º momento” da história da alfabetização no Brasil.

Tanto no livro de leitura analisado quanto em artigo publicado posteriormente a esse, Proença (1929) apresenta passos para o ensino da leitura, nos quais fica evidente o papel central do professor para a processuação do método analítico para esse ensino.

1. Leitura silenciosa pela classe.

Leitura, em voz alta, de palavras apontadas pela professora [...].

2. Leitura expressiva por um ou mais alumnos.

3. Exercicio de visualização;

a) do conjuncto;

b) das partes.

Por suas palavras e gestos, e por outros meios adequados formará a professora, em um espaço imaginario, o quadro completo, tal qual o autor o descreveu. As phrases, e bem assim os vocabulos, serão explicados de modo a evocarem imagens chromaticas, estereoscopicas, cinéticas e emotivas. Evitar a explicação por meio de definições e synonymia. O essencial é que o educando veja e sinta o que o autor viu e sentiu. (PROENÇA, 1929, p.153-154, grifos do autor)

Os três passos apresentados para o ensino da leitura pelo método analítico, nesse artigo, são semelhantes aos passos propostos no prefácio do livro de leitura analisado, a saber: leitura do “todo” seguido da decomposição em partes menores. Esses passos, por sua vez, são semelhantes aos propostos nos dois documentos oficiais expedidos na década de 1910, já mencionados.

Os conteúdos do 1º livro de leitura são indicativos de uma concepção de escola “[...] responsável por introduzir conhecimentos básicos atinentes às ciências naturais, além da

17 Sobre a série Puiggari e Barreto, ver, especialmente: Oliveira (2004).

18 Outras séries de livros de leitura ficaram muito conhecidas, tendo sido editadas diversas vezes. Dentre elas destaco: Série Rangel Pestana, de João Köpke; e Série Leituras Infantis, de Francisco Vianna.

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formação moral e cívica do cidadão.” (OLIVEIRA; SOUZA, 2000, p. 37), consoantes com os ideais da época em que foram publicados.

Destaco, ainda, que Proença “[...] sintonizado com as orientações da época, adverte a respeito da liberdade de escolha do professor – condicionada às normas oficiais e aos princípios do método analítico – e de sua não pretensão de originalidade” (MORTATTI, 2000, p.106) e, em sua cartilha, ele explicita a importância dos “trabalhos” dos professores Theodoro de Moraes, Mariano de Oliveira, Arnaldo Barreto, Benedicto Tolosa, Gomes Cardim e Francisco Vianna, o que é indicativo de que, apesar do número crescente de cartilhas publicadas no período, Proença tinha certa consciência do lugar que sua cartilha e seus livros de leitura poderiam ocupar e que, de fato, ocuparam no ensino da leitura nas escolas primárias brasileiras, já que foram publicados por três décadas e mesmo depois do falecimento do autor.

Se a forma de Proença processar o método analítico, no 1º livro de leitura, não diferencia, consideravelmente, dos outros livros de leitura elaborados de acordo com o método analítico que circulavam nas escolas primárias nos primeiros anos do século XX, considero, entretanto, que os livros de Proença ainda assim tenham conquistado posição de destaque nesse momento histórico por dois motivos: a grande demanda criada pela expansão da escola pública nesse momento; e a posição de destaque que Proença ocupava como Diretor da Escola Normal de São Carlos no momento de publicação da 1ª edição do livro analisado, assim como os demais cargos ocupados no magistério paulista quando da publicação das demais edições desse livro. A última edição de 1º livro de leitura (1948) coincide com o momento em que a Companhia Melhoramentos, após algumas perdas econômicas causadas em decorrência das reformas do ensino e da reforma ortográfica, de 1943, decide deixar de publicar livros didáticos, mantendo em seu catálogo apenas alguns títulos de destaque – por exemplo: Cartilha do provo, de Lourenço Filho; e Cartilha ensino rápido da leitura, de Mariano de Oliveira (DONATO, 1990, p. 129).

Os resultados da análise da configuração textual do 1º livro de leitura, apresentados neste texto, possibilitam compreender que o método analítico nele proposto está em sintonia com as orientações da época e que apresenta características do “2º momento” da história da alfabetização, proposto por Mortatti (2000).

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Considerações finais

Por meio dos resultados da análise da configuração textual, aqui apresentados, é possível concluir que, no livro de leitura analisado, seu autor busca dar continuidade à proposta de concretização do método analítico para o ensino inicial da leitura, apresentada em

Cartilha Proença, utilizando o recurso da “série graduada de leitura” que se tornou prática

comum nesse momento da história do ensino da leitura e escrita no Brasil, à medida que se buscavam implementar políticas de expansão da escola pública e se expandia também o mercado editorial de livros didáticos, para o qual foi significativa a contribuição da Editora Melhoramentos.

Considero que os resultados parciais aqui apresentados vêm confirmar a relevância e pertinência tanto de pesquisas históricas sobre alfabetização no Brasil, quanto de estudos pontuais como esse que venho desenvolvendo e como os dos demais integrantes do GPHELLB.

Referências

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Referências

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