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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO Programa de Estudos Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica

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Academic year: 2019

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO Programa de Estudos Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica

Daniela de Queiroz Picchiai

Da Identidade dos Grupos aos Perfis Programados

Uma Possível Passagem à Luz da Teoria da Comunicação

São Paulo

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Daniela de Queiroz Picchiai

Da Identidade dos Grupos aos Perfis Programados

Uma Possível Passagem à Luz da Teoria da Comunicação

Orientador: Prof. Dr. Rogério da Costa

Área de Concentração: Signo e significações midiáticas

Linha de Pesquisa: Cultura e ambientes midiáticos

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Semiótica – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em Comunicação.

São Paulo

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Folha de aprovação

Autora: Daniela de Queiroz Picchiai

Título: Da Identidade dos Grupos aos Perfis Programados.

Conceito:

Banca Examinadora

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_________________________________

_________________________________

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Agradecimentos

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RESUMO

Título da dissertação: Da Identidade dos Grupos aos Perfis Programados: Uma Possível Passagem à Luz da Teoria da Comunicação

Linha de Pesquisa: Cultura e Ambientes Midiáticos

Área de Concentração: Signo e Significações nas Mídias

Orientador: Prof. Dr. Rogério da Costa

Esta dissertação tem como objetivo principal investigar as recentes mudanças na orientação das pesquisas de mercado, que fazem uso cada vez maior de bases de dados digitais como fonte de informação sobre os consumidores. O trabalho começa analisando as metodologias de pesquisa mercadológica já consolidadas, de natureza qualitativa, que a partir de levantamentos de dados, de caráter amostral, tais como questionários e entrevistas, busca compreender atitudes e comportamentos dos consumidores e, assim, criar estratégias de comunicação mercadológica para as instituições interessadas nessa informação. Com o surgimento das análises ditas de Big Data, o cenário muda. Na evolução desse caminho, destacamos o papel cada vez mais importante das reflexões de filósofos (Foucault, Deleuze) e teóricos da comunicação (Martin-Barbero, Jenkins) sobre nossa atual sociedade de controle. Isso deve significar, para nosso estudo, um caminho cada vez mais centrado na busca por padrões de comportamento através de dados digitais. Com a influência das novas tecnologias, do universo digital e com a chegada do Big Data, a pesquisa de mercado passa a analisar os dados retirados de ambientes tais como as bases de dados das empresas ou de atividades em redes sociais, e verificam quais tipos de padrão de consumo podem ser identificados. Com isso, poderiam em tese construir uma comunicação para induzir e direcionar as ações e escolhas dos consumidores. Com isso, o trabalho compara dois formatos de ação utilizados pelas empresas como estratégia para atingir possíveis consumidores: o primeiro tem como base ferramentas qualitativas e compreensão do ambiente social de determinados segmentos; o segundo considera a gigantesca dimensão de técnicas existentes no ambiente online

que influenciam o comportamento das pessoas. O trabalho faz uma reflexão sobre como as estratégias de comunicação são utilizadas pelas empresas para envolver e gerar identificação em seus públicos. Como metodologia de trabalho, utilizamos os seguintes autores: Harold Lasswell, para identificar a influência das pesquisas na comunicação publicitária; Jesús Martín-Barbero, um dos primeiros estudiosos a compreender as mediações entre indivíduos e ambientes sociais; Philip Kotler e Gilbert A. Churchill, autores centrais no conhecimento das técnicas de marketing; Michel Foucault, Felix Guattari e Gilles Deleuze para reconhecer como o olhar do BigData se articula com nossa sociedade de controle. A pesquisa conclui que a comunicação mercadológica tem um papel decisivo na indução das escolhas dos indivíduos e busca constatar o caminho percorrido nesse processo, para assim reconhecer e pontuar os fatores que conduzem a essas escolhas.

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ABSTRACT

This dissertation has the main objective investigate the recent changes in the orientation market research that makes increasing use of digital databases as a source of information about consumers. The work begins by analyzing the methodologies of market research already established, of qualitative source, from data collection, sample character, such as questionnaires and interviews, focuses on attitudes and behaviors of consumers, and starting from this creates marketing communication strategies for institutions interested in this information. With the emergence of Big Data, the statement changes. In the evolution of this path, we highlight the increasingly important reflections of philosophers (Foucault, Deleuze) and communication theorists (Martin-Barbero, Jenkins) about our role current in society of control. That must mean, for our study, an increasingly centered on search for patterns of behavior by way of digital data. With the influence of new technologies, the digital universe and the arrival of Big Data, the market research proceeds to analyze the data from environments such as businesses databases or activities on social networks, and check what kind of consumption pattern can be identified. With that, they could theoretically build a communication to induce and direct the actions and consumers choices. As a result, the research compares two formats of action utilized by companies as a strategy for reaching possible consumers: the first, as a base, has qualitative tools and an understanding of the social environment and determined segments; the second considers the enormous dimension of existing techniques in the online environment that influence people's behavior.The work reflects on how business communication strategies are utilized by brands in order to involve and generate recognition from its audiences. As a working methodology, we use the following authors: Harold Lasswell, for identifying the influence of research in advertising communication; Jesús Martín-Barbero, one of the first scholars to understand the mediation between individuals and social environments; Philip Kotler and Gilbert A. Churchill, central authors in the understanding of marketing techniques; Michel Foucault, Felix Guattari and Gilles Deleuze to recognize how the look of Big Data articulated in our society of control. The dissertation considers that communication has a decisive role in influencing individuals' choices and constantly searches for the previous path in this process, in order to recognize and emphasize the variables that lead to these choices.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO

I - IDENTIFICANDO OS GRUPOS: PESQUISAS & COMUNICAÇÃO SEGMENTADA

1.1Lasswell X Martín-Barbero

1.2 Estudos e Pesquisas: Diferenciação dos grupos de consumo e suas fragilidades

1.3Segmentação: Uma mudança estrutural na comunicação II – MUDANÇA NOS PADRÕES

2.1 A comunicação na construção da subjetividade

2.2 Da disciplina para o Controle: Dos segmentos aos perfis programados III – BIG DATA : A COMUNICAÇÃO CRIADA COM BASE EM DADOS

ESTATÍSTICOS

3.1 Sai o Alquimista, entra o Cientista

3.2 Comunidades, Segmentação, rastreamento e navegação 3.2.1 Ciclo de vida dos dados

3.3 Big Data

3.4 Análise Preditiva

3.5 O Big Data no mundo corporativo e no dia a dia das pessoas 3.5.1 Marco civil: É possível não estar sendo controlado?

IV- CONCLUSÃO E CONSIDERAÇÕES FINAIS V- BIBLIOGRAFIA

5.1 Artigos Acadêmicos

5.2 Referências Bibliográficas eletrônicas

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Introdução

Esta pesquisa, desenvolvida no âmbito de mestrado em comunicação e semiótica, tem como objetivo principal compreender o que vêm conduzindo as escolhas dos indivíduos dentro do cenário atual do consumo. Para isso, o estudo procura verificar se a comunicação se mistura com as estratégias do mercado de consumo – e até que ponto isso ocorre – ou se apenas contribui para as decisões já tomadas nas corporações. Propõe-se ainda a racionalizar o processo pelo qual a comunicação passou e está passando nos últimos anos. Desse modo, esta dissertação se divide em duas etapas.

Em um primeiro momento, tem em vista investigar as metodologias das pesquisas que procuram encontrar um padrão de comportamento nas pessoas e transformá-las em consumidores. Ao vivenciar as transformações feitas no cenário da propaganda durante os últimos dez anos, é possível afirmar que as metodologias de pesquisa no campo das corporações são aplicadas no intuito de conhecer potenciais consumidores e seu universo. Esse esforço é realizado a fim de pautar as decisões do marketing e da própria empresa. É a partir dos insights, das percepções e atitudes retiradas desses estudos que são encontrados padrões para orientar as empresas sobre que tipo de produto criar, como torná-lo objeto de desejo, qual argumento de comunicação deve se empenhar em construir, que posicionamento necessita tomar e quais meios são os mais interessantes para utilizar em sua estratégia de divulgação e persuasão.

Na segunda etapa, este trabalho investigará a busca das instituições por informações e dados a respeito das atitudes das pessoas com base em informações extraídas do universo digital. Procuro entender como esses dados permitem a construção de um perfil dos usuários, direcionando a comunicação a ser criada com a estratégia de chamar sua atenção, e quais as consequências disso na especulação do mercado.

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Nesse cenário, a comunicação, que antes estava preocupada com diagnósticos qualitativos e comportamentais do consumidor, passa a importar-se e dar atenção também aos valores estatísticos, com base nas análises de dados. As corporações, nesse momento, cobram das empresas de comunicação a diminuição dos riscos e um retorno cada vez maior de seus investimentos. É a era do famoso Big Data.

Com o acesso às novas tecnologias, o interesse nas pesquisas qualitativas vão se transformando, paulatinamente, na procura por dados compatíveis com as ações realizadas pelos usuários no ambiente online. Dessa forma, é possível traçar um perfil compatível com o que de fato esse indivíduo consome.

O objetivo inicial deste trabalho foi pensado a partir da comparação entre dois formatos utilizados nas estratégias de marketing: o primeiro trabalha para entender as pesquisas qualitativas que procuram compreender o universo simbólico, as causas de identificação dos indivíduos com as marcas e o por quê de suas escolhas; o segundo tem como foco a ação do consumo, a diminuição dos riscos e o desperdício de verba.

Porém, com a facilidade e acesso às novas mídias, a área de comunicação das empresas e agências estão se especializando em análise de informações e, com isso, para efetuar suas criações, baseiam-se mais intensamente nos dados extraídos do ambiente online. Ao mesmo tempo, cada vez mais são cobradas pelas grandes corporações por resultados. Os possíveis consumidores têm suas ações no universo digital associadas aos dados numéricos extraídos do Big Data.

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I – Identificando os Grupos: Pesquisas & Comunicação

Segmentada

Somos segmentarizados por todos os lados e em todas as direções. O homem é um animal segmentário. A segmentaridade pertence a todos os estratos que nos compõem. Habitar, circular, trabalhar, brincar: o vivido é segmentarizado espacial e socialmente.

(DELEUZE; GUATTARI, 1996, p.83)

1.1

- Lasswell X Martín-Barbero

No processo de comunicação, para mapear o que induz e como são feitas as escolhas do consumidor contemporâneo, os processos de pesquisa quantitativa e qualitativa são fundamentais.

Neste primeiro capítulo a abordagem será feita com o foco nas metodologias e pesquisas qualitativas. É por meio delas que os empreendedores buscam informações a respeito de fatores externos à marca, como: opiniões, impressões, hábitos, comportamentos dos consumidores, seja em relação a um produto, serviço, sua comunicação ou instituição. A partir dessas informações é possivel que decisões, por parte das empresas, empresários e agências de publicidade, sejam tomadas de forma estratégica com relação aos concorrentes, aumento de vendas e à consolidação e imagem da marca.

A Escola de Chicago, inaugurada em 1892, foi de grande importância no aprimoramento e desenvolvimento de pesquisas para a área de comunicação. No início do século XX, em Chicago, foi feita a primeira importante tentativa de estudos dos centros urbanos combinando conceitos teóricos e pesquisa de campo de caráter etnográfico.

Nesse sentido, diversos estudos sociais e culturais foram produzidos em grandes metrópoles. Conduzidos por sociólogos, muitas premissas e hipóteses eram colocadas em xeque durante esses estudos. Parte deles serviram e ainda servem de referência para as metodologias de pesquisas feitas para as corporações.

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1926, reeditada em 1971. Nesse trabalho, o autor traz as principais sementes teóricas e metodológicas de como deveria ser conduzida uma pesquisa sobre propaganda.

Para Laswell, a propaganda era capaz de manipular as crenças, atitudes e ações do público. Essa posição é, até certa medida, herdeira de uma tradição aristotélica, em que a comunicação era, sobretudo, um ato político e intencional, direcionado para influenciar as pessoas. O projeto de Lasswell tornou-se o trabalho de sua vida inteira.

A tese centra discussões no estudo de conteúdos simbólicos e não simbólicos das propagandas, voltando-se para a análise dos temas mais comuns na publicidade de guerra norte-americana, inglesa, francesa e alemã durante a Primeira Guerra Mundial. A obra de Lasswell teve profunda influência no rumo que as pesquisas na área da Comunicação seguiram e ainda seguem, e este é um ponto que importa muito para a investigação deste trabalho.

Lasswell acreditava que cada comportamento era a manifestação de uma resposta a um estímulo, e que, em geral, poderia ser previsto. No contexto da sociedade de massa e entre as duas grandes guerras mundiais, o autor desenvolveu a Teoria Hipodérmica. O núcleo central dessa teoria diz que a mensagem produzida pela comunicação, apesar de ser elaborada e enviada para uma massa de recebedores, atinge cada indivíduo de forma pessoal – uma percepção inovadora para a época.

Segundo Teoria Hipodérmica, cada indivíduo é um átomo singular, que reage isoladamente às ordens e às sugestões dos meios de comunicação de massa monopolizados. Se as mensagens da propaganda conseguem alcançar os indivíduos que constituem a massa, a persuasão é facilmente inoculada. Isto é, se o alvo é atingido, a propaganda obtém o êxito que antecipadamente estabeleceu para si. Ou seja, bastava enviar uma mensagem que ela seria recebida e injetada no indivíduo.

O modelo da Teoria Hipodérmica é, de forma ampla, a própria teoria da ação psicológica behaviorista: o homem é resultado do meio e dos estímulos que recebe. A teoria defendia uma relação direta entre a exposição às mensagens e o comportamento: se uma pessoa é “apanhada” pela propaganda, pode ser controlada, manipulada e levada a agir. Esse modelo considera também que a comunicação é sempre intencional e visa obter determinado efeito suscetível de ser avaliado na medida em que gera um comportamento que pode ser associado ao objetivo inicial.

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cinco perguntas que se tornaram padrão para as pesquisas em comunicação: “Quem? Diz o quê? Por qual canal? Com que efeito? Para quem?”.

O “Quem?” refere-se aos estudos dos emissores; “Diz o quê?” é relativo ao conteúdo; “Por qual canal?”, tem relação com o estudo dos meios; “Com que efeito”, leva em consideração o estudo dos efeitos globais; e, finalmente, o “Para quem?”, refere-se aos estudos dos receptores. Essas questões foram inseridas em estudos de campo em diversos contextos sociais.

Entendo que a proposta do autor é um método desenvolvido em uma sociedade de massa, na qual percebia a comunicação como elemento instrumental e simétrica entre receptor e emissor. Porém, essa mesma metodologia ainda é muito utilizada nos dias de hoje. O formato das pesquisas qualitativas ainda buscam direcionar a comunicação para um segmento e compreender seus públicos e consumidores.

A organização proposta por Lasswell se tornou tradição nos processos de investigação e pesquisa, sendo possível organizar e fornecer informações assertivas aos diversos aspectos que envolvem a comunicação do ponto de vista do marketing. Com a ajuda da Teoria Hipodérmica, a publicidade ganhou espaço e transformou-se em um fator que amparou e incentivou o sentimento consumista da sociedade.

As técnicas desenvolvidas para articular e incentivar o consumo, preveem uma relação de pelo menos duas intenções: de um lado as pessoas, ao engajarem-se em atos e relações de consumo, obtêm prazeres, exercem poderes, encontram sentidos, constroem diversas subjetividades; de outro, a busca pelo lucro e a relação de poder e competição das corporações monopolizam esse setor.

* * *

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Na obra Dos Meios às Mediações, o autor identifica o desencontro entre método de estudo e situações reais e, dessa forma, rompe com a ideia de simetria entre emissor e receptor. Tal visão é mais atual e oposta à teoria que foi apresentada por Lasswell.

A questão fundamental nos procedimentos de pesquisa não é afinar o esquema teórico para que as situações coincidam com ele, mas construir uma problemática de comunicação, pensando na recepção e na produção de sentido, através do uso dos meios, do conteúdo e dos modos como as pessoas se comunicam. O massivo, para o autor, não se apresenta de modo monolítico, mas como um tecido interseccionado, fissurado, com irregularidades, ranhuras e, dessa forma, descreve uma nova cartografia de socialidades mediadas. Tendo em vista o período no qual o livro foi escrito, Barbero foi visionário ao dizer que um novo e promissor lugar apara uma reflexão em torno do pensamento corrente sobre o consumo.

Ao lançar novo olhar sobre os fenômenos midiáticos e de mercado, o autor se afasta da esfera de produção da “cultura de massa” e desenvolve sua análise por meio do conceito de mediação. Martín-Barbero propõe que devemos entender os indivíduos não apenas como receptores das mensagens, mas também como influenciados por diferentes universos com os quais tomam contato: individuais, sociais, populares, produtores da indústria cultural etc. Sendo assim, para compreender o consumidor, nesse primeiro momento de segmentação, não basta apenas enxergá-lo como um ser único, individual, mas é necessário considerar o ambiente e contexto que o envolvem. A perspectiva integradora e compreensiva dos estudos de Martín-Barbero enfatizam que todo o processo de comunicação é articulado a partir das mediações:

As mediações são esse “lugar” de onde é possível compreender a interação entre o espaço da produção e o da recepção: o que [a mídia] produz não responde unicamente a requerimentos do sistema industrial e a estratagemas comerciais, mas também a exigências que vêm da trama cultural e dos modos de ver. (MARTÍN-BARBERO; MUÑOZ, 1992, p. 20)

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Segundo Muniz Sodré, jornalista, sociólogo e professor da UFRJ, o conceito de mediações é consequência de uma tomada de posição metodológica e conceitual no campo da comunicação, que leva em conta não apenas as mudanças internas da cultura mas também suas novas dinâmicas detectadas pelas ciências sociais nos fenômenos da globalização e de movimentos populares. A partir dessa percepção sobre as novas posturas e funcionamentos da comunicação e da cultura em um mundo globalizado, a transdisciplinaridade emerge como o caminho teórico capaz de evitar a dissolução dos objetos comunicacionais de outras disciplinas e aproximá-los do campo dos “estudos culturais”.

Através das mediações, é possível entender, fundamentalmente, a interação entre produção e recepção ou entre as lógicas do sistema produtivo e dos usos, portanto o que se produz nos meios não responde unicamente ao sistema industrial e à lógica comercial mas, também, a demandas dos receptores, ressemantizadas pelo discurso hegemônico. (MARTÍN-BARBERO, 1987, p. 101)

Martín-Barbero acredita que as pessoas reinterpretam o que leem, ouvem ou veem tendo por base conhecimentos próprios, os quais são influenciados pelo bairro em que moram, pela escola, local de trabalho, religião, associações das quais fazem parte etc. Isso significa dizer que na recepção, interpretação e produção de mensagens pelo indivíduo há interferência de diversos fatores sociais, culturais, políticos e educacionais, ou seja, de mediações, conceito defendido por ele no livro

Dos Meios às Mediações.

[…] uma mediação de interesses e poderes contrapostos, que tem afetado e continua afetando especialmente a regulação dos discursos que, da parte do Estado, buscam dar estabilidade à ordem constituída e, da parte dos cidadãos – maiorias e minorias –, buscam defender seus direitos e fazer-se reconhecer, isto é, reconstituir-se permanentemente no social.

( Ibidem, p.17)

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1.2 – Estudos e Pesquisas: Diferenciação dos Grupos de Consumo e

Suas Fragilidades

No livro Governando o Presente, os autores Nikolas Rose e Peter Miller apresentam um estudo detalhado, realizado na Grã-Bretanha, no qual as concepções psicológicas das pessoas se cruzam com as preocupações das corporações e agências de propaganda, que desejam comercializar seus produtos. O estudo foi realizado pelo Tavistock Institute of Human Relations (Instituto Tavistock de Relações Humanas - ITRH). Criada em 1947, essa instituição é irmã da Clínica Tavistock e foi fundada subsequente à Segunda Guerra Mundial, assumindo uma série de investigações inovadoras em comportamento de grupo organizacional.

A partir dos anos de 1950, o ITRH foi abordado diretamente por muitas companhias importantes acerca do desenvolvimento e da comercialização de seus produtos. O instituto trabalhou com grandes agências de publicidade responsáveis pelo desenvolvimento de muitas campanhas, tais como Caldburys, Shell-Mex, British Petroleum, Guinness, entre outras.

Nikolas Rose e Peter Miller estudaram todo o material produzido pelo ITRH e, dessa forma, traçaram algumas variáveis, tendo como foco a relação do que era comunicado com a pessoa que assimilava seus significados.

Nosso foco restringe-se ao período em que, como hoje, as relações entre a propaganda e a subjetividade do consumidor eram assuntos de preocupação intelectual e de críticas: o período de 1950 a 1970. Acontecimentos ao longo desses vinte anos são interessantes por certo número de razões. Em primeiro lugar, ao largo dessas duas décadas, uma pletora de novos objetos de consumo de massa apareceu dentro do lar, novos meios de propaganda, incluindo-se a televisão, tornaram-se amplamente disponíveis, e divisavam-se novos meios de representar e de influenciar o consumidor baseado em conhecimento psicológico e psicanalítico. Daremos a entender que, no decurso de tais eventos, inventou-se uma nova forma de administração dos atos de consumo por meio de uma nova forma de expertise “psicológica”. Agências de propaganda e companhias individuais tendem a promover suas mercadorias voltadas crescentemente para esse campo das relações humanas, que era visto como algo oculto e inexplorado na multidão de escolhas que os indivíduos faziam entre um produto e outro, opções que, em si mesmas, podiam parecer triviais, mas que podiam ter uma influência fundamental na viabilidade econômica de uma empresa particular ou até mesmo da indústria. (ROSE; MILLER, 2012, p. 142)

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publicitários, mas alguém a ser conhecido em detalhes e cujas paixões e desejos deveriam ser diagramados. O consumo, por sua vez, era uma atividade ligada a toda uma forma de vida que precisava ser anatomizada e influenciada.

[...]Vance Packard denunciou os “persuasores ocultos”, aqueles que tentavam, frequentemente com sucesso impressionante, canalizar nossos hábitos inconscientes, nossas decisões de compra e nossos processos de pensamento mediante o uso de intuições recolhidas da psiquiatria e das ciências sociais. (Ibidem, p. 143)

A palavra ocultos se refere ao fato de que os esforços para persuadir caracterizam-se por ocorrer “sob nosso nível de consciência”. Não estavam em questão a invenção e a imposição de “falsas necessidades”, mas sim um delicado processo de identificação das “reais necessidades” dos indivíduos e ligar tais necessidades a produtos particulares e aos hábitos destes.

Inventar o consumidor exigia simultaneamente criar mercadoria e juntar os pequenos rituais da vida cotidiana que agregam, àquela mercadoria, significado e valor. Essa não é uma tentativa selvagem de impor desejos sobre uma massa plástica e indiferenciada, mas uma cartografia sem precedentes e meticulosa – parte imaginada, parte derivada de novas formas de experimentação – da vida diária de consumo e de seus pequenos prazeres e ansiedades.

A proposta de Martín-Barbero se integra às pesquisas do ITHR, apesar de os objetos de estudo serem diferentes: um trabalha o comportamento e o outro pesquisas nas áreas de comunicação e cultura. As ideias das duas partes se complementam e possibilitam o acesso e o estudo do ciclo completo da teoria da comunicação: de uma lado os aspectos políticos, culturais e sociais e de outro os aspectos subjetivos dos espectadores.

Essas ideias foram, ao longo dos anos, sendo aperfeiçoadas para o mercado de consumo, no intuito de compreender cada vez mais o universo desse espectador e de fornecer capacidade de maior assertividade para consequentemente elevar a margem de vendas. Rose e Miller alegam que os seres humanos, ao engajar-se em atos e relações em torno do consumo, obtêm prazeres, exercem poderes, encontram sentidos, constroem diversas subjetividades e praticam a socialidade de maneira criativa e inovadora.

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em termos de riqueza, cultura e gênero, e modelado por uma relação de poder na qual os produtores e seus agentes impõe seus conteúdos e valores sobre os outros, torna-se importante para esse projeto fazer, num primeiro instante, pelo menos as duas indagações que seguem: qual a influência das relações sociais para escolhas e decisões? Como as socialidades se organizam dentro do processo de consumo?

Segundo Rose e Miller, as sociabilidades são exercidas com o preço de se fechar os olhos aos regimes de exploração, ilusão e exclusão, que incrementam o consumo, e as subjetividades assim elaboradas são enfraquecidas ou prejudicadas. Do ponto de vista das empresas, seus objetivos estão focados em encontrar elementos em comum entre as pessoas que consomem e os produtos ou serviços oferecidos a elas. Nesse contexto, os estudos qualitativos são essenciais.

As pesquisas de marketing envolvem identificação, coleta, análise, divulgação e uso de informações. É um processo sistemático e objetivo organizado para identificar e resolver problemas de marketing das empresas. Assim a pesquisa de marketing pode ser classificada como pesquisa para a identificação de problema e pesquisa para solução de problemas. (MALHOTRA; BOCCO, 2006, p. 23)

Quanto maior o contato das instituições com o universo das pessoas, a possibilidade de criar uma comunicação com menos ruído é maior e os resultados esperados também. É comum, durante esse processo de aproximação entre empresas e possíveis consumidores, a utilização, por parte das instituições, de diferentes recursos e de profissionais de áreas distintas, como da psicologia, sociologia, antropologia ou até mesmo de segmentos especializados, dependendo do projeto.

Existem também diferentes abordagens metodológicas qualitativas, que variam de acordo com a necessidade do objeto de estudo: entrevistas em profundidade; vários indivíduos isolados; pesquisas in loco; entrevistas de grupo – Focus Group. Essas diversas metodologias servem para trazer informações capazes de identificar os elementos subjetivos do grupo analisado. O ambiente natural é a fonte direta para coleta de dados e o pesquisador é o instrumento-chave.

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1.3 - Segmentação: Uma Mudança Estrutural na Comunicação

A presença de outros que veem o que vemos e ouvem o que ouvimos nos assegura da realidade do mundo e de nós mesmos. (ARENDT, 1983, p.60)

Como próximo passo para a compreensão e análise mais precisa dos grupos de pesquisa, no campo mercadológico, foram criadas bases de segmentação e identificação de consumidores. Philip Kotler, especialista em matemática e ciências comportamentais, é um autor muito consultado pelas corporações que pretendem compreender as divisões de segmentação do mercado.

Kotler entende a possibilidade de segmentação do mercado ao considerar a noção de benefício como algo que exige a determinação das principais vantagens que as pessoas procuram em uma classe de produto. O autor identifica diversas variáveis para agrupar indivíduos com o propósito de auxiliar uma empresa na criação de produtos e serviços. Dentre as variáveis observadas por Kotler temos: as geográficas, demográficas e psicográficas. “Um mercado é formado por compradores que diferem entre si em um ou mais aspectos. Eles podem diferenciar em seus desejos, recursos, localizações geográficas, atitudes e práticas de compra. Quaisquer destas variáveis podem ser usadas para segmentar o mercado”. (KOTLER, 2006, p. 321)

Caminhando em direção às nomenclaturas denominadas por Kotler, entende-se por entende-segmentação geográfica o mercado que entende-se divide em unidades geográficas diferentes, não apenas por países, mas por cidades, municípios, regiões, bairros etc. Por exemplo, a Maxewell House, da General Food, vende café moído em todo o país, mas com aromas regionais. A segmentação demográfica consiste em dividir o mercado em grupos considerando a idade, sexo, tamanho da família, ciclo de vida familiar, renda, ocupação, religião, raça, nacionalidade etc. Estas características são as mais comuns para distinguir grupos de pessoas que apresentam desejos e preferência semelhantes.

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As equipes de marketing, sabendo disso, caminham ao lado dessas percepções, dotando seus produtos de personalidades para que seus consumidores se identifiquem com a marca. A marca Apple, ao lançar um novo computador, ofereceu sem custo seus produtos para grandes celebridades, como Gisele Bündchen. Nessa ação, a marca ganhou exposição em diferentes meios de forma espontânea, atrelando seu produto ao dia a dia de celebridades desejadas.

Kotler categoriza cada modo de agrupar os indivíduos no intuito de produzir uma comunicação direcionada para determinado grupo. Segmentação comportamental é o que o autor compreende por pessoas que se identificam com marcas e produtos. Elas encontram benefícios na mercadoria, se assimilam ao universo de uso e são leais às marcas.

Nessa forma de segmentação, os indivíduos são divididos em grupos com base no seu conhecimento, atitude, uso ou resposta ao produto. O autor entende que a segmentação comportamental pode estar presente em diferentes ocasiões: quando os consumidores sentem uma necessidade, compram ou usam um produto (por exemplo, uma viagem aérea pode ser necessária em ocasiões relacionadas a negócios, férias ou a problemas familiares); e também quando existe acordo entre o consumidor e diferentes benefícios que busca em um produto.

A condição do usuário, seu momento de vida, também é uma forma de segmentação comportamental. Dessa maneira, muitos mercados podem ser segmentados entre usuários regulares e usuários em potencial, e, por isso, as empresas com alta participação de mercado estão particularmente interessadas em converter os usuários potenciais em usuários regulares. Esses dois tipos de segmentos exigem abordagens e conteúdos diferentes nas estratégias de marketing.

Atualmente, as empresas costumam segmentar um mercado combinando duas ou mais variáveis, para mapear o segmento de interesse.

Complementando os estudos do Kotler, os autores Gilbert A. Churchill Jr. e J. Paul Peter, no livro Marketing - Criando valor para os clientes, definem segmentação como o processo de dividir um mercado em grupos de compradores potenciais que tenham semelhantes necessidades e desejos, percepções de valores ou comportamentos de compra.

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quais segmentos de mercado podem atender de forma mais lucrativa, enquanto as organizações sem fins lucrativos usam-nas para ser mais eficientes no alcance de suas metas. O segmento específico de mercado que uma organização seleciona para servir o mercado alvo1. (CHURCHILL JR.; PETER, 2000, p. 202)

Um exemplo disso são as editorias. No Brasil, a revista Claudia surgiu em 1961, lançada com o intuito de atingir especificamente o público feminino. No decorrer do tempo, a mesma revista foi se aproveitando de várias segmentações, criando outras divisões que se transformaram em outras revistas como: Casa Cláudia

e Claudia Cozinha, entre outras.

Nesse período, o momento histórico nacional gerava oportunidades para novos negócios advindos da industrialização promovida pelo governo JK e, com isso, também na década de 1960 foi criada a revista Quatro Rodas, especialmente para homens apaixonados por carros. Posteriormente, as editorias Duas Rodas e Placar

foram criadas acompanhando as paixões masculinas por motos e esportes. A partir daí, diversas revistas foram criadas para atender às diferentes demandas dos públicos. Caminhando nessa direção, as editoras foram acompanhando mudanças sociais e culturais. A revista NOVACosmopolitan é uma publicação mensal da editora Abril, sob permissão do The Hearst Corporation, de Nova York, EUA. No Brasil, desde a década de 1970 traz na capa, associada à logomarca, o conceito de Cosmopolitan. Pioneira, a revista exerceu um papel decisivo na época ao quebrar tabus sexuais – nenhuma revista abordava o tema do sexo da maneira direta como ela fez e ainda faz. A temática do sexo é frequente nos periódicos femininos desde então. A revista NOVA Cosmopolitan é um exemplo dos títulos que privilegiam esse assunto, ressaltando, assim, o fenômeno da “segmentação”, uma característica interessante das revistas especializadas.

A segmentação da imprensa feminina surge como consequência de demandas provenientes de diversos setores da sociedade. Fazem com que essa mídia se divida de acordo com recortes de classe social, faixa etária, estilo de vida, prioridades de cunho pessoal e/ou profissional, e mesmo de etnias, conforme divisão apresentada anteriormente. Dessa forma, não faz sentido pensar na categoria “revista feminina” como um todo, na medida em que cada revista se volta especificamente para a segmentação de determinadas mulheres como adolescentes, maduras, pobres, de elite,

1 Nas palavras do autor, mercado alvo é o segmento específico do mercado que uma organização

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emergentes, que cozinham, que costuram, que assistem a novelas, que desejam emagrecer, negras, orientais, esportistas etc. Compõem, no seu somatório, um surpreendente mosaico do universo feminino na sociedade de hoje.

Ou seja, queremos dizer, com o pequeno panorama apresentado acima, que diferentes editorias foram sendo criadas para atender demandas e grupos específicos. Dessa maneira é possível produzir um conteúdo de acordo com o que os leitores buscam.

Já do ponto de vista do broadcast na década de 1990, podemos notar a existência de centenas de canais transmitindo programas ao vivo durante 24 horas por dia, nos sete dias da semana. A maior parte dessa programação era horrenda e maçante: longos comerciais de novos utensílios de cozinha, videoclipes da última banda de música, desenhos animados e notícias de celebridades. Com o passar dos anos, a quantidade de canais aumentou e novos conteúdos surgiram. Porém, para qualquer telespectador, apenas uma porcentagem mínima da programação era interessante, afirma Eli Pariser no livro O Filtro Invisível: O que a Internet Está Escondendo de Você: “[...] com o aumento do números de canais, o método habitual de mudar de um para outro estava ficando cada vez mais frustrante. Percorrer a programação de cinco canais é uma coisa. Com quinhentos canais, a coisa muda de figura. E quando o número chega a 5 mil.” (PARISER, 2011, p. 25)

Com o aumento de possibilidades, a televisão foi reformulada, não apenas em seu conteúdo, mas também no aparato tecnológico. Os aparelhos aderiram às novas tecnologias, inserindo filtros de interesse e campos de busca, para que o espectador consiga visualizar todas as suas possibilidades e escolha de acordo com seu perfil. A televisão, dessa forma, passou pelo mesmo caminho das editorias impressas, criando novos canais e conteúdos de comunicação ao identificar demandas de nichos e grupos específicos.

Em 1956, Wendell Smith publicou o artigo “Product Differentiation and Marketing Segmentation as Alternative Marketing Strategies”, no Journal of Marketing da American Marketing Association. O estudo sobre segmentação era inovador para a época. Em suas pesquisas, Smith propõe observar a segmentação do mercado por meio do desenvolvimento de diferentes combinações de propostas de marketing, visando alcançar as diversas necessidades dos consumidores.

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atendimento às necessidades das partes ditas segmentos de mercado. O entendimento dele sobre o assunto “[...] consiste em uma visão de mercado heterogêneo caracterizado por demandas divergentes em alguns pequenos mercados homogêneos em termos de respostas às preferências de diversos produtos para diferentes segmentos de mercado”. (SMITH, 1956, p. 4)

O artigo de Smith é claro e usual, demonstrando que a oferta precisa estar adequada às pequenas ou grandes variações encontradas entre os diversos segmentos que compõem o mercado. A operacionalização desse conceito para as organizações significa ajustar racionalmente e precisamente o produto, a logística empresarial e, em consequência, os esforços de planos de marketing frente às exigências e demandas dos consumidores.

Na prática, a segmentação tem como principal finalidade encontrar as diferenças e as características similares entre os consumidores e, em um segundo momento, reagrupá-las em grupos semelhantes no que se refere a determinados aspectos objetivos e subjetivos, de modo a otimizar o posicionamento de produtos e facilitar estratégias de marketing. O objetivo dessa ação é aumentar e assegurar a competitividade das organizações diante de seus concorrentes e, nos mercados atuais, caracterizar as marcas e diferenciá-las em meio ao grande número de opções oferecidas.

Diversas marcas tornaram-se exemplos de segmentação depois que muitos teóricos e executivos perceberam que tal modelo de mercado se constitui em uma poderosa arma de marketing, cujas implicações decorrem da escolha de segmentos bem definidos para delinear estratégias competitivas. Um desses exemplos é a coleção de relógios Swatch, uma criação de marketing por excelência, que apareceu pela primeira vez em 1983, quando os fabricantes asiáticos começaram a substituir os relógios mecânicos por microprocessadores a quartzo, diferenciando não apenas os seus componentes, como também seu design e formato. A marca criou distintos modelos, segmentando a sua linha de produto e sua comunicação, oferecendo relógios desde os tradicionais até os contemporâneos.

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público-alvo e, finalmente, posiciona-se o produto como forma de expressar as diferenças existentes. Como se pode perceber, a segmentação, no conjunto, é a base de toda a estratégia dos mercados capitalistas.

Em consequência da segmentação, a variedade de opções que a contemporaneidade oferece é um fator que contribui para a busca de experiência e customização. As concorrências aumentam e, por consequência, as empresas precisam reter seus consumidores. Nesse contexto, a personalização/customização andam juntas, gerando um dilema para muitos modelos de negócios baseados na massificação da criação, produção e distribuição.

A produção em massa reduz custos e permite a prática de preços mais atraentes, mas isso só funciona em determinados cenários. Em outros, não há possibilidade de massificar e a marca se vê obrigada a segmentar e até a subsegmentar, do contrário não consegue fazer com que o consumidor se identifique com os produtos e serviços oferecidos.

A utilização dessas técnicas tornam o conteúdo midiático e a própria mídia coprodutoras de nossas representações mentais, de nossas ações e relacionamentos com outras pessoas. Elas não seriam tão atraentes se não mexessem com nosso desejo além do material, se não criassem uma motivação para maximizar o sentimento de autoexpressão. A sensação diante da variedade gigantesca de produtos e serviços sugere a ideia de liberdade de escolha e decisão.

Entendo que esta seja apenas uma ideia inadequada de liberdade, pois, como afirma Spinoza, não há, na mente, nenhuma vontade absoluta ou livre: a mente é determinada a querer isto ou aquilo por uma causa que é, também ela, determinada por outra, e esta última, por sua vez, por outra, e assim por diante. É da própria natureza humana desejar e querer, independentemente de ter clareza das motivações para tal. Os indivíduos direcionam, conscientemente, seus esforços para o que lhes parece útil, salvo o desejo, que opera de maneira diferente. Este faz com que os objetos desejados sejam vistos como bons, como vulgarmente expressam as pessoas ao dizerem que desejam algo porque aquilo é bom em si mesmo, ou seja, algo em sua essência é bom.

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acreditam que a natureza (que pensam nada fazer senão em função de algum fim) observa essas ideias e as estabelece para si própria como modelos”. (SPINOZA, 2009, p. 156)

Essa ilusão faz com que as pessoas confundam a relação entre a causa e seu efeito pela relação entre meio e fim. As pessoas estão, de fato, conscientes de suas ações e de seus apetites, mas desconhecem as causas pelas quais são determinadas a apetecer algo.

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II - Mudança nos Padrões

2.1 - A Comunicação na Construção da Subjetividade

Não há, na mente, nenhuma vontade absoluta ou livre: a mente é determinada a querer isto ou aquilo por uma causa que é, também ela, determinada por outra, e esta última, por sua vez, por outra, e assim até o infinito. (SPINOZA, 2009, p.107 )

A produção de subjetividade, para além do que corresponde às práticas humanas em sociedade, está diretamente relacionada às estratégias do capitalismo contemporâneo, para as quais a publicidade empresta seu poder de narrar a experiência humana, incorporando-a para estabelecer laços e vínculos com os sujeitos instaurados como consumidores. A publicidade tem como objetivo divulgar novas ideias, produtos e serviços buscando atingir possíveis grupos de consumidores. Por sua vez, pessoas desesperadas, ávidas por novos modelos para seguirem, compram no mercado seus gostos pessoais.

Como vimos, as metodologias das pesquisas de mercado e a segmentação são fatores decisivos nesse processo. É por meio deles que se entende o campo simbólico mais próximo das pessoas e são criados discursos e desejos pertinentes àquela realidade.

Mesmo com tantas mudanças ocorrendo na campo da comunicação, com indivíduos mais participativos e colaborativos, a mídia ainda é produtora de verdades, hábitos e costumes. A subjetividade, nesse contexto, é um resultado da nossa relação com esse meio.

Os meios de comunicação são poderosas ferramentas para a formulação e propagação de opiniões, saberes, normas, valores e subjetividade. Esses meios, por sua vez, aplicam estratégias para tirar vantagem comercial, política e social. “Imagens-movimento ou imagens-tempo se constituem em germes de produção de subjetividade e não se trata de uma imagem passivamente representativa, mas de um vetor de subjetivação.” (GUATTARI, 1992, p 39) A mídia, de maneira geral, invade o cotidiano das pessoas, muda o rumo de suas vidas, influencia suas ações e atitudes e ajuda a construir, assim, uma subjetividade, conforme a afirmação de Félix Guatarri.

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[...] na genealogia da subjetivação, o lugar de honra não é ocupado pelos filósofos que refletem, em seus estudos, sobre a natureza da pessoa, a vontade, a consciência, a moralidade e coisas semelhantes, mas, em vez disso, pelas práticas cotidianas nas quais a conduta tornou-se problemática para outros ou para si própria, bem como pelos textos e programas mundanos que buscam tornar esses problemas inteligíveis e, ao mesmo tempo, administráveis. (ROSE, 2001, p. 37)

Claramente, a mídia exerce um papel fundamental em criar novos hábitos; ela participa na construção da subjetividade dos indivíduos. Uma das estratégias de subjetivação midiática refere-se ao uso de linguagens, de signos gráficos, de símbolos, na tentativa de se aproximar do público ao qual pretende se alcançar efetivamente:

De uma maneira mais geral, dever-se-á admitir que cada indivíduo, cada grupo social veicula seu próprio sistema de modelização da subjetividade, quer dizer, uma certa cartografia feita de demarcações cognitivas, mas também míticas, rituais, sintomatológicas, a partir da qual ele se posiciona em relação aos seus afetos, suas angústias e tenta gerir suas inibições e suas pulsões. (GUATTARI, 1992, p. 20)

Apropriando-se das demarcações cognitivas de populações de espectadores, é possível gerir suas inibições e pulsões. As estratégias de comunicação aplicam essa técnica de reconhecimento de territórios cognitivos para conquistar audiência ou mesmo para efetuar a compra ou venda de um serviço. Sobre esse processo é preciso termos consciência, ainda, de que não são somente a comunicação e a mídia os únicos responsáveis pela construção da subjetividade nos indivíduos. Outros dispositivos disciplinares são fundamentais para isso como: o momento político, a família, a escola, as experiências sociais e pessoais. Dessa forma, entendo que a subjetividade é fruto das relações entre diferentes disciplinas. Segundo Guatarri:

A sociologia, as ciências econômicas, políticas e jurídicas parecem, no atual estado de coisas, insuficientemente armadas para dar conta de uma tal mistura de apego arcaizante às tradições culturais e entretanto de aspiração à modernidade tecnológica e científica, mistura que caracteriza o coquetel subjetivo contemporâneo. (Ibidem, p. 13-14)

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Na contemporaneidade, os meios de comunicação estão presentes em nossas vidas o tempo todo. Eles representam forte influência na construção da subjetividade dos indivíduos. Essa subjetividade produz novas formas de comunicação que, por sua vez, geram nova subjetividade e assim por diante. Nessa espiral, cada movimento sucessivo da produção de subjetividade em direção à produção do comum é uma inovação que resulta em uma realidade mais complexa.

O que importa aqui não é unicamente o confronto como uma nova matéria de expressão, é a constituição de complexos de subjetivação: indivíduo-grupo-máquina-trocas múltiplas, que oferecem à pessoa possibilidades diversificadas de recompor uma corporeidade existencial, de sair de seus impasses repetitivos e, de alguma forma, de se re-singularizar. (Ibidem, p. 17)

Na atualidade, o estilhaçamento de uma única tendência dominante em zilhões de fragmentos culturais multifacetados é algo que revoluciona em toda a sua extensão os meios de comunicação. Sem dúvida esse fenômeno é um dos fatores decisivos na construção do ser humano contemporâneo desterritorializado, não fixo em um único ponto, mas inserido, no essencial, em universos incorporais. A subjetividade entrou no reino de um nomadismo generalizado. “Os jovens que perambulam nos boulevards, com um walkman colado no ouvido, estão ligados a ritornelos que foram produzidos longe, muito longe de suas terras natais.” ( Ibidem, p. 169)

De acordo com Guatarri, os centros urbanos são máquinas produtoras de subjetividade individual e coletiva. A cidade produz o destino da humanidade: suas promoções, assim como suas segregações, a formação de suas elites, o futuro da inovação social, da criação em todos os domínios. Constata-se muito frequentemente um desconhecimento desse aspecto global das problemáticas urbanas como meio de produção de subjetividade. Em essência, o objeto urbano é de uma complexidade muito grande e exige ser abordado com as metodologias apropriadas à complexidade.

Entrelaçam-se nesse contexto as pesquisas de mercado e, por meio delas, é possível compreender as variáveis que influenciam a construção da subjetividade para, em seguida, criar uma comunicação de acordo com os registros levantados, conforme vimos anteriormente.

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da alma”, de relações interpessoais ou nos complexos intrafamiliares. A subjetividade não é fabricada apenas através das fases psicogenéticas da psicanálise ou dos “matemas do Inconsciente”, mas também nas grandes máquinas sociais, mass-mediáticas, linguísticas, que não podem ser qualificadas de humanas. Assim, um certo equilíbrio deve ser encontrado entre as descobertas estruturalistas, que certamente não são negligenciáveis, e sua gestão pragmática de maneira a não naufragar no abandonismo social pós-moderno. (Ibidem, p. 20)

O sujeito contemporâneo de consumo é um ser complexo. Para compreendê-lo é necessário olhar não apenas para os imperativos de lucro e mudanças gerais no entendimento cultural. Uma estratégia indispensável a ser levada em consideração na busca por apreender esse sujeito é o exame dos modos pelos quais atuam a individualidade, a personalidade e a psicologia humana. Essas disciplinas são compreendidas e estudadas pelas ciências da psicologia, que desempenha um papel chave na construção das tecnologias do consumo.

Penso que o sujeito contemporâneo de consumo não pode ser compreendido somente por meio da observação sobre o que ele compra em termos de bens e serviços, mas, sim, como um ser que consome símbolos a todo instante. A comunicação, nesse sentido, cria um discurso pertinente com os desejos e anseios desses indivíduos. Grandes corporações globais se esforçam para atender o maior número de pessoas e gostos e, para isso, laçam novos produtos cada vez mais adaptados ao perfil de cada um.

Na raiz de todos os modos de subjetivação, a subjetividade pática é ocultada na subjetividade racionalista capitalística, que tende a contorná-la sistematicamente. A ciência é construída sobre uma tal colocação entre parênteses desses fatores de subjetivação que só encontram o meio de vir à expressão colocando fora de significação certas cadeias discursivas. (Ibidem, p. 39)

A sociedade enquanto sistema é extremamente complexa, e qualquer processo ou evento que nela acontece é suscetível de um complexo sistema de desdobramentos gerador de infinitos sistemas de consequências que estão mais além das representações conscientes dos indivíduos envolvidos em tais eventos. Dessa forma, esses eventos só podem ser estudados em sua real complexidade por meio de elementos diferenciados de informação dos sujeitos, e esses elementos permitem articular, em um modelo, a significação do social.

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modo como as diversas condições objetivas da vida social afetam o homem. Ela divide espaço com a razão no desenvolvimento do trabalho e da negociação econômica. A produção não cria apenas um objeto para o sujeito, mas também o sujeito para um objeto. Para manter esse ciclo, é necessário ter conhecimento dos desejos e anseios desse sujeito.

A subjetividade racionalista aparece quando o sujeito ou grupos de estudos se implicam em sua expressão e a pesquisa adquire sentido para eles. A informação puramente cognitiva, que caracteriza a forma como os indivíduos respondem a muitos instrumentos empregados pelas ciências sociais, são, com frequência, mais significativo para ocultar a subjetividade.

Ou seja, na prática, para encontrar a essência desses grupos e transformá-la em

insights para a comunicação, as metodologias de pesquisas e o trabalho do pesquisador são essenciais nesse processo.

2.2 Da Disciplina para o Controle: Dos Segmentos aos Perfis

Programados

Como disse anteriormente, tenho consciência de que, para compreender as formas de subjetivação da mídia na sociedade atual, é preciso voltar o olhar para a construção histórica, social e política das práticas que influenciaram essas produções de saberes. O homem, nesse sentido, não é apenas o resultado da sua própria natureza, mas sim o fruto de suas relações com a vida, trabalho, estudos etc.

Ao longo das últimas décadas, diversas mudanças nos padrões de comportamento das pessoas aconteceram; em parte por consequência de forças políticas, econômicas e das novas tecnologias. A comunicação, por sua vez, caminhou na mesma direção das transformações ocorridas, uma vez que produzem novas formas de exercer o poder e de agir sobre ele. Compreender a atuação biopolítica diante das mudanças mencionadas acima e o que ocasionou-as é essencial para perceber como as pessoas estão reagindo a elas e para qual direção estão seguindo.

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forma de dominação a outra, quando a economia percebe ser mais eficaz e rentável “vigiar” do que simplemente “punir”.

O poder disciplinar é com efeito um poder que, em vez de se apropriar e de retirar, tem função maior de “adestrar”, ou, sem dúvida, adestrar para retirar e se apropriar ainda mais e melhor. Ele não amarra as forças para reduzi-las; procura ligá-las para multiplicá-las e utilizá-las num todo [...] “Adestra” as multidões confusas, móveis, inúteis de corpos e forças para uma multiplicidade de elementos individuais – pequenas células separadas, autonomias orgânicas, identidades e continuidades genéticas, segmentos combinatórios. A disciplina “fabrica” indivíduos; ela é a técnica específica de um poder que toma os indivíduos ao mesmo tempo como objetos e como instrumentos de seu exercício. (FOUCAULT, 1999, p.143)

Segundo Foucault, a relação entre vigiar e punir tinha como objetivo “adestrar” as pessoas para que elas exercessem suas tarefas como bons cidadãos. Vigiar consiste em evitar ao máximo que as pessoas infrinjam as normas estabelecidas pelo poder. Já a arte de punir está ligada a uma sanção normalizadora. A disciplina é necessária para que haja obediência, criando, dessa maneira, um corpo obediente, dócil e útil.

A disciplina, como tipo de poder, se constitui por meio de instituições tais como penitenciárias, escolas, fábrica, família etc. As instituições disciplinares têm a intenção de adestrar e aumentar cada vez mais a vigilância constante sobre indivíduos. Para que isso ocorra, os indivíduos sob a custódia facultativa ou obrigatória das instituições devem ser adestrados e vigiados por alguém que sobre eles exerça “seu poder”, ligando-os a aparelhos de produção, formação e correção.

O exercício da disciplina supõe um dispositivo que obrigue pelo jogo do olhar; um aparelho onde as técnicas que permitem ver induzam a efeitos de poder, e onde, em troca, os meios de coerção tornem claramente visíveis aqueles sobre quem se aplicam. (Ibidem, p. 143)

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O autor recorre ao panóptico2 para explicar como age o poder na sociedade: o “ver sem ser visto”, o “poder do olhar”, automatizando e desindividualizando o poder.

Esse artifício está ligado, ao mesmo tempo, à vigilância e à observação, à segurança e ao saber, à individualização e à totalização, ao isolamento e à transparência. Seu efeito mais importante, em uma penitenciária, por exemplo, é induzir no detento um estado consciente e permanente de visibilidade que assegura o funcionamento automático do poder sobre ele. Os detentos são vistos como corpos individuais que devem ser vigiados, treinados, utilizados e, eventualmente, punidos.

É necessário ter em mente que o poder disciplinar é constituído, por um lado, por relações de força e, por outro, constrói verdades levando em conta as implicações que isso traz. Ou seja, as relações de poder são determinadas tanto por relações de força – esta podendo ser apontada em distintos níveis –, quanto pela criação de discursos (incluído aqui o discurso jornalístico e publicitário), que são um dos principais instrumentos de inserção de noções de verdade na realidade social em que se insere, nas microrrelações e/ou nos grupos em que se enquadram com a intenção de manter a disciplina.

As relações de força, que podem se dar de maneira eficiente no campo do discurso, são identificadas em distintas etapas dos processos de interação social, como as identidades, as relações de troca etc

.

A disciplina enquanto hábito, exercício, cria saberes e verdades que não apenas a justificam, mas também apontam como o indivíduo deve se conduzir e ser conduzido.

A mídia de massa, logo no seu início, traduzia esse contexto na medida em que ditava e se apropriava dos discursos, tornando-se, assim, um forte instrumento de poder, já que era configurada por poucos emissores, o que permitia a ela dominar a informação. O poder exercido pela mídia de massa era, ao mesmo tempo, individualizante e totalizante na produção de corpos dóceis e produtivos para o capital. Para o poder, o indivíduo caracteriza-se por fixação espacial, confinamento,

2

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emprego maximal do tempo, vigilância constante e anônima; acumulação de homens em paralelo à acumulação de capital.

Os sistemas de “adestramento” elaborados pela mídia de massa permitiam que, a cada momento, a sociedade e os cidadãos fossem domados e controlados em seu cotidiano. Os meios de comunicação criaram discursos e modelos ideológicos a serem seguidos tendo como base o incentivo à economia do capital. Estudiosos apontaram para o fato de que esses discursos não são simplesmente aquilo que manifesta (ou oculta) o desejo, mas são também aquilo que é o próprio objeto do desejo.

Esse modelo de discurso gerado pelos meios de comunicação de massa teve seu auge durante a Segunda Grande Guerra, quando os poderes oficiais se utilizavam dos veículos de massa visando adquirir força política e impor seu modelo de gestão. A partir da segunda metade do século XX houve o declínio da sociedade disciplinar que deu espaço para a ascensão da sociedade de controle. Michel Hardt examina com bastante procedência essa mudança de estratégias pelo manutenção do poder:

O que gostaria de sugerir é que a forma social tomada por esse novo Império é a sociedade de controle mundial. A passagem da sociedade disciplinar à sociedade de controle se caracteriza, inicialmente, pelo desmoronamento dos muros que definiam as instituições. Haverá, portanto, cada vez menos distinções entre o dentro e o fora. Trata-se, efetivamente, de um elemento de mudança geral na maneira pela qual o poder marca o espaço, na passagem da modernidade à pós-modernidade. A soberania moderna sempre foi concebida em termos de território – real ou imaginário – e da relação desse território com seu fora. É assim que os primeiros teóricos modernos da sociedade, de Hobbes a Rousseau, compreendiam a ordem civil como um espaço limitado e interior que se opõe à ordem exterior da natureza, ou que dela se distingue. O espaço circunscrito da ordem civil, seu lugar, se define por sua separação dos espaços exteriores da natureza. (HARDT, 2000, p. 358.)

A sociedade de controle não apresenta mais fronteiras definidas, não possui muros, tudo se torna atrelado à ideia global e difundida de que cada formação social está ligada às outras, como parte de um projeto imperial.

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absorver qualquer forma de mudança ou transformação, para, assim, dar continuidade homogênea e hegemônica à causa capitalista.

Há aí uma vigilância contínua, concretizada pela propagação das câmeras espalhadas por toda a parte: no comércio, bancos, escolas e até mesmo nas ruas. Se a principal premissa da sociedade disciplinar era fazer com que o indivíduo modelasse o seu comportamento a partir da possibilidade de estar sendo vigiado por alguém, essa perspectiva transmutou-se com o advento da sociedade de controle. O que presenciamos nesta é que houve uma espécie de incorporação da disciplina a tal ponto que os indivíduos podem estar sob os efeitos dos dispositivos disciplinares independente da presença de algum tipo de autoridade investida de poderes capazes de impor os procedimentos de poder e saber. “O controle é, assim, uma intensificação e uma generalização da disciplina, em que as fronteiras das instituições foram ultrapassadas, tornadas permeáveis, de forma que não há mais distinção entre dentro e fora” (Ibidem, p. 369 )

Deve-se levar em conta que, com a passagem da sociedade disciplinar para a sociedade de controle, há uma internalização do controle. Marcado pela descentralização, invisibilidade e onipresença, esse modelo implica em um controle total do tempo. Ele é contínuo e refere-se ao futuro, para onde tudo marcha por si mesmo.

Seguindo as análises de Foucault3, a sociedade de controle é marcada pela interpenetração dos espaços, por sua aparente ausência de limites definidos e pela instauração de um tempo contínuo no qual os indivíduos nunca conseguem terminar nada, pois permanecem prisioneiros em uma campo aberto.

As relações nesse modelo ficam mais complexas e o poder se torna cada vez mais não localizável, pois está disseminado entre as ligações das redes. As instâncias de poder se dissolvem e não possuem mais uma cara única. “O essencial não seria mais a assinatura nem um número, mas uma cifra: a cifra é uma senha [...] A linguagem digital do controle é feita de cifras, que marcam o acesso ou a recusa a uma informação” (DELEUZE, 1990. Paris: Les Éditions de Minuit,)

A relação entre identidade pessoal e código intransferível implica em indivíduos que deixam de ser justamente indivisíveis, pois passam a sofrer uma

3

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espécie de divisão, que resulta do estado de sua senha, de seu código. As pessoas passam a ser controladas por suas senhas.

Com a tecnologia, fica mais fácil rastrear, monitorar e controlar as informações e ações das pessoas. A vigilância sobre elas é constante e intensificada pela disseminação de dispositivos tecnológicos capazes de identificar seus filmes prediletos na smart TV ou até mesmo seus exames médicos. Por meio das novas tecnologias de comunicação e informação, na sociedade de controle, nada escapa de uma documentação partilhada entre diferentes instituições, cada vez mais abertas ao intercâmbio, produzindo um controle incessante sobre cada indivíduo.

Na contemporaneidade, os meios de comunicação desenvolveram-se de uma forma espantosa, sempre em sintonia com os interesses das sociedades capitalistas. Uma das marcas fundamentais do mundo atual é exatamente o inesgotável fluxo de imagens e de conteúdos simbólicos, disponibilizados pelos canais de comunicação a um número cada vez maior de pessoas.

O que controla toda essa estrutura capitalista é o discurso do outro, são os lemas da sociedade que mantêm esses pilares erguidos e, atrás desse discurso, há o controle. Tal controle a sociedade não consegue ver, e ele é de extrema importância para que toda a estrutura de poder continue firme e funcionando, levando-nos cada vez mais a uma vida superficial e artificial que atende às aspirações de quem precisa dessa artificialidade para acumular mais e mais.

Mais uma vez, como o próprio capitalismo, a sociedade de controle só funciona se esfacelando. Com a sociedade de controle, chegamos, enfim, a uma forma de sociedade propriamente capitalista, que a terminologia de Marx denomina a sociedade da subsunção real. Não se pode pensar a sociedade de controle sem se pensar o mercado mundial. O mercado mundial, segundo Marx, é o ponto de partida e o ponto de chegada do capitalismo. Com a sociedade de controle, chegamos finalmente a esse ponto, o ponto de chegada do capitalismo. Como o mercado mundial, ela é uma forma que não tem fora, fronteiras, ou então possui limites fluidos e móveis. Para retomar o título de minha exposição, a sociedade de controle já é, de modo imediato, uma sociedade mundial de controle. ( HARDT, 2000, p. 371-372.)

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As tecnologias de controle, nesse caso, não são limitada apenas a seus aparatos técnicos, como câmeras e softwares, mas servem também como tecnologias discursivas e mecanismos subjetivos de controle do trabalho e do social. É possível afirmar que na sociedade de controle passamos das estratégias de assimiladores de mensagens ao rastreamento de padrões de comportamento. As mídias exercem um papel fundamental nesse processo, na medida em que contribuem com tecnologias de observação e ainda propõem padrões de comportamento, mecanismos indispensáveis à introjeção das ideias que conduzem a uma autocensura.

As empresas e os canais de comunicação possuem uma materialidade que obedece aos mecanismos da economia e do poder em forma de imprensa, edição, rádio, cinema, televisão, internet. Nesse sentido, a sociedade de controle tem como valores o prestígio da informação. Nenhuma forma de poder parece ser tão sofisticada quanto aquela que regula os elementos imateriais de uma sociedade: informação, conhecimento e comunicação.

Por consequência, o estímulo ao consumo – marcado pela criação de valores, pela ideia de melhora na condição de vida e incentivo à economia – tornou-se alvo de instrumentos de poder por uma forma de governar exercendo controle sobre o indivíduo. Vemos assim a produção de uma sociedade calcada no autocontrole, na autovigilância e na intensificação da produção de homens.

O papel desempenhado pelo sistema da mídia é um importante ator discursivo, propositor de definições da realidade. É evidente que o campo midiático é lugar de disputas entre diferentes participantes, em condições desiguais de poder econômico e simbólico, sendo o somatório de seus discursos uma polifonia nem sempre afinada. No seu conjunto, entretanto, podem ser identificadas tendências à reiteração da ordem social instituída – seja em termos institucionais, seja em relação a conflitos de classe, raça ou gênero.

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