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COTIDIANO E GUERRA NOS CINEMAS DE BELÉM (1939- 1945)

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COTIDIANO E GUERRA NOS CINEMAS DE BELÉM

(1939-1945)

MESTRADO EM HISTÓRIA SOCIAL

PUC/SP São Paulo

(2)

ALLAN PINHEIRO DA SILVA

COTIDIANO E GUERRA NOS CINEMAS DE BELÉM

(1939-1945)

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP, como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em História Social, sob a orientação da Prof. Dra. Maria Odila da Silva Dias.

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo São Paulo

(3)

Banca Examinadora:

_______________________________

_______________________________

(4)

AGRADECIMENTOS

Tarefa difícil agradecer a tantas pessoas que contribuíram ao longo de dois anos de elaboração da dissertação. Nesse percurso várias eventualidades ocorreram para a produção da dissertação, porém foram superadas. Espero corrigir alguns equívocos da monografia e fazer os devidos agradecimentos.

Inicialmente agradecer a Darlene, do Colegiado de História da UFPA, pelo apoio constante nos anos da graduação e da pós-graduação. Ao professor e amigo Décio Guzman pela orientação no projeto e pelos poucos, porém produtivos debates a cerca da temática pesquisada.

Aos profissionais da Biblioteca Arthur Viana do CENTUR (Setor de Microfilmagem), Marcos, Simone e Antônio pela grande colaboração e esforço para ajudar no que fosse possível em relação ao material disponível para a pesquisa do jornal Folha do Norte.

Ao professores do Programa de Pós-Graduação em História Social da PUC/SP, especialmente para as professoras Estefânia Knotz, Márcia D’Alessio, Olga Brites, Denise Bernnuzzi, com as quais o contato intelectual influenciou na construção deste trabalho. Não esquecendo a secretária do Programa: a famosa Betinha. Bem como ao CNPq por financiar as pesquisas para a elaboração da dissertação.

Aos professores que participaram da banca de qualificação, momento importante para direcionar os rumos tomados na pesquisa e escrita do trabalho, Janes Jorge e Antonio Pedro Tota. Ao professor Tota devo agradecer pelos debates em sala de aula e extra-classe, com a exibição de filmes relacionados a ideologia do “Motion Picture”.

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Agradecimentos a minha orientadora Maria Odila, pela paciência com o cumprimento dos prazos e pelas interferências para melhorar o desenvolvimento do trabalho.

Aos meus pais Eliana e José por acreditarem no meu amor pelo estudo da História, tendo minha mãe se tornado a principal incentivadora para o ingresso no Programa de Pós-Graduação em História da PUC/SP, meu sincero amor. Aos meus irmãos Andrey, amigo dileto que nas ocasiões angustiantes muito me ajudou, e Tatiane (companheira e amiga com a qual me confortei por estar longe de casa).

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RESUMO

A dissertação discute o cinema em Belém durante a Segunda Guerra Mundial, envolvendo o cotidiano das salas de projeção, a influência dos filmes hollywoodianos, a passagem dos artistas na cidade, a produção cinematográfica na Amazônia com Libero Luxardo, a veiculação das informações sobre o conflito através dos cinejornais e filmes de longas metragens, a propaganda dos países em guerra e a participação do poder público e outros setores sociais e estatais comprometidos, direta ou indiretamente, no conflito.

A partir dos anúncios e artigos relativos ao cinema em Belém, publicados no jornal Folha do Norte e na revista A Semana, a pesquisa procurou refletir sobre a relação do cinema com a sociedade, como espaço de sociabilidade e propaganda. Nesta perspectiva procurou-se visualizar como as exibições dos filmes referentes ao conflito e a utilização das salas de projeção modificaram-se no decorrer do conflito, assumindo inicialmente uma postura “neutra” e com a entrada do Brasil na guerra aderindo a política antinazista dos países Aliados. Considera-se que esses discursos apresentados nos filmes procuraram enfatizar a política de Boa Vizinhança encampada pelo governo norte-americano e pelas pelos principais estúdios cinematográficos dos Estados Unidos, uma vez que a maioria das películas exibidas nos cinemas da capital paraense foi produzida em Hollywood.

Assim, buscou-se interpretar a atuação dos sujeitos sociais como partícipes importantes na construção da relação do cinema como espaço de interesses diversos, ganhando, durante o segundo conflito, destaque por ser um dos principais meios de comunicação de massa utilizados na propagação de ideais e interesses políticos.

(7)

ABSTRACT

The dissertation discuss the cinema in Belém during the World War Second, involving the daily of the projection rooms, the influence of the hollywood movies, the passage of artists on town, the cinematographic production in Amazônia with Libero Luxardo, the transmission of informations about theconflict down the newspaper cinema and lenght movies, the advertising of countries in war and participation of public power and others social and state sectors engaged, direct or indirect in conflit. Begining from advertisement and relatives articles for the cinema in Belém, published at the Folha do Norte newspaper in the A Semana magazine, the research looked for reflect about the relation of cinema with the society as space of sociability and advertising. In this perspective, looked for visualize how the exhibitions of movies referring to conflit and utilization of projection rooms modify during the conflit, assuming initialy a “neuter” posture and with the entrance of Brazil in the war adhering the antinazi of allied countries.To consider that those discourse presented in the movies looked for emphasize the good-neighborhood politic conducted by north american government and by principal cinematographic studios of United States, so the majority of movies exhibited in the cinemas of paraense capital were produced in Hollywood. So, searched to interpreted the performance of social fellow as important integrant in the construction of relation of cinema as space of several interests, winning during the second conflit prominence by to be a for the principal mass media used in propagation of ideal and politic interests.

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO 09

CAPÍTULO I – O cinema no cotidiano de Belém durante a Segunda Guerra 19 1.1 O cinema em Belém: da chegada do Vistacope ao início da Segunda

Guerra 20

1.2 O “fans” e os artistas em trânsito por Belém 38

1.3 Líbero Luxardo e o cinema na Amazônia 51

CAPÍTULO II – A guerra nos cinemas de Belém: a propaganda nos anúncios

de cinema 69

2.1 A guerra nos cinemas: os filmes e cinejornais norte-americanos 70 2.2 Nem tudo é Hollywood: Alemanha e Itália também produzem filmes 81 2.3 Agora é guerra: a propaganda antinazista nos cinemas 92 CAPÍTULO III – Em tempos de guerra, todos devem lutar 111 3.1 Cinema e Estado: as sessões de filmes educativos 112 3.2 Estamos na luta: a exibição de filmes de guerra 123

CONSIDERAÇÕES FINAIS 143

FONTES E BIBLIOGRAFIA 146

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Desde a primeira apresentação das imagens em movimento feita pelos irmãos Lumiére no dia 28 de dezembro de 1895, no Grand Café, no Bulevar de Capucines, em Paris, o cinema vem se desenvolvendo como arte de entretenimento e, posteriormente, como arma política e de propaganda com o decorrer da Primeira Guerra. Com aparência inocente de exibir imagens do real, logo foi percebido como uma importante arma política. Propagado pelo mundo, o cinema se destacou por suas formas de iludir o público e levá-lo a um mundo imaginário de encantos e prazeres.

O cinema passou a destacar-se não só pelas imagens em movimentos criadas a partir de um aparelho, mas também, por seus espaços físicos construídos para servir à exibição dessas imagens. Essa “perfeita” combinação vem alegrando o público até os dias atuais, constituindo uma importante força de propagação de idéias.

Em Belém, as exibições dessas imagens vieram logo em seguida a sua estréia na Europa. Desde a primeira exibição na cidade, em dezembro de 1896, até o início da Segunda Guerra Mundial foram criadas várias salas de projeção para a exibição de filmes. Diante de várias dificuldades encontradas na coleta de documentos, estudar o cinema em Belém remete à reconstrução do cotidiano citadino da população e sua interação com as salas de projeção e exibição de filmes.

Isto ocorre devido o cinema local, enquanto produção, ser bastante incipiente e muito onerosa na sua execução. Contudo, a partir da década de noventa do século XX, o cinema paraense tem se destacado pelo seu desenvolvimento na produção de curta e, também de forma mais acanhada, nos longa metragem.

Desta forma, na atualidade os aparelhos cinematográficos estão mais acessíveis aos que gostam de fazer películas, facilitando sua produção. No entanto, durante a Segunda Guerra Mundial havia uma dificuldade muito grande na elaboração de filmes brasileiros. Os altos custos não compensavam sua produção, pois a circulação interna desses filmes não gerava renda para as produtoras brasileiras, inviabilizando a formação de uma produção cinematográfica nacional estável.

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desses vestígios históricos deixados pelo cinema em Belém. Não só os filmes referentes à Segunda Guerra Mundial, ou produzidos no período, que tinham o objetivo de propaganda, mas mostrando também a sociabilidade criada no cotidiano do público freqüentador.1

Os estudos acerca da relação entre o cinema e história das sociedades vêm crescendo no meio acadêmico. Com a procura de novas fontes de informação a história diversificou-se em seu campo de pesquisa e saber. Dessa forma, surgiram novos problemas colocados para o historiador, que não está mais preso somente ao documento escrito, mas buscando novos métodos de pesquisa historiográfica. O cinema aparece para o historiador como uma inesgotável fonte para as suas pesquisas.

Para Costa (1987, p. 26), o cinema:

(...) é aquilo que se decide que ele seja numa determinada sociedade, num determinado período histórico, num certo estágio de seu desenvolvimento, numa determinada conjuntura político-cultural ou num determinado grupo social (...)2.

Ou seja, o cinema se estrutura a partir da sociedade em que está inserido, viabilizando formas de pensamentos e representações que podem ser observados nas películas.

Estudar o cinema em Belém é um grande desafio, uma vez que na elaboração desta dissertação trabalhou-se com o espaço físico representado nos periódicos da época como espaço de convivência no cotidiano dos freqüentadores e fonte de informação sobre o conflito mundial e propaganda dos países em guerra. Pretendeu-se, ainda, trabalhar com a análise dos anúncios dos filmes referentes ao conflito e sua repercussão na imprensa local.

Verifica-se, portanto, a importância do cinema enquanto fonte para os estudos históricos. Esse destaque dado à relação entre o Cinema e a História ganhou projeção a partir da década de 70 do século XX, sendo gradativamente incorporado como objeto de estudo da história e, nesse sentido, Ferro (1992) destaca-se por ser o primeiro historiador a sistematizar a problemática da relação Cinema e História.

1 Percebe-se, a partir dos diálogos com as fontes pesquisadas, que os artigos e anúncios referentes aos cinemas

(12)

Em seu livro Cinema e História,3 Ferro (1992) traz diversos ensaios que

deram base para os debates que decorreram a partir da década de setenta até os dia atuais, inclusive para os estudos aqui discutidos. Para ele, o cinema é visto por dirigentes políticos como um meio de propaganda que, bem utilizado, pode ter grande efeito na sociedade, sendo que trabalha o cinema como agente da história.

O filme, aqui, não está sendo considerado do ponto de vista semiológico. Também não se trata de estética ou de história do cinema. Ele está sendo observado não como uma obra de arte, mas sim como um produto, uma imagem-objeto, cujas significações não são somente cinematográficas. Ele não vale somente por aquilo que testemunha, mas também pela abordagem sócio-histórica que autoriza.4

Pode-se destacar da leitura do autor que ele não está preocupado com a análise dos filmes enquanto obra de arte, ou mesmo fazer uma história do cinema. Sua preocupação é estudar os filmes enquanto produto social moldado a partir do contexto histórico em que está inserido e da sociedade que o produz.

Já Leif Furhammar e Folke Isaksson, no livro Cinema e Política,5 procuram

discutir o cinema a partir da primeira guerra, como instrumento político com fins de propaganda. Segundo eles, “(...) geralmente os filmes de propaganda são tanto um meio de explorar um dado clima de opinião como o de exercer uma influencia (...)6.

Por isso, a importância de analisar o momento histórico, social, político e cultural para travar o debate entre cinema e história.

Continuam suas idéias questionando que “a velha idéia de que os filmes podem ser considerados apenas como diversão ou arte, ou eventualmente ambos, é atualmente encarado com crescente ceticismo (...)”. E acrescentam ainda:

É amplamente reconhecido que os filmes refletem também as correntes e atitudes existentes em uma determinada sociedade, sua política. O cinema não vive num sublime estado de inocência, sem ser afetado pelo mundo, tem também um conteúdo político, consciente ou inconsciente, escondido ou declarado7.

2 COSTA, Antônio. Compreender o cinema. Tradução: Nilson Moulin Louzado. Rio de Janeiro: Globo, 1987, p.

26.

3 FERRO, Marc. Cinema e História. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992. 4 Ibid., p. 87.

5 FURHAMMAR, Leif e ISAKSSON, Folke. Cinema e Política. Tradução de Júlio Cezar Montenegro. Rio de

Janeiro: Paz e Terra, 1976.

(13)

Como já debatido, o cinema não deve ser encarado somente como um produto de diversão ou uma obra de arte a ser visualizada e apreciada, mas também como um produto da sociedade em que está inserido, possuindo conteúdo político, que pode estar implícito ou explicito nas películas. Por isso, o trabalho do historiador com o cinema deve apontar para essas problemáticas, que também fazem parte da própria organização da sociedade.

A maioria dos estudos referentes ao cinema na capital paraense parte por uma análise estética, ou da história do cinema ou desenvolvendo debates acerca da crítica. A pequena contribuição deste trabalho para a historiografia local tem como ponto de partida fazer uma leitura histórica do cinema, dando visibilidade para a apresentação dos filmes (com características de propaganda política e também de estilos de vida) nos cinemas da cidade, o cotidiano nos espaços de projeção e também seu reflexo no contexto histórico.

Poucos são os trabalhos referentes ao cinema na cidade. A produção historiográfica local parte de poucos trabalhos acadêmicos, de cinéfilos ou críticos de cinema. Destacam-se nessa historiografia os trabalhos de Pedro Veriano, que escreveu dois livros. O primeiro foi A crítica de cinema em Belém e o segundo

Cinema no Tucupi. Médico de profissão e cinéfilo por opção, Veriano escreveu seu primeiro artigo sobre cinema em 1953 e continua até hoje.

Seu primeiro livro faz um histórico da chegada do cinema em Belém, bem como sua afirmação perante a sociedade local e, posteriormente, uma análise dos sujeitos que iniciaram a crítica de cinema. O segundo parte para uma análise da história do cinema, destacando personagens que fizeram e atuaram em filmes, criadores dos espaços para a projeção e suas análises enquanto crítico de cinema.

Trabalhar com o contexto da Segunda Guerra Mundial tem um significado muito importante, porque, mesmo estando distante do conflito, foi criado na capital paraense um estado de pavor pela população (bem como no Brasil de uma forma geral) devido ao perigo iminente de invasão pelo Exército do Terceiro Reich.

(14)

Paulo para criar sensações de guerra”8. As informações veiculadas pelo rádio,

impressos e cinema reproduziram diversas fantasias sobre o perigo nazista existente no país.

Sem dúvida, o cinema era utilizado como um componente estratégico no conflito para criar comoção e propagar as ideologias dos países em guerra. Segundo Virilio (1993, p. 15), os filmes foram importantes instrumentos de guerra.

À medida que os modernos combatentes estão decididos a invadir a totalidade destes campos, impõe-se a idéia de que o verdadeiro filme de guerra não deve necessariamente mostrar cenas de guerra em si ou de batalhas. O cinema entra para a categoria das armas a partir do momento em que está apto a criar a surpresa técnica ou psicológica9.

O desenvolvimento do cinema como arma de propaganda ocorre concomitantemente com a indústria bélica, devido o fato de o cinema ser considerado como uma importante arma psicológica e de representação durantes os conflitos, viabilizando mais uma frente de combate, destacando outros filmes que não falam necessariamente sobre o conflito, todavia criavam certa comoção social.

Pesquisar o cinema como frente de combate, sua representação psicológica perante o público que freqüentava as salas exibidoras durante a Segunda Guerra e os filmes sobre o conflito, como forma de propaganda dos países envolvidos na guerra, tem uma visibilidade bastante significativa em Belém.

A imprensa local publicava diversos anúncios e artigos sobre as películas de guerra. Verificou-se, então, a partir da análise das fontes históricas, que assim como na Primeira Guerra, momento em que o cinema propaganda “engatinhava” para se firmar, na Segunda Guerra os países beligerantes tiveram um amadurecimento e avanço na utilização do cinema como instrumento político de propaganda10.

Dessa forma, trabalhar com fontes que possam mostrar o cinema como palco do cotidiano urbano dos belenenses e da veiculação de informação sobre a guerra resultou na pesquisa do jornal Folha do Norte e a revista A Semana para, assim,

8 CYTRYNOWICZ, Roney. Guerra sem guerra: a mobilização e o cotidiano em São Paulo durante a Segunda

Guerra Mundial. São Paulo: Geração Editorial: Editora da Universidade de São Paulo, 2000. p. 85.

9 VIRÍLIO, Paul. Guerra e cinema. São Paulo: Scritta Editorial, 1993, p. 15.

10 Sobre o cinema e os filmes políticos e de propaganda durante a primeira guerra mundial ver: SILVA, Allan

(15)

tentar caracterizar a partir da imprensa, o funcionamento dos cinemas quanto ao anúncio, à exibição de filmes, repercussão de alguns e os referentes ao conflito.

Os poucos vestígios documentais deixados pela história em relação ao cinema em Belém, remete-nos à imprensa escrita, uma vez que poucos foram os filmes produzidos na região e, nesses casos, muitos já se perderam enquanto documento histórico.

A datação proposta na pesquisa são os anos em que decorreram a Segunda Guerra Mundial, de 1939 a 1945. Sendo que no jornal Folha do Norte encontrava-se disponível para pesquisa todos os anos referentes à guerra. Porém, para a pesquisa da revista A Semana foram disponibilizados os anos de 1939 a 1942.

O jornal Folha do Norte era distribuído diariamente na cidade. Na década de quarenta o jornal passou a ter um segundo caderno chamado Folha Vespertina, que posteriormente tornou-se independente. Todos os dias havia os anúncios dos cinemas. Neste período duas empresas dominavam o ramo de salas exibidoras de filmes: Cinematographica Paraense Ltda e Cardoso e Lopes. Cada uma possuía em média cinco salas de cinema e era reservado um espaço no jornal para o anúncio dos filmes e dos cinemas exibidores. Já a revista A Semana tinha uma circulação semanal, aos sábados, anunciava os lançamentos dos filmes e possuía uma seção de artigos relacionados ao cinema brasileiro e aos filmes estrangeiros.

O jornal Folha do Norte foi criado em 01 de janeiro de 1896 por Enéas Martins e teve como principal editor, e depois dono, Paulo Maranhão. O jornal tinha como objetivo principal a luta pelo desenvolvimento político e social da região e o combate à política de Antônio Lemos (Intendente de Belém). Durante o seu tempo de vida fez oposição à interventoria de Magalhães Barata (personagem muito estudado pela historiografia local) de 1930 a 1935 e depois de 1943 a 1946, devido sua postura ditatorial. Foi um dos principais jornais em circulação no Pará até o seu término em 197611.

A revista A Semana foi fundada em no ano de 1919 do século XX, porém no período pesquisado estavam disponíveis somente os anos de 1939, 1941 e 1942. Como já demonstrado anteriormente, a revista tinha circulação semanal, aos sábados, e possuía como característica ser mais voltada para o entretenimento, não sendo explícita para este momento da pesquisa sua posição política. Eram seus

11 NEVES, Marlene Nazaré Lins. A Folha do Norte enquanto trincheira política na história do Pará. Trabalho

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proprietários Manuel Lobato e Alcides Santos (Diretor Geral). Sua localização era à Rua da Indústria nº 33, no Bairro do Comércio.12

Esses dois meios de comunicação foram utilizados como fontes principais. É importante perceber como nas documentações trabalhadas os materiais escritos sobre cinema não era vinculada somente a cidade de Belém. Vários desses escritos vinham de outras partes do Brasil e do exterior. Não era somente Hollywood que informava sobre suas atividades cinematográficas, mas também França, Inglaterra, Alemanha e Itália, entre outros países que tinham uma constante produção cinematográfica.

Esses artigos vindos de lugares diversos ocasionaram múltiplos questionamentos sobre a estima do cinema na cidade, uma vez que, qual seria a importância para o público das salas de projeção e para os leitores da imprensa local saberem sobre o casamento de Greta Garbo, da situação internacional que vivia as empresas cinematográficas norte-americanas com a guerra ou da passagem de atores hollywoodianos pela cidade do Rio de Janeiro.

Nesse caso, o domínio de Hollywood sobre o público dos cinemas brasileiros não se deu de imediato com a criação do cinema. Desde sua aparição em Belém até a Primeira Guerra Mundial os filmes europeus dominaram o mercado cinematográfico brasileiro. Os filmes vindos da França e da Inglaterra, e até mesmo da Alemanha, faziam sucesso perante o público belenense. Nesse período, o cinema norte-americano ainda estava constituindo sua base de dominação, que veio se concretizar nos anos posteriores ao final do primeiro conflito.

Durante a Segunda Guerra Mundial os cinemas de Belém exibiam, em sua maioria, filmes vindos dos Estados Unidos. De Hollywood surgiam os astros e estrelas que encantavam o público da cidade. Serviam de modelo e inspiração às moças e rapazes que sonhavam com o glamour das telas do cinema hollywoodiano. Greta Garbo, Joan Crawford, Gary Cooper, Henry Fonda, entre tantas outras estrelas e astros do cinema norte-americano, eram anunciados na imprensa13 como mitos a serem venerados e apreciados pelo público.

12 A rua da Indústria hoje é chamada de Gaspar Viana. CRUZ, Ernesto. Ruas de Belém: significado histórico de

suas denominações. 2º. Ed. Belém: CEJUP, 1992.

13 Quando estiver trabalhando com o termo imprensa, está-se referindo ao jornal Folha do Norte e à revista A

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Esses atores e atrizes ganhavam destaque, não só nas salas de projeção, mas também nos noticiários da imprensa. Eram veiculadas notícias sobre a sua vida íntima, com quem se casavam; suas viagens; seus filmes de maior sucesso e quais os artistas que eram mais apreciados pelo público da cidade.

Esse destaque dado à vida dos astros e estrelas, do funcionamento dos cinemas em Belém, dos anúncios diários, da situação cinematográfica internacional durante a Segunda Guerra Mundial, entre tantos encontrados, torna-se relevante para a análise histórica do cinema nesse momento.

Na procura de vestígios que pudessem mostrar o cotidiano dos cinemas da cidade de Belém no momento da guerra, servindo como espaço de entretenimento e fonte de informação sobre o conflito, os anúncios tiveram papel de destaque na análise dos discursos referentes à Segunda Guerra Mundial.

Ao trabalhar com os anúncios dos filmes e suas descrições, sendo que muito deles foram conhecidos a partir do contato com as fontes, verifica-se que em seus conteúdos havia um intenso caráter de propaganda, colocando os países do Eixo como grandes “demônios” a serem exorcizados do mundo14. A democracia era o

grande baluarte da luta contra o nazi-fascismo.

Assim, o cinema passou a fazer parte do ambiente citadino, caracterizando sua atuação junto ao público como uma relação amorosa parecida com os filmes de

Hollywood, imaginário na sua criação e real para quem assistia.

Um dos grandes desafios desta dissertação é falar de cinema sem necessariamente ter assistido a maioria dos filmes exibidos durante o segundo conflito mundial, uma vez que vários outros filmes referentes à guerra e com finalidade de propaganda, infelizmente não puderam ser encontrados em Belém para análise. Contudo, esses registros ficaram e podem ser encontrados e analisados a partir dos jornais e revistas que circulavam na cidade. Assim sendo, pôde-se também pesquisar o cotidiano dos cinemas na vida dos moradores da cidade em um período conturbado pelo qual passava a humanidade.15

14 Neste caso e analisado como referência os filmes produzidos pelos aliados (Estados Unidos, França e

Inglaterra) que eram a maioria exibida em Belém, mas filmes Italianos e alemães também passavam nos cinema da cidade até o afundamento dos navios brasileiros por submarinos alemães e o rompimento das relações diplomáticas com os países do Eixo.

15 Um dos trabalhos pioneiros no Brasil sobre o estudo do cotidiano é o da historiadora Maria Odila Leite. Sua

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No primeiro capítulo, intitulado “O cinema no cotidiano belenense”, tenta-se analisar, primeiramente, a chegada do aparelho reprodutor das imagens em movimento e a consolidação dos espaços para a projeção dos filmes, discutindo-se o cinema no cotidiano da cidade de Belém e utilizando-se artigos da imprensa local sobre a interação do cinema com o público. Em outro ponto do trabalho, a importância dos artistas na propagação dos ideais e da cultura norte-americana, bem como a influência sobre os fãs da cidade, notícias sobre a atividade cinematográfica no Brasil e no mundo. E na última parte do capítulo, a atuação do cineasta Libero Luxardo e seu valor para a produção cinematográfica amazônica.

No segundo capítulo, “A guerra nos cinemas de Belém: a propaganda nos anúncios cinematográficos” destacou-se, inicialmente, a análise dos anúncios e artigos referentes aos filmes de guerra e qual o caráter político e de propaganda desenvolvido principalmente por Hollywood dentro do contexto da Segunda Guerra Mundial. Na segunda parte, a análise da política getulista, refletida nos anúncios diante do contexto do conflito, pois houve uma interferência por parte do Departamento Estadual de Imprensa e Propaganda na exibição de filmes e cinejornais nos cinemas de Belém. Com essa análise, pôde-se verificar, inicialmente, uma ligação entre os países do eixo com o Brasil, a partir da liberação de filmes vindos da Alemanha e Itália, e depois da declaração guerra a esses países, a proibição. E por último, a propaganda antinazista propagada pelos Estados Unidos nos cinemas belenenses.

No terceiro capítulo “Em tempos de guerra, todos devem lutar” foi trabalhada a análise da participação do governo municipal e estadual na política desenvolvida contra os regimes totalitários, bem como a participação do Comitê de Coordenação dos Negócios Inter-Americanos no Estado do Pará e outras organizações da sociedade civil, promovendo atividades relacionadas ao esforço de guerra do Brasil e dos países Aliados, dentre elas a exibição de películas informativas e de propaganda sobre o conflito.

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CAPÍTULO I

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1.1 O CINEMA EM BELEM: DA CHEGADA DO VISTACOPE À SEGUNDA GUERRA

27 annos completará, terça-feira, 25, o querido cinema da Praça da República, e ainda recebe no seu confortável salão de projeção a fina flor que Belém possue. Nas “soirées” elegantes é alli que a sociedade se reúne em alegria comunicativa para sentir o deleite de algumas horas de distração (...).

Folha do Norte16

O cinema começou a fazer parte da vida citadina belenense desde fins do século XIX, chegando à cidade no momento em que ela estava vivendo um esplendor econômico proporcionado pelo comércio da borracha. Esse progresso urbano e cultural foi ocasionado pelos grandes lucros alcançados com a exportação do látex e que produziu altas receitas para o poder público e sua elite comerciante. Pode-se observar que esse aumento no fluxo de capitais na cidade serviu para que houvesse grandes investimentos e um aceleramento no processo de urbanização, como: transformação do espaço público, a construção de boulevard, melhoria no sistema de iluminação, transporte e instalação de rede de esgoto, entre várias outras17.

A construção de ambientes que atendessem a ostentação do luxo e da riqueza da elite formada com o comércio da borracha foi prioridade para o poder público durante o final do século XIX e início do XX. Em meio às transformações ocorridas no comércio e na estrutura urbana intensificou-se a importação de produtos culturais vindos da Europa e América do Norte, sendo que, nessa rota da modernidade, a cidade de Belém foi uma das primeiras capitais brasileiras a receber a “inovação” científica que produzia imagens em movimento.

Como efeito dessas tecnologias produzidas pela modernidade surge o cinematógrafo, patenteado pelos irmãos Lumiére na França, que tinha como objetivo inicial mostrar cenas em movimento da vida real através de um aparelho. Neste caso, o cinematógrafo caminhava paralelamente aos aperfeiçoamentos que Thomas

16 Folha do Norte – Belém, 23 de abril de 1939, p. 06.

17 Ver SARGES, Maria de Nazaré. Belém – Um outro olhar sobre a “Paris dos Trópicos” (1897-1911). In:

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Edson fazia nos Estado Unidos, em seus vários engenhos para chegar ao filme e ao projetor que hoje se conhece18.

O registro da primeira exibição no Brasil das imagens em movimento ocorreu no Rio de Janeiro na data de oito de julho de 1896. Já na capital paraense, a primeira exibição do Vistacope de Thomas Edson à sociedade belenense ocorreu no Teatro da Paz em 29 de dezembro de 1896. No entanto, a primeira exibição não obteve grande repercussão por conta de deficiência técnica19.

Desde então, o cinema (não contendo nesse momento o espaço físico como se conhece hoje por salas, mas somente as projeções de imagens em movimento) se fixou e ganhou ao longo dos anos diversos adeptos de sua arte. Criou vínculos muito fortes com a população belenense, se enraizou como as grandes mangueiras e como diz uma música local “quem vai ao Pará, parou”. Sim, realmente ele parou e estabeleceu moradia em vários bairros e no gosto do público.

Dessa forma, o cinema passou a fazer parte do cotidiano da capital paraense como um espaço social, servindo não só como um evento para o público, mas também a vários outros propósitos que serão discutidos ao longo do trabalho.

Trabalhar com o cotidiano criado através dos cinemas na sociedade local não é homogeneizar as relações criadas em torno desse ambiente, mas sim perceber que as várias formas de se relacionar com o espaço diferem dentro da sociedade. Ou seja, visualizar a história do cotidiano, apenas como hábitos e rotinas a se repetirem não leva em consideração as abordagens do cotidiano relacionadas às tensões e confrontos,

Deixando entrever um mundo onde se multiplicam formas peculiares de resistência/luta, integração/diferenciação, permanência/ transformação, onde a mudança não está excluída, mas sim vivenciada de diferentes formas20.

Desse modo, pesquisar o cinema em Belém durante a Segunda Guerra Mundial é apreender que ele atende a interesses diversificados, tanto do público quanto do Estado.

18 VERIANO, Pedro (coord.). A crítica de cinema em Belém. Belém: Secretaria de Estado de Cultura, Desportos

e Turismo, 1983, p. 15.

19 VERIANO, Pedro. Cinema no tucupi. Belém: SECULT, 1999, p. 11.

20 MATOS, Maria Izilda Santos de. Cotidiano e cultura: história, cidade e trabalho. Bauru, SP: EDUSC, 2002,

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Neste período, o continente europeu estava vivendo momentos conturbados em sua política internacional em fins da década de trinta, uma vez que se prenunciava um conflito armado entre seus países devido à progressiva mobilização do exército do Terceiro Reich que visava à expansão territorial do regime nazista alemão.21 Assim, enquanto a Europa havia se transformado em um “barril de pólvora” pronto para explodir, o jornal Folha do Norte, em Belém, anunciava o aniversário do cinema Olímpia, uma vez que se comemorava vinte e sete anos de trabalhosa orientação para agradar a “fina flor” da sociedade belenense.

Os acontecimentos no “velho” continente pareciam não afetar a rotina da cidade. O “ilustre” cinema Olímpia, construído no fim do período áureo do comércio gomífero em Belém, continuava como o espaço de “soirées” elegantes que levava o público freqüentador daquela sala de projeção a deleitar-se com as grandes produções hollywoodianas. Estas falavam de amor e apresentavam os famosos atores e atrizes como modelos de beleza e valores morais a serem seguidos. Local de convívio e distração, o cinema incorporava no ambiente citadino um cotidiano de sensações mistas entre a ficção e a realidade22.

O artigo do jornal Folha do Norte intitulado “O anniversario do ‘Olympia’ – 27 annos de profícua e laboriosa orientação”23 mostrava como o cinema era tratado pela imprensa local quanto a sua utilização. Geralmente, era veiculado como meio de sociabilidade para o seu público, que ali se encontrava para extravasar suas alegrias com os filmes e ao mesmo tempo em que se encontrava com amigos e conhecidos.

O artigo coloca o cinema Olympia como sendo o mais antigo da cidade em atividade. Durante esse percurso, várias salas de projeção se instalaram, mas

21 Diversas questões podem ser discutidas para entender a posição belicosa da Alemanha durante a década de

trinta. Contudo, um dos fatos destacados pelos historiadores seriam os tratados prejudiciais – imposição dos países vencedores no fim da Primeira Guerra – aos interesses da Alemanha. HOBSBAWM, Eric. Era dos Extremos: o breve século XX (1914-1991). Tradução de Marcos Satarrita. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. VIGEVANI, Tullo. Origens e desenvolvimento da Segunda Guerra: considerações sobre a querela dos historiadores. In: COGGIOLA, Osvaldo. Segunda Guerra Mundial: um balanço histórico. São Paulo: Xamã: Universidade de São Paulo. Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas. Departamento de História, 1995.

22 Segundo Veriano a inauguração do cinema Olympia, nessa época seu nome era escrito com y, no dia 24 de

abril ano de 1912, foi registrada na imprensa como um grande acontecimento para a sociedade – no caso as classes abastadas que se beneficiaram com o comercio da borracha que foram à inauguração em decorrência dos requintes da sala de projeção – que viu na sessão inaugural uma película sobre a tragédia do Titanic, navio que afundou meses antes da inauguração. No ano de inauguração do Olympia existiam na cidade cerca de 12 cinemas. VERIANO, P. op. cit. p. 18, nota 18.

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tiveram vidas efêmeras, tendo o cinema Olímpia passado por diversas fases da cinematografia: do mudo ao sonoro, dos artistas de “pelliculas de Arte da Scena Muda” como May Murray, Theda Bara, Thomas Meignan, Willian Powell, Ronald Colman, Rudolph Valentino, Joan Crawford, Chales Chaplin (Carlitos), aos da “tela sonora do Olympia que na phase nova do cinema norte-americano e europeu” como Jeanette Mac Donald, Maurice Chaveller, Henry Garat, Humphrey Bogart, Ingrid Bergman, entre tantos outros24, que encantaram o público de Belém com sua magia e beleza.

Jurandir (1960) pondera sobre dois cinemas da capital paraense.

Por isso, iam as Alcântaras ao melhor cinema, de graça. Quanto a Isaura não dar as entradas aos irmãos. Emília explicava a si mesma: qual dos dois irmãos ia ao Olímpia? Um sapateiro mexendo nos motores da fábrica de sapatos, o outro, marceneiro, nem um nem outro ia. A Maga? Mãe Ciana? Violeta, essa não fazia muito empenho, primeiro porque o Olímpia

pedia traje correspondente, segundo porque no Íris ali no Reduto, com o subúrbio em peso na fita em série, ela preferia muito mais. Olímpia era dos patrões do sapateiro e do marceneiro, das pessoas que tinham nome no jornal, nome nas portas e janelas de escritório, nas tabuletas do comércio, da indústria e nas residências de doutores de Nazaré e São Jerônimo.25

A Belém dos anos vinte vivia os resquícios da Belle Epoque paraense, em decorrência da decadência do comércio da borracha. O autor discorre sobre a vida de uma família (os Alcântaras: pai, mãe e filha) que viveram o apogeu desse período, mas que tiveram grandes perdas com o seu declínio.26 No romance, a capital paraense é revisitada pelo escritor mostrando diversos aspectos da sociedade belenense e de sua estrutura urbana, sendo que, em vários momentos, as salas de projeção foram descritas como parte da ambientação do período. O destaque foi para o Olímpia que servia para, além da projeção dos filmes, como ponto de encontro para a elite local. Segundo pensava Emília, a filha de seu Virgílio

24 Folha do Norte – Belém, 23 de abril de 1939, p. 06.

25 JURANDIR, Dalcídio. Belém do Grão Pará. São Paulo: Editora Martins, 1960, p. 117. Dalcídio Jurandir

nasceu em Ponta de Pedras, Ilha do Marajó no Pará, em 10 de janeiro de 1909. Em 1921 partiu para Belém com o intuito de estudar, sendo que em 1928 viajou para o Rio de Janeiro, antes de concluir o segundo ano ginasial, e lá trabalhou como revisor da revista Fon Fon. Ao voltar para Belém em 1931 começa suas atividades políticas e posteriormente de escritor. Dalcídio Jurandir morreu em 16 de junho em1979 e hoje é considerado um dos principais escritores da literatura paraense, entre seus livros destaca-se Belém do Grão Pará de 1960.

26 A decadência da borracha na Amazônia começou no ano de 1910, quando os preços iniciaram o processo de

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Alcântara e Dona Inácia, o Olímpia era freqüentado pelos donos de indústria, advogados e comerciantes que enriqueceram com o comércio da borracha.

Nas imagens da cidade descritas pelo escritor, percebe-se a importância dos cinemas para a trama citadina "olhava as luzes, os passageiros do bonde. Adiante era a cidade, os cinemas, o Largo da Pólvora, o Lamarão no Palacete...”.27 A paisagem das salas de projeção já fazia parte do cotidiano da cidade e da vida dos moradores.

Em contraposição aos requintes do cinema Olímpia existiam outras salas de projeção que atendiam a população que tinha poder aquisitivo mais baixo. Dessa forma, a vontade dos Alcântaras de freqüentar o Olímpia, como forma de reviver o passado da família no período auge da borracha, era satisfeita com os convites de Isaura, costureira que ganhava os ingressos por conta de seus serviços prestados à empresa (Martins e Teixeira) dona do cinema e que convidava Emília e Dona Inácia por terem roupas adequadas. Sendo assim, o Íris que ficava no Bairro Reduto e tinha como característica aglutinar a população dos subúrbios, era o cinema freqüentado pela família de Isaura, que devido suas condições financeiras ia se divertir indo assistir as fitas em séries que ali passavam.

A estagnação econômica e social vivida nos anos vinte perdurou durante as décadas de trinta e quarenta. Não obstante, pôde-se perceber que durante o segundo conflito mundial essas características aglutinadoras dos cinemas de Belém persistiram como um hábito para parte da população que apreciava os salões de espera dos cinemas e os vários filmes exibidos nas telas.

A década de quarenta foi marcada pela forte presença dos cinemas no cotidiano das grandes capitais brasileiras, porém com a introdução da televisão nos anos cinqüenta, iniciou e, paulatinamente foi se consolidando, a crise em torno das salas de projeção, que hoje se faz visível.

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Aos vários gostos e sentimentos, os filmes proporcionavam uma viagem ao mundo de sonhos, oferecida por uma máquina em uma sala escura, pois no dizer de Morin (1997): “a técnica e o sonho andam, desde o princípio, a par. Em nenhum momento de sua gênese e do seu desenvolvimento se pode confinar o cinematógrafo ao campo exclusivo do sonho ou da ciência”.28 A sala escura, as trilhas sonoras, o romance e aventura dos filmes, sobrepostas aos telespectadores por uma máquina de projetar imagens em movimento compunha um ritual que, misturando ciência e sonho, transportava-os para outra realidade que durava até o acender das luzes.

No início da primeira década do século XX as projeções em Belém foram feitas em cines-teatro ou mesmo em projeções volantes (como exemplo na festividade religiosa do Círio de Nazaré). Esse período:

(...) será caracterizado como a época dos empresários cinematográficos ambulantes, viajantes brasileiros e estrangeiros, que se deslocam de cidade em cidade com seu aparelho vendendo ilusões com filmes comprados ou alugados na França, Estados Unidos, Alemanha e Itália (...).29

Essas projeções ambulantes duraram até a construção das primeiras salas de projeção, como o “Politheama” (que ficava na Rua 28 de setembro, no Bairro do Comércio) e o “Odeon” (no Bairro de Nazaré). 30 Somente, em 1912 a cidade

“ganhou” seu primeiro cinema de “luxo”. Construído pelos empresários Antonio Martins e Carlos Augusto Teixeira, o cinema Olímpia, servia para satisfazer a elite da borracha.

De acordo com os estudos de Maria de Nazaré Sarges sobre o período da

Belle Époque em Belém, entre os anos de 1870 a 1912, o cinema já fazia parte do cotidiano dos citadinos desde fins da primeira década do século XX.

27 JURANDIR, op. cit., p. 87.

28 MORIN, Edgar. O cinema ou o homem imaginário. Lisboa: Relógio D’Água Editores, 1997. p. 28.

29 COSTA, Selda Vale da. Eldorado das ilusões. Cinema & Sociedade: Manaus (1897/1935). Manaus: Editora

da Universidade do Amazonas, 1996, p. 33.

30 Selda Costa aponta outro fator para a decadência das projeções volantes que caracterizaram o início das

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Os “Coronéis da Borracha” davam-se ao prazer de ter suas cocottes (prostitutas de luxo), muitas delas européias, como ‘Panchita’ (espanhola), ‘Raito de Ouro’ (espanhola), ‘Margot’ (francesa), freqüentadoras das sessões das sextas-feiras do cinema Olympia. Onde exibiam os vestidos luxuosos que mandavam buscar na Europa e jóias da Casa Krause. Os ‘Coronéis da Borracha’, embora dependentes financeiramente de Londres e dos Estados Unidos, estavam culturalmente ligados a Paris, uma das cidades-polos da Belle-Époque, cidade símbolo da fase áurea da modernidade.31

Como se observa na citação, a elite da borracha, ou como chama a historiadora “Coronéis da Borracha”, aproveitavam o espaço do cinema Olímpia como interação social para que suas “cocottes” (não só elas, mas também para as mulheres de uma forma geral) pudessem mostrar seus luxuosos vestidos vindos da Europa e as jóias da Casa Krause aos freqüentadores e também a elite que freqüentava a sala de cinema32. Nesse momento, as salas de projeção já estavam sendo utilizadas como influenciador do público quanto ao vestuário (pois a moda paraense seguia a tendência européia) e espaço social para exibi-lo.33

Contudo, imaginar o cinema somente como produtor de outra realidade, que dura nas horas em que as luzes estão apagadas é não perceber a força construída pela indústria que se formou em torno desse empreendimento, no qual a influência diante da realidade social foi percebida durante a primeira guerra e ganhou muita força durante o segundo conflito. 34

31 Ver: SARGES, Maria de Nazaré. Belém: riquezas produzindo a Belle-Époque (1870-1912). Belém:

Paka-Tatu, 2002, p. 83.

32 Neste caso faz-se referência à elite, pois o cinema Olympia passou a fazer parte de um Triângulo cultural que

ficava localizado na Praça da República e era freqüentado pela elite comercial da borracha no fim do século XIX e início do XX. Pedro Veriano afirma que “A criação do cinema Olympia transformaria em quadrado o triângulo de bom tom com vértices no Palace, no Grande Hotel e no Theatro da Paz, alguns passos adiante. Esse trecho de rua, ou da Praça da República, que o povo ainda chamava de Largo da Pólvora, era justamente o mais freqüentado pela elite”. Cf. VERIANO, op. cit., p. 17, nota 19.

33 Segundo Wanessa Cardoso na década de vinte do século XX as mulheres da capital paraense desfilavam com

suas vestimentas compradas na Rua João Alfredo, centro comercial de Belém no período, nos diversos espaços, tais como os clubes (Assembléia Paraense, Grêmio Literário Português, Clube do Remo), teatros, festividades religiosas do Círio de Nazaré, os cinemas com as sessões do Olímpia que “também tiveram sua influência nessa incorporação de hábitos reelaborados pela mulher paraense. O cinema era a diversão moderna mais requisitada pelas classes médias e altas, os filmes em sua grande maioria eram produzidos nos Estados Unidos ou França (que na verdade tem a primazia desta arte), trazendo traços e modos de uma mulher outra, diferenciando-se muito de modelo feminino cultivado em uma sociedade patriarcal como a brasileira”. CARDOSO, Wanessa Carla Rodrigues. “A Elegância da alma do século XX”: a mulher e a moda na Belém dos modernistas (1923-1929). Monografia de Conclusão de Curso. Universidade Federal do Pará, 2001, p. 25.

34 “Os filmes produzidos durante a Primeira Guerra Mundial tinham uma propaganda extremamente patriótica.

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Desse modo, a sociedade local pôde desfrutar das imagens em movimento e das salas de projeção, estruturadas da forma como se conhece hoje e chamado de cinema. Foram recintos construídos para o entretenimento e espaço de convívio social de seus freqüentadores.

O papel desempenhado pelo cinema nos anos iniciais, como o de apenas mostrar imagens em movimento ou, posteriormente, servir como propagador de moda, logo foi percebido como um importante instrumento de divulgação de idéias políticas que durante a Primeira Guerra serviu como veículo de informação, através dos cinejornais, e também de propaganda dos países beligerantes, uma vez que seus governos patrocinavam a produção de filmes com conteúdos de propaganda política e social.35

Na segunda década do século XX os filmes europeus eram os mais exibidos nos cinemas da cidade. Empresas produtoras, como a Pathé Fréres francesa, distribuíam para os cinemas do Brasil diversas películas, sendo que nas salas de projeção da capital paraense a Empresa dividia espaço com outras do mesmo continente.36

No decorrer da Primeira Guerra Mundial a maioria dos filmes exibidos nas salas de cinema em Belém vinha da Europa. Nesse momento, não havia filmes vindo dos Estados Unidos com grande repercussão. Assim explica Jean-Claude Bernardet:

(...) até a guerra de 1914/18, o domínio fica com a França, Itália, Alemanha, Suécia e Dinamarca. Após a guerra, com o enfraquecimento das cinematografias européias, é a vez dos Estados Unidos que se instalam e até hoje continuam instalados (...).37

Cf. SILVA, Allan Pinheiro da. O cinema político: a propaganda sobre os filmes bélicos durante a Primeira Guerra Mundial em Belém. Monografia de Conclusão de Curso. Universidade Federal do Pará, 2003, p. 24.

35 Ver: SILVA, A. P. op. cit.

36 Nos estudos realizados para a construção da monografia sobre o cinema e a exibição de filmes na cidade no

período da Primeira Guerra Mundial percebeu-se que a dominação inicial da distribuição de filmes pelos estúdios cinematográficos europeus nos cinemas “pode ser bastante visualizada durante a Primeira Guerra Mundial nos cinemas de Belém. A maior parte dos filmes vinha de produtoras como a Pathe (França), Gaumont (França), Éclair (França), Milano (Itália), Mester Films (Alemanha) e Nordisk (Dinamarca), entre outras que assim investiam no mercado brasileiro”. Ibid., p. 11. A Pathé Freres alcançou êxito mundial na primeira década do século XX, conquistando parte do mercado exibidor norte-americano, contudo não influindo no conteúdo dos filmes e na formação da indústria cinematográfica. SKLAR, Robert. História social do cinema americano. Tradução de Octavio Mendes Cajado. São Paulo: Editora Cultrix, 1975, p. 43.

37 BERNARDET, Jean-Claude. Cinema Brasileiro: proposta para uma história. Rio de Janeiro: Paz e Terra,

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A decadência econômica ocasionada com a Primeira Guerra desestruturou o parque industrial europeu e, conseqüentemente, a indústria cinematográfica, tendo o eixo principal de distribuição de filmes, que antes era na Europa, passado para o controle dos Estados Unidos. Durante a Segunda Guerra os filmes produzidos em Hollywood dominaram o mercado brasileiro e também encheram de ilusões o público dos cinemas em Belém.

A dominação do mercado brasileiro pelos filmes estrangeiros dava-se pelo imenso custo que seria o da produção de um filme nacional. Para os que gostavam de fazer filmes no Brasil era preciso importar a tecnologia da França ou dos Estados Unidos.38 Desse modo, para um filme se firmar no mercado cinematográfico, precisava primeiro obter renda perante o público freqüentador dos cinemas nacionais para depois ser distribuído para outros lugares. No caso, os Estados Unidos.

(...) o mercado interno americano sustentava a produção e o mecanismo básico que possibilitou a afirmação e a manutenção da dominação parece ser o seguinte: por dispor de amplo mercado interno, os produtores americanos conseguem cobrir os custos de sua produção média nos próprios EUA. Assim, chegando, por exemplo, ao Brasil, o filme norte-americano já pago, custa as despesas de cópia, de frete, taxas de alfândegas e censura que não representam muito, publicidade (reprodução e, quando muito, adaptação da publicidade americana), colocação das legendas. Fica patente que, nestas condições, a concorrência por parte dos produtores brasileiros é impossível, pois, além dos custos de comercialização, os filmes brasileiros têm que pagar a totalidade de sua produção...39

A comercialização das películas ficava a cargo das grandes empresas estrangeiras que forneciam os filmes para o mercado nacional. Coube aos empresários brasileiros cuidar apenas da exibição das películas nos cinemas espalhados pelo Brasil. As empresas proprietárias de cinemas em Belém também faziam parte dessa rota de distribuição e exibição.40

38 Discussões a cerca do nascimento do cinema brasileiro e sua constituição ver: BERNARDET, Jean-Claude.

Historiografia clássica do cinema brasileiro: metodologia e pedagogia. 3º edição. São Paulo: Annablume, 2004. ARAULO, Vicente de Paula. A Bela Época do cinema brasileiro. São Paulo: Perspectiva, 1976. GOMES, Paulo Emílio Salles. Cinema: trajetória do subdesenvolvimento. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980. Viany, Alex. Introdução ao cinema brasileiro. Rio de Janeiro: Alhambra/Embrafilme, 1987.

39 BERNARDET, op. cit., p. 13-4, nota 37.

40 A distribuição de filmes pelo Brasil seguia “uma rotina de circuito que vinha do Sul para o Norte, o normal era

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No decorrer da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) a cidade de Belém possuía vários cinemas, sendo que todo dia havia anúncio dos filmes para o público e leitor do jornal. Durante os anos de guerra duas empresas dominavam o ramo cinematográfico, eram elas: Cinematographica Paraense S/A (antes Teixeira & Martins) dona dos cinemas Olímpia, próximo à Praça da República no Bairro do Comércio; Iracema, em Nazaré; Guarani, na Cidade Velha; Íris, no Reduto; São João, na Praça Brasil (Umarizal); Popular e Poeira, ambos em Nazaré e à empresa Cardoso & Lopes pertenciam os cinemas Moderno, em Nazaré; Independência, no bairro de São Braz; Universal, na Cidade Velha e Rex, no bairro da Pedreira.41

No final da década de trinta existiam na cidade onze cinemas em atividade espalhados por alguns bairros, sendo que em Belém residiam aproximadamente 208 mil habitantes distribuídos por um total de vinte bairros, eram eles: Marambaia, Souza, Sacramenta, Telégrafo sem Fio, Pedreira, Marco, Umarizal, Matinha, São Braz, Canudos, Terra Firme, Reduto, Nazaré, Cremação, Guamá, Comércio, Batista Campos, Condor, Cidade Velha e Jurunas.42

Segundo Penteado (1968), a cidade de Belém, de 1888 a 1920, aumentou significativamente seu contingente populacional - de 66.000 habitantes passou para 236.000 devido à comercialização da borracha. Contudo, efetivada sua decadência na década de vinte do século passado houve um declínio populacional, passando a cidade, no final da década de trinta, a possuir 208.000 habitantes.

As principais atividades econômicas desenvolvidas nesse período eram: domésticas (98.000 habitantes); prestação de serviços (17.525); Indústria de transformação (14.611); transporte, comunicações, armazenagens (12.581) e comércio de mercadoria (12.322). Um dado surpreendente apresentado nos estudos de Penteado (1968) é o da alfabetização da população na capital paraense, pois 75% dos habitantes sabiam ler e escrever43.

Esses dados foram retirados do Recenseamento Geral de 1950, feito pelo IBGE. São elementos importantes para a reflexão a respeito das atividades em torno

41 Ibid. p. 32-33.

42 Uma obra de grande referência sobre a cidade de Belém na década de quarenta é a de Antônio Rocha

Penteado. Em seu livro Belém – Estudos de geografia urbana, o autor, analisa a hidrografia, o clima, a vegetação, a evolução da cidade (desde o seu fundamento no século XVII até a década de cinqüenta do XX), a população e a economia. Cf. PENTEADO, Antônio Rocha. Belém – Estudos da geografia urbana. Coleção Amazônia, série José Veríssimo. Universidade Federal do Pará, 1968. Ver anexo 1.

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desse cometimento na cidade, pois durante as décadas de vinte e trinta, Belém sofreu com o declínio demográfico e com a estagnação econômica ocorrida devido à queda abrupta do comércio gomífero.

No plano político, o Brasil vivia sob a ditadura do Estado Novo. Diniz (1986) propõe a discussão da centralização do poder sobre dois enfoques: a primeira, explorada pela ideologia oficial, focaliza o fortalecimento do poder Executivo “contra a ação desagregadora do privatismo e do localismo”; sendo que a segunda visualiza a política nacional constituída desde o golpe do Estado Novo, em 10 de novembro de 1937, como um processo de centralização, ainda mais, do poder de decisão do Estado como representante dos anseios da nação.

Destacando as transformações econômicas e sociais e a crise política e hegemônica, com o embate entre os setores das classes dominantes ocorridas durante as décadas de vinte e trinta, favoreceu a implantação do estado autoritário e da promulgação da Constituição em benefício do fortalecimento do poder Executivo. Suas análises se detiveram sobre o segundo enfoque e as características dessa organização estatal redimensionaram sua atuação:

A centralização e o aumento do grau de coerção do Estado não eliminaram, entretanto, uma tendência inaugural com a vitória do movimento de trinta, de combinar uma estrutura de poder elitista com uma base de sustentação policlassista, como forma de conferir certo grau de legitimidade ao sistema político em fase de reestruturação.44

Com o Estado centralizado o controle dos meios de comunicação se intensificou, culminando com a criação do DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda) em 1939. A estrutura de governo criada desde o movimento de trinta possibilitou condições para a criação de diversos órgãos ligados ao governo federal com a finalidade de atrelar e utilizar o rádio, o cinema e a imprensa como instrumentos de propaganda.45

A criação do Departamento Estadual de Imprensa e Propaganda no Pará aconteceu no dia 15 de abril de 1941 com a assinatura do decreto nº 3718 pelo Interventor Federal no Estado José da Gama Malcher. O órgão deveria ficar

44 DINIZ, Eli. O Estado Novo: estrutura de poder. Relações de classes. In: História geral da civilização

brasileira: o Brasil republicano. 3. ed. São Paulo: DIFEL, 1986, cap. 2, p. 77-120.

45 “A maioria dos autores reconhece que o Estado decorrente da revolução de 1930 criou uma prole de aparelhos

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subordinado ao governo estadual e ao Departamento de Imprensa e Propaganda. Assim informou o jornal Folha do Norte sobre o decreto-lei:

Art. 1º - Fica criado o Departamento Estadual de Imprensa e Propaganda, subordinado, sob o ponto de vista da orientação técnica e doutrinária ao Departamento de Imprensa e Propaganda.

Art. 2º - Ao Departamento Estadual de Imprensa e Propaganda compete colaborar com o Departamento de Imprensa e Propaganda nos serviços relativos a imprensa, rádio-difusão diversões públicas, propaganda, publicidade e turismo, os quais ficam assim agrupados:

a) divisão de imprensa;

b) divisão de rádio-difusão e diversões públicas; c) divisão de propaganda, publicidade e turismo.46

Os outros artigos do decreto-lei versavam sobre as questões burocráticas para a instalação do DEIP no Pará, tais como: escolha do diretor geral do Órgão, que ficaria a cargo do chefe do executivo estadual; as divisões e escolha dos diretores; a contratação de funcionários; a remuneração dos diretores, dentre outros. A orientação “doutrinária” estava subordinada aos princípios do órgão nacional que serviu de instrumento político e de propaganda do Estado Novo.

Apesar da estagnação econômica, a cidade ainda mantinha um número considerável de salas de projeção e o que se percebe, a partir das fontes, era uma grande movimentação em torno desse empreendimento. No final da década de trinta existiam poucas atividades de lazer proporcionadas à população belenense. Como os cinemas tinham um funcionamento diário ir às salas de exibição era uma diversão.

Cinema era uma festa. Filme era assunto. As discussões em torno do colete de Douglas Fairbanks ou da coleira do au au animavam os saraus e as matinês de uma classe média que se mantinha com poucos réis. Parecia um papo democrático, embora as patroas visse as “fitas” no Olympia e a empregada no Poeira. Vale dizer, as estrelas, não apenas o sol, nasciam para todos.47

Para o autor a “democratização” do cinema ocorria devido ao seu atendimento ao público diversificado que assistia aos mais variados e do qual fazia parte tanto a patroa como a empregada. Esses personagens históricos sonhavam com as estrelas e os astros de Hollywood, choravam e se emocionavam da mesma

46 Folha do Norte – Belém, 17 de abril de 1941, p. 01 do Segundo Caderno. “Departamento de Imprensa e

Propaganda do Pará – A íntegra do decreto-lei creando esse novo órgão público”.

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forma. Tanto para a empregada como para a patroa, Hollywood estava distante, assim como o sol, que poderia se ver, mas nunca tocar.

O acesso do público às salas de projeção dava-se entre os que tinham muito e pouco dinheiro, pois havia diferença nos preços de uma sala para a outra. As empresas proprietárias possuíam seus cinemas de destaque, em que exibiam primeiro os lançamentos e posteriormente seguiam para outras salas de exibição. Os cinemas Olímpia, Iracema, Moderno e Independência eram as casas lançadoras, como se dizia na época a respeito das salas que lançavam os filmes.48

Para cada cinema existia um público específico, como no caso do Olímpia, que ficava no centro da cidade. Possuía estrutura mais moderna e tinha preço mais elevado (custava 4$500 nas “soirees”), atendendo a uma camada social com maior poder aquisitivo. Os cinemas Moderno e Independência tinham uma característica peculiar em suas salas, pois se diferenciavam no mesmo espaço, a partir dos assentos, o público (poltrona 4$000 e platéia 1$800). A poltrona possuía cadeiras estofadas, enquanto que a platéia possuía bancos de madeira. Já cinemas como São João e Rex, que ficavam nos subúrbios, custavam em média 1$100 e atendiam a camadas sociais mais baixas.

Outras salas de projeção também promoviam suas sessões visando determinado público, como no caso do cinema Poeira que promovia bailes e sorteios para a classe proletária. No anúncio do jornal Folha do Norte de 05 de setembro de 1940, com o título “As classes proletárias vão ter sábado próximo, no Poeira, uma noite de festa!”,49 destacavam-se as festas promovidas pela empresa proprietária

(Cinematographica Paraense S/A).

Como já é por todos sabido, o “Poeira” associando-se as grandes commemorações que se projectam para encerramento da Semana da Pátria, vae realizar, sabbado próximo, dia 7, uma grande festa dedicada às classes proletárias. E, reunindo o útil ao agradável, levará a effeito, após a sessão da noite, um monumental baile ao ar livre.50

Os anúncios publicados nos periódicos eram escritos pelas empresas proprietárias das salas de projeção de acordo com os seus interesses para chamar a

48 PENHA, Fernanda Jardim da. Cinema diário: cotidiano em Belém – 1945-1950. Monografia de conclusão de

curso. Universidade Federal do Pará, Belém, 2001.

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atenção para as sessões e outras atividades festivas. Durante o período pesquisado era comum em datas comemorativas esse tipo de evento. A influência da cultura norte-americana era muito visível: “o quadrilátero destinado às danças receberá ornamentação festiva e iluminação especial, que o transformarão em um ambiente encantador. Para delícia dos pares, Mario Rocha já tem organizado endiabrada jazz”.51

As festas promovidas pelos cinemas em seus salões geralmente tocavam o “jazz” ou o “fox” que muito se escutava nos filmes de Hollywood. Algumas sessões passavam filmes musicais, que destacavam o ritmo a ser tocado depois nos bailes. Acessíveis aos diversos freqüentadores, os anúncios sobre as salas de projeções procuravam destacar seus ambientes, o público freqüentador e o preço.

Não haverá alteração nos preços habituais das entradas, pois a empresa não visa interesse outro senão o de, por alguma forma, concorrer também para dar alegria e diversão ao povo, pugnando pelo regozijo de todos à passagem da grande data nacional.52

A tentativa das empresas nos anúncios era de mostrar que sua relação com o público tinha características bem amistosas, direcionada para a diversão, alegria e conforto do povo belenense, atendendo as diferenças de renda e servindo como espaço de aglutinação para as comemorações cívicas.

Goudinho (2005), ao trabalhar com a participação feminina no laicato católico em Belém, no período de 1939 a 1947, discorre, no terceiro capítulo, a respeito do discurso da Igreja Católica sobre os locais de diversão existentes no cotidiano citadino e como alguns eram considerados “inadequados” para participação feminina. Dentre esses espaços destacava-se o cinema como local propício à transgressão moral, bem como à exposição de imoralidades contida no conteúdo dos filmes exibidos, muitas vezes impróprio, condenados pela censura da Igreja Católica.53

A preocupação com a moral e bons costumes, apregoados com ardor nesse período, não convinha somente ao discurso religioso, mas ainda a outras manifestações de repreensão aos comportamentos imorais dentro desses espaços,

51 Ibid., p. 05. 52 Ibid., p. 05.

53 GOUDINHO, Liliane do socorro Cavalcante. Mulheres em ação... (católica) – Belém (1939/1947).

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como destacado no artigo publicado no jornal Folha do Norte, de 25 de abril de 1939, por um repórter amador, intitulado Meninas de Cinema:

Entre as meninas que preferem as ‘matineis’ às ‘soiries’ do cinema (e quando digo meninas incluo na jurisdição do epitheto as que vão dos quinze aos vinte anos) há um certo número para quem as fitas do ‘écran’ são apenas pretexto para se reunirem com os namorados na penumbra de tolerância e discrição da sala obscurecida (...).54

No artigo, o repórter amador colocava as salas de cinema e, também, os filmes, como espaços de imoralidade e agressores do bom comportamento. As meninas (que categoricamente classifica sua idade) preferiam ir ao cinema pelas matines, pois pela parte da noite seriam obrigadas a serem acompanhadas pelos pais ou irmãos. O escurinho do cinema servia como espaço para interação e, ao mesmo tempo, transgressão da honra e de valores morais. Os grandes romances proporcionados nas telas pelos atores e atrizes, também fazia parte do imaginário do público feminino que procurava revivê-los como uma cena de cinema.55

Com o advento da guerra no cotidiano da cidade, a partir de 1942, o escurinho das salas de projeção ganhou outro sujeito histórico,56 como informa a

matéria do jornal Folha do Norte de 14 de abril de 1944.

Estava se tornando verdadeiramente escandaloso o que se assistia nos cinemas de Belém. Cenas de repugnante devassidão eram ali praticadas por casais despudorosos, que, inteligentemente, aproveitavam a penumbra do ambiente. Por isso, o capitão Geolás, chefe de polícia, determinou que, diariamente sejam destacados investigadores para zelar pelo decoro público nesses lugares. Ontem, à noite, no cinema “Olímpia”, o investigador Miranda, ali de serviço, conseguiu apanhar em flagrante, duas jovens praticando atos de libidinagem com dois cidadãos americanos (...).57

54 Folha do Norte – Belém, 25 de abril de 1939. p. 01 do 2º caderno.

55 Liliane Goudinho explica que “estar no cinema sem um responsável ou apenas com o namorado era

desaconselhável, uma vez que longe da vigilância da família as moças poderiam se comportar de forma ‘inadequada’. Outra preocupação se dava em relação a como as moças se apresentariam e com qual intenção iriam a tais locais”. GOUDINHO, op. cit.. p. 131-132.

56 Em outubro de 1941 o Brasil assinou um acordo com o governo dos Estados Unidos de cooperação militar,

sendo que Brasil receberia armas e equipamento, em troca, concederia aos norte-americanos o direito de instalar bases militares em Macapá, Belém e Natal. Na cidade de Belém foi instalada a base de Val-de-Cans, aonde hoje é o Aeroporto Internacional de Belém (o bairro que se constituiu ao redor da base levou o mesmo nome), para abrigar os militares vindo dos Estados Unidos e sua a infra-estrutura teria sido construída pelo seu governo. GOMES, Raimundo Ney da Cruz. Guerra e Memória: o cotidiano de Belém durante a Segunda Guerra Mundial – 1939 a 1945. Monografia, Universidade Federal do Pará, 2002, p. 31-34.

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