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Cidadania, participação social, democracia e qualidade na educação : uma análise dos pareceres do Conselho de Educação do Distrito Federal

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Academic year: 2017

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Programa de Pós-Graduação

Stricto Sensu

em Educação

CIDADANIA, PARTICIPAÇÃO SOCIAL, DEMOCRACIA E

QUALIDADE NA EDUCAÇÃO: UMA ANÁLISE DOS

PARECERES DO CONSELHO DE EDUCAÇÃO DO DISTRITO

FEDERAL

Brasília - DF

2013

(2)

Regina Tomás Blum de Oliveira

Cidadania, participação social, democracia e qualidade na educação: uma

análise dos pareceres do Conselho de Educação do Distrito Federal

Dissertação apresentada à Comissão Examinadora da Universidade Católica de Brasília como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Educação na área de Política e Administração Educacional.

Orientador: Prof. Dr. Wellington Ferreira de Jesus

(3)

Ficha elaborada pela Biblioteca Pós-Graduação da UCB

O48c Oliveira, Regina Tomás Blum de.

Cidadania, participação social, democracia e qualidade na educação: uma análise dos pareceres do Conselho de Educação do Distrito Federal. / Regina Tomás Blum de Oliveira – 2013.

110f.; il : 30 cm

Dissertação (mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2013.

Orientação: Prof. Dr. Wellington Ferreira de Jesus

1. Educação. 2. Participação do cidadão. 3. Conselho de Educação do Distrito Federal. 4. Qualidade (Educação). I. Jesus, Wellington Ferreira de. orient,. II. Título.

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FOLHA DE APROVAÇÃO

Dissertação de autoria de REGINA TOMÁS BLUM DE OLIVEIRA intitulada

Cidadania, participação social, democracia e qualidade na educação: uma análise dos pareceres do Conselho de Educação do Distrito Federal, apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Educação da Universidade Católica de Brasília, em 21 de junho de 2013, defendida e aprovada pela banca examinadora abaixo-assinada:

____________________________________________ Prof. Dr. Wellington Ferreira de Jesus

UCB – Orientador

____________________________________________ Prof. Dr. Erisevelton Silva Lima

SEDF – Membro externo

____________________________________________ Profª Drª Clélia de Freitas Capanema

UCB – Membro interno

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Aos profissionais da educação que, na busca por uma educação de qualidade e, eficazmente transformadora, motivam-se pelas questões mais emergentes da educação brasileira e fazem de seu campo de atuação um locus

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AGRADECIMENTOS

A Deus pelas oportunidades, pelas conquistas e pelos anjos que colocou em meu caminho.

Ao Prof. Dr. Wellington Ferreira de Jesus, meu orientador, pela seriedade, pelo apoio, pelas cobranças nos momentos precisos, pelo rigor em suas orientações e, sobretudo, por ser paciente com minhas limitações.

Ao Prof. Dr. Erisevelton Silva Lima e à Profª Drª Clélia de Freitas Capanema, membros da banca de qualificação, pelas considerações, ponderações e sugestões que tanto contribuíram para a realização deste trabalho.

À Profª Drª Beatrice Laura Carnielli (in memorian) por ter iniciado minha orientação.

As lembranças de seu otimismo e energia me foram essenciais.

Às funcionárias da UCB, Célia, Sheila, Erivana e Joana, que sempre me atenderam com educação e eficiência, tornando meu percurso mais ameno.

À Alessandra, minha supervisora, por ter sempre buscado uma maneira de viabilizar minhas necessidades acadêmicas. Obrigada por seus ajustes no horário, por suas negociações. Seu apoio e compreensão foram fundamentais! Aos meus chefes Cel. Bandeira e Cel. Roberto que prontamente atenderam às minhas solicitações, garantindo a tranquilidade necessária para a realização desse trabalho.

Aos meus pais, por terem sido exemplos de correção e dedicação e sempre encontrarem uma forma de me incentivar. Mãe, obrigada por suas orações!

Ao meu irmão, William, por suas leituras e por suas pertinentes observações.

Ao meu esposo, Tabajara, por ter me apoiado e incentivado em todos os momentos, sem sua dedicação eu não teria chegado até aqui! Obrigada por esperar pacientemente o fim do mestrado e, com isso, minha volta ao ‘normal’!

Aos meus queridos filhos, Raul e Bethânia, vocês foram o incentivo para esta iniciação tardia à vida acadêmica! À minha nora e ao meu genro por entenderem minhas ausências. André, muito obrigada pelas palavras de apoio e pelas leituras!

Aos meus netinhos, Henrique, Inácio e Guilherme, que chegaram durante o mestrado, trazendo um novo ânimo a essa jornada. Obrigada por estarem aguardando pacientemente por nossas brincadeiras e passeios!

À Marcília e à Neuda, minhas amigas da UCB. Obrigada pelo incentivo constante e otimista, pelas conversas e desabafos.

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A raiz mais profunda da politicidade da educação se acha na educabilidade mesmo do ser humano, que se funda na sua natureza inacabada e da qual se tornou consciente. Inacabado e consciente de seu inacabamento, histórico, necessariamente o ser humano se faria um ser ético, um ser de opção, de decisão.

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RESUMO

OLIVEIRA, Regina Tomás Blum de. Cidadania, participação social, democracia e qualidade na educação: uma análise dos pareceres do Conselho de Educação do Distrito Federal. 110 folhas. Mestrado em Educação – Universidade Católica de Brasília, Brasília, 2013.

Ao longo do percurso da civilização ocidental, o conceito de cidadania já passou por uma série de modificações, determinadas pelos diversos momentos históricos vivenciados pelo ser humano. Marshall (1967) define a cidadania como um conjunto de direitos cuja organização está embasada em três elementos fundamentais: o aspecto civil, o político e o social. Torres (2011) amplia essa noção de cidadania apregoada por Marshall acrescentando à discussão as questões do multiculturalismo, tão pertinentes à construção de um conceito pleno de cidadania. Considerando esse mote teórico, esta investigação busca identificar, com base na análise de pareceres emitidos entre os anos de 2011 e de 2012 pelo Conselho de Educação do Distrito Federal (CEDF), como os conceitos de cidadania, participação social, democracia e qualidade na educação comparecem nas decisões emanadas desse órgão e de que forma isso impacta na qualidade da educação no Distrito Federal. Tal análise mostra-se de grande relevância, uma vez que, entre os anos de 2011 e de 2012, o CEDF vivencia um período de transição governamental. Em razão disso, está vinculado, ainda, a um período de acomodações políticas que, certamente, influenciam nos rumos das decisões ligadas à educação. Nessa perspectiva, este trabalho valeu-se de uma abordagem qualitativa, compreendendo o CEDF como um caso a ser estudado. A metodologia qualitativa mostrou-se a mais adequada para o alcance dos objetivos da pesquisa em função de, neste estudo, a análise dos pareceres levar em consideração a construção de discursos produzidos por indivíduos cultural e historicamente determinados. Para isso, o estudo de caso pretendido valeu-se dos seguintes instrumentos: a observação e a análise de conteúdo. Foram observadas cinco sessões plenárias do órgão com o intuito de verificar a dinâmica na condução dos trabalhos. Depois disso, foi realizada uma análise do conteúdo dos pareceres emitidos, tendo como base teórica os pressupostos de Bardin (2011). Desse modo, esta investigação determinou categorias a priori, o que conduziu o processo de análise dos pareceres. As

categorias determinadas foram: participação social e democracia; cidadania; e qualidade na educação. Após a análise desses pareceres, verificou-se que o CEDF caracteriza como um órgão-chave para a compreensão e a difusão do conceito de gestão democrática. Nesse sentido, pressupõe em suas ações a participação da sociedade civil. No entanto, ainda não se configura, de forma concreta, para a sociedade como um todo de que modo o CEDF pode ser acionado para a resolução de questões atinentes à educação. Ainda é muito palpável que apenas cidadãos de médio ou elevado status socioeconômico têm demandado o CEDF com

mais regularidade. Com isso, o órgão ainda necessita realizar algumas mudanças estruturais para se converter, plenamente, em um espaço de participação social e de promoção da cidadania, um dos caminhos que possibilitam mudanças estruturais que sejam, de fato, substanciais na educação.

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ABSTRACT

During the development of the western civilization, the concept of citizenship have had several modifications, determined by different historical moments experienced by the human beings. Marshall (1967) defined citizenship as a set of rights, which organization is based on three key elements: the civil aspect, the political aspect and the social aspect. Torres (2011) extends this concept of citizenship defined by Marshall, including issues of multiculturalism, as relevant item for the construction of a complete concept of citizenship. Considering this theoretical background, this research aims to identify, based on the analysis of disclosed opinions by the Education Council from the Brazilian Federal District - CEDF - between the years 2011 and 2012, how the concepts of citizenship, social participation, democracy and quality in education permeate the decisions from the council and how it impacts the quality of the education in the Brazilian Federal District. This assessment is important since, between the years 2011 and 2012, the CEDF experienced a period of transitional government. Thus, it was still connected to a period of political adjustment that certainly influenced the direction of the decisions related to education. In this perspective, this research applied a qualitative approach, comprising the CEDF as a case study.. The qualitative methodology proved to be the most appropriate for achieving the objectives of this research. In this study, the analysis of opinions considers the construction of discourses produced by people culturally and historically determined. Therefore, the following tools were used in this case study: observation and content analysis. Five (5) plenary sessions were observed, in order to verify

the sessions’ dynamic. Thereafter, an analysis of the opinions’ content was performed, based on theoretical assumptions of Bardin (2011). This research determined categories a priori,

which led the process of the opinions’ analysis. The determined categories were: social

participation and democracy; citizenship; and quality in education. After the assessment of the council opinions, CEDF was considered a key element for the understanding and dissemination of the concept of democratic management. On the other hand, it assumes the civil society participation and it is still not clear for the whole society how the CEDF can be required to solve issues related to education. Only citizens of medium or high socioeconomic status have demanded actions from CEDF more regularly. The Council still needs structural changes to become a space for social participation and citizenship promotion. Only in this way, structural changes substantial for the education will be, in fact, undertaken.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Quadro 1. Composição do Conselho de Educação do Distrito Federal (CEDF) ... 60

Quadro 2. Organização temática dos pareceres emitidos pelo CEDF em 2011 ... 75

Quadro 3. Organização temática dos pareceres emitidos pelo CEDF em 2012 ... 76

Quadro 4. Participação social e democracia ... 82

Quadro 5. Cidadania ... 88

Quadro 6. Qualidade na educação ... 93

Tabela 1. Organização percentual e temática da distribuição dos pareceres emitidos pelo CEDF em 2011. ... 76

Tabela 2. Organização percentual e temática da distribuição dos pareceres emitidos pelo CEDF em 2012 ... 77

Gráfico 1. Distribuição dos pareceres emitidos pelo CEDF em 2011 ... 75

Gráfico 2. Distribuição dos pareceres emitidos pelo CEDF em 2012 ... 76

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LISTA DE ABREVIATURAS

BNH – Banco Nacional de Habitação

Cacs – Conselho de Acompanhamento e Controle Social

CE – Conselhos de Educação

CEB – Câmara de Educação Básica

CEDF – Conselho de Educação do Distrito Federal

CEE – Conselhos Estaduais de Educação

CEP– Câmara de Educação Profissional CES – Câmara de Educação Superior

CETEB – Centro de Ensino Tecnológico de Brasília

CFE – Conselho Federal de Educação

CME – Conselhos Municipais de Educação

CNE – Conselho Nacional de Educação

Conbrasd – Conselho Brasileiro de Superdotação

Cosine – Coordenação de Supervisão Institucional e Normas de Ensino CPLN – Câmara de Planejamento e Legislação e Normas

CRC – Conselho Regional de Contabilidade DF – Distrito Federal

EF – Ensino Fundamental

EJA – Educação de Jovens e Adultos

FGTS – Fundo de Garantia do Tempo de Serviço

Fundef – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério

LDB – Lei de Diretrizes e Bases

LDBEN – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional LODF – Lei Orgânica do Distrito Federal

PCN – Parâmetros Curriculares Nacionais

PNE – Plano Nacional de Educação SEDF – Secretaria de Educação do Distrito Federal Proeduc/MPDFT – Promotoria de Justiça de Defesa da Educação

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 14

1.1 JUSTIFICATIVA ... 18

1.2 PROBLEMA DE PESQUISA ... 19

1.3 OBJETIVOS ... 20

1.3.1 Objetivo geral ... 20

1.3.2 Objetivos específicos ... 20

2 REVISÃO DE LITERATURA ... 21

2.1 PARTICIPAÇÃO SOCIAL E DEMOCRACIA ... 21

2.2.1 Breve percurso histórico e teórico do conceito de cidadania ... 26

2.2.2 Cidadania no Brasil ... 35

2.3 DEMOCRACIA, PARTICIPAÇÃO SOCIAL E CIDADANIA NA EDUCAÇÃO: O CONCEITO DE GESTÃO DEMOCRÁTICA E SUA RELAÇÃO COM A QUALIDADE NA EDUCAÇÃO ... 37

2.4 CONSELHOS: ORIGENS E CONCEITO ... 41

2.5 CONSELHOS GESTORES E A TRAJETÓRIA DOS CONSELHOS DE EDUCAÇÃO NO BRASIL ... 45

2.6 O CONSELHO DE EDUCAÇÃO DO DISTRITO FEDERAL: HISTÓRICO, CONSTITUIÇÃO E COMPETÊNCIAS ... 53

2.6.1 Breve histórico do Conselho de Educação do Distrito Federal (CEDF) ... 53

2.6.2 Estrutura e competências do Conselho de Educação do Distrito Federal ... 57

2.6.3 Composição atual do CEDF ... 59

3 METODOLOGIA ... 62

3.1 PESQUISA EM CIÊNCIAS HUMANAS: O VIÉS QUALITATIVO PARA ANÁLISE DOS DADOS DA INVESTIGAÇÃO ... 62

3.2 O ESTUDO DE CASO ... 64

3.3 INSTRUMENTOS PARA COLETA DE DADOS ... 65

(13)

3.3.2 A análise de conteúdo ... 68

3.4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ... 70

4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS ... 71

4.1 ORGANIZAÇÃO TEMÁTICA DOS PARECERES... 75

4.2 A OBSERVAÇÃO DAS REUNIÕES DO CEDF ... 77

4.3 ANÁLISE DAS CATEGORIAS ... 81

4.3.1 Participação social e democracia... 82

4.3.2 Cidadania ... 88

4.3.3 Qualidade na educação ... 93

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 98

REFERÊNCIAS ... 102

APÊNDICE A – AUTORIZAÇÃO PARA REALIZAR A PESQUISA ... 110

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1 INTRODUÇÃO

Não há educação fora das sociedades humanas e não há homem no vazio.

Paulo Freire

Historicamente, o conceito de cidadania tem ocupado local de destaque em debates políticos, sociológicos e filosóficos. Carvalho (2010) introduz a discussão acerca de cidadania apresentando a definição de Marshall, para o qual cidadania é um conjunto de direitos embasados e organizados em três elementos: civil, político e social. Observe-se que, para esse sociólogo britânico, a cidadania não é um direito (como se apregoa com facilidade no senso comum) isolado, mas uma confluência, uma multiplicidade de direitos que, no todo, estabeleceriam o estado de cidadania.

O aspecto civil da cidadania compreende os direitos ligados às liberdades individuais (direito de ir e vir, liberdade de pensamento, direito à justiça). No que se refere ao aspecto político, tem-se o direito de exercício do poder político, de representatividade, como eleitor. Por sua vez, o aspecto social está ligado ao acesso aos bens culturais e materiais, que pressupõem uma vida civilizada.

Nesse sentido, um estado ‘pleno’ de cidadania, que, segundo Carvalho (2010, p. 9)

“[...] é um ideal desenvolvido no Ocidente e talvez inatingível”, compreende a possibilidade de o cidadão estar inserido em um ambiente que respeite sua individualidade e trate a todos igualmente em direitos, oportunidades e deveres, ao mesmo tempo em que possibilita a esse cidadão representatividade. Com isso, o indivíduo tem condições de ter acesso a todos os bens que a sociedade organizada produz, como forma de se posicionar no espaço que o rodeia.

Dessa forma, consideramos cidadania um estado de exercício de direitos e de deveres; e é esse exercício que possibilita ao indivíduo posicionar-se como um ser cultural e historicamente determinado, capaz de intervir no meio e nas pessoas que o rodeiam.

(15)

características essenciais o hibridismo entre as necessidades da administração pública e a satisfação dos cidadãos, permeado pela participação da sociedade.

O conceito de cidadania, dessa forma, não se desvencilha das condições sociais, econômicas e políticas que constituem a sociedade, uma vez que tais condições nortearão a noção que se terá de cidadania para um determinado grupo de pessoas em um certo contexto histórico, conforme se vê no Brasil na atualidade. E essas condições, por sua vez, impactam, sobremaneira, a educação.

Em 1985, o Brasil assistiu ao término de um regime autoritário, durante o qual o aspecto civil da cidadania foi limitado, ao mesmo tempo em que, no aspecto político, houve um predomínio dos interesses do grupo governamental dominante. Com isso, a participação social foi reduzida àquilo que não fosse de encontro aos interesses e à ideologia do grupo dominante. Prova disso é o período de censura que a cultura e os meios de comunicação vivenciaram.

Com o término do regime autoritário, os grupos sociais se organizaram para apresentar à sociedade uma Constituição que resgatasse a visão de cidadania em sua acepção ampla, baseando-se nos aspectos civis, políticos e sociais. Essa demanda é facilmente compreendida logo no primeiro artigo da Carta Magna, em que a participação é assegurada por intermédio de seus representantes ou diretamente, como também por meio da inscrição de políticas públicas como direitos sociais, tendo como diretriz a participação social.

Observe-se que, de acordo com o texto da Constituição de 1988 (BRASIL, 2013), o conceito de cidadania está embasado em um tripé político, social e civil. No entanto, mais que enfatizar esses três aspectos, o conceito de cidadania em que se baseia o Estado brasileiro na atualidade pressupõe a participação ativa do chamado ‘cidadão’: este passa a ser (ou, minimamente, deveria ser) um indivíduo que, consciente de seu papel político, civil e social, busca atuar qualitativamente nos espaços que ocupa.

Por meio de uma participação efetiva, o indivíduo se posiciona como um agente de transformação e emancipação, e não apenas como um objeto de recepção de ideias prontas e acabadas a respeito de algo (AHLERT, 2003). Essa postura participativa é que possibilita o indivíduo incluir-se socialmente, na medida em que se afasta e combate processos de exclusão. A esse respeito, é bem pertinente a seguinte afirmação de Adorno (1995, p. 143):

(16)

consciente independente de cada pessoa em particular, é um antidemocrata, até mesmo se as ideias que correspondem a seus desígnios são difundidas no plano formal da democracia.

Observe-se que com a participação se atinge o estado de democracia. Essa participação, no entanto, deve estar calcada na emancipação do indivíduo, condição fundamental para que este possa ser considerado, de fato, um cidadão.

É justamente em razão disso que, na atualidade, somente se pressupõe o desenvolvimento da cidadania quando se concebe a participação efetiva das pessoas, buscando aliar interesses civis e sociais a partir do viés político.

A educação, dessa forma, apresenta-se como instrumento de formação da consciência política e cidadã, a qual deveria possibilitar a reprodução, em seus mecanismos de atuação – como os CEs – da participação voltada para a cidadania. Em uma análise mais cuidadosa, não se percebe a educação apenas como reprodutora desses processos, e sim como um instrumento privilegiado para a construção e para o debate dos conceitos de cidadania e de participação.

Ahlert (2003) defende que as políticas públicas seriam respostas que o Estado busca dar às demandas que emergem da sociedade. Dessa forma, seriam a expressão de um compromisso estabelecido com um grupo em uma área específica e em um prazo relativamente longo.

Observe-se que uma educação voltada para a cidadania pressupõe a organização de políticas direcionadas que possibilitem a participação dos indivíduos em seu processo de planejamento, efetivação e controle. Com isso, a educação apresenta-se como via de condução à formação do indivíduo para a cidadania, por apresentar, em sua estrutura, condições para a mobilização dos três aspectos da cidadania apontados por Marshall (1967). Um bom exemplo disso é a organização dos Conselhos de Educação (CEs), órgãos colegiados, de caráter deliberativo, normativo e consultivo, cuja atribuição magna seria interpretar e resolver demandas da legislação educacional como forma de garantir um processo democrático na tomada de decisões concernentes à educação (CURY, 2001).

(17)

coerentes, avessas ao autoritarismo e à centralização, conceitos que, certamente, cabem à educação discutir.

Nesse sentido, é pertinente a análise do Conselho de Educação do Distrito Federal (CEDF) como órgão local que, além de regular os caminhos trilhados pela educação, busca realizar uma mediação entre a administração pública do Distrito Federal e a sociedade civil. Nessa perspectiva, esse órgão busca também estar atento às diversas demandas sociais que emergem da relação dos indivíduos com a sociedade no que concerne ao ensino.

Faria (2006, p. 96) postula que:

Uma das principais funções do conselho é realizar uma mediação entre o governo e a sociedade civil, de forma a contemplar a pluralidade das demandas sociais na formulação de normas e também na proposição ou deliberação de diretrizes de ação para os órgãos executivos. Estando o conselho na estrutura do sistema de ensino do Distrito Federal, tem-se que sua função enquanto órgão normativo-consultivo e de deliberação colegiada o distingue dos órgãos executivos, cuja natureza lhes atribui um caráter administrativo e de implementação das políticas e normativas.

Observe-se, desse modo, que o CEDF tem natureza distinta dos órgãos executivos justamente por representar um ponto de mediação entre as políticas de governo e as demandas da sociedade. Abriga, dessa maneira, os aspectos civil, político e social do conceito de cidadania apregoado por Marshall (1967), uma vez que une em suas ações o caráter da representatividade, das liberdades individuais e, assim, possibilita, por meio da educação, o acesso aos bens culturais que a sociedade produz.

Neste trabalho, procura-se investigar, com base na análise dos pareceres emitidos pelo CEDF, a participação social e o exercício da cidadania, bem como seus limites e possibilidades de atuação. Além disso, busca-se relacionar esses conceitos aos de democracia e qualidade da educação. Como base teórica estão os pressupostos de Carvalho (2010), Torres (2011) e Gohn (2011).

No capítulo 1, realiza-se a contextualização do problema e problematiza-se o locus dos

conceitos de cidadania, democracia e participação social na práxis dos Conselhos de Educação (CEs), com ênfase na atuação do Conselho de Educação do Distrito Federal (CEDF). Encerra-se o capítulo com a delimitação das questões de pesquisa e os objetivos pretendidos com a investigação.

(18)

empreendida. Neste capítulo, são desenvolvidos os conceitos de democracia, cidadania, participação social, gestão democrática e qualidade na educação. É feita uma análise temporal do conceito de cidadania no Brasil, bem como da evolução da democracia no país. O capítulo também desenvolve o conceito de conselhos gestores e apresenta um perfil do CEDF e de seus conselheiros.

No capítulo 3, aborda-se o método desenvolvido. O foco é a pesquisa qualitativa em Ciências Humanas e são apresentados os instrumentos de coleta de dados a serem utilizados para a análise do estudo de caso que envolve o CEDF. Como instrumentos para a coleta dos dados qualitativos, são utilizadas a observação e a análise de conteúdo, tendo como bases teóricas as contribuições de Bardin (2011), Vianna (2007) e Franco (2008).

No capítulo 4, são realizadas as análises dos pareceres emitidos pelo CEDF em 2011 e em 2012, bem como o diário de bordo com as observações das sessões do CEDF. Neste capítulo, são estabelecidas as categorias de análise do conteúdo: participação social e democracia; cidadania; e qualidade na educação. Essas análises são contrastadas com a teoria que embasa a pesquisa e permitem a inferência dos conceitos de cidadania, participação social e democracia e qualidade na educação nas decisões do CEDF.

Finaliza-se o estudo enfatizando-se o locus ocupado pelos conceitos de cidadania,

participação social e democracia e qualidade na educação nas decisões do CEDF. Após isso, propõem-se algumas demandas investigativas que, a partir desta pesquisa, podem ser realizadas.

1.1 JUSTIFICATIVA

Os CEs constituem-se como instrumentos privilegiados para a promoção da emancipação e da prática democrática no locus da educação. Ganha relevância, aqui, a

pressuposição da educação como espaço de representação das vivências dos indivíduos em sociedade.

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Nesse sentido, é relevante a afirmação de Gadotti (2010, p. 47) ao postular que “[...] a participação e a democratização num sistema público de ensino é a forma mais prática de formação para a cidadania. A formação para a cidadania dá-se na participação no processo de

tomada de decisão”. Vê-se que, por essa via de raciocínio, os CEs se inserem como instrumento para a participação cidadã, envolvendo o indivíduo na tomada de decisões para os rumos da qualidade na educação.

Nessa perspectiva, mostram-se relevantes trabalhos de pesquisa que se proponham a estudar os CEs, bem como a interface entre esses conselhos e os conceitos de cidadania e de participação. Faria (2006), Alves (2005), Moura (2010), Amorim (2005) e Martiniano (2010) são alguns dos exemplos que apresentam investigações pertinentes a esse respeito, mais especificamente na relação entre os CEs e os conceitos de cidadania e participação.

Nesse sentido, este trabalho pretende levantar a discussão acerca de cidadania e de participação, pautando-se na forma como esses conceitos se materializam nos pareceres emitidos pelo CEDF. Pretende-se, dessa forma, verificar se o CEDF tem se convertido, efetivamente, em espaço de promoção da emancipação e da consciência cidadã.

Essa discussão é pertinente justamente pelo fato de a participação dos indivíduos ainda não ter crescido, fundamentalmente, como participação política (NOGUEIRA, 2009). Um dos aspectos que mais contribuíram para o crescimento dessa participação foi justamente o delineamento de um padrão de solidariedade. Esse aspecto, intimamente ligado a estados subjetivos do indivíduo, reforça ainda mais a importância de se compreender de que forma cidadania e participação se manifestam no CEDF.

1.2 PROBLEMA DE PESQUISA

A Constituição Brasileira de 1988 (BRASIL, 2013), em seus artigos 206 (incisos VI e VII), 208 (§ 1º) e 211, estabelece respectivamente os seguintes preceitos e princípios para a educação: gestão democrática do ensino público e garantia de padrão de qualidade, afirmação da educação como direito subjetivo e a descentralização administrativa do ensino.

(20)

de participação social e exercício da cidadania, conforme se conhece hoje, apenas se configura com a LDBEN (Lei n. 9.394/1996), a qual reforça a possibilidade da criação de sistemas municipais de educação, ratificando o preceito constitucional da gestão democrática. Observe-se que, tendo por base o texto da Constituição de 1988 e a LDBEN, os CEs se inserem em um contexto de gestão democrática, a qual pode possibilitar a participação vinculada à cidadania. Com base nisso, este trabalho pretende lançar luz ao seguinte problema de pesquisa: com base nos pareceres emitidos pelo CEDF são possíveis a identificação e a análise dos conceitos de cidadania e participação social nas decisões desse órgão no que concerne à educação, levando-se em conta os limites e as possibilidades desse conselho?

Esse questionamento central abre espaço, ainda, aos seguintes questionamentos correlatos:

a) De que maneira a conformação do CEDF possibilita a participação cidadã? b) Como o CEDF contribui para a melhoria da qualidade na educação no DF?

c) Quais os limites e as possibilidades de participação efetiva do CEDF nos rumos da educação praticada no Distrito Federal?

1.3 OBJETIVOS

1.3.1 Objetivo geral

Identificar e analisar, nos pareceres emitidos pelo CEDF, a participação social e o exercício da cidadania, bem como seus limites e possibilidades de atuação.

1.3.2 Objetivos específicos

a) Analisar a composição, a formação e as atribuições do CEDF como órgão público ligado à educação.

b) Identificar possibilidades de atendimento às demandas da sociedade no setor da educação escolar com base na análise dos pareceres do CEDF.

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2 REVISÃO DE LITERATURA

O movimento de democratização e de participação na educação surge da necessidade de se construir um ambiente em que a noção de cidadania é fundamental não somente para transformações, mas, principalmente, para a consolidação de uma consciência social de que são necessárias ações fundamentadas em ideias coerentes, avessas ao autoritarismo e à centralização. Dessa forma, pressupõe-se que a educação cumprirá seu papel de formação de cidadãos na medida em que possibilite o diálogo na busca de soluções para as questões sociais que emergem das interações sociais.

Em razão disso, ao se investigar os CEs observa-se que esses órgãos se vinculam a um processo ideológico de luta pela democracia, uma vez que possibilitam, por meio da participação social, a construção da cidadania. Nesse sentido, é pertinente que se compreendam os conceitos de cidadania, democracia e participação social, bem como a relação entre esses conceitos e a ideia de gestão democrática evocada na educação do Distrito Federal e de que modo essas questões interferem na qualidade do ensino.

2.1 PARTICIPAÇÃO SOCIAL E DEMOCRACIA

A participação social está relacionada a dois conceitos essenciais: democracia e descentralização. O conceito de democracia remonta à Grécia Antiga e, quando surgiu, sua significação estava mais próxima da participação ‘popular’. No entanto, o povo estava ausente da participação nas decisões políticas, o que tornava relativa, naquele contexto, a democracia. Isso se dava, justamente, pelo fato de a maior parte da população continuar sem controle sobre as questões essenciais relacionadas ao governo da época (NAQUET, 2002).

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Embora em suas origens o conceito de democracia ainda não incluísse a participação de todos os indivíduos, serviu de base para que, na atualidade, se compreenda a democracia como o modo de governo em que o povo governa para o povo. E isso somente é possível em razão da legitimidade que o processo democrático exige.

O exercício do poder pelo povo no Estado democrático ocorre por intermédio de seus representantes, eleitos para fazerem valer a vontade da sociedade. O processo de democratização, inclusive, traz em sua essência a necessidade de participação, pois configura a oposição a qualquer sistema ditatorial.

A relação entre democracia, liberdade e igualdade formou-se a partir de uma evolução histórica, diante da crescente participação popular e do surgimento de movimentos sociais (PINSKY, 2010).

A análise da evolução histórica do conceito de democracia remonta a três grandes tradições do pensamento político: a teoria clássica, a teoria medieval e a teoria moderna. De acordo com Bobbio; Matteucci e Pasquino (2010, p. 319),

[...] a teoria clássica, divulgada como teoria aristotélica, das três formas de Governo, segundo a qual a Democracia, como Governo do povo, de todos os cidadãos, ou seja, de todos aqueles que gozam dos direitos de cidadania, se distingue da monarquia, como Governo de um só, e da aristocracia, como Governo de poucos.

Por essa primeira tradição, democracia seria o modo de governo que garantiria a representação de todos aqueles considerados cidadãos. Por essa perspectiva, ser cidadão era ter o direito de exercer um papel político. Garantia-se, assim, a representatividade àqueles que se enquadrassem no conceito de ‘cidadão’ defendido à época.

Seguindo-se essa teoria clássica, surge a teoria medieval, de origem romana, apoiada na soberania popular, a qual defendia que

[...] há a contraposição de uma concepção ascendente a uma concepção descendente da soberania, conforme o poder supremo deriva do povo e se torna representativa ou deriva do príncipe e se transmite por delegação do superior para o inferior. (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO op. cit., 2010)

(23)

Por fim, Bobbio; Matteucci e Pasquino (2010, p.319) apresentam a teoria moderna, alicerçada nos pressupostos de Maquiavel:

[...] nascida com o Estado moderno na forma das grandes monarquias, segundo a qual as formas históricas de Governo são essencialmente duas: a monarquia e a república, e a antiga Democracia nada mais é que uma forma de república (a outra é a aristocracia), onde se origina o intercâmbio característico do período pré-revolucionário entre ideais democráticos e ideais republicanos e o Governo genuinamente popular é chamado, em vez de Democracia, de república.

Vê-se, pois, que o conceito de democracia, nesse sentido, também está vinculado à ideia de intercâmbio. Observa-se que, na atualidade, a noção de democracia traz embutida a questão da representatividade, que já se mostrava presente desde os primeiros passos na consolidação desse conceito.

Hoje, a noção de democracia está mais atrelada à teoria clássica, ainda que a noção de democracia grega tenha sofrido grandes alterações em seu conceito. Atualmente, ao se falar em democracia, considerando-se a discussão entre participação, representatividade e cidadania, observa-se que a soberania popular pouco corresponde a esse ideal de democracia. Isso é perceptível pelo fato de se levar em conta que todos os governos são feitos pela elite e para a elite, em que o poder efetivo se encontra nas mãos de uma pequena parcela de privilegiados. (BOBBIO, 2000).

Apesar de todas essas questões de ordem sociológica e política, a sociedade mostra-se alinhada à noção de democracia preconizada na teoria clássica. Em razão disso, observa-se que o conceito de democracia está atrelado ao conceito de participação social, o qual está além do conceito de democracia. É um passo à frente, pois concretiza o ideal democrático, constituindo a possibilidade de atuação dos membros da sociedade na gestão pública. A esse respeito, Faria (2006, p. 6) afirma que “[...] a participação é um dos mais importantes princípios políticos numa sociedade democrática por estabelecer instrumentos de diálogo, expressão e escolha coletiva”. De acordo com esse conceito, participar pressupõe a necessidade de um Estado democrático que garanta a todos, com base no diálogo, o direito de escolher o que lhe aprouver. Dessa forma, garante-se a efetivação da cidadania em seu aspecto civil.

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Beghin (2005, p. 375) consideram que “[...] os conselhos emergem, sobretudo, das demandas de democratização da sociedade em face do processo decisório que permeia as políticas sociais”.

Segundo Abramovay (2001, p. 121), “[...] não há estudo sobre o tema que não enfatize a precariedade da participação social nestas novas organizações e sua tão frequente submissão a poderes locais”, pois, apesar de se pressupor a participação de todos os segmentos sociais nas decisões dos diversos conselhos, observa-se que, na prática, nem todos realmente efetivam tal participação. A respeito disso, Guimarães (2009) alerta que a simples institucionalização dos conselhos não é garantia de participação efetiva, citando como exemplo os Conselhos Municipais de Educação. Também destaca que a constituição dos conselhos é uma vitória na democratização do processo decisório no interior do aparelho estatal; porém, o Estado continua determinando a agenda política social.

Jacobi (2008) enfatiza essa ideia ao afirmar que a participação social deve ser percebida como um processo continuado de democratização e, por isso, uma concessão dos espaços de poder, podendo levar a uma maior ou menor ruptura com as estruturas tradicionais, patrimonialistas e autoritárias. Para que ocorra essa ruptura é preciso, segundo o autor, a presença crescente de uma pluralidade de atores nos processos decisórios. Silva e Brito Junior (2009), por sua vez, ressaltam que a participação social só é bem vinda quando é individualizada e despolitizada, ou seja, com limites aceitos pelo próprio poder público, na busca pela não interferência em demasia da sociedade na gestão de seus órgãos.

Mesmo com essas questões, não se pode deixar de lado a necessidade e a importância de se manter e de se fortalecer instrumentos que possibilitem o exercício pleno da cidadania. Somente assim é possível a garantia de que a participação da sociedade não se faça apenas com grandes demandas, mas que se realize com pequenas ações diárias, por meio da fiscalização dos órgãos governamentais quanto ao cumprimento de suas funções.

Para Silva (2009), os cidadãos precisam ir além do mero conhecimento a respeito de seu direito de intervir e participar. Antes, a simples defesa da democracia participativa bastava. Agora, busca-se a democracia deliberativa. O autor explica que a participação garante uma dinamização na máquina estatal, constituindo, portanto, um ponto positivo para o próprio Estado. Essa atuação conjunta norteia a necessidade da existência dos conselhos nas diversas esferas públicas – e em especial na educação.

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diagnóstico dos CEs do Rio de Janeiro, puderam verificar que as principais motivações para a criação dos Conselhos de Educação são o cumprimento da legislação e a descentralização, ou seja, a participação social não configura motivação para o Estado, tampouco para os cidadãos. Os autores explicam que a participação social efetiva, por meio da presença de pais e de alunos, nestes órgãos é baixa, não totalizando 10% dos membros.

A inércia na participação é uma das características da sociedade brasileira, realidade que pouco tem mudado ao longo dos anos. A burocratização e os entraves oferecidos pelo Estado também constituem obstáculos à participação dos cidadãos na tomada de decisões. Um dos elementos que comprova a necessidade de atuação efetiva se encontra na própria bibliografia analisada, segundo a qual se pode observar a participação social como conceito que constitui uma dos maiores preocupações dos autores na compreensão do papel dos CEs em todo o Brasil.

Presentes esses dois fatores – inércia da sociedade e entraves gerados pelo próprio Estado –, cumpre analisar quais seriam as soluções possíveis para que a participação social ocorra de forma efetiva, especialmente no CEDF, objeto desta investigação.

2.2 CIDADANIA

O artigo 1º da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2013) preceitua a cidadania como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil. A cidadania também está presente no texto constitucional como garantia passível de habeas corpus ou habeas data.

Trata-se de conceito inteiramente vinculado à educação (citada no artigo 205), sendo um de seus objetivos.

Cidadania pressupõe a ação do cidadão, ou seja, aquele que se diferencia do indivíduo por possuir a capacidade de gozar seus direitos políticos e civis (PINSKY, 2010). Nesse sentido, a cidadania é o exercício das atribuições conferidas ao cidadão, permitindo, desse modo, a prática constante de participação, levando as pessoas a refletirem na busca de um ideal democrático.

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de direito, está intrinsecamente relacionada à ideia de cidadania. Desse modo, para se entender o conceito atual de cidadania é preciso conhecer os diversos entendimentos de cidadania nos diferentes períodos da história da humanidade.

2.2.1 Breve percurso histórico e teórico do conceito de cidadania

A origem da cidadania é a mesma da democracia: a polis grega. Nas cidades-Estado,

criadas pelos gregos, os cidadãos eram responsáveis pela cidade (polis), exercendo direitos e

deveres políticos, num regime democrático. Eram considerados cidadãos aqueles que pudessem participar da atividade política e social da cidade. Por isso a cidadania era relativa, uma vez que somente os homens livres – excluindo-se mulheres, crianças, idosos, estrangeiros, escravos, assalariados (artífices), agricultores e pobres – podiam exercer atividades políticas e sociais (ZIZEMER, 2006).

Arendt (1997) assinala que, na Antiguidade, as atividades destinadas a prover a própria subsistência ou assegurar a sobrevivência eram consideradas nulas. Segundo a autora, o trabalho regular impedia a liberdade, e, para ser cidadão, era preciso viver somente na esfera política; dessa forma, a liberdade só era possível na esfera da polis. À família eram destinadas

as atividades de prover o sustento, e, por isso, as mulheres e os escravos não eram cidadãos nem poderiam ser, pois realizavam atividades servis.

O conceito de que ser cidadão era ser um indivíduo que pertencesse a uma comunidade, à polis, permaneceu, mesmo depois do domínio político de Roma sobre a Grécia

e foi incorporado pelo sistema jurídico romano. De acordo com Zizemer (2006), a cidadania Antiga era marcada por uma sujeição do indivíduo ao Estado, e, ao mesmo tempo, por uma grande liberdade do cidadão na manifestação de suas opiniões, ou seja, havia uma valorização dos direitos e dos deveres atribuídos aos cidadãos. E é nesse ponto, segundo a autora, que consiste a riqueza da noção de cidadania grega.

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Nesse período, de acordo com os referidos autores, a única estrutura que lembraria o sentido de cidadania seria a ideia de pertencer a uma comunidade. Isso se tornou possível, sobretudo, pela forte atuação da Igreja Católica, que assumiu a primazia sobre a liderança espiritual dos indivíduos, ao mesmo tempo em que exercia influência decisiva sobre os pilares das decisões políticas.

Com isso, a Igreja conseguia congregar sob sua égide os habitantes das aldeias e também os de zonas mais afastadas, abrindo espaço para que, ainda que em uma perspectiva rudimentar, surgisse uma noção de cidadania. Esta, no entanto, está vinculada à subordinação, a uma liderança espiritual – representada pela diocese. Desse modo, ser ‘cidadão’ era entregar sua educação, sua orientação cívica e espiritual nas mãos da Igreja, tornando-se, pois, um

‘cidadão cristão’.

No entanto, embora possa se dizer que houve na Idade Média uma ‘ressurreição’ da ideia de cidadania, na medida em que o indivíduo pertencia a uma comunidade cristã, houve, de maneira contundente, um retrocesso em relação à Antiguidade, visto que as relações sociais e políticas não eram democráticas; e a relação indivíduo-cidadão foi substituída pela relação súdito-soberano, vassalo-senhor feudal (ZIZEMER, 2006).

Vale destacar também que esse foi um período em que o poderio da Igreja levava o indivíduo a um temor constante, representado pela figura de um ‘Deus’ severo e punitivo, o que tornava o indivíduo um ser ainda mais facilmente manipulável e, portanto, alienado de seu papel de cidadão e sujeito de sua própria identidade.

A Idade Moderna representa a ruptura com a visão teocêntrica e feudal da Idade Média, abrindo espaço para a construção de um ideário de soberania nacional. Os antigos feudos passam a dar lugar aos Estados; com isso, o vassalo – ainda que submetido a um rei soberano e absoluto – cede lugar ao cidadão.

O Renascimento e o Humanismo foram dois movimentos fundamentais para o conceito de cidadania que se instituiria na Idade Moderna, uma vez que preconizavam uma retomada à Antiguidade Clássica, substituindo o ‘teocentrismo’ pelo ‘antropocentrismo’ – ou seja, o Homem no centro de um processo de transformação, operada pela razão.

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Nesse mesmo período da Revolução Francesa – o século XVIII –, ganha força o Iluminismo, movimento de cunho filosófico que tem seus antecedentes no próprio Renascimento, uma vez que trouxe o individualismo, o racionalismo, o método científico e o experimentalismo para o locus de atuação da filosofia, da arte e da ciência (MORAES, 1998);

com isso, abre-se espaço para a ascensão do Estado liberal.

O Estado liberal, por sua vez, instaura, em um movimento contínuo e contundente, o capitalismo. Para isso, torna-se necessária uma concepção de cidadão atrelada à ideia de liberdade individual, uma vez que esta, por sua vez, abriria espaço para a ideia de livre mercado e de livre concorrência. No entanto, essa instalação da livre concorrência aumenta a desigualdade entre as pessoas, fazendo com que a cidadania perca espaço e que se estabeleça um conflito com a noção de cidadania preconizada pela filosofia liberal (ZIZEMER, 2006).

De acordo com a filosofia liberal, a liberdade do indivíduo é um bem indiscutível, quando de sua relação com o Estado. Essa noção, contudo, entra em choque com as relações que o capitalismo crescente estabelece entre os indivíduos, pois cada vez mais a busca pelo capital estabelece uma disputa desenfreada entre esses mesmos indivíduos. Nesse período, portanto, o conceito de cidadania atrela-se à valorização do trabalho.

Deve-se refletir, no entanto, que o capitalismo se tornou, na atualidade, um dos grandes responsáveis pelo esvaziamento do exercício da cidadania. Não se pode perder de vista que a busca desenfreada pelo lucro e a aplicação da teoria do mercado nas relações entre os indivíduos e do Estado com os indivíduos possibilitaram uma estrutura cruel e elitista que reduz a cidadania a uma pseudocidadania (PINSKY, 2010).

A contemporaneidade faz com que o conceito de cidadania sofra grandes modificações, principalmente no decorrer dos séculos XIX e XX. Alves (2000) é categórico ao afirmar que, com a superação dos Estados absolutistas, o conceito de cidadania – em conjunto com a noção de soberania – vincula-se à ideia de direitos humanos.

Nesse contexto, ganha força a noção de cidadania preconizada por Marshall, segundo o qual a cidadania é dividida em três aspectos: civil, política e social. De acordo com o autor, o aspecto civil vincula-se à liberdade individual; o aspecto político está atrelado à participação política; e o aspecto social é ligado ao bem-estar econômico, nos dizeres do próprio Marshall (1967), tudo o que permite levar a vida de um ser civilizado, de acordo com os padrões da sociedade em que se insere.

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pontos. Para se compreender esse percurso da cidadania na atualidade, é de grande relevância a visão que Torres (2011) apresenta do conceito de cidadania.

De acordo com esse estudioso, as teorias tradicionais de cidadania, baseadas na teoria política ocidental, apresentam contradições, omissões e lacunas, cuja principal consequência foi a exclusão de uma camada significativa da população das prerrogativas inerentes ao status de cidadão. De acordo com Torres (2011), tais teorias, desenvolvidas

por brancos heterossexuais do sexo masculino, “[...] identificavam uma cidadania homogênea através do processo de exclusão sistemática em vez da inclusão social”

(TORRES, 2011, p. 65).

De fato, tais teorias, ao vincularem o conceito de cidadania à figura do Estado-Nação, propiciaram a criação de uma base para a homogeneidade cultural e ética e a democratização do aparelho estatal, ainda que “[...] às custas da opressão e da exclusão de minorias nacionais.” (HABERMAS, 1997, p. 281).

Dessa forma, conforme salienta Torres (2011) um expressivo contingente da

sociedade, compreendendo “[...] mulheres, grupos sociais identificáveis (como, por exemplo, judeus, ciganos), pessoas da classe trabalhadora, membros de grupos étnicos e raciais específicos, pessoas carentes de certos atributos ou habilidades (isto é, a

alfabetização ou a capacidade de contar)”, foi em princípio excluído da definição de

cidadão em numerosas sociedades.

Além da exclusão social, essas teorias, fortemente marcadas por segregações de ordem étnicas, sociais e de gênero, têm um efeito ainda mais perverso, na medida em que submetem os indivíduos não cidadãos a um processo contínuo de ‘opressão’ e de

‘dominação’. Torres (2011) fundamenta-se nos estudos de Paulo Freire e afirma que este estudioso brasileiro, ao analisar o potencial da educação como instrumento essencial para estancar esse processo, acredita que, embora existam outras formas de opressão na

sociedade, “[...] o racismo, sexismo ou exploração de classe são as formas mais evidentes de dominação” (p. 88).

Vale salientar, entretanto, que o vínculo estabelecido entre cidadania e Estado-nacional pelas teorias tradicionais começa a enfraquecer-se em face das transformações sociais, políticas e econômicas que caracterizam o processo de ‘globalização’ em curso no mundo contemporâneo. No dizer de Baracho (1995, p. 1), “[...] o conceito de cidadão e cidadania vem adquirindo particularidades, que não se esgotam na compreensão de ser cidadão aquele que participa dos negócios da cidade” (grifo do autor).

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internacionalização do capital, os avanços tecnológicos recentes e a criação de blocos econômicos e políticos, estão abalando os princípios e as bases teóricas que sustentavam a autonomia dos Estados-nacionais, desafiando a construção de uma cidadania global. Nesse sentido, Habermas (2002, p. 123) assevera:

A globalização do trânsito e da comunicação, da produção econômica e de seu financiamento, da transferência de tecnologia e de poderio bélico, em especial dos riscos militares e ecológicos, tudo isso nos coloca em face de problemas que não se podem mais resolver no âmbito dos Estados nacionais, nem pela via habitual dos Estados soberanos. Salvo melhor juízo, tudo indica que continuará avançando o esvaziamento da soberania dos Estados nacionais, o que fará necessária uma reestruturação e ampliação das capacidades de ação política em um plano supranacional que, conforme já vínhamos observando, ainda está em fase incipiente. Na Europa, na América do Norte e na Ásia, estão se constituindo formas de organização supraestatal para ‘regimes’ continentais, que poderiam até mesmo ceder a infraestrutura necessária às Nações Unidas, ainda muito ineficientes.

Além das instituições supranacionais, outros fatores estão se tornando decisivos para a conceituação da cidadania em outros termos, afastando-a do seu sentido tradicional de cidadania vinculada à ideia de nacionalidade e limitada a um espaço territorial determinado.

Entre esses fatores estão a possibilidade de ‘múltiplas filiações’ e de ‘múltiplas identidades’ em decorrência do intercâmbio cultural promovido pelas novas tecnologias de comunicação e pela redução das barreiras e livre circulação de capitais e pessoas. Nesse contexto, a cidadania vinculada à comunidade nacional e ao Estado-nacional esfacela-se e assume os contornos da ‘pluralidade cultural’, fragmentando-se em identidades diversas ligadas a estilos de vida, à orientação sexual, à cor da pele, etc. Sobre esse novo conceito de cidadania, Carvalho (2002, p. 115) discorre:

[...] a identidade nacional única se fragmenta em identidades parciais, baseadas em gênero, etnias, idade, condições físicas, opções sexuais. Se os direitos não devem ser universais, mas articularizados, também a identidade coletiva se particulariza em pequenos guetos...

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Em sintonia com essas transformações, Torres (2011) propõe a formulação de uma teoria de cidadania que apresente um escopo multicultural e democrático. Espera-se, com isso, a conscientização da necessidade de se desenvolver uma teoria da democracia que possibilite a atenuação – ou a completa eliminação – das diferenças, das desigualdades e das injustiças sociais que permeiam as sociedades capitalistas.

Nesse sentido, a educação passa a exercer papel preponderante no processo de construção de uma cidadania multicultural democrática. Portanto, é fundamental que os aparelhos de representação popular – e por extensão locus de cidadania – vinculados à

educação, como é o caso dos Conselhos de Educação, tenham a real noção de seu papel para a desconstrução de uma escola pública que segrega por classe e por raça, e na qual as distinções de gênero continuam ocupando espaço central nas práticas escolares.

Desse modo, a fim de que se possa realmente falar de cidadania no plano educacional, deve-se ter em mente não apenas os aspectos civil, social e político do conceito, como também deve haver espaço para a abordagem da ‘diversidade’ e do

‘multiculturalismo’, como molas propulsoras da real transformação nos estatutos sociais que cabe à educação realizar.

Essa ideia, certamente, efetiva-se com base em uma consciência política que se vincule à participação e compreenda a diversidade e o multiculturalismo como fatores de agregação e de riqueza em uma dada sociedade, e não como elementos de esfacelamento dessa consciência cidadã.

Conforme Torres (2011), tais temas são centrais, porque o novo paradigma de cidadania requer um senso de solidariedade que una indivíduos em torno de metas nas

quais a diversidade cultural seja entendida como uma força cultural, e a ação

afirmativa, como uma política útil (grifo do autor).

De acordo com o raciocínio empreendido até aqui, observa-se que as contribuições de Torres (2011) abrem espaço para a ampliação das ideias defendidas por Marshall. Nesse sentido, esta pesquisa compreende a cidadania como um processo que busca a conscientização do indivíduo em seus papéis social, político e civil; essa conscientização, contudo, deve estar ancorada e atenta à diversidade e ao multiculturalismo, típicos da pós-modernidade.

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É também para essa nova concepção de cidadania que devem ser direcionados os esforços da educação, ou seja, para uma cidadania que se amplia e ultrapassa a tradicional noção de direitos e deveres e chega aos direitos de terceira geração, tendo como meta eliminar ou, ao menos, reduzir as diferenças, as desigualdades e as injustiças sociais existentes em nossa sociedade.

Essa concepção de cidadania busca, além do bem-estar social, a harmonia do ser humano com a natureza e demais seres vivos. A cidadania, nesse sentido, é voltada para uma relação equilibrada entre o ser humano e o meio ambiente. Com essa caracterização foi configurada nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN, 1998), que prescreveram o desenvolvimento da consciência ambiental como forma de o indivíduo empenhar-se pela vida e pelo bem-estar da sociedade no contexto socioambiental:

A principal função do trabalho com o tema Meio Ambiente é contribuir para a formação de cidadãos conscientes, aptos a decidir e atuar na realidade socioambiental de modo comprometido com a vida, com o bem-estar de cada um e da sociedade, local e global. (BRASIL, 1998, p. 187)

Essa noção ampliada de cidadania pressupõe a inclusão social como meio para reduzir as desigualdades e alcançar uma sociedade mais justa, igualitária e solidária. Uma das formas mais eficazes de promover a inclusão social é levar a educação a um contingente cada vez maior de pessoas. Isso porque, conforme Carvalho (2010), a educação é um direito de todos. Desse modo, por meio dela é possível a obtenção de outros direitos, uma vez que, ao ampliar a capacidade de percepção e compreensão do indivíduo, a educação o habilita a conhecer seus direitos, bem como os mecanismos de luta para obtê-los:

Trata-se da educação popular. Ela é definida como direito social, mas tem sido historicamente um pré-requisito para a expansão dos outros direitos. [...] Foi ela que permitiu às pessoas tomarem conhecimento de seus direitos e se organizarem para lutar por eles. A ausência de uma população educada tem sido sempre um dos principais obstáculos à construção da cidadania civil e política. (CARVALHO, 2010, p. 11)

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[...] há uma parte considerável da população de tal maneira carente que, mesmo que tenha formalmente direitos políticos, pela falta de condições culturais e materiais para exercer esses direitos dificilmente pode considerar-se englobada no processo de formação da cidadania.

Para embasar seu ponto de vista, Lando expõe o pensamento do político e pensador francês Alexis de Tocqueville, segundo o qual o conceito de cidadania está atrelado à pressuposição de que o cidadão seja capacitado, minimamente, de todas as possibilidades sociais para a expressão de suas opiniões. Com isso, torna-se possível também a possibilidade de reivindicação dos direitos individuais de cada pessoa.

É com base nessa percepção que os PCNs, ao dedicar um capítulo inteiro sobre trabalho e consumo, reivindicam o acesso ao consumo como um direito fundamental de

cidadania: “Um direito básico do cidadão é ter acesso ao mercado de consumo, aos produtos

ou serviços que são oferecidos” (BRASIL, 1998, p. 352).

Trata-se, assim, de permitir aos cidadãos uma participação efetiva na riqueza produzida na sociedade como forma de corrigir a injustiça social decorrente da concentração de renda e riqueza existente no país.

Esse posicionamento, contudo, não representa um alinhamento favorável ao

‘consumismo’ que impera na sociedade contemporânea, isto é, ao consumo compulsivo, excessivo e acrítico de determinados bens, independentemente de sua necessidade. Pelo contrário, o referido documento repudia a lógica do sistema capitalista que fomenta esse tipo de consumo, formulando o seguinte questionamento:

Como fazer frente à lógica desse sistema que depende de criar cada vez mais mercadorias para continuar se expandindo, e que para isso tem uma complexa engrenagem de ‘fabricação de novas necessidades’, instalando a ideia do poder de consumo como um valor em si? (BRASIL, 1998, p. 353).

A razão para esse posicionamento é que o indivíduo movido pela engrenagem do sistema capitalista se torna somente e cada vez mais um consumidor, afastando-se de preocupações com a política e os problemas coletivos, deixando, portanto, de exercer sua cidadania.

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[...] propiciar aos alunos o desenvolvimento de capacidades que lhes permitam compreender sua condição de consumidor, com os conhecimentos necessários para construir critérios de discernimento, atuar de forma crítica, perceber a importância da organização, solidariedade e cooperação para fazer valer seus direitos e assumir atitudes responsáveis em relação a si próprios e à sociedade. (BRASIL, 1998, p. 354)

A ideia de participação do cidadão na cadeia de consumo remete ao conceito de cidadania ativa. Trata-se de um conceito amplo que requer a “[...] participação popular como

possibilidade de criação, transformação e controle sobre o poder ou os poderes”

(BENEVIDES, 1991, p. 20).

De acordo com Wanderley (2000), a cidadania ativa distingue-se da cidadania passiva por materializar-se em uma participação popular autônoma e independente da tutela estatal:

[...] a cidadania passiva – aquela que é outorgada pelo Estado, com a ideia moral do favor e da tutela – da cidadania ativa, aquela que institui o cidadão como portador de direitos e deveres, mas essencialmente criador de direitos para abrir novos espaços de participação política. (WANDERLEY, 2000, p. 158)

Essa forma de participação popular está em conformidade com a nova concepção de cidadania mais abrangente que se cristaliza na atualidade, uma vez que amplia as formas de participação do cidadão por meio de movimentos, associações e outras instituições sem vínculo governamental, estabelecendo uma nova base para relações entre o cidadão e o poder estatal.

Após essa breve exposição sobre os contornos mais evidentes de uma cidadania mais abrangente e aberta para as demandas e as transformações da sociedade contemporânea, cumpre salientar que este trabalho foi desenvolvido em uma perspectiva de cidadania que se apoia no conceito cristalizado por Marshall (1967) e que se complementa com as contribuições de Torres (2011) vinculadas à questão do multiculturalismo e da diversidade. Ou seja, uma cidadania transformadora que, além dos direitos individuais, políticos e sociais, contemple os denominados direitos da terceira geração – os direitos metaindividuais.

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2.2.2 Cidadania no Brasil

Ao se discorrer sobre cidadania no Brasil, são elucidativas as análises empreendidas por Carvalho (2010) tendo como foco as concepções teorizadas por Marshall (1967). O percurso da cidadania no Brasil tem como marco inicial de análise o ano de 1822, em função da independência em relação ao domínio português. Deve-se entender que somente a partir desse período é que se inicia um processo de construção da noção de ‘pátria’, conceito este que demorou cerca de um século para ser consolidado, tendo em vista a forte herança de um passado colonial na constituição da identidade do brasileiro. Nesse primeiro momento os direitos políticos têm destaque capital:

A Constituição regulou os direitos políticos, definiu quem teria direito de votar e ser votado. Para os padrões da época, a legislação brasileira era muito liberal. Podiam votar todos os homens de 25 anos ou mais que tivessem renda mínima de 100 mil-réis. (CARVALHO, 2010, p. 29)

Todavia, essa primazia do aspecto político não significou que existisse uma cidadania ancorada na participação política. Cabe ressaltar que foi um período marcado pelo apontamento do Estado acerca de quem seria o cidadão; ou seja, era o poder político dominante que traçava o perfil daquele que poderia ser considerado cidadão e, portanto, participar do processo político que se instalava. No entanto, essa participação também era regulada, uma vez que havia forte influência do poder político para se manter as estruturas então dominantes. Nesse sentido, o século XIX prossegue com uma série de medidas que enfatizam o aspecto político da cidadania.

Com a Revolução de 1930, é quebrado o paradigma de cidadania desenvolvido até então no Brasil. Embora a Constituição de 1891 – escrita em função do advento da República

– tenha estruturado uma série de mudanças na constituição política do país, o governo de Getúlio Vargas representou um salto no aspecto social do conceito de cidadania. A esse respeito, Carvalho (2010) ilumina:

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A Era Vargas representou, sem dúvidas, um grande avanço no que diz respeito ao aspecto social da cidadania. Não se deve esquecer que é nesse período também que surge o Ministério da Educação, ainda atrelado à Pasta da Saúde. No entanto, esse maior desenvolvimento do aspecto social também não representou, de fato, uma noção de cidadania que abrangesse todos os cidadãos. O Estado permanecia estabelecendo um perfil de cidadão que seria beneficiado pelos direitos que, nessa perspectiva, passavam a ser um prêmio, e não um direito inerente pelo simples status de cidadão. Um exemplo concreto disso é o fato de a

legislação trabalhista organizada na época não dar o mesmo tratamento a trabalhadores urbanos e rurais nem a trabalhadores domésticos.

Embora seja um período de maior desenvolvimento do aspecto social da cidadania no Brasil, o período de 1930 a 1945 representou uma estagnação dos aspectos civil e político da noção de cidadania, uma vez que se viveu um período de governo ditatorial, em que os aparelhos do Estado eram constantemente utilizados para a manutenção da ordem vigente. Com isso, o cidadão não tinha condições de se politizar e, portanto, questionar o que se vivia. Como consequência, o aspecto social da cidadania muitas vezes acabou confundido com

‘paternalismo estatal’, tão bem materializado na imagem de Getúlio Vargas como o ‘pai dos pobres’.

O fim da Era Vargas, em 1945, representa um impulso no aspecto político da cidadania. A Constituição de 1946 mantém as conquistas sociais do período anterior e garante, dessa feita, direitos civis e políticos, como a liberdade de imprensa e o direito de organização política (CARVALHO, 2010). Trata-se de um período em que cresce a participação do povo nas eleições, embora ainda ocorram fraudes em vários locais do país. Contudo, o processo de urbanização do país tornava o eleitor das cidades menos vulnerável ao aliciamento e à coerção. Mas a política populista dá o tom no Brasil desse período, manipulando as grandes massas, uma vez que os políticos populistas não tinham a real vinculação com os problemas vivenciados pelas grandes massas que os elegiam. Um símbolo desse período é o político Ademar de Barros, grande divulgador do slogan‘rouba, mas faz’. A

participação política só vai se intensificar nos primeiros anos da década de 1960, sendo abafada pelo movimento militar de 1964.

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Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e se incentiva a aquisição da casa própria pelo trabalhador por intermédio do Banco Nacional de Habitação (BNH).

Apesar disso, o governo militar cerceou de forma truculenta a participação política e civil da sociedade: as eleições passam a ser indiretas, os movimentos de contestação e de organização política são severamente perseguidos e a liberdade de expressão é tolhida por meio da censura aos meios de comunicação. Somente a partir do governo do general Geisel (1974-1979) é que tem início um ‘lento e gradual’ processo de abertura política e consequente retomada da participação política e civil. Esse processo culmina em 1985 com a eleição de Tancredo Neves para a Presidência da República.

Com a redemocratização e a promulgação da Constituição de 1988, o Brasil entrou em um período de busca da cidadania plena. Observa-se que até 1988 o país viveu um processo dicotômico no que diz respeito à cidadania: há momentos em que se acentua mais o aspecto político (em detrimento dos outros); outros em que o aspecto social ganha primazia; e ocasiões em que o aspecto civil tem seu destaque.

A análise do percurso histórico do conceito de cidadania no Brasil mostra que ainda não se atingiu um estado de cidadania plena justamente por se ter vivido – por quase dois séculos inteiros – um período de cidadania restrita, que se caracteriza, sobretudo, pelo fato de uma elite dominante determinar, segundo sua ótica, quem seriam os cidadãos e quais seriam seus direitos para, de fato, serem considerados cidadãos.

Além disso, a noção de cidadania no Brasil mostra-se restrita em praticamente todo o percurso de sua história como nação independente justamente pelo fato de não se desenvolver, em conjunto, os aspectos civil, social e político. A essa tríade pode-se (e deve-se) acrescentar também a diversidade e o multiculturalismo. Essa análise mostra que, na atualidade, há uma forte luta com o intuito de quebrar esse paradigma para que, de fato, o brasileiro possa se apropriar, de forma mais plena, do status de cidadão.

2.3 DEMOCRACIA, PARTICIPAÇÃO SOCIAL E CIDADANIA NA EDUCAÇÃO: O CONCEITO DE GESTÃO DEMOCRÁTICA E SUA RELAÇÃO COM A QUALIDADE NA EDUCAÇÃO

Imagem

Gráfico 1. Distribuição dos pareceres emitidos pelo CEDF em 2011
Gráfico 2. Distribuição dos pareceres emitidos pelo CEDF em 2012
Tabela 2. Organização percentual e temática da distribuição dos pareceres emitidos pelo CEDF em 2012  Temática  dos  pareceres  A  B  C  D  E  F  G  H  I  J  K  L  M  %  39,44  45,07  3,17  0,70  1,76  0  3,17  0  0,70  0  3,17  0,35  1,06  284  112  128

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