Percepção de risco, ameaça e
desigualdades sociais
Maria Luisa Lima CIS/ISCTE-IUL, Lisboa
Seminário Ambiente Urbano e riscos
Instituto superior de engenharia de lisboa, 23 março 2012
Risco
• Quais as hipóteses de ocorrer?Probabilidade de ocorrência de um evento negativo
• Qual a gravidade das consequências? Extensão e gravidade dos danos
Risco e Ciência
•
Ciências físicas:pode ser avaliado quantitativamente
•
C. Sociais:Quem decide a gravidade dos danos? Danos para quem?
Sabemos bastante sobre
percepção de riscos
•
Que riscos tememos?Sabemos bastante sobre
percepção de riscos
•
Que riscos tememos?•
Que efeitos tem a experiência do risco?(e.g., Lima, 2004; Lima, Barnett & Vala, 2005)
La certitude, Gilbert Garcin, 2002
Sabemos bastante sobre
percepção de riscos
•
Que riscos tememos?•
Que efeitos tem a experiência do risco?•
A adesão a valores sociais tem impacto?Sabemos bastante sobre
percepção de riscos
•
Que riscos tememos?•
Que efeitos tem a experiência do risco?•
A adesão a valores sociais tem impacto?•
Qual a influência dos media?(e.g., Castro, Correia e Lima, 2006; Lima, Sobral, Castro & Sousa, 2007)
POCTI/HCT/60718/2004 PIQS/PSI/50070/2003
Para que serve o estudo da
percepção de riscos?
•
A percepção de riscos tem um papel muitosecundário na determinação dos comportamentos
Ameaça
Risco percebido e
comportamento
Percepção de risco de acidente de trabalho Comportamentos de protecção Comportamentos de riscoAmeaça
Risco percebido e
comportamento
Percepção de risco de acidente de trabalho Comportamentos de protecção Comportamentos de risco r=.01 r=-.04Ameaça
Risco percebido e
comportamento
Percepção de risco Comportamentos de saúdeModelo das crenças de saúde (Rosenstock, 1974) Modelo da motivação para a protecção (Rogers, 1975) Modelo de auto-regulação (Leventhal et al., 1980) Teoria do comportamento planeado (Ajzen, 1985)
Ameaça
Risco percebido e
comportamento
Percepção de risco Comportamentos de saúde Harrison et al., 1992 McCaul et al., 1996 Floyd et al., 2000 Milne et al., 2000 Brewer et al., 2007 Meta-análises: efeitos fracos ou inexistentesAmeaça
Risco percebido e
comportamento
Percepção de risco Comportamentos prevenção face a desastresAmeaça
Risco percebido e
comportamento
Percepção de risco Comportamentos prevenção face a desastres efeitos fracos ou inexistentes Cheias: Siegrist & Gutscher, 2006Miceli et al., 2008 Sismos: Jackson, 1981
Rustemli & Karanci, 1999 Lindel & Whitney, 2000 Tornados: Weinstein et al., 2000 Vulcões: Patton et al., 2000
Para que serve o estudo da
percepção de riscos?
•
A percepção de riscos tem um papel muitosecundário na determinação dos comportamentos
•
Preditor indirecto do comportamentoNovas direcções no estudo da
percepção de riscos?
•
Provavelmente porque a deliberaçãosistemática e racional não é a base do nosso comportamento habitual
Novas direcções no estudo da
percepção de riscos?
•
Modelos duais–
em comportamentos de saúde(e.g., Gibbons et al., 2003; Gerrard et al., 2005)
–
em comportamentos ambientais(Ohtomo & Hirose, 2007)
–
Decisões deliberadas–
Decisões reactivasNovas direcções no estudo da
percepção de riscos?
•
Provavelmente porque a deliberaçãosistemática e racional não é a base do nosso comportamento habitual
•
Aumento substancial do poder preditivoNovas direcções no estudo da
percepção de riscos?
•
Heurística do afecto(Finucane et al., 2000; Slovic & Peters, 2006) Afecto
+/-Risco percebido Benefícios percebidos
Ameaça
Risco percebido e
comportamento
Afecto (quanto o preocupa?) Comportamentos prevenção face a cheiasPercepção de risco de cheias como
Probabilidade (qual a probabilidade?)
Novas direcções no estudo da
percepção de riscos?
•
Muitas operacionalizações diferentes, omesmo nome para conceitos muito diferentes
•
Necessidade de clarificação–Weinstein et al., 2007
–Brewer et al., 2007
Novas direcções no estudo da
percepção de riscos?
Os nossos estudos aplicados
1997 – EIA incineradora de Resíduos Sólidos de Lisboa. (Valorsul) 1997 – EIA incineradora de Resíduos Sólidos do Porto (Lipor)
Desde 1998 – Monitorização Psicossocial da incineradora de Resíduos Sólidos do Porto (Lipor)
2005 – EIA da incineradora de Resíduos Hospitalares de Lisboa (SUCH) 2007 – Adesão das Comunidades ao Projecto do novo aeroporto da Ota (NAER)
2009 – Adesão das Comunidades ao Projecto da Barragem do Fridão (EDP) 2007 – Impacto social das operações florestais (Aliança Florestal/Soporcel) 2000 – EIA da Central de Valorização Orgânica (Compostagem) (Valorsul)
Os nossos estudos aplicados
Estimativa de risco
-
Estimativa da probabilidade deocorrência de consequências negativas
Sentimento de Ameaça
- Sentimento de vulnerabilidade e de medo face à situação
Os nossos estudos aplicados
Estimativa de risco
-
OperacionalizaçãoQuais são os riscos das Incineradoras de resíduos hospitalares para a sociedade portuguesa como um todo? (1=NENHUM RISCO 5=MUITÍSSIMO RISCO
Qual é a probabilidade de uma pess oa ficar doente, devido à poluição produzida pela incineradora do Parque de Saúde de Lis boa?
T enho a certeza que não vai acontecer Tem 50% de probabilidades de acontecer Tenho a certeza que vai acontecer 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
Os nossos estudos aplicados
Sentimento de ameaça
-
OperacionalizaçãoAté que ponto as Incineradoras de resíduos hospitalares lhe causam: - Preocupação
- Medo
1=NENHUM 5=MUITÍSSIMO
Gostaríamos que avaliasse o risco que a central de incineração de resíduos hospitalares do Parque de Saúde de Lisboa representa: NENHUM RISCO POUCO RISCO ALGUM RISCO BASTANTE RISCO MUITÍSSIMO RISCO Para si e para os seus
familiares 1 2 3 4 5
Para as pessoas do seu
Os nossos estudos aplicados
Expectativas de oportunidades
-
OperacionalizaçãoQuais são os benefícios das Incineradoras de resíduos hospitalares para a sociedade portuguesa como um todo? 1=NENHUM Benefício 5=MUITÍSSIMO Benefício
Na sua opinião as incineradoras de resíduos hospitalares trazem mais vantagens ou desvantagens? Praticamente só
desvantagens 1 2 3 4 5
Praticamente só vantagens
Ameaça como principal preditor
Ameaça como principal preditor das atitudes face à construção da incineradora de Lisboa e do Porto
Ameaça como principal preditor
Risco Ameaça Oportunidade .019 -.139** .361** Comporta mento R2Aj=.182Exemplo: Estudo aeroporto
Questão cientificamente
relevante (1)
• O que faz um acontecimento incerto ser visto como uma oportunidade ou como uma
ameaça?
- A percepção de justiça no processo:
Processos transparentes e participados, em que as comunidades locais têm espaço para expressar as suas opiniões promovem uma visão de
Questão cientificamente
relevante (1)
• O que faz um acontecimento incerto ser visto como uma oportunidade ou como uma
ameaça?
- A confiança nos actores do processo:
Quando existe confiança entre os diversos actores sociais é mais provável que haja uma visão de oportunidade
Lima, M. L. (2006). Predictors of Attitudes towards the Construction of a Waste Incinerator: Two Case Studies.
Journal of Applied Social Psychology, 36 (1), 441 - 466
Questão cientificamente
relevante (2)
• Interpretar o acontecimento como
oportunidade ou ameaça tem consequências para as comunidades?
-Sim:
Ver o evento como uma ameaça está associado a diminuição da qualidade de vida psicológica (bem estar psicológico, stress e ansiedade)
E para além das percepções?
A exposição aos riscos é desigual
Lima, M.L. (2008). Percepção de riscos e desigualdades sociais. In J. Madureira Pinto & V. B. Pereira (Orgs.),
Desigualdades, Desregulação e Riscos nas Sociedades Contemporâneas (pp. 267-290). Porto: Afrontamento.
Justiça ambiental
• afirmação do direito de todos a seremprotegidos pelas leis e regulamentos ambientais e de saúde
• luta contra a exposição desproporcionada dos grupos destituídos de poder a situações de degradação ambiental
Riscos:
um caso de Injustiça ambiental (1)
As pessoas que vivem na proximidade de fontes de poluição ou de risco ambiental são normalmente mais pobres do que as que vivem longe delas
(Adeola, 1994)
Incineradora do Porto:
Níveis de escolaridade da população por proximidade
0 10 20 30 40 50 60 70 80 1km 10km
até ao 4º ano superior ao 9º ano
LL1
Riscos:
um caso de Injustiça ambiental (1)
As pessoas que vivem na proximidade de fontes de poluição ou de risco ambiental são normalmente mais pobres do que as que vivem longe delas
(Adeola, 1994)
Incineradora do Porto:
Níveis de escolaridade da população por proximidade
10 20 30 40 50 60 70 80 10 20 30 40 50 60 70 80 LL3
Slide 35
LL1 Luisa Lima; 23-03-2012
Slide 36
Riscos:
um caso de Injustiça ambiental (2)
As pessoas mais pobres estão mais
frequentemente sujeitas a níveis superiores de risco ambiental
(e.g., Evans & Kantrowitz, 2002)
Riscos:
um caso de Injustiça ambiental (3)
As pessoas mais pobres têm menos meios para se protegerem contra a exposição a riscos
(e.g., Terney, Lindell & Perry, 2001 )
Cheias:
Os mais pobres têm ajustamentos menos
eficientes, como protecções nas portas (Lima, 1996)
Riscos:
um caso de Injustiça ambiental (4)
As pessoas mais pobres estão menos informadas sobre os riscos que correm
(questões de formato e de linguagem)
Incineradora:
a escolaridade está associada à
• Informação sobre incineração: (r=0,22; p<0,001) • informação sobre o processo
de tomada de decisão (r=0,26; p<0,001)
Riscos:
um caso de Injustiça ambiental (5)
As pessoas mais pobres têm menos poder para influenciar os processos de tomada de decisão em matéria ambiental
Riscos e Injustiça ambiental
As desigualdades ambientais acentuam asdesigualdades sociais, porque
• dinâmica do mercado (indústrias procuram terrenos baratos e ao instalarem-se ainda os desvalorizam mais) • menor capacidade de mobilização social em zonas
pobres
• segregação racial e infra-humanização dos elementos minoritários
E para além das percepções?
Os impactos dos desastres são
desiguais
Há desastres naturais?
“Reducing Disaster Risk: A Challenge forDevelopment”
Relatório do PNUP (2004)
n 75% da população do mundo vive em
áreas afectadas pelo menos uma vez entre 1980-2000 por tremores de terra, ciclones, cheias ou secas
n Em média há 184 mortes por dia atribuíveis
directamente a estas causas
Desastres naturais:
desigualdades nas consequências
• Nos países menos desenvolvidos– Vive 11% da população exposta aos desastres naturais – Encontram-se 53% dos mortos em desastres naturais • Nos países mais desenvolvidos
– Vive 15% da população exposta aos desastres naturais – Encontram-se 1.8% dos mortos em desastres naturais
Países com mais mortes devidas a
desastres naturais
0 150 300 450 600 Afganistão Mauritania Bangladesh Venezuela Honduras Etiopia Sudão Armenia Moçambique Rep Dem CoreiaNº de mortos por milhão hab (Fonte: PNUD, 2004)
Desastres naturais:
desigualdades nas perdas
0 100 200 300 400 500 600 700 800 900 0 20000 40000 60000 80000 100000 120000 140000 160000 180000
Desastres naturais:
desigualdades nos impactos indirectos
• Custos directos: físicos (casas, fábricas,
armazéns), infra-estruturas económicas (estradas, electricidade) e sociais (escolas)
• Custos indirectos: alteração na circulação de bens e serviços, fornecimento de serviços básicos, custos de saúde
• Efeitos secundários: consequências a médio e longo prazo (pobreza e exclusão, endividamento nacional)
Desastres naturais:
desigualdades no tsunami de 2004
• Desigualdades no acesso ao sistema de alerta
Existência de sistema de detecção de tsunamis no Pacífico (Japão e EUA), mas não no Índico
• Desigualdades nos impactos:
Maldivas – 100 mortos e 12.000 deslocados, mas país pobre,
totalmente dependente do turismo e da pesca
Índia – 10.000 mortos e 150.000 deslocados, uma potência mundial que não quer ajuda internacional para a reconstrução
O tsunami agravou assimetrias de
Dois conselhos de quem já anda
nisto há muito tempo
Se querem prever comportamentos, não se foquem na percepção de risco e centrem-se antes no sentimento de ameaça
A nossa equipa de pesquisa tem instrumentos estáveis, válidos e desenvolvidos para Portugal que permitem diferenciar os dois conceitos
Dois conselhos de quem já anda
nisto há muito tempo
Não deixem que as questões interessantes das diferenças na percepção de risco vos deixem cegos às enormes desigualdades e injustiças ambientais – de que o risco é parte integrante
Percepção de risco, ameaças e
desigualdades sociais
Maria Luisa Lima luisa.lima@iscte.pt
Seminário Ambiente Urbano e riscos