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Academic year: 2021

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Universidade Federal do Pará

Instituto Amazônico de Agriculturas Familiares

Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Embrapa Amazônia Oriental Programa de Pós-Graduação em Agriculturas Amazônicas

Mestrado em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentável

Lidenilson Sousa da Silva

Estratégia de valorização da Farinha de Bragança, Pará:

controvérsias no processo da certificação da Indicação Geográfica (IG)

Belém

2020

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Lidenilson Sousa da Silva

Estratégia de valorização da Farinha de Bragança, Pará:

controvérsias no processo da certificação da Indicação Geográfica (IG)

Dissertação apresentada para obtenção do grau de Mestre em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentável. Programa de Pós- Graduação em Agriculturas Amazônicas, Instituto Amazônico de Agriculturas Familiares, Universidade Federal do Pará, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Amazônia Oriental. Área de concentração:

Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentável.

Orientador: Prof. Dr. William Santos de Assis

Belém

2020

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) de acordo com ISBD Sistema de Bibliotecas da Universidade Federal do Pará

Gerada automaticamente pelo módulo Ficat, mediante os dados fornecidos pelo(a) autor(a)

S586e Silva, Lidenilson Sousa da

Estratégia de valorização da Farinha de Bragança, Pará: controvérsias no processo da certificação da Indicação Geográfica (IG) / Lidenilson Sousa da Silva. — 2020.

140 f. : il. color.

Orientador(a): Prof. Dr. William Santos de Assis Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação em Agriculturas Amazônicas, Instituto Amazônico de Agriculturas Familiares, Universidade Federal do Pará, Belém, 2020.

1. Farinha de Bragança. 2. Identificação Geográfica. 3. Ator Rede. 4. Mercados Sociais. 5.

Transição Agroecológica. I. Título.

CDD 338.109811

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Lidenilson Sousa da Silva

Estratégia de valorização da Farinha de Bragança, Pará:

controvérsias no processo da certificação da Indicação Geográfica (IG)

Dissertação apresentada para obtenção do grau de Mestre em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentável. Programa de Pós- Graduação em Agriculturas Amazônicas, Instituto Amazônico de Agriculturas Familiares, Universidade Federal do Pará, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Amazônia Oriental. Área de concentração:

Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentável.

Data de aprovação 31/07/2019.

Banca examinadora

___________________________________________

Prof. Dr. William Santos de Assis (Orientador) (INEAF/UFPA)

__________________________________________

Profa. Dra. Romier da Paixão Sousa (Examinador externo) (PPGDRGEA/IFPA)

__________________________________________

Prof. Dr. Prof. Luis Mauro Santos Silva (Examinador interno) (UFPA/INEAF e PDTSA/UNIFESSPA )

__________________________________________

Prof. Dr. Carlos Valério Gomes (Examinador suplente)

(EMBRAPA Amazônia Oriental)

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DEDICATÓRIA

Á Maria Lucia e Manoel Silva (in memória), meus pais que sempre foram esteio em todos momentos da vida.

As minhas filhas Gabriela e Manuela, e meu filho Vinícius Silva, em versos de resistência me inspiram a continuar lutando todos os dias.

A Lorena Carla por dividir momentos tão decisivos

da vida, gratidão por este caminho em construção.

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AGRADECIMENTOS

Este trabalho é resultado da história e da perspectiva coletiva que se materializa em pequenas oportunidades de estudo. Agricultores e filhos de agricultores, que carregam

“cicatrizes” da luta pelo acesso a universidade pública e de qualidade.

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientifico e Tecnológico (CNPq) pela disposição da bolsa.

A Universidade Federal do Pará (UFPA), por se espaço de exercício da democracia, de construção de conhecimento e dos saberes frente aos desafios políticos da educação.

Ao Instituto Amazônico de Agriculturas Familiares (INEAF), que vem demonstrando ao longo de sua existência o compromisso com a luta e resistência do campesinato brasileiro, por uma agricultura agroecológica, soberana e popular.

Ao Programa de Pós-Graduação em Agriculturas Amazônicas (PPGAA), por acolher a diversidade em sua intensa dinâmica metodológica e formação interdisciplinar.

Ao professor orientador William Assis pela cordial paciência na orientação da dissertação, pelas prosas, pela amizade e compreensão na dinâmica agricultor-militante- pai de família-estudante ao limite do esforço físico e intelectual. Minha Gratidão!

Aos professores, mestres e amigos do MAFDS e INEAF pela recepção e estima durante dois anos de convivência. A parceria é uma expressão de confiança e carinho que os indivíduos depositam e extraem uns dos outros. Só é possível a parceria com afetos e solidariedade, e nesta casa estes elementos existem de sobra.

Aos colegas de turma MAFDS 2017. Foram dias partilhados, lágrimas testemunhadas pelos corredores, partilha das dificuldades na fila do RU, mais acima de tudo, o que fica são os momentos fraternos, harmoniosos e místicos que soubemos muitos bem delinear. Nossa decisão de viver a mística militante nos lanches coletivos foi fundamental para ligar a diversidade de pensamento, de posição política e convicção ideológica.

Abro um grande parêntese para agradecer a Antonia Borges “maninha”, por dividir dias difíceis da vida, por ouvi as dores da militância e as dificuldades de estudos no ambiente de moradia. Obrigado pela amizade honesta e companheira!

Aos agricultores familiares que gentilmente concederam as entrevistas,

acompanhado do majestoso café quente, divertidas prosas sobre temas da agricultura e

lembranças alegres. Em meio aos punhados de farinha, visitas as margens dos igarapés,

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sentados nas varandas ou na cozinha as informações foram brotando. Não importando a forma, a gentileza e humildade foram sempre superiores.

Aos representantes das instituições: Emater Esloc. Bragança, Secretaria Municipal de Agricultura de Bragança e de Turismo de Bragança (SETURB), Casa do Empreendedor, ADEPARÁ que cederam gentilmente seu tempo para entrevista.

Ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Bragança (STTRB) pela solicita atenção ao pedido de entrevista, que reuniu todos os diretores e de forma coletiva responderam o questionário.

A Cooperativa Mista dos Agricultores Familiares dos Caetés (COOMAR) pela cordialidade na escuta, disposição para as entrevistas e qualificação dos dados. Vocês são os protagonistas desta história.

Aos militantes do MCP Valéria Carolina, Vilciney Carmo, Rosane Santos e Itamar Martins, e a Raquel Leite pela colaboração nas coletas de dados tão imprescindíveis para a dissertação. Agradeço o companheirismo e disposição num trabalho tão pessoal.

Agradecimentos especiais a minha família por ser o marco dessa jornada tão

controvérsia. Filho de camponeses, o último de 7 irmãos, questionador do discurso do ler,

escrever e fazer conta como suficiente. Alfabetizado aos 11 anos de idade, trabalhador

nas feiras livres e subversor da ideológica da ordem social “Vida Maria”. O resultado que

ora colho, é inspirado na lição dos Traginos: a estrada é curta para quem não tem coragem

de enfrentar os desafios, e longa, para os de coração livre.

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RESUMO

O trabalho focou na análise da estratégia de valorização da Farinha de Bragança, no Nordeste Paraense. O objetivo foi compreender as implicações do processo de criação da Identificação Geográfica para um produto, cuja qualidade, está intrinsicamente relacionada ao modo artesanal do saber-fazer. É visto como mecanismo de salvaguardar a cultura e a tradição, enquanto, outros a potencializam como mercadoria. Os procedimentos metodológicos adotados foram revisão bibliográfica, análise documental, cartografia das controvérsias e história oral, auxiliado pela abordagem da Teoria do Ator- Rede. Analisou-se, que o processo da certificação fez interface com diferentes temas:

mudança do processo de produção da mandioca e fabricação da farinha, construção de mercados sociais, construção da identidade da IG da Farinha de Bragança e os desafios da transição agroecológica. Os temas desenvolvidos na forma de conteúdo, aprofundaram a análise sobre a tecnificação da fabricação da farinha, frente a crescente demanda. Deu um panorama dos mercados acessados pelos agricultores, com ênfase para os mercados sociais de circuitos curtos e os institucionais. Identificou a trajetória da IG como cheias de controvérsias complexas responsáveis por associação, (re)associações e (re)agregações dos atores-redes, e, uma análise direcionada para a dimensão técnico produtiva da transição agroecológica. Concluiu-se, que a fabricação mecanizada polarizou as opiniões dos produtores, entre garantir a produtividade versus manter a qualidade, originalidade e tipicidade da Farinha de Bragança. Mas, a análise dos actantes, não permitiu qualificá-los em fortes ou fracos, sendo as associações dinâmicas, porém não são absolutas.

Palavras-chave: Farinha de Bragança; Identificação Geográfica; Ator Rede; Mercados

Sociais; Transição Agroecológica

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ABSTRACT

This work has focused on the valorization strategy of Bragança flour in Northest of Pará.

The goal was understand implications on the process of creating Geographic Identification for a product, whose quality is intrinsically related to handmade product of, know it and do it. It has seen as a mechanism of safeguarding culture and tradition, while others maximize as a commodities.

Methodologic procedure has been achieved through a bibliographic review, documental analyses, cartographic of dispute resolutions, and oral history supporting by theory of Ator–Rede. Regarded as, the process of certification has done interface with several themes like change in the process of flour manufacturing, building social markets, creation of flour IG Identity of Bragança and the challenges of agreocological transition.

The themes have been developed in the form of content and a deepen analysis about the flour manufacturing technical facing a growing demand. Similarly, such research had an overview of markets accessed by family farmers, with emphasis on social markets of short circuits and institutional. The IG trajectory full of complex controversial responsible for associations, (re) associations, and (re) aggregations of atores-redes have been identified, as well as, a targeted analysis to the productive technical whole of agreocological transition.

In conclusion, the mechanized manufacturing polarized the opinions of producers, between ensure productivity or keep the quality, uniqueness, and typicality of Bragança flour. However, the actantes analysis do not allow to qualify them into strong or week, been dynamic association, but are not absolute.

Keywords: Farinha de Bragança; Identificação Geográfica; Ator Rede; Mercados

Sociais; Transição Agroecológica

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LISTA DE FIGURA

Figura 1. Localização da área de estudo ... 20

Figura 2. Fases e etapas da fabricação da Farinha de Bragança ... 51

Figura 3. Atores atuantes no circuito da comercialização da Farinha de Bragança ... 69

Figura 4. Comerciante atestando a qualidade da farinha durante negociação ... 73

Figura 5. Exposição da farinha e início da negociação ... 73

Figura 6. Tipos de mercados praticados pelos agricultores de Bragança ... 75

Figura 7. Casa de farinha durante o Festival Junino em Bragança ... 78

Figura 8. Agricultor torrando farinha no Festival Junino de Bragança ... 78

Figura 9. Trajetória do processo de IG da Farinha de Bragança ... 92

Figura 10. Selo aprovado para registro da IG da Farinha de Bragança ... 96

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1. Grupo de entrevistados ... 21

Quadro 2. Variedades das manivas cultivadas no Território Bragantino ... 46

Quadro 3. Relatos das transformações na fabricação da Farinha de Bragança ... 62

Quadro 4. Variação do valor da farinha ... 74

Quadro 5. Acordos internacionais sobre identificação geográfica ... 84

Quadro 6. Composição do grupo de trabalho IG da Farinha de Bragança ... 89

Quadro 7. Cartografia das controvérsias dos actantes ... 99

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1. Roças cultivadas solteiras e em sistema de consócio ... 40

Gráfico 2. Cultivos alimentares em sistema de consócio com a mandioca ... 40

Gráfico 3. Casas de Farinhas no Território Bragantino ... 104

Gráfico 4. Áreas no sistema de corte e queima e sistema mecanizada ... 117

Gráfico 5. Valores pagos por serviço de mecanização de terras ... 118

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1. Produção mundial de mandioca ... 38

Tabela 2. Principais estados produtores de mandioca ... 38

Tabela 3. Produção da mandioca nos municíos paraenense ... 42

Tabela 4. Composição do Conselho Regulador... 97

Tabela 5. Agricultores beneficiários da IG ... 106

Tabela 6. Comparativo do custo de limpeza dos roçados... 113

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

a.C antes de Cristo

ADEPARÁ Agência de Defesa Agropecuária do Estado do Pará ANT Actor-Network Theory

AOCs Appellations d’Origine Contrôlée

APROPAMPA. Associação dos Produtores de Carne do Pampa Gaúcho da Campanha Meridional

APROVALE Associação dos Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos CDB Cáritas Diocesana de Bragança

CDLB Câmara de Dirigentes Lojistas de Bragança

CE Ceará

CESUPA Centro Universitário do Pará

CNA Comissão Nacional de Alimentação

CNBB Conferência Nacional dos Bispos do Brasil CNME Campanha Nacional da Merenda Escolar

COOMAC Cooperativa Mista dos Agricultores Familiares dos Caetés COOMAR Cooperativa Mista dos Agricultores entre os Rios Caeté e Gurupi COOPAGRO Cooperativa de Agroindústria da Santa Maria do Acaizal

CUP Convenção da União de Paris

DF Distrito Federal

DO Denominação de Origem

EMATER Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural EPI Equipamentos de Proteção Individual

ES Espírito Santo

FAF Feira da Agricultura Familiar

FETAGRI/PA Federação dos Trabalhadores na Agricultura Pará FNDE Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação FNS Fundo Nacional de Solidariedade

GIZ Deutsche Gesellschaft für Interenationale Zusammennnarbeit

GT Grupo de Trabalho

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IG Identificação Geográfica

IN Instrução Normativa

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INAO Institut National des Appellations d’Origine INEAF Instituto Amazônico de Agriculturas Familiares INPI Instituto Nacional Propriedade Industrial IO Identificação de Origem

IP Indicação de Procedência

IPGCM Indicação Procedência da Carne dos Pampas Gaúcho da Campanha Meridional

IPVV Procedência do Vale dos Vinhedos LPI Lei da Propriedade Industrial

MA Maranhão

MAPA Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento MEC Ministério da Educação

NEDET Núcleo de Estudos de Desenvolvimento Territorial NIEJ Núcleo Integrado de Empreendedores Juniores OMC Organização Mundial do Comércio

OMPI Organização Mundial da Propriedade Intelectual PAE Programa de Alimentação Escolar

PI Piauí

PIB Produto Interno Bruto

PMB Prefeitura Municipal de Bragança

PPGAA Programa de Pós-Graduação em Agriculturas Amazônicas

RJ Rio de Janeiro

SAPS Serviço de Alimentação da Previdência Social

SEBRAE Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas SECTI Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Inovação SEMAGRI Secretária Municipal de Agricultura

SENAR Serviço Nacional de Aprendizagem Rural SETUR Secretaria de Estado de Turismo

SETURB Secretaria Municipal de Turismo de Bragança

STTRB Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Bragança

TAR Teoria do Ator-Rede

TRIPS TRIPS - Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights UFPA Universidade Federal do Pará

WIPO World Intellectual Property Organization

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 17

2 METODOLOGIA ... 19

2.1 Área de estudo ... 19

2.2 Procedimentos metodológicos ... 20

3 PERSPECTIVA TEÓRICO-METODOLÓGICA: MÚLTIPLOS OLHARES E ARTICULAÇÕES ... 23

3.1 Contribuição da Teoria do Ator Rede (TAR) para a análise das controvérsias ... 23

3.2 Identificação Geográfica: valorização dos produtos tradicionais ... 27

3.3 Princípios da Agroecologia: realidades, práticas e desafios ... 31

3.4 Construção social de mercados na perspectiva da agricultura familiar ... 35

4 RESULTADOS E DISCUSSÕES ... 37

4.1 Cultivo de mandioca e a fabricação da Farinha de Bragança ... 37

4.1.1 O processo técnico de cultivo da mandioca na região Bragantina ... 37

4.1.2 A variabilidade genética da mandioca e saberes locais ... 45

4.1.3 O Saber-fazer a farinha de Bragança: memórias, saberes e técnicas tradicionais... 49

4.1.4 Mudanças no processo de fabricação da farinha e a memória do passado ... 58

4.2 A comercialização da farinha tradicional e a diversificação dos mercados ... 67

3.2.1 O mercado da farinha em Bragança ... 67

3.2.2 Mercados para a farinha na cidade de Bragança e nas comunidades ... 75

3.2.3 Os mercados institucionais mecanismo de preços diferenciados ... 79

4.3 A construção da identificação geográfica da Farinha de Bragança ... 81

3.3.1 História da identificação geográfica ... 81

3.3.2 História da IG da Farinha de Bragança ... 89

3.3.3 Análise das controvérsias no processo da IG da Farinha de Bragança ... 97

4.4 Os desafios da transição agroecológica entre os beneficiários da IG ... 110

4.4.1 Insumos utilizados no cultivo da mandioca ... 110

4.4.2 Práticas de cultivo... 114

5 CONCLUSÃO ... 121

REFERÊNCIAS ... 123

ANEXOS ... 134

(17)

1 INTRODUÇÃO

A agricultura desenvolvida no território bragantino é predominantemente familiar. A base dessa agricultura é a produção de alimentos provenientes do cultivo de espécies como a mandioca (Manihot esculenta Crantz.), o milho (Zea Mays L.), o feijão-caupi (Vigna unguiculata (L.) Walp.), o arroz (Oryza sativa L.), uma variedade de hortaliças, frutas e criação de pequenos animais para auto consumo e para comercialização do excedente.

A forma de cultivo do território é constituída de técnicas e traços de origem diversa. Tem haver com formação étnica da Região Nordeste Paraense, indigenas, negros escravizados, colonizadores europeus, por último os imigrantes nordestinos em função da construção da BR Belém Brasília (CORDEIRO, ARBAGE e SCHWARTZ, 2017). Esta dinâmica vem se transformando, exercendo influencia nas práticas agrícolas de outros municípios da região. Um exemplo marcante a farinha de mandioca.

Os agricultores da região nordeste do Pará, em especial os denominados atualmente de agricultores familiares (BUAINAIN e ROMEIRO, 2000; CARNEIRO, 1999), aperfeiçoaram técnicas de cultivos, equipamentos de trabalho e formas de processamento de produtos.

O caso da farinha de mandioca é o mais emblemático do território bragantina. Os agricultores desenvolveram técnicas de manejo da mandioca, selecão de material genético, embalagens próprias e aprimoraram o processo de fabricação da farinha. Esse conjunto de elementos confere ao produto característica única que a tornou conhecida pela sociedade como Farinha de Bragança (.

A Farinha de Bragança faz parte da construção da identidade local. Conserva no nome a origem geográfica, elemento que a credencia em ambientes de mercado diversos. A farinha é conhecida nacionalmente pelas peculiaridades, relativa a sabor, textura, cor e crocância. Estas características estão relacionadas a fatores técnicos e as habilidade do modo de fazer, saber-fazer ou saber tradicional dos agriultores como elo no tempo e no espaço (PIMENTEL, 2013).

Apesar do nome fazer referêcia á origem do produto, a Farinha de Bragança é produzida em um território que abrange cinco municípios: Bragança, Tracuateua, Augusto Corrêa, Viseu e Santa Luzia do Pará. O uso do termo tem haver com história e memória cultural dos produtores, que conservam as técnicas e conhecimentos tradicionais do modo de produzir entre gerações. Os quatro municipios já foram parte do território de Bragança.

A notoriedade da Farinha de Bragança é comprovada pela boa aceitação em mercados

regionais e nacional. O reconhecimento do produto, tem o agravante do uso indevido do nome para

comercializar produtos falsos. A identificação desse problema, resultou na mobilização da

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Cooperativa Mista de Agricultores Familiares dos Caetés (COOMAC) para discussão de mecanismo de proteção da farinha.

A COOMAC se associou a atores locais, dando origem a formação do Grupo de Trabalho (GT) da Identificação Geográfica (IG) da Farinha de Bragança. Esse grupo foi formado por representantes de órgãos públicos municipais e estaduais, entidades representativas dos agricultores, organizações privadas, instituições de ensino e os agricultores familiares com objetivo de organizar o pedido de registro da farinha.

A atuação do GT foi marcada por controvérisias. Questões polêmicas, foram remetidas para o Regulameno de Uso (RU), que o tornou a chave das negociações entres os atores. Questões sem consenso, ficaram subordinadas a aprovação do RU que só aconteceu no final de 2018. O pano de funda estratégia era ganhar tempo ou desidratar polêmicas internamente no GT. O resultado parcial da atuação do GT foi a apresentação do registro da IG junto ao Instituto Nacional de Propriedade Individual (INPI) em fevereiro de 2019.

A IG é um mecanismo pouco desenvolvido no Brasil e menos ainda na região amazônica (VALENTE et al., 2012). Os produtos e serviços certificados com a IG representam a reconhecida notoriedade da sociedade, com procedência e origem, se firmando no mercado como alternativa aos produtos convencionais.

O interesse pelo tema da pesquisa surgiu com o conhecimento das ações do GT sobre da IG da Farinha de Bragança. Reforçado pela necessidade de compreender as transformações, no que concerne, a produção e comercialização da farinha como estratégico para os agricultores. Nesse sentido, pesquisa e pesquisador se encontram numa perspectiva profissional, pessoal e acadêmica.

As inquietações foram motivadoras para formular a pergunta de pesquisa, que segue: Quais as implicações do processo de criação do selo de IG da Farinha de Bragança para os agricultores familiares do território bragantino?.

No intuíto de aprofundar a pesquisa, de forma subsidiaria, elaboramos duas perguntas, quais sejam: i) novas tecnologias aplicadas ao processo produtivo da Farinha de Bragança podem alterar suas características originais? ii) a criação da IG pode favorecer a disseminação de práticas agroecológicas entre os camponeses? Como isso, ampliamos a possibilidade de informações, fontes e entre outros instrumentos metodológicos com vista a qualificação dos dados.

Por tanto, o objetivo geral desse estudo é analisar as implicações do processo de criação da

Identificação Geográfica da Farinha de Bragança considerando os saberes locais, as transformações

tecnológicas, a participação e os interesses dos atores. Com tudo, três objetivos específicos

complementam o geral: a) Descrever o processo de cultivo da mandioca e fabricação da farinha

considerando os aspectos técnicos e culturais; b) Descrever e analisar a articulação para certificação

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da Farinha de Bragança com a IG, considerando as estratégias dos atores e o contexto histórico da certificação; e, c) Identificar em que medida o cultivo da mandioca por pretensos beneficiários da IG adotam práticas agroecológicas e as relações com a dinâmica da criação da IG.

Por fim, este trabalho está organizada em cinco seguimentos principais, com as devidas seções mais esta introdução. O primeiro segmento apresenta as categorias de análise; no segundo, discutimos o cultivo da mandioca e fabricação da farinha; enquanto, no terceiro analisamos a comercialização da farinha tradicional e os mercados; no quanto segmento, voltamos a análise para a IG da Farinha de Bragança; e no quinto e último,discutimos os desafios da transição agroecológica na peréctiva da dimensão técnica produtiva entre os beneficiários, e as considerações finais.

2 METODOLOGIA

Na metodologia estão descritos os métodos, os procedimentos e ferramentas utilizadas na pesquisa. Com efeito, o estudo se apoiou nos métodos qualitativos e quantitativos para analisar os dados. Para tanto, utilizamos um conjunto de ferramentas metodológicas, tais como: Campo Exploratório; Revisão Bibliográfica; Análise Documental; História Oral; Entrevistas Semiestruturadas e; Cartografia das Controvérsias nos diferentes momentos da pesquisa.

2.1 Área de estudo

A área de estudo está situada na mesorregião Nordeste Paraense, num território composto por

cinco municípios: Bragança, Tracuateua, Augusto Corrêa, Santa Luzia do Pará e Viseu conforme a

figura 1 “batizado” de Território Bragantino. Tal território é delimitado por uma linha imaginária,

delineada pelo conhecimento tradicional do saber-fazer a farinha de Bragança.

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Figura 1. Localização da área de estudo

Fonte: IBGE, 2017. Adaptado pelo autor com créditos à estudante de Geoprocessamento da UFPA Campus Ananindeua Carla Braga.

Realizar a pesquisa neste território, é justificável por diferentes razões. Em primeiro plano, significa dá crédito para a construção histórica da importância da Farinha de Bragança na formação cultural e econômica das comunidades locais. Em segundo, que o território é marcado por um saber- fazer a farinha com proporções à garantir as características durante décadas. Por terceiro, a farinha produzido no território é objeto de muitos intereses, e, em quarto e último, é a relevância do tema da IG da Farinha de Bragança como atual e estratégico.

2.2 Procedimentos metodológicos

A coleta de dados foi realizada no campo exploratório (BRUMER et al., 2008) em outubro de 2017 com objetivo de levantar informações e compreender a realidade genérica dos atores. Em dezembro do mesmo ano, foi realizado o segundo campo, que qualificou as informações coletadas inicalmente.

Durante as visitas foram realizados diálogos com informantes chaves. Como primeiro contato, as entrevistas não seguiram um roteiro de perguntas, mais uma conversa com perguntas espontâneas e abertas. Forma entrevistasdos, dois agricultores das comunidades de Camutá; um diretor da COOMAC e um proprietário de depósito. Os encontros, foram gistrados em um caderno de campo e gravados, depois sistematizado e apresentado na forma de fluxograma.

Com base nas informações do campo exploratório, foi organizada a lista de informantes. As

informações coletas possibilitou definir critérios para seleção dos entrevistados em três grupos:

(21)

i) Os agricultores: a) reconhecimento da família como produtora de Farinha de Bragança de modo artesanal pelo GT da IG; b) famílias que produzem com introdução de tecnologias; c) a regionalidade territorial que contemple produtores dos cinco municípios;

e d) famílias com notoriedade na produção de farinha de Bragança;

ii) Os técnicos: atuar como representante da instituição do GT da IG;

iii) Comerciantes: o tempo de trabalho na atividade comercial da farinha e o volume negociado.

O terceiro e quarto campo, foram mais exaustivos. Por ocasião, a coleta de dados aconteceu durante visita as propriedades dos agricultores, se observou as casas de farinhas e as roças das famílias. Da mesma forma, foram aplicados os questionários semiestruturados em entrevistas com comerciantes locais, representantes das instituições membras do GT da IG e outros informantes chaves (quadro 1).

Quadro 1. Grupo de entrevistados

Categoria Quantidade Localização

Agricultores produtores de farinha 17

Camutá, Soares, Uripiuna, Cariambá, Vila Q`uera, Km 18, São Raimundo, Atoleiro, Km 12, Km 8, Rio Grande, Tauarí, Jaranaca,

Represnetantes das instituições no

GT 8 ADEPARÁ, Emater, SETURB,

SEMAGRI, COOMAC, Casa do Empreendedor, STTR

Comerciantes proprietários de

depósitos 5 Cidade de Bragança

Informante chave 1 Ex - Prefeito

Total 31

Fonte: Dados da pesquisa de campo (2018)

Para cada grupo, foi aplicado um questionário semiestruturado espcífico, com perguntas fechadas e abertas de modo a consolidar quali e quantitativamente os dados (MARTINS, 2004;

GOLBENBERG, 1997). Complementar, registramos os flagrantes no processo desembarques e início das negociações da farinha na feira livre de Bragança.

Depois da coleta, os dados foram registradas em planilha Excel 2010, formando um banco de dados. A tabulaçao dos dados, gerou ferramentas de analises, como gráficos, quandros, fluxogramas e tabelas. Para determinadas ferramentas, foi usado o Word.

Apesar de tratar de um território, a imersão revelou a existência de realidades diferentes. Os

contextos se alteram sob influência de vários fatores internos e externos. Por vias de compreender o

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ambiente de estudo (SÁ-SILVA et al., 2009), recoremos a pesquisa documental por definir aspectos especifícos (CELLARD, 2008) necessários na interpretação.

A análise documental permitiu um diálogo entre a teoria e os dados. Os documentos analisados foram agrupados nas seguintes categorias: i) Documentos Oficiais – Leis, Decretos, Normativas e documentos congêneres; ii) Relatórios Técnicos; e iii) Regulamento de Uso. O agrupmento é para efeito didático.

A revisão bibliográfica foi continua a partir de uma literatura geral e especializada sobre o tema em estudo. Da mesma forma, ocorreu com os artigos científicos, dissertações de mestrado, teses de doutorado e estudos de casos em particular. A leitura dos documentos seguiu a metodologia de fichamento de texto.

Utilizamos a história oral como ferramenta metodológica para reavivar o passado através da memória. Foi através dos relatos orais coletados in loco com uso de ferramentas e e técnicas apropriados que recuperamos da memória as narrativas sobre as práticas e as mudanças da fabricação da Farinha de Bragança. Com uso de gravador, resgistramos os relatos até então silênciado na memória, depois foram transcritos em documentos word. A memória, as ações e as narrativas. A oralidade e a escrita, para além da preservação de informação, são instrumento de transmissão de cultura, de valores e costumes entre gerações (BESSA et al., 2010).

Em forma de sistematização da anáilse das controvérsias do GT, aplicamos a metodologia da

Cartografia de Controvérsias baseada na Teoria do Ator-Rede como forma prática de aplicar a teoria

(OLIVEIRA e PORTO, 2016). A cartografia foi organizada em forma de quadro contendo os

discursos, as práticas, elementos de formação das associações, (re)associações e (re)agregações dos

atores-redes no ambiente do GT da IG.

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3 PERSPECTIVA TEÓRICO-METODOLÓGICA: MÚLTIPLOS OLHARES E ARTICULAÇÕES

O estudo de um fenômeno social em pleno movimento e construção desafia qualquer pesquisador no momento de definir um arcabouço teórico-metodológico. É o caso do estudo da certificação da Farinha de Bragança por meio da Indicação Geográfica.

O grande desafio foi articular as contribuições da Teoria do Ator-Rede (TAR), para análise do processo de construção da Indicação Geográfica (IG) da Farinha de Bragança, com elementos aparentemente tão distantes como as bases teóricas da Agroecologia e da Construção Social de Mercados.

Cientes das dificuldades implícitas a esse desafio, o esforço realizado foi na busca para a melhor explicação do fenômeno estudado. Nos próximos segmentos apresentamos elementos que justificam nossas escolhas.

3.1 Contribuição da Teoria do Ator Rede (TAR) para a análise das controvérsias

A Teoria Ator-Rede (TAR) tem uso recente no Brasil. Em países de língua francesa (Acteur Reseau) e inglesa (Actor-Network Theory) já tem um tempo maior de uso, mas pode ser considerada ainda uma perspectiva teórico-metodológica nova em âmbito geral. No Brasil, a maior abordagem tem sido em estudos no campo da administração, estudos sobre políticas públicas, sobre inovações tecnológicas e até em educação rural (VALADÃO et al., 2018).

Os principais expoentes da Teoria do Ator-Rede são Latour (1992) e Law (1992), com contribuições em trabalhos pioneiros (LATOUR; CALLON, 1981; CALLON, 1986) que desenvolveram a teoria numa crítica a sociologia clássica. Diferente das principais correntes sociológicas vigentes a TAR se preocupa com as associações entre coletivos ao invés de uma preocupação geral com a sociedade. O coletivo, no sentido desses autores, não se restringe a pessoas, mas a associações entre atores (materiais e não materiais ou humanos e não humanos) envolvidos em relações sócio técnicas (VALADÃO et al., 2018, p. 97; NOBRE e PEDRO, 2010).

Duas noções são bem marcantes na TAR: i) a irredutibilidade e; ii) a simetria

generalizada. A primeira noção trata de eliminar procedimentos reducionistas na análise dos

processos sociais. Segundo Valadão et al. (2018), essa noção já era utilizada pela filosofia e até

mesmo na física. A segunda noção que trata da simetria é um pressuposto de implicações

epistemológicas, seja pelo questionamento de análises fundadas nas divisões objetivo/subjetivo,

natureza/sociedade, seja pela recusa a uma atribuição explicativa única com base no social. A

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preocupação central aqui é mostrar que há necessidade de ampliar a visão sobre as relações entre natureza e sociedade.

Dito de outra forma, o que se quer é evitar a purificação da prática científica, principalmente da ciência moderna, que tende a colocar a natureza de um lado (em um polo), separada dos humanos, que por sua vez devem ficar isolados (em outro polo). Para a TAR esses polos não existem.

Na TAR há entre esses dois polos uma multiplicidade de seres que não podem ser considerados nem humanos, nem naturais, mas ao mesmo tempo se aproximam, ora de um, ora de outro desses polos. Estes seres intermediários são considerados na TAR como quase-objetos (SERRES, 1990) ou quase-sujeitos (LATOUR, 1994). A noção de simetria nos chamou a atenção para evitar deslocamentos para um polo ou para outro.

O pesquisador no exercício do ofício da investigação, deve prevalecer em um ponto médio onde lhe permita observar e acompanhar as transformações e o desempenho dos atores.

De modo, a melhor considerar fatores humanos e não humanos sem preocupação de definir o peso de cada um deles. A perspectiva da observação congregou elementos para uma análise sem tendências.

Prestava-se também a discutir questões relacionadas ao exercício do poder na perspectiva de Foucault (FOUCAULT, 1979). No entanto, o que interessa fixar na análise é que os teóricos da TAR consideram que nenhuma das noções referida é redutível ou irredutível a outra, isso significa que em situação de realidade todos os atores concretos (humanos e não humanos) estão em pé de igualdade, E, o que confere poder a uns e a outros são as relações intrínsecas as associações formadas.

As associações são formas de atuação dos atores em rede. Estas podem alterar-se de acordo com as conexões e desconexões em relação aos interesses envolvidos em dada conjectura ou mesmo correspondentes a alterações do “dinamismo processual e sempre constante de associações” (NOBRE e PEDRO, 2010, p. 48) influenciados por fenômenos como naturais ou induzidos que nos permitem analisar para das unidades sólidas.

Portanto, entender o social na perspectiva da TAR passa pela compreensão do

funcionamento das redes de “actantes” que nada mais é do que a associação de elementos

humanos a não humano, sendo a rede o centro da interação, relacionamento e articulação

(LATOUR, 2012). O social tende a se diferenciar da sociologia tradicional (LATOUR, 2008)

à medida que o não humano (os objetos) é considerado resultado da ação humana, ganhando

vida na dinâmica social pela “formação indispensável da heterogeneidade das redes” no jogo

dos atores (OLIVEIRA e PORTO, 2016, p. 58).

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Dessa forma, a sociedade passa a ser encarada não apenas como “um conjunto de pessoas em um sistema de organização coletiva”, mas como parte da rede constituída por elementos humanos e não humanos. Esse raciocínio sustenta que existem materialidades diversas entre os humanos em ação (social), ou seja, as associações no âmbito de uma rede são possíveis porque nelas estão presentes também elementos não humanos (materiais, textos, dados, tecnologias) (VALADÃO et al., 2018, p. 97).

Na TAR, o social e a realidade são formados a partir de várias materialidades heterogêneas construídas na pulsação da dinâmica dos acontecimentos. São resultante de transformações subsequentes da relação de interação global moderno (que põe em cheque a interpretação da realidade) como estado natural em si. Que busca descrever o sentido do “nó górdio” numa sociedade dominada pela tecnologia, pela ciência em função da sociedade marcada pela modernização industrial (LATOUR, 1994, p. 9).

Nesta perspectiva, o sentido de processo toma importância analítica à medida que ajuda na explicação da realidade para além dos fatos, com olhar sobre a complexidade da simetria entre o social e tecnocientífico (NOBRE e PEDRO, 2010). No jogo dos atores, a realidade não é linear quando tratamos do futuro, não cabendo previsibilidade sob os resultados gerados em decorrência aos vários e diferentes interesses circunscritos pelos sujeitos sociais envolvidos.

Segundo a teoria social matusiana (MATUS, 2005), a realidade é marcada por conflitos, na qual os atores podem até escolher o seu plano, mas não podem escolher as circunstâncias em que tem que realizá-lo. Seguindo esse raciocínio, compreende-se que a realidade não é resultado da vontade de um sujeito, de um coletivo, nem de um segmento, todavia uma construção social complexa derivada de inúmeros elementos humanos e não humanos.

Com base em Latour (1988), Harman (2009) e Valadão et al. (2018, p. 104) existem quatro princípios que dão sustentação a realidade:

i) a permanente presença de atores na definição e evidenciação da realidade; ii) a própria ideia de irredutibilidade de que nada é, por si só, redutível a qualquer outra coisa; iii) a existência de translação sempre que houver vínculo entre os atores e; iv) a ideia de que não há atividade e inatividades a priori, mas contínuas provas de força (VALADÃO et al., 2018, p. 104).

Com o primeiro princípio pressupõe-se a elaboração e desempenho dos atores de forma permanente humanos e não humanos, ou seja, a realidade é parte de um movimento dinâmico dos elementos de um dado contexto e está sempre em transformação. Portanto, a realidade são formas de realização e atuação dos actantes em movimento.

O segundo prega a não redução dos objetos (não humanos) mediante aos elementos

humanos o que leva a raciocinar de forma a questionar a máxima que explica um fato pelo

outro. Pressupõe-se dessa forma que os acontecimentos e seus resultados devem ser analisados

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como concretude evitando entendê-lo simplesmente como efeito de outro (VALADÃO et al., 2018).

O terceiro princípio trata dos deslocamentos negociados que permite estabelecer novas associações, novas conexões e novas redes denominadas de translação ou transformações de interesses (PINTO e DE DEMENICO, 2014). Translação é um termo usado para reforçar o entendimento de que os deslocamentos produzem transformações, que existem movimentos, que existem mediadores em diferentes situações, dependendo dos objetivos e das estratégias dos atores.

O quarto princípio trata da força entre os atores. A principal contribuição está na compreensão de que os atores não são mais fortes e/ou mais fracos a priori. São as alianças construídas entre si que determinam a força. Portanto, a força não é absoluta, constante, imutável, mas sempre provisória e momentânea (VALADÃO et al., 2018), podendo ser alterada de acordo com as negociações estabelecidas.

Para identificar a força dos atores, é fundamental analisar as controvérsias existentes. O olhar treinado para identificação das controvérsias permitiu uma análise sem julgo de valores, o que possibilitou uma leitura dos acontecimentos de forma crítica sem demonstrar posição diante das negociações ou formações de associações em determinadas estratégias. Mas para isso foi fundamental compreender o conceito de controvérsias na TAR.

Para Nobre e Pedro (2010), controvérsias “referem-se a uma disputa em que se alegam razões pró ou contra, as quais se podem evidenciar movimentos, cujo desdobramentos será a consecução de um objetivo comum” e é central na teoria de Ator-Rede (NOBRE e PEDRO, 2010, p. 53). A noção de controvérsia é associada ao observatório do movimento das forças, que formam as associações e são visibilizadas mesmo que momentaneamente.

Já segundo Pinto e De Domenico (2014), o conceito de controvérsias se refere à dinâmica dos actantes associados em rede, com as seguintes características: “(a) são debatidas;

(b) envolvem todo tipo de ator; (c) mostram o social em sua forma mais dinâmica; (d) são resistentes à redução da complexidade; (e) envolvem distribuições de poder” (PINTO e DE DOMENICO, 2014, p. 3).

A partir das definições, consideramos controvérsias divergências que dá origem a

grupos com posições contrárias, formando os antigrupos. O conceito de controvérsia ganha

acento no núcleo central da análise do jogo dos atores, aparecendo sempre que necessário à

solidez de uma posição, de um argumento ficando claro os aliados e adversários. É um recurso

para entender as movimentações e as dinâmicas dos atores durante os processos.

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As controvérsias são basilares para a análise do jogo dos atores. A elaboração da estratégia é o mecanismo do planejamento estabelecido para realização ou alcance de determinados objetivos, sendo que a aplicação, assim como os resultados dependem do cenário e da correlação de força dos sujeitos envolvidos numa controvérsia.

A estratégia também é considerada como a maneira de lidar com outros jogadores na mesma trama, onde a confluência em um campo de atuação produz divergência ou alinhamento de interesses. Tratando de estratégia política no jogo dos atores, as relações políticas seriam responsáveis pela produção, ao mesmo tempo que um produto social (MATUS, 2005) das configurações em rede.

A Teoria do Ator Rede, possibilitou analisar as várias estratégias decorrentes das controvérsias originadas das associações formadas em torno do processo da Identificação Geográfica da Farinha de Bragança. Porém, as associações sempre dinâmicas se (re) associaram em rede à medida que os objetivos mudavam, o que configurou um movimento constante representado nos discursos e posicionamento dos atores. Mas, de modo direcionado a análise das controvérsias foi potencializada no estudo da IG da farinha.

3.2 Identificação Geográfica: valorização dos produtos tradicionais

A identificação geográfica segundo Gollo e Castro (2008), é política de conteúdo local.

De maneira similar a essa definição, os autores Fernandes e Pedreira (2013) e Nierdele, et al.

(2009) a definem como política de valorização dos produtos tradicionais locais, como produtos diferenciados vinculados a mercados dinâmicos.

Segundo Vales (2014), os produtos tradicionais são considerados como únicos, refletem a cultura, a identidade e a memória de uma sociedade local. Possível devida à origem geográfica, o conhecimento do saber produzir e a matéria prima utilizada. Mas, esta conclusão tem haver com a história. O rigem está na identificação que produtos de regiões específicas conservavam características e qualidades particulares que os diferenciavam de outras regiões, sendo atribuídas tais especificidades a nomes geográficos que indicavam a procedência da produção (GOLLO e CASTRO, 2008).

O reconhecimento e valorização dos produtos tradicionais são tendências da sociedade

contemporânea, uma vez que, a mundialização da economia tende a concentrar o mercado e

padronizar a produção, distribuição e o consumo. No cenário conturbado do mercado

capitalista, surgem anseios por adquirir produtos diferenciados que possibilitem aos

consumidores rastrearem sua origem e procedência como meio de segurança e valorização

(VALENTE et al., 2012).

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Um produto ou serviço certificado ganha referência nos diversos mercados diferenciados, quando garante aos consumidores as características originais e as vantagens aos produtores beneficiados, permitindo a capacidade de reprodutibilidade dos processos produtivos e culturais do saber fazer (NIERDELE, 2009; FERNANDES e PEDREIRA, 2013).

Associado a isto, está a notoriedade do produto e as características peculiares que as vinculam a um território.

Ao longo dos anos os produtos, os serviços e as técnicas de produzi-los foram aperfeiçoadas. Essa transformação representa a união do saber-fazer de um grupo específico ou indivíduo territorializado em um ambiente com a experiências das famílias que se especializaram em determinadas atividades. O aperfeiçoamento das técnicas é proveniente do desenvolvimento de tecnologias simples e eficazes, originais locais.

Ao longo do tempo, as transformações das técnicas tradicioais, associadas a fatores naturais de clima e solo impulsionaram a exigência de adequação das legislações sobre produção, consumo, circulação e comercialização de mercadorias. As mudanças também influenciaram a política de patente no âmbito nacional. Este movimento obrigou o Brasil a cumprir exigências que refletiram na política de criação da Indicação Geográfica (IG).

A necessidade de proteção dos produtos tradicionais é antiga, como também é antiga a utilização indevida do nome. É neste contexto que a IG constitui-se como forma de proteção e valorização de produtos e serviços nos diferentes territórios brasileiro. À medida que o consumo por produtos ou serviços seguros tornando-se uma realidade no Brasil e no exterior, a IG ganha relevância na forma de proteção jurídica, por se diferenciar em relação aos produtos convencionais.

A transformação da lógica de consumo está na segurança do produtos. Também motiva o surgimento de novos mercados e aumento da produtividade. Esta dinâmica segue tendência dos padrões de qualidade regulamentados pela procedência e denominação de origem nos itens tradição e da tipicidade, além do controle de técnicas e insumos agrícolas como no caso do vinho (AGUIAR, 2013. p.104).

A IG de produtos tradicionais da agricultura, se insere na estratégia de desenvolvimento territorial. Levando em consideração a abordagem de Schneider (2004), o território na perspectiva do desenvolvimento rural e sua capilaridade externa, é, o ambiente de articulação e campo de relações políticas entre os diferentes atores .

Os pressupostos da IG para além da geografia do espaço e do lugar têm a haver com o

desenvolvimento da concepção de território socialmente construído, articulado aos interesses e

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interações entre atores. Neste sentido, a compreensão de território intrinsicamente incorpora valores culturais locais representados pelos conhecimentos comunitários das sociedades históricos.

Olhar o território por esta perspectiva de análise, possibilitou inserir o debate da IG de produtos tradicionais numa abordagem que extrapola a visão regional. Portanto, retomar a reflexão teórica sobre o lugar e papel dos atores sociais no contexto globalizado atualiza a leitura de desenvolvimento territorial como estratégia indispensável dos atores.

A IG como identidade territorial tem uma história. Segundo Valente et al. (2012), a reivindicação da identidade de um produto a partir de um território específico é antigo, para isso o autor recorreu as investigações na literatura bíblica para exemplificar que o reconhecimento de produtos a partir do território ou região específica remontam ao século IV a. C. Logo, a IG tem relação com o reconhecimento da originalidade e notoriedade de um produto ultrapassando as normativas legais que as regula.

De acordo com o mesmo autor, a Europa foi a pioneira no registro de um produto.

A necessidade de proteção a produtos locais com características peculiares tanto na qualidade resguardada pela cultura do saber-fazer como por fatores naturais tais como

“geográficos (solo, vegetação), meteorológicas (mesoclima) e humanas (cultivo, experiência)” em territoriais específicos levou a criação da Identificação Geográfica na Europa. Entre os direitos à Propriedade Intelectual na Europa a IG é uma ferramenta de potencializar o desenvolvimento de regiões através da proteção jurídica de marcas na perspectiva de torná-la mais competitiva (VALENTE et al., 2012;

GOLLO, 2006. p. 13).

A França foi o país da Europa que fez as primeiras tentativas de elaboração de medidas jurídicas para proteção de produtos através do Parlamento de Toulouse com o queijo Roquefort.

É considerado o país com lastro na regulamentação técnica das Identificações Geográficas em especial os Vinhos. No entanto, foi Portugal quem efetivou o primeiro registro em 1756 com o Vinho do Porto ( GOLLO, 2006) .

Em 1935, o decreto do governo francês criou o Institut National des Appellations d’Origine (INAO) e o Comitê Nacional para Vinhos e Aguardentes. Depois foi instituído as Appellations d’Origine Contrôlée (AOCs) ou denominações de origem controlada, com as funções administrativas, profissionais e jurídicas (GLASS e CASTRO, 2009) tutelado pelos Ministérios da Agricultura e Economia daquele país.

Em escala global, nos séculos XIX e XX ocorreram várias convenções – chamadas de

tratados – cujos objetivos foram definir normativas internacionais comuns de proteção aos

produtos. Dois exemplares de conversões são: o Acordo de Madri realizado em 1891 e a

Convenção da União de Paris - CUP realizada em 1883 que trataram em suas deliberações da

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Proteção de Propriedade Industrial dos quais o Brasil é signatário (FERNANDES e PEDREIRA, 2013; BRUCH, 2008).

Os tratados internacionais foram fundamentais para definições de políticas nacionais de valorização e proteção de produtos nativos.

No Brasil, o termo indicação geográfica foi introduzido por ocasião da promulgação da Lei da Propriedade Industrial de nº 9.279 de 14 de maio de 1996 – LPI/96. A lei determinou duas modalidades de IG para produtos e serviços: i) a Denominação de Origem (DO); e, ii) Indicação de Procedência (IP). A lei estabeleceu no parágrafo único do art. 182 ao Instituto Nacional Propriedade Industrial (INPI), no Ato Normativo (AN) 075/2000 (FERNANDES e PEDREIRA, 2013) a competência para estabelecer as condições de registro dos produtos brasileiros.

Existem outras legislações relacionadas à IG no Brasil, a saber: as Instruções Normativas (IN) nº 25/INPI/2013 e nº 30/MAPA/Queijos úteis, que estabelece parâmetros e definir os procedimentos para obtenção do registro que regulam os direitos e obrigações sobre Processo de IG no Brasil. Decreto de nº 5351/2005 e atualizado através do Decreto nº 7.127, de 04 de março de 2010 no tema da IG (VALENTE et al., 2013; BRASIL, 1996) que defini a atuação do MAPA.

A discussão da IG para produtos e serviços no Brasil vem de um legado cronológico determinado por políticas governamentais que seguem mudando. Este processo segue duas tendências antagônicas no mercado global. A primeira tende ao aperfeiçoamento dos mecanismos de transformação bens coletivos em nicho de mercado. A segunda muito voltada para a proteção dos conhecimentos e das tradições das comunidades, por meio valorização dos produtos locais.

Tratando-se da realidade amazônica, a região concentra produtos específicos com notório potencial de registro geográfico nas modalidades de IP ou DO, os quais são tipicamente reconhecidos como: Castanha do Brasil, Cachaça de Abaeté, Farinha de Bragança, Açaí do Pará ou Marajó, Gurijuba de Vigia, Queijo Marajoara e Caranguejo de São Caetano de Odivelas (GOLLO e CASTRO, 2008). Não se percebe diante do potencial amazônico políticas públicas específicas.

As experiências de aprovação de registros de produtos com identificação geográfica bem sucedida no Brasil, são motivadoras para formulação de estratégias regionais de indicação de novos registros como meio de desenvolvimento da Amazônia.

Partindo deste pressuposto, identificamos o registro da Farinha de Mandioca em Uarini

no Amazonas (ROCHA & WITKOSKI, 2010), em Cruzeiro do SUL no Acre (EMPERAIRE et

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al., 2012) e o Cacau (Theobroma cacao) de Tomé Açu no Pará (INPI, 2019) ambos com registros aprovados. Soma-se a estes exemplos, a tramitação do pedido de registro da Farinha de Bragança citado nos trabalhos (OLIVEIRA, 2015; SANTOS, 2016), protocolado no INPI, em janeiro de 2019.

A fabricação da farinha de Bragança é um exemplo de aperfeiçoamento das técnicas, que rendeu destaque no estado do Pará e no Brasil. Esta referência proporcionou a articulação do grupo para discutir a IG do produto. O movimento pela certificação mobilizou vários atores, numa trajetória marcada pela formação constante de associações (PINTO e DE DEMENICO, 2014; NOBRE e PEDRO, 2010). Estratégias e contra estratégia, deram origem as controvérsias (Idem).

O registro de produtos como IP ou DO representa elementos materiais e culturais (imateriais) de uma região. No caso da IG da Farinha de Bragança, a representação entre material e econômico versus cultural e simbólico é propulsor de controvérsias entre os actantes.

A diferença é demarcadas pelas posições representadas por instituições e individuos.

Analisar o processo da Identificação Geográfica da Farinha de Bragança a partir da literatura e de teóricos se faz oportuno para situar a discussão no contexto global de mercados diferenciados e de valorização de produtos tradicionais.

3.3 Princípios da Agroecologia: realidades, práticas e desafios

A agroecologia é um tema complexo e pouco aprofundado na academia brasileira, mas que vem ganhando destaque na pesquisa. Salientamos na introdução do tema da subseção a importância da abordagem das dimensões, multidimensões e/os princípios da groeocologia enquanto conceito e conteúdo. Segundo os autores Caporal e Costabeber (2004) são seis as dimensões da agroecologia, a saber: ecológica, social, econômica, cultural, ética e política.

A dimensão ecológica é bastante evidenciada com foco na ecologização das práticas agrícolas através das atividades de plantio, manejo e colheita, mas principalmente na saúde do solo, que, tem em Altieri (2010) uma abordagem que caracteriza bem:

A ciência da agroecologia, a qual se define como a aplicação de conceitos e princípios ecológicos ao desenho e manejo de agroecossistemas sustentáveis, proporciona um marco para valorizar a complexidade dos agroecossistemas. Este método baseia-se em melhorar a qualidade do solo para produzir plantas fortes e sadias, debilitando ao mesmo tempo as pragas (plantas invasoras, insetos doenças e nematóides) ao promover organismos benéficos (ALTIERI, 2010, p.23).

Provavelmente, a evidência desta dimensão tenha relação com o apelo global sobre as

questões climáticas, mas inevitavelmente na causa dos problemas da produção agrícola, a

qualidade do solo.

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As dimensões social, cultural e econômica – considerada como técnico-produtivo – vem sendo trabalhada através da criação de mecanismos de valorização dos saberes culturais locais, produção, consumo, acesso e comercialização de produtos saudáveis em diferentes sistemas e redes. Com particular da dimensão técnica-produtiva sobre o paradigma da modernização, que permitiu a intensificação produtiva, alterando os agroecossistemas em comparação a ecossistemas naturais.

As experiências dos novos sistemas de produção com base nos preceitos da agroecologia (ALTIERI, 2004; GLIESSMANN, 2000; COPORAL e COSTABEBER, 2000) resultaram na inter-relação das dimensões da economia, da política, do social e do ecológico na perspectiva de transformação do modelo de desenvolvimento rural e da agricultura vigente, desestabilizados por “crises alimentares que abalaram a confiança nos sistemas alimentares industriais” (NIEDERLE, 2014, p. 175 ).

A ideia de progresso técnico hegemônico na agricultura, baseado na utilização intensiva de insumos químicos, genéticos e mecânicos (CAPORAL e COSTABEBER, 2004a) tornou determinante na sociedade capitalista. Essas transformações aliadas à ofensiva ideológica associaram a “teoria ortodoxa econômica, com um paradigma cientifico-tecnológica”

(PETERSEN, 2013, p. 72) cujo fim é responder as necessidades dos mercados em escala global.

A Agroecologia enquanto ciência, articula diversas áreas do conhecimento produzindo transdisciplinaridade em sintonio com os saberes populares. Essa relação explicitamente favorece a interação entre saberes, conhecimentos e as ações de transformação dos agroecossistemas a partir de uma base ecológica, cultural (SERVILLA GÚZMAN, 2013) e militante.

A agroecologia como sistema integrado e complexo, à medida que é entendida como conceito-tema, conteúdo e ação crítica tornam-se indissociável a discussão da soberania. E não apenas como prática de substituição de insumos ou mesmo como conhecimento epistemológico, mas como promotora do protagonismo dos movimentos sociais .

A agroecologia enquanto abordagem territorial recupera no sentido dinâmico a noção de dimensões de territorialidade como ambiente de produção, vivência e partilha de culturas vinculadas ao modo de vida dos sujeitos camponeses. É a ponte entre os acontecimentos do presente e a memória do passado, marcado pelas transformações temporais, que constitui práticas transmitidas entre as gerações.

Segundo Toledo (2015), os saberes locais permitem aproximar o conjunto complexo de

interpretações em contextos de múltiplos sentidos dos elementos da natureza, portanto, a

compreensão do saber local passa por uma dualidade combinada de representações das

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experiências e cultura. Uma teia entre crenças, conhecimento e práticas. Neste sentido, a agroecologia é parte da história das comunidades locais, sinônimo de resistência a imposição de modo hegemônico de vida.

As dimensões ética e política designa refletir e intervir de forma organizada para garantia de democracias e dos direitos, principalmente mediante a crise de valores da sociedade capitalista. Para isso, a agroecologia torna-se um movimento militante que nega a exploração dos recursos para o acúmulo. Os movimentos sociais têm sido fundamentais para dimensão política, traduzida na luta por democracia, por reforma agrária, soberania alimentar, políticas públicas, e de outros direitos como das mulheres.

O fortalecimento das organizações e dos movimentos sociais vem possibilitando desenvolver ações e experiências coletivas que põem em cheque paradigmas que reduzem a agroecologia ao campo da utopia, de um modelo saudosista de produção primitiva (COSTABEBER, 1998 ). Ou mesmo de um sistema sem insumos externos, com evidências que os sistemas agroecológicos são produtivos, resilientes e sustentáveis (AGRICULTURA, 2012).

A produção orgânica no Brasil é realizada em escala, controlada por empresas que se especializaram em atender um mercado restrito de pessoas com alta capacidade financeira de consumo (NIEDERLE et al., 2013). A visão reducionista de produção de alimentos sem insumos químicos para responder a um nicho de mercado, não corresponde a complexidade dos sistemas agroecológicos.

O aumento do consumo de orgânico foi impulsionado no fim do século XX sob o argumento da qualidade de vida, porém, vem se transformando na maneira de realização de novos negócios, reduzindo os orgânicos a status de mercadoria, após ser incorporados por setores empresariais agroalimentares (NIEDERLE, 2014). Salientamos que isso vem ocorrendo com os produtos orgânicos absorvidos pelos sistemas agroalimentares e redes de supermercados.

Entende-se a agroecologia como um processo de interação dinâmica entre os diversos agentes do meio, os objetivos e finalidades, técnicas e conhecimentos, saberes e práticas coletivas em um território. Neste contexto, os camponeses e povos tradicionais são referências inspirados e inspirando teorias e práticas, valores e conhecimentos históricos fundamentada numa visão crítica (CAPORAL e COSTABEBER, 2002a) e totalitária da vida e do ambiente.

A abordagem da agroecologia estabelece interesse em compreender como os

aprendizados são incorporados à dinâmica cotidiana. Efetivamente as práticas agroecológicas

em sistemas de produção, são resultados das experiências que extrapolam os limites da

propriedade física (ALTIERI, 2002) das famílias.

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Para tanto, é perceptível que para consolidação de práticas ecológicas os camponeses levam em consideração a redução do custos através da substituição de insumos convencionais por método alternativos no próprio ambiente (GLIESSMANN et al., 2007). Tem viabilidade devido a oferta de metéria orgânica (biomassa), do conhecimento de técnicas de manejo e uso do solo.

O uso da biomassa disponível nas unidades em substituição a insumos sintéticos adquiridos no mercado são iniciativas correspondente a transição agroecológica. Mas de acordo com Marin (2009), a transição agroecológica é a integração entre as dimensões sociais, econômicas e ambientais da agroecologia ou a construção de valores de consciência.

Para Costabeber (1998, p. 39) a transição agorecológica é a ecologização da agricultura como processo dinâmico, contínuo, multilinear em constante adaptação, em que a “intervenção humana no processo de produção agrícola deve respeitar as especificidades, potencialidades e limitações” (COSTABEBER, 1998, p.39) de cada ecossistema.

Consideramos as práticas agroecológicas dos camponeses subsidiada pelo conhecimento científico, um redesenho de agroecossistemas sustentáveis nas unidades produtivas. Essa interação permiti a criação de novos processos com uso dos princípios e conceitos da ecologia (GLIESSMANN, 2000) fundamental na transição agroecológica.

Essas dinâmicas dialeticamente geram conexões entre os atores envolvidos. A ciência e os pesquisadores, da mesma forma entre os produtores e os consumidores são favorecidos através das redes ou por meios de mecanismos diretos de relações de trocas.

As percepções sobre as práticas de manejo das famílias produtoras de farinha, identificadas no estudo, ganham centralidade no tema da transição agroecológica. O “processo gradual e multilinear de mudança” social, implica na “racionalização econômica-produtiva”, mas também nas mudanças de valores dos atores (CAPORAL e COSTABEBER, 2004b).

A discussão da transição agroecológica na interface com o processo da identificação geográfica no caso da farinha de Bragança, tomou relevância particular ao envolver atores diversos – pessoas e institucionais – num jogo que gerou muitas associações e (re) associações em torno de questões controvérsias. A relação entre os temas na pesquisa se dá devido as contradições que ora convergem e divergem a posição dos atores envolvidos.

De forma particular lançar um olhar sobre a dinâmica atual na perspectiva da agroecologia é um imperativo. Mobilizar o foco para as diferentes práticas agroecológicas, associado à cultura ancestral da produção de alimentos nos remete a entender como funciona,

“entender como está” as tendências e os processos em curso (GOMES e ASSIS, 2013, p.154).

Referências

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