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Conflitos ambientais, o direito à água e mediação no baixo São Francisco : a atuação do Ministério Público Federal em Sergipe

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Academic year: 2021

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(1)UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO PROGRAMA REGIONAL DE DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE. CONFLITOS AMBIENTAIS, O DIREITO À ÁGUA E MEDIAÇÃO NO BAIXO SÃO FRANCISCO: A ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL EM SERGIPE. Autor: Pablo Coutinho Barreto Orientador: Profa. Dra. Flávia Moreira Guimarães Pessoa. Novembro – 2011 São Cristóvão – Sergipe Brasil.

(2) ii UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO PROGRAMA REGIONAL DE DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE. CONFLITOS AMBIENTAIS, O DIREITO À ÁGUA E MEDIAÇÃO NO BAIXO SÃO FRANCISCO: A ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL EM SERGIPE. Dissertação de Mestrado apresentada ao Núcleo de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente da Universidade Federal de Sergipe como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente.. Autor: Pablo Coutinho Barreto Orientador: Profa. Dra. Flávia Moreira Guimarães Pessoa. Novembro – 2011 São Cristóvão – Sergipe Brasil.

(3) iii. FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE. B273c. Barreto, Pablo Coutinho Conflitos ambientais, o direito à água e mediação no baixo São Francisco : a atuação do Ministério Público Federal em Sergipe / Pablo Coutinho Barreto. – São Cristóvão, 2011. 167 f. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente) – Núcleo de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente, Programa Regional de Desenvolvimento e Meio Ambiente, Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa, Universidade Federal de Sergipe, 2011. Orientador: Profª. Drª. Flávia Moreira Guimarães Pessoa. 1. Meio ambiente. 2. Bacias hidrográficas. 3. São Francisco, Rio, Bacia. 4. Direito ambiental. I. Título. CDU 502.51(282.281.5).

(4) iv UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO PROGRAMA REGIONAL DE DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE. CONFLITOS AMBIENTAIS, O DIREITO À ÁGUA E MEDIAÇÃO NO BAIXO SÃO FRANCISCO: A ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL EM SERGIPE. Dissertação de Mestrado defendida por Pablo Coutinho Barreto e aprovada no dia 09 de dezembro de 2011 pela banca examinadora constituída pelos doutores:. ________________________________________________ Profa. Dra. Flávia Moreira Guimarães Pessoa PRODEMA-UFS. ________________________________________________ Prof. Dr. Rodolfo Pamplona Filho DIREITO-UFBA ________________________________________________ Profa. Dra. Maria José Nascimento Soares PRODEMA-UFS.

(5) v Este exemplar corresponde à versão final da Dissertação de Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente.. ________________________________________________ Profa. Dra. Flávia Moreira Guimarães Pessoa PRODEMA-UFS.

(6) vi É concedido ao Núcleo de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente da Universidade Federal de Sergipe permissão para disponibilizar e reproduzir cópias desta dissertação.. ________________________________________________ Pablo Coutinho Barreto PRODEMA-UFS. ________________________________________________ Profa. Dra. Flávia Moreira Guimarães Pessoa PRODEMA-UFS.

(7) vii. Às quatro mulheres da minha vida, Leila, Sofia, Alice, e Maria das Graças. Aos homens que são meus exemplos de conduta, Adelino e Antonio..

(8) viii. AGRADECIMENTOS. Agradeço a Deus por tudo. À minha família, sempre presente, pelo apoio, compreensão e paciência. À minha orientadora, Profa. Dra. Flávia Moreira Guimarães Pessoa, pelo incentivo e aconselhamento sem os quais a conclusão desta pesquisa não teria sido possível. Ao Prof. Dr. Antenor de Oliveira Aguiar Netto pelas suas importantes contribuições na fase inicial desta caminhada. Ao PRODEMA pela oportunidade de crescimento ao participar de sua incansável luta pela construção de uma (cons) ciência ambiental. Aos meus colegas e amigos do Ministério Público Federal em Sergipe, sem o auxílio dos quais eu não teria conseguido compatibilizar trabalho e estudo. À toda equipe que compõe o ofício da Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão da PR-SE, que muito me ajudou na coleta de dados. À Coordenadoria Jurídica da Procuradoria da República em Sergipe, pela excelência dos serviços prestados ao público interno e externo..

(9) ix. RESUMO A presente pesquisa se debruça sobre a forma como o Ministério Público enfrenta os conflitos ambientais relacionados ao direito fundamental à água. Seu objetivo geral é analisar a atuação do Ministério Público Federal em Sergipe na mediação dos conflitos ambientais relativos à água no baixo São Francisco entre os anos de 2004 e 2010. Os objetivos específicos são três: i) examinar as características dos conflitos hídricos do baixo São Francisco objeto de enfrentamento pelo Ministério Público Federal em Sergipe; ii) especificar os instrumentos jurídicos e a estratégia de atuação utilizados; iii) investigar se a atuação do Ministério Público Federal na mediação desses conflitos ambientais é efetiva. Foram selecionados todos os dezesseis casos em que o Ministério Público Federal atuou na mediação de conflitos hídricos no baixo São Francisco, entre os anos de 2004 e 2010, e aplicados sobre eles uma ficha com a finalidade de coletar e sistematizar as informações referentes as partes envolvidas no conflito hídrico, as circunstâncias que originaram a atuação do Ministério Público Federal, o tipo de conflito ambiental estabelecido, as medidas jurídicas adotadas para a resolução de tais conflitos, e o resultado do processo de mediação. Após a análise dos dados obtidos, constatouse que a maior parte dos conflitos ambientais relativos ao direito à água se referem a danos à área de preservação permanente e à poluição das águas, sendo os de maior relevância os relacionados à restrição aos usos múltiplos. Os instrumentos mais utilizados são o inquérito civil e o procedimento preparatório, a requisição e a notificação, não havendo registro da utilização de recomendação ou termo de ajustamento de conduta. A estratégia utilizada pelo Ministério Público Federal em Sergipe não tem conseguido obter resultados efetivos extrajudicialmente de forma ágil, havendo um grande direcionamento dos conflitos hídricos ao Poder Judiciário. PALAVRAS-CHAVE: Meio ambiente, bacia hidrográfica, conflito..

(10) x. ABSTRACT This present study focuses on how the prosecutor faces environmental conflicts related to the fundamental water right. Its general purpose is to analyze the performance of the Federal Prosecutor in Sergipe in the mediation of environmental conflicts related to water down the San Francisco between the years 2004 and 2010. The specific objectives are threefold: i) examine the characteristics of the low water conflicts object facing San Francisco by federal prosecutors in Sergipe ii) specify the legal instruments used and operating strategy; iii) to investigate whether the actions of the Federal Prosecutor in the mediation of environmental conflicts is effective. We selected all sixteen cases in which federal prosecutors acted in the mediation of conflicts in water below San Francisco, between 2004 and 2010, and applied them on a sheet in order to collect and systematize information about the parties involved water in the conflict, the circumstances that led to the actions of the Federal Public Ministry, the type of environmental conflict established the legal measures taken to resolve such conflicts, and the result of the mediation process. After analyzing the data obtained, it was found that most environmental conflicts related to water rights refer to damage to the area of preservation and water pollution, the most relevant being those related to the restriction on multiple uses. The instruments most commonly used are the civil investigation and preparatory procedure, the request and notification, there is no record of the use of the term recommendation or adjustment of conduct. The strategy used by federal prosecutors in Sergipe has achieved effective results out of court swiftly, with a major reallocation of water disputes to the courts. KEYWORDS: Environment, watershed conflict...

(11) xi. LISTA DE FIGURAS. Página Figura 4.1: Níveis de conflitos entre usos da água na bacia hidrográfica do rio São Francisco............................................................................................................................. 114. Figura 4.2. Barragem de Xingó........................................................................................... 116. Figura 5.1: Número de instaurações entre os anos de 2004 e 2010.................................... 123. Figura 5.2: Origem.............................................................................................................. 124. Figura 5.3: Tipologia........................................................................................................... 127. Figura 5.4: Agente causador do dano ou risco.................................................................... 130. Figura 5.5: Instrumentos jurídicos utilizados...................................................................... 132. Figura 5.6: Resultado final.................................................................................................. 139. Figura 5.7: Tempo de tramitação........................................................................................ 142.

(12) xii. LISTA DE TABELAS. Página Tabela 4.1. Principais características físicas e hidroclimáticas da bacia hidrográfica do rio São Francisco............................................................................................................................. 109. Tabela 4.2. Principais características socioeconômicas da bacia hidrográfica do rio São Francisco............................................................................................................................. 110. Tabela 5.1. Casos em que o MPF atuou na mediação de conflitos hídricos no baixo São Francisco entre os anos de 2004 a 2010.............................................................................. 121.

(13) xiii. LISTA DE SIGLAS Siglas ACP – Ação civil pública ADEMA – Administração Estadual do Meio Ambiente ANA – Agência Nacional das Águas APP – Área de preservação permanente CBH – Comitê de Bacia Hidrográfica CBHSF – Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco CF – Constituição Federal de 1988 CNMP – Conselho Nacional do Ministério Público CNRH – Conselho Nacional de Recursos Hídricos COORJUR – Coordenadoria Jurídica CSMPF – Conselho Superior do Ministério Público Federal GEF – Fundo para o Meio Ambiente Mundial IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis IDH – Índice de Desenvolvimento Humano LACP – Lei da Ação Civil Pública LOMP – Lei Orgânica Nacional do Ministério Público (Lei nº 8.625/1993) LOMPU – Lei Orgânica do Ministério Público da União (Lei Complementar nº 75/1993) MP – Ministério Público MPF – Ministério Público Federal MPU - Ministério Público da União OEA – Organização dos Estados Americanos PNRH – Política Nacional de Recursos Hídricos (Lei nº 9.433/1997) PNUMA – Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente PR-SE – Procuradoria da República em Sergipe SINGREH – Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos SRH – Superintendência de Recursos Hídricos TAC – Termo de ajuste de conduta ÚNICO – Sistema Integrado de Informações Institucionais do Ministério Público Federal.

(14) xiv. SUMÁRIO. Página 1. INTRODUÇÃO............................................................................................................. 16. 1.1 Problema de pesquisa, justificativa e objetivos............................................................ 19. 1.2 Metodologia.................................................................................................................. 20. 1.3 Estrutura da pesquisa.................................................................................................... 23. 2. SUSTENTABILIDADE, CONFLITOS AMBIENTAIS E O DIREITO DO MEIO AMBIENTE....................................................................................................................... 26. 2.1. Entre a racionalidade econômica e a racionalidade ambiental: a busca da sustentabilidade................................................................................................................... 27. 2.2. Conflitos ambientais: a natureza em disputa ou a disputa entre a natureza?............... 37. 2.3. As éticas ambientais e a gestação de um direito do meio ambiente............................ 45. 3.. O. MINISTÉRIO. PÚBLICO. E. A. MEDIAÇÃO. DE. CONFLITOS. AMBIENTAIS................................................................................................................... 58. 3.1. A evolução institucional do Ministério Público no Brasil: de acusador a mediador de conflitos............................................................................................................................... 59. 3.2. A mediação como técnica de enfrentamento de conflitos ambientais pelo Ministério Público................................................................................................................................ 69. 3.3. O instrumental jurídico do Ministério Público mediador............................................. 77. 3.3.1. O inquérito civil e o procedimento administrativo preparatório................... 78. 3.3.2. A notificação.................................................................................................. 83. 3.3.3. A requisição................................................................................................... 83. 3.3.4. A recomendação............................................................................................ 84. 3.3.5. A audiência pública....................................................................................... 86. 3.3.6. O compromisso de ajustamento de conduta.................................................. 88. 4. O DIREITO À ÁGUA, O SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS E OS CONFLITOS DO BAIXO SÃO FRANCISCO........ 92.

(15) xv 4.1 O direito à água e suas múltiplas faces.......................................................................... 93. 4.2 A institucionalização de um Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos voltado para o arbitramento de conflitos............................................................................ 101. 4.3 Os conflitos ambientais do baixo curso do rio São Francisco...................................... 107. 5. O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL EM SERGIPE E A MEDIAÇÃO DE CONFLITOS AMBIENTAIS NO BAIXO SÃO FRANCISCO.................................... 120. 6. CONCLUSÕES E SUGESTÕES................................................................................. 146. REFERÊNCIAS................................................................................................................ 151. APÊNDICE.........…........................................................................................................... 165.

(16) 16. CAPÍTULO 1 INTRODUÇÃO.

(17) 17 1. INTRODUÇÃO. A vida em sociedade é marcada pela presença constante de conflitos. Não pode ser de outra forma, pois o conflito é uma das possíveis formas de interação social (SIMMEL, 2006), que implica disputa no acesso e distribuição de recursos escassos (BOBBIO et. al., 1998). O conflito é inerente à convivência humana, todavia, o seu acirramento e descontrole contribuem para o esgarçamento do tecido social e a erosão das condições ambientais, essa última consequência em se tratando de conflito ambiental. Essa percepção leva os grupamentos sociais organizados a tentar diluir os conflitos, canalizá-los dentro de formas previsíveis, submetê-los a regras precisas e explícitas, contê-los e, às vezes, direcionar o seu potencial de mudança para um sentido preestabelecido (BOBBIO, 1998). Não se trata, entretanto, de resolver o conflito no sentido de eliminá-lo do meio social, porquanto impossível e indesejável. Os conflitos são processos sociais que podem evoluir ou involuir. As soluções podem ser dadas apenas aos problemas que surgem dos conflitos. Além disso, somente há como tratar e controlar a fase pública, externa do conflito: a disputa (SUARES, 2005)1. Ao longo das últimas três décadas, um novo perfil institucional do Ministério Público foi sendo construído através de sucessivas mudanças legislativas. Esse processo histórico convergiu para que a atuação do Ministério Público na defesa do meio ambiente ganhasse importância e relevo, transformando a Instituição em um ator de destaque na mediação de conflitos ambientais. O pano de fundo da presente pesquisa é a forma como o Ministério Público Federal enfrenta os conflitos ambientais relacionados aos usos múltiplos da água, no desincumbir de sua função institucional de proteger o meio ambiente e, por conseguinte, fazer valer o direito à água.. 1. Em razão disso, no desenvolvimento da presente pesquisa, prefere-se falar em tratamento ou equalização à resolução do conflito..

(18) 18 Marchesan (2005) destaca a tutela da água como um dos temas que mais têm absorvido a atuação do Ministério Público no Estado do Rio Grande do Sul, quer pela urgência (na área ambiental o tempo milita, como em nenhuma outra matéria, contra o êxito da atuação institucional); pela complexidade (a transdisciplinaridade é característica desta forma de atuação); pela abrangência (os interesses difusos envolvidos nas demandas por água de qualidade transbordam em muito a esfera ambiental) e pela transcendência (o que hoje se constrói em termos de prevenção e reparação de recursos hídricos se projeta para o futuro de gerações não nascidas). Aponta, ainda, que os assuntos que se sobressaem nesse contexto pelo envolvimento direto e/ou indireto com a tutela da água são os poços artesianos, as matas ciliares, os esgotos, a utilização de agrotóxicos, a deposição inadequada de resíduos sólidos e captações de água para irrigação. A relevância da atuação do Ministério Público para a prevenção da degradação das águas, decorre não só dos inquéritos civis instaurados e das ações civis públicas propostas, mas dos acordos efetuados, visando ao atendimento da legislação. A simples possibilidade da sua intervenção costuma inibir muitas atividades poluidoras (POMPEU, 2010). Soares (2005) sustenta que os avanços na capacidade de se dar tratamento democrático aos conflitos ambientais no Estado do Rio de Janeiro depende da aproximação e do trabalho harmônico entre Ministério Público e os demais órgãos governamentais, do amadurecimento dos instrumentos de atuação de procuradores e promotores, em especial da ação civil pública (ACP) e do termo de ajustamento de conduta (TAC), bem como do aumento da participação da população no controle público do respeito à legislação ambiental. Sugere, ainda, que o Ministério Público apresenta-se como um ator político central para a regulação de conflitos ambientais no Rio de Janeiro. Debruçando-se sobre a atuação do Ministério Público na proteção da água na Região Norte-Noroeste Fluminense, Totti et al. (2007) apontam diversos fatores que dificultam essa atuação, tais como uma má compreensão por parte dos agentes sobre a real função do Ministério Público, falta de entrosamento entre os agentes públicos, que inclusive fazem parte dos agressores, falta de capacitação dos envolvidos, inclusive do próprio pessoal do Ministério Público. Apesar das dificuldades indicadas, registram que a instituição vem se consolidando como importante referencial para assuntos de ordem ambiental, especificamente em relação à água..

(19) 19 Mio et. al. (2005) sustentam que a utilização do inquérito civil em conjunto com o termo de ajustamento de conduta permite a resolução mais eficiente e mais rápida dos conflitos ambientais, importando, inclusive, em menores custos quando comparados à abordagem tradicional pelo Poder Judiciário. Apontam, ainda, que o emprego em conjunto desses dois instrumentos jurídicos representa o diferencial do Ministério Público em relação à proteção ao meio ambiente, quando comparado a outras instituições de gestão e fiscalização também legitimadas à assinatura de termo de ajustamento de conduta.. 1.1 Problema de pesquisa, justificativa e objetivos O problema de pesquisa que se pretende esclarecer com esta investigação é a forma de atuação do Ministério Público Federal em Sergipe no tratamento dos conflitos ambientais relativos à água no baixo São Francisco, entre os anos de 2004 e 2010. Três questões de pesquisa se mostram visíveis na presente investigação: i) Quais as características dos conflitos hídricos do baixo São Francisco objeto de atuação do Ministério Público Federal em Sergipe?; ii) Quais os instrumentos jurídicos que compõem a estratégia desta atuação; iii) Esses conflitos ambientais são efetivamente mediados pelo Ministério Público Federal em Sergipe ou são encaminhados ao Poder Judiciário? A presente pesquisa é motivada pelo interesse em se conhecer as características dos conflitos ambientais relacionados ao direito à água e como eles são tratados no âmbito do Ministério Público, de forma a possibilitar uma visão estrutural da conflituosidade existente e extrair elementos que possam orientar uma ação efetiva no enfrentamento de conflitos ambientais. Seguindo uma sequência lógica e sistemática, a presente pesquisa tem como objetivo geral analisar a atuação do Ministério Público Federal em Sergipe na mediação dos conflitos relacionados com o direito à água no baixo São Francisco entre os anos de 2004 e 2010. Os objetivos específicos são três, podendo ser assim enumerados: i) examinar as características dos conflitos hídricos do baixo São Francisco objeto de enfrentamento pelo Ministério Público Federal em Sergipe; ii) especificar os instrumentos jurídicos que compõe a estratégia desta atuação; iii) investigar se esses conflitos ambientais são efetivamente mediados ou são submetidos ao Poder Judiciário..

(20) 20. 1.2. Metodologia A presente pesquisa está voltada para a análise da atuação do Ministério Público na mediação de conflitos ambientais relacionados à água. Debruça-se, portanto, sobre os embates estabelecidos entre as diversas formas de apropriação da água e como o Ministério Público busca velar para que os valores ecológicos, social, cultural, econômico e espiritual desse elemento da natureza sejam respeitados de forma equânime, atuando como mediador de tais conflitos. Antes de tudo cabe revelar que o autor da pesquisa é Procurador da República, então, membro do Ministério Público Federal. Esse fato por si não afasta a credibilidade científica da investigação realizada. Há muito sabe-se que não se pode falar em uma objetividade científica pura, uma vez que o objeto observado é construído na sua inter-relação com o sujeito. Cabe, sim, ao investigador minimizar essa circunstância através do rigor técnico a ser adotada na metodologia escolhida. Encontrando-se em situação idêntica, Rodrigues (2006) assim justificou a honestidade científica de sua pesquisa:. Com efeito, a relação do cientista com o fato investigado não é anódina, e nem mesmo nas ciências exatas se pode infirmar plenamente a relação de influência entre o investigador e o investigado. Em se tratando de ciências sociais a “ilusão objetivista”, tão criticada por Habermas, tem, ainda, menos força. Não chegamos a conclusões pela mera observância dos fatos. É inevitável superar a simples faticidade para a bordagem de um dado fenômeno social, sendo recorrente o auxílio a elemento de ordem subjetiva para a sua compreensão. Até mesmo, com já afirmamos, a problematização da questão ocorre a partir do contexto social e histórico em que se insere o investigador. Seria leviano afirmar que o nosso status profissional não venha a influir na nossa abordagem, uma vez que já partimos de algumas noções dadas. Contudo, não podemos condenar, de antemão, ao descrédito dados que foram objetivamente levantados, ainda que a sua análise não seja infensa ao contesto do pesquisador. De qualquer sorte, já se indicia um grau satisfatório de honestidade científica na revelação da posição do investigado, o que permitirá aos que examinem o resultado da pesquisa tomar em consideração esse fato (RODRIGUES, 2006, p. 243-244)..

(21) 21 Esclarecido este importante ponto, avança-se com a descrição do método e técnica utilizados para a coleta e a interpretação dos dados empíricos obtidos. A investigação em tela tem natureza exploratória-descritiva (MARCONI & LAKATOS, 2009). Trata-se de pesquisa empírica que além de levantar informações sobre um determinado objeto de estudo, objetiva descrever completamente esse fenômeno específico através de análises empíricas e teóricas. Dentro de uma abordagem quantitativa-qualitativa (SEVERINO, 2007), uma vez que a presente investigação envolveu questões mensuráveis e outras não-mensuráveis. Adotou-se como método de pesquisa o monográfico, criado por Le Play (MARCONI & LAKATOS, 2009). Parte-se do princípio de que o estudo aprofundado da atuação do Ministério Público Federal no baixo São Francisco, entre os anos de 2004 e 2010, pode servir como modelo de análise para outros casos em que o Ministério Público atue no enfrentamento de conflitos ambientais relacionados à água. Não se pretende, todavia, inferir uma verdade geral ou universal acerca da atuação do Ministério Público partindo-se dos dados particulares obtidos na observação do fenômeno no baixo São Francisco, apenas se busca a construção de um modelo de análise que possa ser útil à compreensão de uma manifestação da realidade – o enfrentamento de conflitos hídricos pelo Ministério Público. Afere-se a eficiência da metodologia escolhida para a análise do objeto de estudo da presente pesquisa em razão da circunstância da representação (ato de levar a existência de um conflito ambiental ao conhecimento do Ministério Público) caracterizar por si só a presença de algum grau de conflito pelo usufruto do meio ambiente, bem como a existência de impactos indesejáveis transmitidos pelo solo, pela água ou pelo ar (SOARES, 20052). Totti et. al. (2007) apontam que uma análise da atuação do Ministério Público no controle do meio ambiente é uma boa estratégia metodológica, pois é onde vão se confluir as explicitações dos conflitos ambientais e as suas soluções. Ressaltam, ainda, que “a vinculação metodológica entre MP e recursos hídricos constitui uma estratégia organizacional de conhecimento sistematizado, ainda pouco explorado no âmbito nacional, podendo ser escalonado em diferentes abrangências de tempo e espaço geográfico” (TOTTI et al, 2007, p. 195). 2. Adota-se na presente pesquisa o termo representação e não denúncia, nomenclatura utilizada por Soares (2005), em razão desta última expressão ser utilizada para nomear a petição que inicia uma ação penal.

(22) 22 De forma a viabilizar a conclusão da presente pesquisa obedecendo a tempo e modo às regras vigentes no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente da Universidade Federal de Sergipe, o objeto de estudo foi delimitado à análise dos conflitos ambientais relativos à água ocorridos na região fisiográfica do baixo São Francisco que foram alvo da atuação do Ministério Público Federal em Sergipe, entre os anos de 2004 e 2010. A delimitação espacial da pesquisa ao baixo São Francisco deve-se a duas razões: a primeira, em face da existência de conflitos ambientais de grande destaque que ainda não foram objeto de um número representativo de estudos (ANA et. al., 2004). A segunda, tendo em vista a importância da bacia hidrográfica do São Francisco, a maior em área e a que apresenta a maior disponibilidade hídrica em seu território. A importância do rio São Francisco para o desenvolvimento e a sustentabilidade do Estado de Sergipe fica evidente em razão de ser o curso d'água responsável pelo abastecimento dos principais perímetros públicos irrigados, da maior parcela da população e indústria sergipana (AGUIAR NETTO et. al., 2010). De acordo com a Constituição Federal de 19883, o rio São Francisco é um bem público do domínio da União, portanto cabe ao Ministério Público Federal, um dos ramos do Ministério Público da União, tratar os conflitos ambientais relacionados à bacia hidrográfica onde está inserido esse curso d'água. Em território sergipano esta incumbência está acometida à Procuradoria da República em Sergipe. A abrangência temporal do estudo ficou delimitada ao período compreendido entre os anos de 2004 e 2010, ou seja, sete anos. O marco inicial coincide com a data de implantação de controles e registros da atuação extrajudicial do Ministério Público Federal na Procuradoria da República em Sergipe. A presente pesquisa foi eminentemente documental (MARCONI & LAKATOS, 2009), com a aplicação de uma ficha para a coleta dos dados4 necessários ao alcance dos objetos inicialmente propostos (RODRIGUES, G., 2006). Inicialmente, foi solicitado à Coordenadoria Jurídica [COORJUR] da Procuradoria da República em Sergipe a realização de uma pesquisa no sistema integrado de informações do 3 4. Artigo 20, inciso III, da Constituição Federal. A ficha de coleta de dados se encontra reproduzida no apêndice da presente pesquisa..

(23) 23 Ministério Público Federal [ÚNICO], que fornecesse uma relação dos casos em que ocorreram a atuação do Ministério Público Federal em questões relacionadas à água, no baixo São Francisco, entre os anos de 2004 e 2010. Esse levantamento de dados foi realizado utilizando-se como parâmetro de pesquisa as expressões “rio São Francisco”, “água”, “bacia hidrográfica”, “recursos hídricos”. Da relação obtida a partir dos parâmetros utilizados, foram submetidos a tratamento e análise os casos em que o Ministério Público atuou como mediador de conflitos relativos ao direito à água. Assim, foram descartados aqueles casos em que a Instituição desempenhou o seu papel tradicional de órgão de acusação. Com este corte metodológico, obteve-se uma relação indicativa da existência de dezesseis casos em que o Ministério Público Federal atuou na mediação de conflitos hídricos no baixo São Francisco, entre os anos de 2004 a 2010. Após reprografia/digitalização de todos os casos selecionados, a documentação obtida foi analisada, sendo aplicada uma ficha sobre o material empírico coletado, com a finalidade de sistematizar as informações obtidas levando em consideração, especificamente, as partes envolvidas no conflito hídrico, as circunstâncias que originaram a atuação do Ministério Público Federal, o tipo de conflito ambiental estabelecido, as medidas jurídicas adotadas para a resolução de tais conflitos, e o resultado do processo de mediação. Esse modelo metodológico tem como referência conceitual aquele desenvolvido nos trabalhos de José Luiz Soares (2005) e Totti et. al. (2007).. 1.3 Estrutura da pesquisa A presente pesquisa está organizada em um capítulo introdutório, três capítulos que trazem em seu corpo o referencial teórico adotado, seguidos por outro que apresenta os resultados obtidos a partir da investigação realizada. Ao final, um capítulo apresenta as últimas considerações sobre o tema objeto de estudo. Neste capítulo introdutório, são apresentados os motivos que originaram a presente pesquisa, uma breve contextualização teórica a respeito da temática abordada, é enunciado o problema de estudo, são formulados as questões e os objetivos da presente investigação, expõe-se a sua relevância científica e social e os limites escolhidos para a pesquisa em.

(24) 24 desenvolvimento, apresenta-se a metodologia utilizada e, por fim, são apresentados os capítulos que a integram. Apresentado em três breves seções, o segundo capítulo lança-se pelo tortuoso caminho dos conceitos e categorias. Inicia-se com a abertura de um debate sobre a racionalidade econômica que impera nos dias atuais e a proposta de uma nova racionalidade – a ambiental, na necessária busca de uma trilha segura que conduza à sustentabilidade. Discute-se, posteriormente, os diversos enfoques que permeiam a análise da denominada problemática ambiental e os distintos conceitos apresentados para os conflitos ambientais. Ao fim, apresenta-se, em resumo, as diferentes propostas de ética ambiental e como influenciaram e influenciam na construção de um direito do meio ambiente. No terceiro capítulo, o referencial teórico apresentado passeia pela evolução institucional que transformou completamente o perfil do Ministério Público, deslocando-o de sua posição tradicional de órgão estatal responsável pela acusação para se constituir em uma instituição vocacionada para a mediação de conflitos ambientais. Em seguida, detalha-se um pouco mais a mediação como técnica de enfrentamento de conflitos ambientais. O capítulo se encerra com uma descrição sintética dos instrumentos utilizados pelo Ministério Público no enfrentamento dos conflitos ambientais. Expõe-se, no quarto capítulo, o estado da arte acerca da afirmação de um direito fundamental à água, uma das múltiplas dimensões do direito do meio ambiente, construído historicamente como um reflexo dos direitos à vida, à saúde e consequência direta do princípio da dignidade da pessoa humana. Aborda-se, também, a institucionalização de um Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, criado com a finalidade de arbitrar os conflitos relacionados ao uso e à apropriação das águas no Brasil. Por fim, registra-se a literatura científica que analisa o conteúdo, as causas e as consequências dos conflitos ambientais existentes no baixo São Francisco. O quinto capítulo, apresentado em seguida, encontra-se dividido em duas seções. A primeira delimita a área de estudo da presente investigação – o baixo São Francisco, apontando ainda as suas principais características socioambientais. A segunda seção descreve os procedimentos metodológicos utilizados para a investigação do objeto de estudo. A pesquisa desenvolvida tem natureza exploratória-descritiva (MARCONI & LAKATOS,.

(25) 25 2009), utilizando-se de uma abordagem quantitativa-qualitativa (SEVERINO, 2007), porquanto envolve dados mensuráveis, que podem ser traduzidos em números e classificados com a utilização de técnicas estatísticas, e, de outro lado, dados que não podem ser mensurados. Em seguida, o sexto capítulo retrata os resultados obtidos com o desenvolvimento da presente pesquisa sobre a atuação do Ministério Público Federal em Sergipe na mediação de conflitos ambientais no baixo São Francisco. Apresenta-se um quadro sistemático que indica as principais características dos conflitos hídricos do baixo São Francisco objeto de enfrentamento pelo Ministério Público Federal em Sergipe; especifica os instrumentos jurídicos que compõem a estratégia desta atuação do MPF; e, ao cabo, esclarece se esses conflitos ambientais são efetivamente mediados ou são levados ao crivo do Poder Judiciário. No capítulo final, são apresentadas as conclusões e sugestões sobre o tema objeto de estudo da presente investigação, desenvolvida no intuito contribuir para o debate acerca da efetividade da atuação do Ministério Público Federal na mediação de conflitos ambientais relacionados com o direito à água. O presente capítulo é metodológico. Cuida, em sua primeira parte, da delimitação e da caracterização da área de estudo da presente pesquisa – o baixo São Francisco. A segunda parte descreve os procedimentos metodológicos utilizados para o desenvolvimento da investigação. Traça-se a correlação entre os objetivos propostos e os métodos e as técnicas utilizados..

(26) 26. CAPÍTULO 2 SUSTENTABILIDADE, CONFLITOS AMBIENTAIS E O DIREITO DO MEIO AMBIENTE.

(27) 27 2. SUSTENTABILIDADE, CONFLITOS AMBIENTAIS E O DIREITO DO MEIO AMBIENTE. Este capítulo se empenha na exposição de conceitos e categorias. A abordagem começa delineando o debate travado entre a racionalidade econômica que impera nos dias atuais e a proposta de uma nova racionalidade – a ambiental, na necessária busca de uma trilha segura que conduza à sustentabilidade. Discute-se, posteriormente, os diversos enfoques que permeiam a análise da denominada problemática ambiental e os distintos conceitos apresentados para os conflitos ambientais. Ao fim, apresenta-se, em resumo, as diferentes propostas de ética ambiental e como influenciaram e influenciam na construção de um direito do meio ambiente.. 2.1. Entre a racionalidade econômica e a racionalidade ambiental: a busca da sustentabilidade É na natureza que o homem se envolve e se desenvolve. O homem pertence à natureza e deve a ela a sua sobrevivência. Ao mesmo tempo em que o homem a constrói [cultural e materialmente], ele a destrói. O certo é que, embora essa relação seja marcada por uma tensão permanente, seus destinos – homem e natureza – estão atados por correntes inquebrantáveis. Para uma melhor compreensão da relação homem-natureza, faz-se necessário a percepção de que conceito de natureza não é natural, mas histórico, uma construção cultural de cada sociedade. Nesta direção, Porto-Gonçalves (2008) esclarece que toda sociedade, toda cultura, cria, inventa, institui uma determinada ideia do que seja a natureza. Assim, o conceito de natureza não é natural, sendo na verdade criado e instituído pelos homens. Constitui um dos pilares através do qual os homens erguem as suas relações sociais, sua produção material e espiritual, enfim a sua cultura. Ao longo da história, diversas concepções informaram a relação homem-natureza. Nas.

(28) 28 eras primitivas, a natureza era divina, sagrada, e o homem, sempre temeroso, percebia-se subjugado pelo mundo natural, esse visto como onipotente, imprevisível e indominável (CAMARGO, 2008). A visão sacralizada da natureza cedeu espaço, no mundo ocidental, à concepção do ser humano dominador, externo à natureza e seu senhor. Iniciada sob a influência do pensamento de Sócrates e Platão, a separação e subjugação da natureza pelo homem recebeu grande contribuição da filosofia judaico-cristã. Entretanto, a oposição homem-natureza somente ficaria completa na obra Discurso sobre o Método de René Descartes, para quem o homem deveria se tornar o senhor e possuidor da natureza (DESCARTES, 2002). Para Leite (2010), a visão antropocêntrica tradicional já era verificada nos escritos dos filósofos gregos e na própria Bíblia. O animal era visto por Aristóteles como um escravo, um fornecedor de matéria-prima, um bem útil para a alimentação e para o uso diário. Trechos da Bíblia, Gênesis (I 26-28), por muito tempo, foram utilizados como fundamentação para a visão antropocêntrica5, porquanto a interpretação vigente era que Deus teria outorgado ao homem, criado à sua imagem e semelhança, o domínio sobre todas as coisas. A visão utilitarista da natureza também está presente na obra de Tomás de Aquino, de Kant e da maioria dos filósofos ocidentais (VIDAL, 2010). Na mesma linha, Antunes (2001) registra que a tradição humanista ocidental sempre esteve enlaçada com a concepção da existência de uma contradição entre homem e natureza e que o ser humano deveria dominar a natureza para alcançar o progresso e a felicidade. A modernidade foi marcada fortemente pela filosofia cartesiana de sentido pragmático e utilitarista, voltada para o antropocentrismo. O homem passou a ser visto como o centro do mundo, o sujeito em oposição ao objeto, a natureza.. O século XIX será o do triunfo desse mundo pragmático, com a ciência e a técnica adquirindo, como nunca um significado central na vida dos homens. A natureza cada vez mais um objeto a ser possuído e dominado, é agora subdividida em física, química, biologia. O homem em economia, sociologia, antropologia, história, psicologia, etc. Qualquer tentativa de 5. “Qualquer perspectiva que aumente a importância dos seres humanos no cosmo, e. g., vendo-o como algo que foi criado para o nosso benefício, é antropocêntrica” (BLACKBURN, 1997)..

(29) 29 pensar o homem e a natureza de forma orgânica e integrada torna-se agora mais difícil, até porque a divisão não se dá somente enquanto pensamento (GONÇALVES, 2008, p. 34).. A natureza nada mais é do que um recurso a ser utilizado em benefício das atividades humanas, daí falar-se em recurso natural. Instrumentaliza-se a natureza, retirando-lhe seu valor intrínseco, sua finalidade exclusiva é servir ao atendimento das necessidades humanas. Inicialmente, os impactos negativos decorrentes desta relação utilitarista – a apropriação e a exploração da natureza pelo homem – eram totalmente assimilados pelo ecossistema, em razão do uso voltado para a satisfação das necessidades humanas básicas, centradas principalmente na sobrevivência; da pequena quantidade de seres humanos no planeta; da ausência de conhecimento para a exploração em larga escala, enfim de uma situação diametralmente oposta àquela dos dias atuais (COSTA, 2010). A revolução industrial radicalizou a gravidade do impacto antrópico sobre a natureza. O estabelecimento de uma economia industrializada centrada espacialmente na urbe e lastreada em tecnologias de produção e consumo predatórios vem provocando grande impacto sobre a natureza (CAMARGO, 2008). A expansão geométrica da produção e a ausência de preocupação com a capacidade de suporte da natureza caracterizaram esse período. A chamada sociedade industrial no século XX foi fortemente marcada pela tradição da cultura ocidental de controlar e dominar a natureza, característica pertinente tando às sociedades capitalistas quanto às sociedades socialistas, que, apesar de apresentarem diferenças estruturais, são caracterizadas por um padrão profundamente agressivo de relação e apropriação dos recursos naturais. A combinação de várias formas de exploração da natureza e de seus respectivos efeitos sobre o meio ambiente transformou o planeta no século XX. Se inicialmente a sociedade industrial acreditava ter à sua disposição fontes ilimitadas de energia, em suas três últimas décadas, ficou evidente que o padrão de produção, exploração da natureza e a consequente degradação ambiental a inviabilizariam por completo a médio e longo prazo (ENNES, 2008). Para Portilho (2005), o consumo total da economia humana tem excedido a capacidade de reprodução natural e assimilação de resíduos da ecosfera, enquanto a distribuição de tais.

(30) 30 rejeitos e da riqueza produzida é socialmente desigual e injusta. Essas duas dimensões, exploração excessiva dos recursos naturais e iniquidade inter e intra geracional na distribuição desigual dos benefícios e dos resíduos gerados conduziram à reflexão sobre a insustentabilidade ambiental e social dos atuais padrões de consumo e seus pressupostos éticos-normativos. Os impactos negativos causados pela ação antrópica no meio ambiente, antes desapercebidos ou, ao menos não levados em conta pela maioria da população, passaram a ser objeto de preocupação da comunidade científica e de grupos sociais específicos (ambientalistas). Isso se deveu à ocorrência, ao longo do tempo, de diversos impactos ambientais graves, a exemplo da contaminação da baía de Minamata no Japão por mercúrio, em 1930; as drásticas consequências do uso de DDT, relatadas na obra silent spring de Rachel Carson, que resultou na criação da primeira agência de proteção ambiental; o acidente nuclear da usina de Chernobyl, na Ucrânia, em 1986; e a atual discussão sobre o aquecimento global decorrente da emissão de gases do efeito estufa (COSTA, 2010). Na visão de Daltro Filho & Soares (2010):. O cenário atual, no tocante às questões ambientais, revela uma crise sem precedentes na história da vida humana no planeta Terra. O modelo de desenvolvimento adotada até a primeira metade do Século XX foi notadamente predatório, voltado para o acúmulo de riquezas com grande usurpação dos recursos naturais, o que ocasionou impactos ambientais de grande magnitude e muita destruição em todo o ecossistema global. Desse modo, a temática ambiental tem sido uma preocupação em nosso dia a dia, pois a preservação da Natureza é uma questão da sobrevivência da espécie humana e de todas as demais espécies de nosso planeta. Uma vez que é o próprio homem o grande responsável pela crise ambiental, pois suas ações, por vezes, culminaram na espoliação dos recursos naturais e na geração de resíduos de toda forma, comprometendo o equilíbrio do Meio Ambiente, é dele a responsabilidade de tentar aplacar os impactos que vem causando (DALTRO FILHO & SOARES, 2010, p. 7).. A inserção do debate sobre a questão ambiental6 na academia e nos demais espaços 6. Seguindo a lição de Portilho (2005), entende-se por questão ambiental o conjunto de fatores e variáveis existentes na relação homem-natureza em seus diversos aspectos: biológicos, éticos, estéticos, territoriais, políticos, sociais, culturais, econômicos, axiológicos, espirituais, etc..

(31) 31 públicos na atualidade, entretanto, não é orientada por uma unidade discursiva, ao revés, há uma profusão de discursos e práticas que emergem de diferentes lugares e atores, expressando diferentes ideologias que orientam a definição do significado da questão ambiental, bem como as propostas e agendas políticas para o seu enfrentamento. A tentativa de se obter uma resposta para a pergunta sobre as causas estruturais que estariam na raiz da degradação ambiental enseja a percepção de que o tema envolve uma disputa ideológica. Não existe uma crise ambiental única, mas uma pluralidade de formas de se problematizar a questão e uma disputa por proposições e tentativas de solução entre diferentes campos sociais e políticos, sendo que as diversas formas de se perceber a questão ambiental tem se alterado em razão do aprofundamento do debate, da ampliação dos atores que dele participam, da agudização dos problemas e do desenvolvimento de novos estudos científicos (PORTILHO, 2005). O início do debate ecológico pode ser representado por duas grandes correntes: o preservacionismo, amparado nas ideias de John Muir, que pregava o “culto à vida silvestre” e tinha por base a exclusão do homem para a preservação do espaço intocado, que influenciou fortemente as éticas ambientais contemporâneas, como o biocentrismo e o ecocentrismo; e o conservacionismo, fundado no pensamento de Gifford Pinchot, que pregava o uso adequado e criterioso dos recursos naturais e defendia o crescimento econômico com base na ecoeficiência e na modernização ecológica, precursor do que hoje se chama desenvolvimento sustentável (DIEGUES, 2008; ALIER, 2007; LARRÈRE, 2008). O conservacionismo de Pinchot tinha por objetivo assegurar a renovação dos recursos naturais disponíveis para o desenvolvimento nacional, através de uma gestão racional das populações florestais, amparada em conhecimentos científicos. Sua finalidade era eminentemente econômica e seu raciocínio utilitarista. A filosofia preservacionista de Muir afirmava o valor intrínseco da natureza e tinha por modelo a ser protegido a wilderness. A natureza aparece como uma alteridade radical a ser preservada ,em sua pureza original, da nociva ação humana (LARRÈRE, 2008). Até a década de 70, prevalecia uma definição estreita da questão ambiental, mantida pelo poder político das nações industrializadas, que atribuía a degradação do meio ambiente e o esgotamento da capacidade de suporte da natureza ao crescimento demográfico dos países pobres, àquela época chamados de Países do Terceiro Mundo. É com o advento da Conferência de das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, no ano de 1972, que se.

(32) 32 inicia a progressiva mudança desta perspectiva neomalthusiana (PORTILHO, 2005). Segundo Leff (2008), foi na Conferência de Estocolmo que se assinalaram os limites da racionalidade econômica e os desafios da degradação ambiental ao projeto civilizatório da modernidade. A escassez, alicerce da teoria e prática econômica, foi alçada a nível global que já não se resolve através do progresso tecnológico, pela substituição de recursos escassos por outros mais abundantes ou pela utilização de espaços não saturados para o depósito de rejeitos originados do processo produtivo. A Conferência de Estocolmo ficou marcada por acalorados debates sobre meio ambiente e desenvolvimento. De um lado os países ricos buscando conferir ênfase à explosão demográfica, do outro os países pobres apontando como as principais causas da crise ambiental a iniquidade econômica entre os países e o estilo de produção, seja capitalista ou socialista, das nações ricas, que requeria grande quantidade de recursos e energia do planeta, causando grande parte dos problemas ambientais, especialmente os de impacto global (PORTILHO, 2005). Neste evento da Organização das Nações Unidas ficou famosa a frase a então primeira ministra da Índia, Indira Gandhi, “a pobreza é a maior das poluições” que bem simboliza o conteúdo das discussões ali travadas. A partir dos debates travados em Estocolmo72, surgem diversos questionamentos ao conceito tradicional de desenvolvimento, que, amparado na concepção de que o lucro gera o progresso, busca o crescimento da produção na certeza de que isso trará o bem-estar coletivo (CAMARGO, 2008). Como se percebe, não se diferenciava a ideia de crescimento econômico do conceito de desenvolvimento. Como bem ilustra Veiga (2006, p. 161). Na verdade, até meados dos anos 70 praticamente todo mundo identificava o desenvolvimento apenas com progresso material. Para alguns, esse progresso levaria espontaneamente à melhoria dos padrões sociais. Para outros, a relação aprecia mais complexa, pois o jogo político intervinha, fazendo com que o crescimento tomasse rumos diferenciados, com efeitos heterogêneos na estrutura social. Mas todos ainda viam o desenvolvimento como sinônimo de crescimento econômico.. No âmbito do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, resultado da.

(33) 33 Conferência de Estocolmo, surgiu a estratégia do ecodesenvolvimento, termo utilizado inicialmente por Maurice Strong para designar uma alternativa de política para o desenvolvimento, cujas premissas básicas foram formuladas por Ignacy Sachs (CAMARGO, 2008). Sachs (2007, p. 64) conceitua o ecodesenvolvimento como um “estilo de desenvolvimento que insiste em buscar soluções específicas, em cada ecorregião, para seus problemas particulares, tendo em vista não somente os dados ecológicos, mas também os culturais e as necessidades imediatas e de longo prazo”. Esta nova visão integrou seis grandes diretrizes para o desenvolvimento: a satisfação das necessidades básicas; a solidariedade com as gerações futuras; a participação da população envolvida; a preservação dos recursos naturais e do meio ambiente em geral; a elaboração de um sistema social garantindo emprego, segurança social e o respeito a outras culturas; e programas de educação (CAMARGO, 2008). A estratégia do ecodesenvolvimento buscava abranger, simultaneamente, cinco dimensões de sustentabilidade: a social, que tem por objetivo a construção de uma civilização com maior equidade na distribuição de renda e de bens, de modo a reduzir o abismo de diferenças entre os padrões de vida dos ricos de dos pobres; a econômica, em busca de maior eficiência na alocação e gerenciamento de recursos, da superação dos obstáculos criados pelos países ricos para o desenvolvimento dos países pobres, devendo ser avaliada em termos macrossocial e não da conveniência da rentabilidade empresarial; a ecológica, através da utilização de novas tecnologias para otimizar o uso da natureza e a capacidade de suporte, da limitação e substituição dos recursos e produtos não renováveis por outros renováveis, da redução da produção de rejeitos poluentes, da limitação do consumo e implementação de uma normatização ambiental sistêmica e efetiva; a espacial, que confere ênfase para uma configuração urbano-rural mais equilibrada; e a cultural com a adoção de modelos e soluções fundados no saber local e adequados a cada ecorregião específica (SACHS, 1993). Leff (2008) aponta que ecodesenvolvimento teve seu potencial crítico e transformador dissolvido pelas estratégias de resistência à mudança na ordem econômica, antes de conseguir vencer as barreiras da gestão setorializada do desenvolvimento, reverter os processos de planejamento centralizado e penetrar nos domínios do conhecimento tradicional. Em seu lugar, foram buscar um conceito capaz de esverdear a economia, com o objetivo de mascarar a contradição entre crescimento econômico e preservação da natureza. Assim, o conceito de.

(34) 34 ecodesenvolvimento foi suplantado pelo discurso do desenvolvimento sustentável.. A retórica do desenvolvimento sustentável converteu o sentido crítico do conceito de ambiente numa proclamação de políticas neoliberais que nos levariam aos objetivos do equilíbrio ecológico e da justiça social por uma via mais eficaz: o crescimento econômico orientado pelo livre mercado. Este discurso promete alcançar seu propósito sem uma fundamentação sobre a capacidade do mercado de dar o justo valor à natureza e à cultura; de internalizar as externalidades ambientais e dissolver as desigualdades sociais; de reverter as leis da entropia e atualizar as preferências das futuras gerações (LEFF, 2008, p. 24).. Para Zhouri et. al. (2005), o surgimento da crítica transformadora desencadeada pela ecologia política suscitou reações por parte dos defensores da industrialização, que começaram a incorporar, paulatinamente, as chamadas variáveis ambientais, centrando o seu discurso na fé irrestrita nas soluções tecnológicas como solução para a questão ambiental. Dessa forma, na medida em que as forças hegemônicas da sociedade reconheciam e institucionalizavam temas ambientais que não colocavam em risco as instituições da sociedade vigente, houve uma certa despolitização do debate ecológico. Os mesmos autores falam de uma “adequação ambiental”, que se constituiria em um verdadeiro paradigma inserido dentro da visão desenvolvimentista que motiva ações políticas que atribuem ao mercado a capacidade institucional de resolver a degradação ambiental, apostando na modernização ecológica. Sendo um paradigma reformador, a adequação ambiental se coloca como obstáculo aos discursos que visam à construção de um paradigma transformador para a sustentabilidade. Na mesma linha, Ennes (2008) aponta que houve uma apropriação e uma ressignificação da questão ambiental pelo pós-industrialismo. Com isso, é o modo de produção que passa a ter necessidade de garantia da sustentabilidade, reduzindo o alcance da ideia de sustentabilidade e afastando o seu potencial transformador e inovador quanto às formas de relação entre a sociedade e a natureza. O discurso hegemônico conseguiu manter o foco do debate ambiental concentrado “em mudanças técnicas, tecnológicas e de procedimentos dentro do mesmo modelo de.

(35) 35 produção industrial, preservado-o das críticas ideológicas por parte dos ambientalistas”, conforme relata Portilho (2005, p. 47). Houve um certo consenso político-econômico sobre a necessidade da adoção de novas tecnologias, mais eficientes. Entretanto, conseguiu-se manter o debate sobre a questão ambiental distante da iniquidade na distribuição, acesso e gestão dos recursos naturais do planeta, dos valores da sociedade moderna e dos estilos de vida e padrões de consumo desiguais (PORTILHO, 2005). O núcleo da crise ambiental se limitaria ao desperdício de matéria e energia, que encontraria resposta em ações da chamada modernização ecológica ou ecoeficiência inseridas dentro da lógica econômica, que atribuem ao mercado a capacidade institucional de resolver a degradação ambiental, através da “economia” do meio ambiente e da abertura de mercados para novas tecnologias. Celebra-se o mercado, consagra-se o consenso político e promove-se o progresso técnico, que seria capaz de superar a crise ambiental fazendo uso das instituições da modernidade, sem abandonar o padrão da modernização e sem alterar o modo de produção capitalista de modo geral. Não se vê presente no discurso da modernização ecológica a diversidade social na construção da crise ambiental e a possibilidade de existir uma lógica política na distribuição desigual dos problemas ambientais (ACSELRAD, 2002). A apropriação e ressignificação da questão ambiental pelo modo de produção capitalista, apresentando como solução para a crise a adoção de tecnologias mais eficientes, guarda identidade com a estratégia descrita na obra-prima “O Gattopardo”, de Tomasi de Lampedusa, quando Tancredi, príncipe de Falconeri e sobrinho de Don Fabrizio, incita seu tio cético e conservador a abandonar sua lealdade aos Bourbons do Reino das Duas Sicílias e aliar-se com os Saboia: “Se nós não estivermos presentes, eles aprontam a república. Se queremos que tudo continue com está, é preciso que tudo mude. Fui claro?” (LAMPEDUSA, 2007, p. 69). Da análise das críticas lançadas ao modelo de desenvolvimento propugnado pelo discurso capitalista, percebe-se a existência de uma disputa ideológica relativas às diversas formas que o homem se relaciona com a natureza, sendo que uma corrente privilegia o modelo de desenvolvimento econômico atual e a outra que se preocupa com um modelo voltado para a sustentabilidade. Há, em verdade, uma crise de paradigmas (KUHN, 2009) representada pelo contraponto entre duas visões, uma com fundamento na racionalidade econômica vigente e outra, ainda em construção, que busca sustentáculo em uma nova.

(36) 36 racionalidade, a racionalidade ambiental. O paradigma da racionalidade econômica está em crise. A natureza e a humanidade sofrem com os seus efeitos perversos e, com isso, busca-se trilhar novos caminhos éticos, epistemológicos, científicos, tecnológicos e políticos através da construção de novos paradigmas. Dentro do contexto de crise, o princípio da sustentabilidade aparece como uma resposta à fratura da razão modernizadora e como um pressuposto para a construção de uma nova racionalidade produtiva, lastreada no potencial ecológico e em novos sentidos de civilização a partir da diversidade cultural do gênero humano. Trata-se da reapropriação da natureza e da reinvenção do mundo que abarca e respeita os diversos outros mundos, abrindo o cerco da ordem econômico-ecológica globalizada (LEFF, 2008). A racionalidade ambiental é uma categoria que aborda as relações entre instituições, organizações, práticas e movimentos sociais, que atravessam o campo conflitivo do ambiental e afetam as formas de percepção, acesso e usufruto dos recursos naturais, assim como a qualidade de vida e os estilos de desenvolvimento das populações (LEFF, 2006). Opõe-se, frontalmente, à racionalidade econômica e ao modelo de desenvolvimento predominantes nos dias atuais. A construção de uma racionalidade ambiental, nas palavras de Leff (2006), implica a necessidade de desconstrução não só dos conceitos e métodos de diversas ciências e campos disciplinares do saber, assim como dos sistemas de valores e as crenças em que se fundam e que promovem a racionalidade econômica e instrumental onde repousa uma ordem social e produtiva insustentável. A racionalidade ambiental é aberta à diferença, à diversidade e pluralidade de racionalidades que definem e dão sua especificidade e identidade à relação do material e do simbólico, da cultura e da natureza. Essa visão crítica tem motivado o desenvolvimento de uma concepção de sustentabilidade que associa as dimensões sociais com as relacionadas à natureza, a exemplo da sustentabilidade socioambiental citada por Leff (2008). O desenvolvimento da noção de sustentabilidade socioambiental traz ao debate duas dimensões pouco consideradas pela tradição do pensamento ocidental acerca da relação entre sociedade e natureza: a política e a cultura, que ganham, de forma gradativa, mais importância com a crítica que se faz à ideia de avanço tecnológico como única solução para os problemas ambientais. Resultando, também, no reconhecimento da existência de relações de poder e de dominação que envolvem os sujeitos, as comunidades, os órgãos e representantes do Estado, as universidades e a iniciativa.

(37) 37 privada envolvidos em projetos “sustentáveis” (ENNES, 2008). A sustentabilidade ecológica aparece como um critério normativo para a reconstrução da ordem econômica, como uma condição para a sobrevivência humana e um suporte para chegar a um desenvolvimento duradouro, questionando as próprias bases da produção (LEFF, 2008). Atualmente, o sistema jurídico brasileiro, conformado pelos princípios inseridos na Constituição Federal de 1988 parece trilhar o caminho da racionalidade ambiental. O texto constitucional acolheu a sustentabilidade como o princípio diretivo do modelo socioeconômico brasileiro, ao eleger a defesa do meio ambiente como princípio da ordem econômica vigente, como expresso no seu artigo 170, inciso VI, e inserir o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, artigo 225, dentro do título destinado à ordem social.. 2.2. Conflitos ambientais: a natureza em disputa ou disputa entre a natureza? A palavra conflito tem origem latina, conflictu, significando choque, embate, combate, luta (HOUAISS, 2009). O conflito é uma das possíveis formas de interação entre indivíduos, grupos, organizações e coletividades, que implica disputa no acesso e distribuição de recursos escassos (BOBBIO et. al., 1998). O conflito é inerente à convivência humana. As aspirações do ser humano, materiais ou espirituais, além dos limites impostos pela natureza das coisas, operam em fronteiras delimitadas por desejos ou necessidades de outro indivíduo ou da própria coletividade. Naquele primeiro caso, o conflito tem uma conotação eminentemente individual ou, quando muito plural. Neste, diversamente, o conflito adquire ares de supraindividualidade (BENJAMIN, 2003). Para Alonso & Costa (2002), a definição de um conflito supõe considerar a interação entre diversos grupos de agentes em choque pelo controle de bens e recursos ou do poder de gerar e impor certas definições da realidade. Os conflitos se estruturam em torno de interesses e de valores. Prevalece no senso comum ocidental a noção de conflito como um dado negativo, um obstáculo para a coesão do tecido social, motivo de desordem e desarmonia, e por isso deveria ser evitado ou eliminado (NASCIMENTO, 2001). Todavia, não se pode emprestar ao conflito uma significação essencialmente negativa. O conflito é intrínseco à condição humana e.

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