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Componentes estruturais da desindustrialização : uma análise da economia brasileira para o período 2003-13

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INSTITUTO DE ECONOMIA

DANIEL CHAVES DRACH

Componentes estruturais da

desindustrialização: uma análise da

economia brasileira para o período 2003–13

Campinas

2016

(2)

af ..

�-,.

UNICAMP UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ECONOMIA

DANIEL CHAVES DRACH

Componentes estruturais da desindustrialização: uma análise da

economia brasileira para o período 2003-13

Prof. Dr. Marcelo Pereira da Cunha -orientador

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Económicas da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do titulo de Mestre em Ciências Económicas.

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL

DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELO ALUNO DANIEL CHAVES DRACH E ORI �DA PELO PROF. DR.

MARCELO PEREIRA DA UNHA.

CAMPINAS 2016

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Ficha catalográfica

Universidade Estadual de Campinas Biblioteca do Instituto de Economia

Mirian Clavico Alves - CRB 8/8708

Drach, Daniel Chaves,

D78c DraComponentes estruturais da desindustrialização : uma análise da economia brasileira para o período 2003-13 / Daniel Chaves Drach. – Campinas, SP : [s.n.], 2016.

DraOrientador: Marcelo Pereira da Cunha.

DraDissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Economia.

Dra1. Desindustrialização. 2. Economia - Brasil. 3. Relações intersetoriais. I. Cunha, Marcelo Pereira da,1967-. II. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Economia. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: Structural determinants of deindustrialization : a 2003-13 analysis

of the brazilian economy

Palavras-chave em inglês:

Deindustrialization Economics - Brazil Intersectoral relations

Área de concentração: Teoria Econômica Titulação: Mestre em Ciências Econômicas Banca examinadora:

Marcelo Pereira da Cunha [Orientador] Joaquim José Martins Guilhoto

Célio Hiratuka

Data de defesa: 29-02-2016

Programa de Pós-Graduação: Ciências Econômicas

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DANIEL CHAVES DRACH

Componentes estruturais da desindustrialização: uma

análise da economia brasileira para o período 2003-13

Defendida em 29/02/2016

COMISSÃO JULGADORA

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of intelligent animals deals with the brute force at its disposal. It is a question of how the human agent deals with his means of life, not of how the forces of the environment deal with man. (VEBLEN, 1908, p.542)

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A presente dissertação se propõe a trazer contribuições qualitativas para o debate da desindus-trialização no Brasil; para isso, se aplica um modelo de decomposição estrutural às matrizes insumo-produto de 2003 e 2013, estimadas a partir das tabelas de recursos e usos do IBGE, de modo a explicar as mudanças das participações do emprego industrial no emprego total em função: (1) de variações na escala e na composição — padrões de consumo — da demanda fi-nal; (2) das evoluções observadas nos processos de substituição ou penetração de importações nos consumos intermediário e final; (3) e de modificações na eficiência produtiva. Mais do que trazer uma resposta binária — ocorreu ou não ocorreu desindustrialização — o intuito é o de explorar alguns dos determinantes estruturais desta dinâmica sob a ótica do emprego, forne-cendo elementos para uma compreensão mais aprofundada da dinâmica industrial recente no país. Se conclui que o aumento de participação da indústria da transformação no emprego total observado para o período analítico configura uma espécie de “industrialização negativa” que deriva de reduções na eficiência produtiva industrial em relação àquela do restante da econo-mia. Além disso se observa uma espécie de “desagriculturalização positiva”, com os setores da agropecuária perdendo participação no emprego total devido aos seus elevados ganhos de efi-ciência produtiva. Ou seja, existem indícios de um processo de especialização regressiva para a economia brasileira no período analisado, com o dinamismo tecnológico se concentrando nos setores primários da economia.

Palavras-chaves: Desindustrialização, Emprego Industrial, Insumo-Produto, Decomposição Es-trutural, Especialização Regressiva.

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The present thesis aims at offering contributions to the Brazilian deindustrialization debate by means of a structural decomposition analysis model (SDA) applied to the 2003 and 2013 Brazil-ian input-output matrices, estimated from the National Accounts, IBGE. This model explains changes in the share of the industrial employment in the economy as a function of: (1) varia-tions in both the scale and composition of the final demand; (2) shifts in the imports substitution or penetration patterns, as either final or intermediate consumption absorbs less or more im-ported content; (3) changes in the general level of productive efficiency in industrial sectors, in relation to the economy’s average efficiency. The goal is to explore the underlying determinants of Brazilian industrial employment evolution in recent years, trying to dodge the commonplace binary question — deindustrialization or not deindustrialization. The study concludes that the increase of industrial employment as a share of total employment observed derives from relative losses in terms of industrial productive efficiency, in a sort of “negative industrialization”. Be-sides that, the employment share of the primary sectors in relation to the total economy decreases due to substantial productive efficiency gains. The conjunction of these movements suggests that, between 2003 and 2013, the Brazilian economy followed a path of structural specialization in primary sectors.

Keywords: Deindustrialization, Industrial Employment, Input-Output Analysis, Structural De-composition Analysis.

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Tabela 1 – Diferentes Abordagens no Debate de Mudança Estrutural da Indústria no Brasil 28

Tabela 2 – Desenvolvimentismos, o novo e o “velho” . . . 34

Tabela 3 – Principais Indicadores da Abordagem Intrassetorial . . . 38

Tabela 4 – Conclusões de Morceiro, mudança estrutural brasileira . . . 41

Tabela 5 – Matriz de transações estilizada . . . 45

Tabela 6 – Interpretações dos efeitos do modelo proposto . . . 51

Tabela 7 – Evolução macro setorial do valor adicionado (2003–13) . . . 62

Tabela 8 – Fontes da variação absoluta do emprego por macro-setores (2003–13) . . . 63

Tabela 9 – Decomposição da variação do share do emprego, macro-setores . . . 64

Tabela 10 – Decomposição da variação absoluta do emprego, intensidade tecnológica . . 68

Tabela 11 – Decomposição estrutural da variação do emprego . . . 87

Tabela 12 – Decomposição estrutural da variação no share do emprego setorial . . . 88

Tabela 13 – Setores perdedores e ganhadores de share . . . 90

Tabela 14 – Classificações dos setores da indústria . . . 93

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Figura 1 – Metas da SELIC, definidas pelo COPOM (2008–2015) . . . 7

Figura 2 – Participação do emprego industrial no total, regiões selecionadas (1960–1994) 14 Figura 3 – Categorização do conceito tradicional de desindustrialização . . . 17

Figura 4 – Variação “natural” da composição setorial do emprego . . . 19

Figura 5 – Participação da indústria no PIB, correções de Bonelli e Pessôa . . . 30

Figura 6 – Preços internacionais das commodities e termos de troca (2005=100) . . . . 32

Figura 7 – Saldos comerciais brasileiros por categoria tecnológica (1996–2008) . . . . 36

Figura 8 – Taxa de câmbio efetiva real e balança comercial (2000–2015) . . . 37

Figura 9 – Participação da indústria no valor adicionado, por intensidade tecnológica . 39 Figura 10 – Determinantes da variação absoluta do emprego, total da economia . . . 59

Figura 11 – Determinantes da variação absoluta do emprego, setores perdedores e ganha-dores (total) . . . 60

Figura 12 – Determinantes da variação relativa do emprego, setores perdedores e ganha-dores (total) . . . 60

Figura 13 – Evolução da estrutura macro setorial, valor adicionado e emprego . . . 61

Figura 14 – Determinantes da variação absoluta do emprego, macro setores . . . 63

Figura 15 – Determinantes da variação relativa do emprego, macro setores . . . 65

Figura 16 – Determinantes da variação relativa do emprego, perdedores e ganhadores (indústria) . . . 67

Figura 17 – Determinantes da variação absoluta do emprego, intensidade tecnológica . . 69

Figura 18 – Determinantes da variação relativa do emprego, por intensidade tecnológica 70 Figura 19 – Cinco principais ganhadores e perdedores de participação relativa no emprego 71 Figura 20 – Variação da participação no emprego total, por intensidade tecnológica . . . 72

Figura 21 – Determinantes da variação absoluta do emprego, paradigma fordista . . . . 73 Figura 22 – Diferenças entre indústria com e sem a inclusão da SIUP e Construção Civil 92

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Introdução . . . . 1

O fim da ISI e a ascensão do Modelo Neoliberal . . . 4

O “Desenvolvimentismo” do Governo Lula . . . 5

O primeiro governo Dilma . . . 6

Proposta do trabalho . . . 8

Estrutura do trabalho . . . 9

1 O conceito de desindustrialização no debate internacional e suas rami-ficações locais. . . . 11

1.1 Indústria e desenvolvimento . . . 12

1.2 O conceito tradicional de desindustrialização e suas extensões . . . 14

1.2.1 Desindustrialização positiva . . . 18

1.2.2 Desindustrialização negativa . . . 20

1.3 Causas da desindustrialização . . . 21

1.3.1 Duas abordagens para o conceito de doença holandesa . . . 24

1.4 O debate brasileiro . . . 27

1.4.1 Argumentos da abordagem liberal . . . 29

1.4.2 Argumentos da abordagem novo-desenvolvimentista . . . 33

1.4.3 Argumentos da abordagem intra-setorial . . . 37

2 Metodologia . . . . 43

2.1 O modelo insumo-produto . . . 43

2.2 Dados utilizados e métodos de estimação das matrizes . . . 46

2.2.1 Retirando o efeito preço . . . 47

2.3 Método de decomposição estrutural (SDA) . . . 47

2.3.1 O Modelo de Kupfer, Freitas e Young . . . 48

2.3.2 Avaliando a desindustrialização pela SDA . . . 51

3 Resultados . . . . 57

3.1 Considerações preliminares . . . 57

3.2 Variação do emprego no total da economia . . . 59

3.3 Comportamento dos macro-setores . . . 61

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4 Conclusão . . . . 75

Referências . . . . 81

APÊNDICE A Dados Brutos do Modelo . . . . 87

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Introdução

A dinâmica industrial brasileira das últimas décadas bem como suas relações com a política econômica foi e ainda é bastante conturbada. Assim como em outros países, onde diferentes paradigmas teóricos implicaram contrapartidas tangíveis no que diz respeito à condução da po-lítica econômica e industrial, no Brasil estes mesmos paradigmas geraram adaptações locais, com suas particularidades teóricas e consequências práticas profundas. Passou-se de uma ide-ologia1 desenvolvimentista dos anos de 1950-80, para uma ideologia do liberalismo moderado do “Consenso de Washington” (WILLIAMSON, 2008) a partir de meados de 1994, na qual o Estado era visto como um protagonista menor e a estabilidade macroeconômica passaria a ser o principal objetivo. A partir da ascensão do Partido dos Trabalhadores (PT) ao governo, persistiu-se com algum meio termo entre estas duas posições; na esfera estritamente econômica continuou-se na trajetória iniciada pelos governos Fernando Henrique Cardoso (FHC) (MO-RAIS; SAAD-FILHO, 2011), implementando-se uma espécie de “desenvolvimentismo às aves-sas” (GONÇALVES, 2012b) enquanto na esfera social mudanças apreciáveis são observáveis. Cada uma destas ideologias traz imbuída em seu processo de formação histórica uma visão acerca do papel ou não papel do Estado como indutor do “desenvolvimento”, bem como das relações da indústria com o sistema distributivo nacional e internacional. Tais visões são inevita-velmente balizadas pela antiga oposição entre: de um lado, a crença na eficiência e infalibilidade dos mecanismos alocativos do mercado; e do outro lado, a ideia de que a ação governamental dotada de propósito e direcionada a um objetivo socialmente desejável deve seguir como guia último para os falhos mecanismos alocativos do sistema de preços. Porém, a diferença entre ambas as posições não se restringe apenas à dicotomia entre o protagonismo do Estado ver-sus protagonismo do mercado, também diz respeito ao diagnóstico do papel da indústria como indutora do “desenvolvimento social”.

Para os teóricos radicais de inclinação liberal-econômica parece não existir uma composição desejável entre o tamanho do setor de transformação e o dos setores primário e terciário — tanto faz se produzimos bananas ou microchips —, é como se a única regra válida fosse a das “vantagens comparativas estáticas” (RICARDO, 1817), ou seja, o país deve se especializar na-1 Aqui o termo é utilizado em um sentido vulgar, pretende-se englobar um “conjunto de ideias, convicções e

princípios filosóficos, sociais, políticos que caracterizam o pensamento de um indivíduo, grupo, movimento, época, sociedade”.

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queles setores nos quais produz com maior eficiência pecuniária no presente momento e utilizar o mercado internacional para satisfazer suas outras necessidades de consumo através da troca de sua produção por aquela de outros países, assim se maximizaria o bem estar social em âmbito global. Caso se produzam bananas deve-se adquirir microchips com os fundos oriundos de ex-portações de bananas e vice-versa, dentro desta ideologia o bem estar geral do país que produz bananas seria mais baixo caso ele tentasse se dedicar à produção — de forma inevitavelmente ineficiente — ao invés da importação de microchips.

Já os teóricos de vertentes desenvolvimentistas e economistas heterodoxos tendem a distinguir o setor secundário dos demais; para eles, o crescimento do setor de transformação se confi-gura como um objetivo central, sendo esta escolha derivada da percepção generalizada de que o mesmo possuí características específicas que o distinguem dos setores primário e terciário. Por exemplo, dentro de uma perspectiva pós-keynesiana, como argumenta Kaldor (1968, pp.386-87), a indústria teria papel central no processo de desenvolvimento econômico, sendo a “matu-ridade econômica” atingida através dos ganhos de produtividade no setor industrial que tendem a irradiar para o resto da economia. Para vertentes schumpeterianas o setor industrial, em espe-cial as firmas industriais, formariam o “lócus privilegiado da inovação”, inovação esta que seria o único fator indutor do real “desenvolvimento” (SCHUMPETER, 1934) — como oposto ao simples crescimento da economia.

Já o pensamento cepalino, que está na base do nacional-desenvolvimentismo brasileiro, parece considerar que para superar o subdesenvolvimento e lograr uma inserção mais equitativa dos países subordinados rompendo com a clássica divisão “centro-periferia” (PREBISCH, 1962) que vigora no sistema internacional de divisão do trabalho, políticas direcionadas à indústria são imperativas. Esta divisão constantemente negaria à periferia o acesso aos benefícios oriundos dos ganhos de produtividade do setor industrial. Os cepalinos ainda destacariam uma miríade de fatores que agravariam a situação frágil da periferia: o alto valor agregado dos produtos da indústria frente aos produtos primários, bem como a baixa elasticidade renda dos últimos, imporiam uma dinâmica de crescimento truncada aos países periféricos; além disso, a elevada elasticidade preço das matérias primas — exportações dos países periféricos — seriam indutoras de uma grande vulnerabilidade externa na medida que geram grande volatilidade nos preços destas mercadorias.

Em suma, parece haver larga concordância dentro de variadas correntes heterodoxas de pensa-mento econômico que a questão industrial está inequivocadamente conectada à ideia de

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desen-volvimento social, e que, além disso, existe uma necessidade estratégica de se atingir um dado grau de desenvolvimento das forças industriais para que se possa gozar de relativa segurança frente às turbulências da economia internacional. Portanto, deve-se lançar um olhar especial so-bre a indústria, utilizando-se de políticas e instrumentos que objetivem a criação de um parque industrial nacional como pré condição para a superação da condição de sub-desenvolvimento. Como destacado por Gonçalves (2012b), a leitura liberal e sua ênfase nas “vantagens compa-rativas estáticas” ricardianas não é de todo rejeitada pelo pensamento desenvolvimentista; ao invés disso, se reconhece a existência de um conjunto de fenômenos — curvas de aprendizado, learning by doing, entre outros — que criam uma inércia inicial, colocando países periféricos em uma posição de desvantagem temporária ao competir com os desenvolvidos na manufatura. Esta barreira inicial, ou “desvantagem comparativa estática”, pode ser combatida a médio e curto prazos através de mecanismos de proteção parcial à indústria nascente — substituição de im-portações — e de incentivos creditícios, fiscais tecnológicos, entre outros, de modo que, a longo prazo, e com a incidência de fatores dinâmicos que possam modificar a estrutura econômica, este mesmo país seria capaz de superar sua posição de desvantagem.

Em outras palavras, uma desvantagem estática, quando se considera a estrutura produtiva que o país possui em um dado instante no tempo, não necessariamente implica em uma desvantagem dinâmica, quando se consideram suas potencialidades no futuro. Chang (2002, pp.4-5), a título de exemplo, destaca que os Estados Unidos da América — EUA — já foram considerados (SMITH, 1776) uma nação com vocação indubitavelmente agrícola; sob uma perspectiva da economia liberal e sob a vigência da lei das vantagens comparativas seria uma tolice que o país se dedicasse a nada mais do que a agricultura. Algumas décadas depois dos comentários de Smith (1776) assiste-se a emergência dos EUA como uma das principais potencias industriais do mundo2.

Até agora o foco foi direcionado a uma breve apresentação do pano de fundo ideológico sob o qual se desenrolou, e ainda se desenrola, a disputa por um projeto econômico para o Brasil. As inflexões históricas, os debates políticos, apesar de possuírem peculiaridades importantes, frequentemente podem ser decompostos em variações das posições apresentadas, cuja forma geral foi estabelecida há muito tempo. São de especial interesse os seguintes momentos históri-cos da política industrial doméstica: (1) a retomada do liberalismo sob a roupagem peculiar do

2 Vale destacar que o potencial agrícola norte-americano ainda o mantém na posição de grande potência neste

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“Consenso de Washington”, de forma branda na virada para a década de 1990, e de forma mais contundente a partir da implementação do Plano Real; (2) o “desenvolvimentismo às avessas” do governo PT, que traz uma prática econômica liberal bastante distinta do discurso desenvol-vimentista subjacente.

O fim da ISI e a ascensão do Modelo Neoliberal

A ideologia nacional-desenvolvimentista, em especial em sua versão latino-americana, foi rela-tivamente influente no período que se iniciou na década de 1950 e terminou na de 1980, sendo talvez o ápice desta influência localizado na primeira década deste período (COLISTETE, 2001). Durante esta fase se implementou, a grosso modo, um regime de “industrialização por substi-tuição de importações” — ISI —, (TAVARES, 2011, p.73). O objetivo central do ISI seria o de “deslocar o centro dinâmico” da economia do setor externo para a demanda interna, da expor-tação para o consumo interno, sendo o ato de substituir importações orientado para o objetivo final de adensar as cadeias produtivas nacionais e criar uma malha industrial completa.

Tal modelo passou por algumas etapas históricas no caso brasileiro, sendo seu ápice e posterior esgotamento alcançado durante a execução do II Plano Nacional de Desenvolvimento, iniciado em 1974. Com a implementação do referido plano completou-se o movimento de adensamento da estrutura produtiva que se iniciara na década de 1950, com o Plano de Metas do então pre-sidente Juscelino Kubitschek, obtendo-se moderado sucesso na implementação de um setor de bens de capital relativamente completo no país (HERMANN, 2005).

Este último surto desenvolvimentista foi lentamente sucedido pela implementação nacional dos princípios pregados pelo Consenso de Washington. A deterioração das situações interna e ex-terna, determinada em boa parte pelo quadro de instabilidade econômica internacional crescente a partir do desmonte do sistema de Bretton Woods e pela correlata crise da dívida externa bra-sileira (CARNEIRO, 2012, p.765), catalisou o processo de aceitação das reformas neoliberais. Durante a década de 1990, e em especial após 1994, observou-se uma ascensão definitiva do ideário neoliberal ao governo brasileiro, sendo implementadas a partir deste ponto, inúmeras reformas de cunho liberalizante: abertura comercial, abertura financeira, âncora cambial, priva-tizações, entre outras.

Os princípios desenvolvimentistas que guiaram a gestão da política industrial nas décadas ante-riores foram subitamente revertidos; o fomento à indústria nascente e os incentivos ao aprofun-damento das cadeias industriais em direção aos setores base agora eram vistos através de uma

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perspectiva baseada nas vantagens comparativas estáticas. Ou seja, segundo o relato neoliberal, todo o esforço desenvolvimentista teria criado uma extensa distorção no sistema de preços e fomentado o surgimento de um conjunto enorme de setores desnecessários e ineficientes que contribuiriam para redução da competitividade, manutenção de taxas de lucro demasiadamente elevadas, aumento da inflação, estagnação da produtividade e consequente piora do padrão de distribuição de renda (FRANCO, 1998).

A onda liberalizante contaminou ânimos, prometendo uma correção automática das ineficiências alocativas promovidas pelo exagerado intervencionismo estatal das décadas precedentes; “novas ideias” pregavam uma política industrial não intervencionista, na qual as empresas locais seriam expostas à concorrência externa em um choque competitivo gerador de eficiência, que levaria à “redução de custos, aumentos de produtividade e introdução de novas tecnologias”. Setores ineficientes, inadequados e desnecessários seriam eliminados restando apenas aqueles realmente necessários e possuidores de vantagens comparativas reais — leia-se estáticas.

Os efeitos desta política industrial — ou ausência dela — sobre a estrutura produtiva brasileira são objeto de controvérsia até o presente momento. Se por um lado a modificação repentina do quadro competitivo destruiu muitas empresas nacionais, por outro vivenciou-se um extenso aumento na produtividade industrial (KUPFER et al., 2004). No entanto, é possível que este aumento de produtividade se deva, em boa parte, à especialização regressiva em direção a ati-vidades nas quais o país possuía vantagens comparativas estáticas, e ao aumento no uso de insumos importados levando a uma consequente fragilização das cadeias produtivas industriais. Novamente dois grupos de autores possuem leituras bastante distintas deste processo: enquanto aqueles de filiação mais liberal efetuavam uma leitura otimista do quadro aqueles de filiação desenvolvimentista enxergavam um perigoso esvaziamento produtivo, uma involução daquilo que foi conquistado no passado.

O “Desenvolvimentismo” do Governo Lula

O prelúdio à posse de Lula esteve marcado por um ambiente de grandes expectativas de mu-dança de rumo na condução da política econômica. Havia um temor, por parte dos defensores do liberalismo econômico — e uma esperança por parte da heterodoxia — de que se retornasse a uma política econômica desenvolvimentista. Temia-se que a retomada de uma política industrial ativa viesse a prejudicar a relativa estabilidade macroeconômica atingida no pós 1994. Porém, a despeito dos temores, o governo do PT vem sendo até o presente momento marcado, a despeito

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de algumas modificações substanciais, por uma relativa continuidade com a política econômica anterior.

Como destaca Erber (2011) parecem existir, no âmago dessa gestão, duas “convenções” em permanente disputa, e que se relacionam hierarquicamente: (1) uma neoliberal estrita, que prio-riza a estabilidade macroeconômica; (2) uma neodesenvolvimentista, que concilia uma agenda pós-keynesiana com um forte conteúdo neoliberal. Porém esse conflito se dá mais no campo ideológico, pois na prática se observaria que “a convivência entre elas se dá através da hege-monia da primeira [neoliberal estrita], que privilegia a estabilidade de preços ao custo de um desenvolvimento restrito” (ERBER, 2011, p.53). Em uma leitura mais radical de Gonçalves (2012a) e outros críticos, apesar da retórica “neodesenvolvimentista”, na prática se observaria uma espécie de “desenvolvimentismo às avessas”, com a inversão dos eixos estruturantes do desenvolvimentismo original e geração de “desindustrialização”, “fragilidade externa”, etc.

O primeiro governo Dilma

No primeiro mandato do governo Dilma, — que se extende do início de 2011 ao final de 2014 — se operou uma fracassada tentativa de reversão da política anterior, denominada de “nova matriz macroeconômica”3, tal reversão foi uma “tentativa de reconfigurar a ’matriz’ macroeconômica numa nova divisão de forças que favorecia a indústria nacional a partir da desvalorização cambial e da contração de custos, porém limitaria os ganhos do setor financeiro (privado) com juros e novos capitais” (MARTINS, 2015).

As mudanças eram substanciais, como destacam Modenesi et al. (2015): (1) o afrouxamento da política monetária4 — figura 1 — visava o estímulo à demanda agregada enquanto sinalizava que a política de controle de preços não seria seguida a qualquer custo; (2) vários instrumentos — medidas macro-prudenciais5— além da taxa de juros foram articulados no combate à infla-ção; (3) a política fiscal foi utilizada de forma contracíclica, em especial após a crise subprime; 3 Assim, foi reforçada a política anticíclica e adotada a chamada nova matriz macroeconômica, que consistiu

na construção das condições para a redução dos juros, acompanhada pela desoneração de impostos e pela

moderação da valorização do real, a partir do câmbio flutuante. Tudo isso resguardado o regime de metas de inflação e a manutenção de superávits primários consistentes com a redução da dívida pública.

(MINIS-TÉRIO DA FAZENDA, 2014, grifos nossos)

4 Apesar da existência de algumas reduções similares na SELIC — no final de 2008 início de 2009 — foi a

primeira vez que “BCB cortou a taxa Selic num contexto de inflação corrente em aceleração e de expectativas

de aceleração inflacionária no futuro” (MARTINS, 2015).

5 Como medidas “macroprudenciais” Serrano e Summa (2012, p.174) destacam: (1) o aumento do compulsório;

(2) aumento dos requerimentos de capital mínimo para algumas operações de crédito; (3) aumento do IOF; (4) aumento do percentual mínimo dos pagamentos de saldos do cartão de crédito.

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(4) a política creditícia foi alavancada e os bancos públicos foram utilizados para elevar a com-petitividade no mercado baixando o “spread” bancário; (5) medidas tais como implementação de controles de capitais foram tomadas visando evitar uma apreciação excessiva do Real.

2008 2009 2010 201 1 2012 2013 2014 2015 0% 5% 10% 15%

Figura 1 – Metas da SELIC, definidas pelo COPOM (2008–2015)

Fonte: Banco Central do Brasil

Existem diferentes leituras das razões que levaram ao fracasso da “nova matriz macroeconô-mica”; o relato ortodoxo se fixa em dois eixos argumentativos centrais:

O primeiro propõe o esgotamento do modelo de crescimento baseado no consumo; segundo este argumento a política de estímulo ao consumo, baseada na dobradinha aumentos reais de salário e política creditícia expansiva, levaram, por um lado, a um maior endividamento das famílias, e por outro, ao aumento do custo unitário em dólares da indústria nacional, derivado principalmente do descompasso entre estes aumentos salariais e a produtividade do trabalho (PARNES; HARTUNG, 2013).

O segundo se fixa na problemática trajetória da política fiscal do Governo: pelo lado do gasto existe uma forte rigidez à queda — que seria resultado das políticas sociais — enquanto as re-ceitas foram sistematicamente comprometidas pela política de isenções fiscais que objetivava estimular a indústria; esta mesma política de isenções teria gerado uma série de distorções alo-cativas, abalando a confiança do empresariado e reduzindo a sua propensão a investir. Por fim a “institucionalidade da gestão fiscal” teria sido comprometida pela explosão da “contabilidade criativa”, comprometimento este que teria gerado perda de credibilidade do governo e um con-sequente arrefecimento do investimento privado. Martins (2015, p.16) resume a argumentação deste grupo de autores:

À guisa de síntese, podemos afirmar que sob esta outra perspectiva, de filiação neoliberal, o primeiro governo Dilma pode ser resumido na tentativa fracassada de reavivar o consumo através do crédito, no excesso de intervencionismo, que gerou distorções e ampliou a incerteza, e na total perda de credibilidade na

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gestão fiscal, com resultados ruins e utilização de artifícios de contabilidade “criativa”. Além do mais, em nenhum momento o governo se voltou a políticas que buscassem ampliar a produtividade.

A heterodoxia atribui o fracasso da “nova matriz” a outros fatores; Serrano e Summa (2012) descartam a ideia de que tal fracasso resultaria de um cenário externo desfavorável — hipótese sustentada pelo governo —; chamam atenção para o papel da política fiscal restritiva do biênio 2011–12 que teria contraído a demanda, inibindo os investimentos privados. Neste sentido, a política de desonerações tributárias para a indústria é inócua, pois num cenário de demanda desaquecida o investimento privado é essencialmente inelástico à taxa de juros. Além disso, a política de desvalorização cambial também levaria a uma redução na demanda devido a seus efeitos negativos sobre o poder de compra dos salários.

Outros fatores seriam também determinantes; Martins (2015, p.10) ressalta que a capacidade de reação da indústria às desonerações tributárias e à queda nos juros era bastante baixa pois não se recuperam facilmente “décadas de erosão dos lucros, devido à exposição à competição externa (em especial, com a China) e, mais recentemente, ao crescimento dos salários, que diminuem a capacidade de acumulação interna das firmas”. Além disso, devido à crescente financeirização do setor industrial, a redução da rentabilidade relativa do setor financeiro teria também deprimido a rentabilidade da indústria, prejudicando sua capacidade de investimento.

Proposta do trabalho

Ou seja, a década de 2000 foi marcada por uma política econômica majoritariamente focada na estabilidade macroeconômica, à exceção de alguns episódios específicos a política indus-trial ficou essencialmente subjugada a este objetivo — predomínio da convenção “neoliberal estrita” (ERBER, 2011). Neste contexto é importante entender quais foram as consequências deste arranjo particular de políticas públicas sobre a estrutura industrial brasileira. Existe am-pla bibliografia que aborda o tema de mudança estrutural/desindustrialização para a economia brasileira — revisão apresentada na seção 1.4, capítulo 1 desta dissertação — porém este tra-balho propõe uma metodologia que possivelmente contribuirá qualitativamente para o debate, caracterizando a industrialização/desindustrialização brasileira no período 2003–2013 através de alguns de seus componentes estruturais.

Assim, a presente dissertação tem por objetivo geral quantificar as modificações estruturais da indústria brasileira, observadas no período 2003–13, pela ótica do emprego — medida

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clás-sica de desindustrialização —, através de uma análise dos dados provenientes das Tabelas de Recursos e Usos brasileiras. Como objetivo específico se pretende identificar alguns fatores que tenham contribuído para estas mudanças estruturais e quantificar/qualificar a contribuição de cada um deles pelo método de decomposição estrutural. Tal método será aplicado em uma forma específica, derivada do modelo apresentado por Kupfer et al. (2004), porém com algumas especificidades que são delineadas na seção 2.3 do capítulo 2.

A metodologia em questão permite a decomposição estrutural da variação do emprego em um elevado numero de componentes, o que possibilita que se explorem algumas interessantes lacu-nas identificadas na bibliografia sobre desindustrialização no Brasil. São de especial interesse os efeitos das variações nos coeficientes de importações tanto sobre o consumo intermediário — que influi sobre a densidade das cadeias produtivas — quanto sobre a demanda final, bem como os efeitos da mudança tecnológica, que permitem avaliar a evolução da estrutura industrial brasileira de uma forma mais qualitativa.

Estrutura do trabalho

Este trabalho é composto por quatro capítulos, a exceção desta introdução, o capítulo 1 efetua uma revisão da bibliografia sobre a desindustrialização tanto em uma perspectiva metodoló-gica quanto em uma prática — esta última focada no contexto brasileiro; o capítulo 2 apresenta em maior detalhe a proposta metodológica da presente dissertação, o foco do mesmo reside na seção 2.3.2, na qual se constrói uma forma de adaptar a metodologia de decomposição estrutu-ral desenvolvida por Kupfer et al. (2004) à discussão de desindustrialização no Brasil; o capí-tulo 3 apresenta os principais resultados encontrados, já interpretados e organizados de forma a realizar-se um diálogo com os argumentos apresentados no debate de mudança estrutural no Brasil, seção 1.4. Este trabalho termina com o capítulo 4, uma pequena conclusão na qual são sumarizados os principais resultados encontrados, apresentadas algumas limitações metodoló-gicas, e discutidas as perspectivas de continuidade e desenvolvimento futuro para pesquisas relacionadas ao tema aqui explorado.

(21)
(22)

1 O conceito de desindustrialização no debate internacional e suas

ramificações locais.

Este capítulo tem por objetivo central compilar os trabalhos de maior relevância encontrados até o presente momento que abordam a temática da “desindustrialização” ou da mudança es-trutural da indústria, tanto em um contexto internacional quanto com um enfoque para o caso brasileiro. Através desta revisão se pretende apreciar em que pés se sustenta o atual debate aca-dêmico sobre o tema, bem como quais foram as principais vias metodológicas escolhidas por seus participantes e os principais problemas teóricos enfrentados. Tal revisão é imprescindível, pois define quais são os possíveis caminhos a serem seguidos, fornecendo um panorama das lacunas de informação existentes no debate e ajudando na escolha do enfoque a ser imprimido. Além disso será explorada a dimensão teórica do debate sobre mudança estrutural e desindus-trialização, bem como das relações teóricas entre a industria e desenvolvimento identificadas. A seção 1.1 apresentará brevemente a oposição entre a perspectiva “setor-neutra” e a “setor específica” explicitando o paralelo das mesmas com diferentes escolas de teoria do crescimento. Em seguida — ainda na seção 1.1 — se pretende relatar de forma mais detalhada a visão “setor-específica” adentrando-se em parte da literatura que justifica a escolha do setor industrial como o centro dinâmico da economia por excelência.

Já na seção 1.2 serão apresentados os distintos conceitos de desindustrialização; existem algumas diferentes “definições”1 para este conceito na bibliografia internacional, tendo a maioria delas, à exceção uma corrente específica — visão de Cambridge —, o trabalho de Rowthorn e Wells (1987) como ponto de partida. Morceiro (2012) identifica a existência de três distintos grupos de autores no debate internacional sobre desindustrialização: (1) a corrente tradicional, composta de um grande grupo que conta com autores como Rowthorn e Wells (1987), Palma (2005) e outros, e que tende a se focar na participação da indústria no emprego total como sinalizador central de um processo de desindustrialização; (2) uma extensão da corrente tradicional, que engloba autores tais como Tregenna (2009) e Chang (2002), e que também considera a dimensão da produção — participação da indústria no PIB ou valor adicionado —, conjunta ou separadamente do emprego como sinalizadores deste processo; (3) a visão de Cambridge, que propõe um foco 1 Como será explicado mais adiante existem problemas com a abordagem tomada pela maior parte dos autores

desta bibliografia, como destaca Morceiro (2012, pp.24-44) em geral se escolhe definir o fenômeno da desin-dustrialização através da proposição de um método de mensuração e não da exposição do sentido essencial do termo.

(23)

no setor externo, em especial na incapacidade de se manter uma balança comercial equilibrada, como sinal de ocorrência da desindustrialização. As duas primeiras visões2 destacadas acima serão abordadas na seção 1.2 dedicada a apresentar tanto o conceito tradicional quanto suas extensões.

A seção 1.3 apresentará algumas das causas de desindustrialização corriqueiramente apontadas pela literatura, tentando associá-las a um ou mais subtipos de desindustrialização. Especial aten-ção será devotada à apresentaaten-ção do conceito de Doença Holandesa, com enfoque nas definições de Bresser-Pereira (2008) e de Palma (2005).

Por fim, o debate sobre a ocorrência ou não da “desindustrialização” no Brasil será abordado na seção 1.4, onde se apresentarão os principais trabalhos encontrados sobre o tema — e sobre mudança estrutural — agrupados segundo uma classificação geral proposta por Vergnhanini (2013). A partir dessa separação se discutirão as perspectivas teóricas adotadas, os principais indicadores utilizados e algumas das proposições de política econômica imbuídas nas propostas de cada categoria de trabalhos.

1.1 Indústria e desenvolvimento

A relação entre o setor industrial e o desenvolvimento dos países é tópico de discussões desde praticamente os surgimento da manufatura moderna. Ao abordar a evolução estrutural da indús-tria de um país periférico — como o Brasil — esta dissertação necessariamente se entrelaça neste antigo debate, dominado de um lado pelo conflito entre os defensores de uma perspectiva setor-indiferente3 do desenvolvimento, e do outro pelos defensores da perspectiva setor-específica, que identificam na indústria uma série de características especiais que a tornam desejável frente aos setores agrícola e de serviços. Palma (2005, pp.102–106) apresenta uma separação das te-orias de crescimento atuais em três vertentes4: (1) uma setor e atividade neutra, que incorpora os trabalhos neoclássicos mais tradicionais; (2) uma setor-neutra e atividade-específica, que en-globa as novas teorias de crescimento econômico; (3) uma setor-específica e atividade neutra na qual se incluem trabalhos de cunho mais heterodoxo — shumpeterianos, pós-keynesianos e 2 Dado o enfoque do presente trabalho na ótica do emprego, a revisão da visão de Cambridge foi excluída. 3 Numa perspectiva setor neutra/indiferente os setores nos quais um determinado país se especializa não

deter-minam as propriedades dinâmicas — potencial de crescimento, comércio etc. — de sua economia; já numa perspectiva setor-específica o padrão de especialização econômica é determinante central de suas potenciali-dades.

4 Para compreensão desta classificação se faz necessária a apresentação dos conceitos de “atividade” e

“se-tor”, Palma (2005, p.103) os apresenta por meio de exemplos: sendo um setor algo como “agricultura” ou

(24)

outros.

A presente dissertação se aproxima do terceiro grupo de autores devido ao pressuposto implícito em sua proposta de que o padrão de especialização intra-setorial da economia tem algo impor-tante a dizer sobre sua capacidade de desenvolvimento/crescimento a longo prazo; portanto, é importante revisar alguns dos pontos que vem historicamente sendo levantados pela perspec-tiva setor-específica. As maiores fontes intelectuais modernas de argumentos para esta corrente parecem derivar dos trabalhos de alguns teóricos do crescimento ligados aos pensamentos de Kaldor, Schumpeter e ao desenvolvimentismo latino-americano. Porém, como destaca Gon-çalves (2012b), o pensamento desenvolvimentista latino-americano tem suas raízes intelectu-ais firmemente plantadas no pensamento mercantilista, perpassando pelas ideias de pensadores nacional-desenvolvimentistas — ou neo-mercantilistas5.

As doutrinas mercantilistas e nacional-desenvolvimentistas eram consoantes àquelas pregadas pelos liberais no que diz respeito a objetivos gerais — o enriquecimento da nação —, porém, as duas vertentes teóricas divergiam substancialmente tanto em sua leitura da realidade do comér-cio internacomér-cional quanto no caráter de sua metodologia agregativa6. No plano internacional as ideias liberais de vantagens absolutas e comparativas levavam a uma visão do comércio inter-nacional como um jogo de soma positiva, que levaria todos os países envolvidos a um padrão de especialização macro-setorial eficiente. Já o nacional-desenvolvimentismo tem sua crítica:

centrada nas vantagens comparativas estáticas e na centralidade das vantagens comparativas dinâmicas. Estas últimas são criadas via mecanismo da indús-tria nascente, que envolve protecionismo temporário em setores específicos, bem como obtenção de ganhos derivados de economias de escala e aprendi-zado. (GONÇALVES, 2012b, p. 648)

A principal ponto de ataque destes autores parece recair sobre a confiança exagerada no meca-nismo alocativo automático do mercado — principalmente no âmbito do comércio internacional — e sua suposta capacidade de gerar a alocação mais eficiente de recursos sem o planejamento de longo prazo e a intervenção do estado; neste sentido o argumento liberal, de que caso a ma-nufatura fosse eficiente e desejável em um determinado país ela naturalmente surgiria como 5 “Os registros de formulações e experiências são bastante conhecidos: [os mercantilistas] na Grã-Bretanha

nos séculos XVI (Henrique XVII e Elizabete I) e XVII (Robert Walpole); França no século XVII (Jean-Baptiste Colbert); [os neomercantilistas ou ‘nacional-desenvolvimentistas’] Estados Unidos no final do século XVIII (Alexander Hamilton) e na primeira metade do século XIX (Henry C. Carey); e na Alemanha no século XIX (Friedrich List).”(GONÇALVES, 2012b, p.641)

6 O nacional-desenvolvimentismo, assim como sua derivação latino-americana moderna rejeitam o

individua-lismo metodológico como princípio, reconhecendo que as propriedades que emergem da agregação de partes específicas não necessariamente carregam as características destas partes.

(25)

resultado do livre comércio, é rechaçado. Hamilton (1892, pp.24–27), político que influenciou extensamente as ideias dos nacional-desenvolvimentistas, apresenta uma série de razões para o não funcionamento do mecanismo de comércio internacional tal como proposto pela vertente liberal, salta aos olhos o pioneirismo do texto que identifica ideias7 que posteriormente se tor-naram alvo de extensa pesquisa e desenvolvimento intelectual.

1.2 O conceito tradicional de desindustrialização e suas extensões

A partir da década de 1970 observa-se a emergência de um novo fenômeno no mundo desen-volvido; a reversão das tendências de aumento da participação do emprego e produto industrial em seus respectivos totais, tendência que vigorava até então. Países foram afetados de forma diferenciada — figura 2 —, tendo sido tais diferenças explicadas (ALDERSON, 1999; KOLL-MEYER, 2009) por fatores tanto internos, tais como o aumento de produtividade industrial relativa ou a modificação da política industrial, quanto externos, tais como a especialização pro-dutiva oriunda do crescente comércio norte-sul derivado da globalização. Dentro deste contexto histórico nasce a bibliografia tradicional de “desindustrialização”, tendo por objetivo “explicar a mudança setorial do emprego em favor dos serviços ao longo do processo de desenvolvi-mento nas economias avançadas, observada a partir da década de 1970.”(VERGNHANINI, 2013, p.31) 1960 1962 1964 1966 1968 1970 1972 1974 1976 1978 1980 1982 1984 1986 1988 1990 1992 1994 15% 20% 25% 30%

OECD Japão União Européia EUA

Figura 2 – Participação do emprego industrial no total, regiões selecionadas (1960–1994)

Fonte: Extraído de Rowthorn e Ramaswamy (1997, p.8)

O trabalho de Rowthorn e Wells (1987, p.5), amplamente considerado a obra seminal desta corrente, define a “desindustrialização” como “uma queda da parcela relativa da indústria, em 7 Mesmo que de forma embrionária se encontra em Hamilton (1892) menções as ideias de path-dependence,

(26)

especial da indústria manufatureira, no emprego total” e identifica três subcategorias deste pro-cesso: (1) a desindustrialização “positiva”, abordada com maior detalhamento na subseção 1.2.1; (2) a “negativa” ou “precoce”8, pormenorizada na subseção 1.2.2; (3) e a desindustrialização por comércio exterior, que ganha centralidade em trabalhos, tais como os de Palma (2005) e Shafa-eddin (2005), que estendem o debate da corrente tradicional aos países da periferia econômica. Porém, antes de detalhar as causas e consequências destas variedades de desindustrialização — tarefa das subseções 1.2.1 e 1.2.2 — uma pormenorização mais rigorosa das definições, em especial da dicotomia entre as variedades “positiva” e “negativa”, se faz necessária.

... ‘negative’ de-industrialization. This most certainly is a pathological phe-nomenon, which can affect economies at any stage of development. It is a prod-uct of economic failure and occurs when industry is in severe difficulties and the general performance of the economy is poor. Under these circumstances, labour shed from the manufacturing sector because of falling output or higher productivity -will not be reabsorbed into the service sector. Unemployment

will therefore rise. Thus, negative de-industrialization is associated with stag-nant real incomes and rising unemployment. (ROWTHORN; WELLS, 1987, p.6, grifo nosso)

Apesar da maior parte do debate tradicional se estruturar na oposição entre as formas “positiva” e “negativa” da desindustrialização, as definições oferecidas para estes conceitos são bastante problemáticas — em especial para a variedade “positiva” — fato que dificulta a compreensão e o diálogo dentro desta literatura. Por isso nas páginas que se seguem se empreende uma avaliação mais rigorosa do conteúdo das definições originais e das implicações lógicas das ambiguidades encontradas visando a produção de definições para ambos os conceitos que sejam simples, claras e fiéis aos conceitos formulados pelos autores da vertente tradicional e de suas extensões. Para facilitar esta análise se consideram as seguintes atribuições de significado:

Ei queda da parcela relativa do emprego industrial no total. D desindustrialização, i.e., D = Ei.

Dn desindustrialização “negativa”. Dp desindustrialização “positiva”.

Pi aumento relativo da produtividade industrial — do trabalho — frente a de outros setores. Pe ocorrência de um quadro de prosperidade9econômica.

8 Os termos são frequentemente utilizados como sinônimos, mas observando-se as definições de ambos

percebe-se que, como destaca Morceiro (2012, p.49), a desindustrialização “negativa” pode acometer economias em qualquer estágio de desenvolvimento enquanto a “precoce” ou “prematura” (RICUPERO, 2014) acomete aqueles países que não atingiram nem um maior grau de maturidade industrial nem um patamar de renda per capita adequado. Ou seja, a desindustrialização “precoce” ou “prematura” seria um subconjunto da “negativa”.

9 Então¬P

(27)

E os seguintes operadores lógicos: ∧ Operador de conjunção “e”. ∨ Operador de disjunção “ou”. ¬ Operador de negação “não”.

↔ Conectivo “se e somente se”, usado aqui para fazer definições.

A interpretação da citação acima, que define a variedade “negativa” da desindustrialização, é bastante simples; se trataria da ocorrência de um processo de redução na parcela do emprego industrial em relação ao total associada a um quadro generalizado de falência econômica — estagnação da renda, desemprego, etc. — e acometendo economias em qualquer estágio de de-senvolvimento, ou seja, qualquer país. Portanto, em termos lógicos a definição de desindustri-alização “negativa” seria dada pela expressão Dn ↔ D ∧ (¬Pe), ou seja, a mesma ocorre se e somente se uma redução relativa do emprego industrial frente ao total e um processo de falência ou estagnação econômica ocorrem.

There is what we call ‘positive’ de-industrialization, which is the normal result of sustained economic growth in a fully employed, and already highly

devel-oped, economy. It occurs because productivity growth in the manufacturing

sector is so rapid that, despite increasing output, employment in this sector is reduced, either absolutely or as a share of total employment. However, this

does not lead to unemployment, because new jobs are created in the service

sector on a scale sufficient to absorb any workers displaced from manufactur-ing. [...] Throughout the process industry remains internationally competitive,

per capita incomes rise and the economy remains close to full employment.

For reasons we explain, positive industrialization occurs only in highly

de-veloped economies. (ROWTHORN; WELLS, 1987, p.5, grifo nosso)

Já a definição de desindustrialização “positiva”, abordada pela citação veiculada acima deste parágrafo, é ambígua pois não explicita nem quais dos elementos dentre os listados realmente são fundamentais nem qual a relação lógica entre eles. Como se trata de um subconjunto da “desindustrialização” temos que o elemento D deve figurar em todas as possíveis definições derivadas da citação enquanto pelo menos um dos elementos dentre Pi e Pe deve aparecer. A expressão lógica D∧ (Pi∨ Pe) atende exatamente a estes requisitos gerando três candidatos — reproduzidos respectivamente nas figuras (a), (b) e (c) — à definição:

(a) Dp ↔ D ∧ Pi (b) Dp ↔ D ∧ Pe (c) Dp ↔ D ∧ Pi∧ Pe

A alternativa (a), apresentada sobre a forma de conjunto na figura 3a, termina se mostrando muito problemática devido a dois fatos: (1) as diferentes subcategorias de

(28)

desindustrializa-ção não são exaustivas, ou seja, não englobam o universo U de todas as possibilidades (U ̸= A∪B ∪C) sendo alguns10processos de desindustrialização, destacados como a área pontilhada na figura 3a, não classificáveis em nenhum dos sub conceitos; (2) existem intersecções não va-zias entre dois ou mais subtipos de desindustrialização. Sobre o segundo fato, é especialmente preocupante a existência da intersecção (A ∩ B ̸= ∅), representada pela área hachurada na figura 3a, pois os casos contidos neste conjunto — D∧ Pi∧ (¬Pe)— seriam considerados si-multaneamente como desindustrialização “negativa” e “positiva”, uma conclusão insustentável. Em suma, a definição gerada pela alternativa (a) não se mostra viável.

A = “comércio exterior”

C = “positiva” B = “negativa” U = desindustrialização

C = “comércio exterior”C = “comércio exterior”C = “comércio exterior”C = “comércio exterior”C = “comércio exterior”C = “comércio exterior”C = “comércio exterior”C = “comércio exterior” C = “comércio exterior” C = “comércio exterior” C = “comércio exterior” C = “comércio exterior” C = “comércio exterior” C = “comércio exterior”C = “comércio exterior”C = “comércio exterior”C = “comércio exterior”

BBBBBBBB′′′′′′′′= “precoce”= “precoce”= “precoce”= “precoce”= “precoce”= “precoce”= “precoce”= “precoce”

B′= “precoce” B′= “precoce” B′= “precoce” B′= “precoce” B′= “precoce” B′= “precoce”

BBB′′′= “precoce”= “precoce”= “precoce”

A = “positiva”A = “positiva”A = “positiva”A = “positiva”A = “positiva”A = “positiva”A = “positiva”A = “positiva” A = “positiva” A = “positiva” A = “positiva” A = “positiva” A = “positiva” A = “positiva”A = “positiva”A = “positiva”A = “positiva”

B = “negativa” AAAAAAAA∩ B∩ B∩ B∩ B∩ B∩ B∩ B∩ B A∩ B A∩ B A∩ B A∩ B A∩ B AAAA∩ B∩ B∩ B∩ B AAAAAAAA∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C A∩ C A∩ C A∩ C A∩ C AAAAA∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C BBBBBBBBBBBBBBBBB∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C (a) A = Dp = Ei∧ Pi B =”negativa´´ B =”negativa´´B =”negativa´´B =”negativa´´B =”negativa´´B =”negativa´´B =”negativa´´ B =”negativa´´ B =”negativa´´ B =”negativa´´ B =”negativa´´ B =”negativa´´ B =”negativa´´ B =”negativa´´ B =”negativa´´B =”negativa´´B =”negativa´´ BBBBBBBB′′′′′′′′=”precoce´´=”precoce´´=”precoce´´=”precoce´´=”precoce´´=”precoce´´=”precoce´´=”precoce´´

B′=”precoce´´

B′=”precoce´´

B′=”precoce´´

B′=”precoce´´

B′=”precoce´´

BBBB′′′′=”precoce´´=”precoce´´=”precoce´´=”precoce´´

A =”positiva´´A =”positiva´´A =”positiva´´A =”positiva´´A =”positiva´´A =”positiva´´A =”positiva´´A =”positiva´´ A =”positiva´´ A =”positiva´´ A =”positiva´´ A =”positiva´´ A =”positiva´´ A =”positiva´´A =”positiva´´A =”positiva´´A =”positiva´´

C =”comércio exterior´´C =”comércio exterior´´C =”comércio exterior´´C =”comércio exterior´´C =”comércio exterior´´C =”comércio exterior´´C =”comércio exterior´´C =”comércio exterior´´ C =”comércio exterior´´ C =”comércio exterior´´ C =”comércio exterior´´ C =”comércio exterior´´ C =”comércio exterior´´ C =”comércio exterior´´ C =”comércio exterior´´C =”comércio exterior´´C =”comércio exterior´´ U = desindustrialização BBBBBBBB′′′′′′′′∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C B′∩ C B′∩ C B′∩ C B′∩ C B′∩ C BBBB′′′′∩ C∩ C∩ C∩ C BBBBBBBB∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C B∩ C B∩ C B∩ C B∩ C B∩ C BBBB∩ C∩ C∩ C∩ C AAAAAAAA∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C A∩ C A∩ C A∩ C A∩ C A∩ C A∩ C AAA∩ C∩ C∩ C (b) A = Dp = Ei∧ Pe U = desindustrialização

B =”negativa´´B =”negativa´´B =”negativa´´B =”negativa´´B =”negativa´´B =”negativa´´B =”negativa´´B =”negativa´´ B =”negativa´´ B =”negativa´´ B =”negativa´´ B =”negativa´´ B =”negativa´´ B =”negativa´´B =”negativa´´B =”negativa´´B =”negativa´´ BBBBBBBB′′′′′′′′=”precoce´´=”precoce´´=”precoce´´=”precoce´´=”precoce´´=”precoce´´=”precoce´´=”precoce´´

B′=”precoce´´

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BBBBB′′′′′=”precoce´´=”precoce´´=”precoce´´=”precoce´´=”precoce´´

A =”positiva´´A =”positiva´´A =”positiva´´A =”positiva´´A =”positiva´´A =”positiva´´A =”positiva´´A =”positiva´´ A =”positiva´´ A =”positiva´´ A =”positiva´´ A =”positiva´´ A =”positiva´´A =”positiva´´A =”positiva´´A =”positiva´´A =”positiva´´

C =”comércio exterior´´ C =”comércio exterior´´C =”comércio exterior´´C =”comércio exterior´´C =”comércio exterior´´C =”comércio exterior´´C =”comércio exterior´´ C =”comércio exterior´´ C =”comércio exterior´´ C =”comércio exterior´´ C =”comércio exterior´´ C =”comércio exterior´´ C =”comércio exterior´´ C =”comércio exterior´´ C =”comércio exterior´´C =”comércio exterior´´C =”comércio exterior´´

BBBBBBBB′′′′′′′′∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C B′∩ C B′∩ C B′∩ C B′∩ C BBBBB′′′′′∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C BBBBBBBB∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C B∩ C B∩ C B∩ C B∩ C BBBBB∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C A∩ C AAAAAA∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C∩ C A∩ C A∩ C A∩ C A∩ C A∩ C A∩ C A∩ C AAA∩ C∩ C∩ C (c) A = Dp = Ei∧ Pi∧ Pe Figura 3 – Categorização do conceito tradicional de desindustrialização

Fonte: Elaboração Própria

Em uma definição adequada é imperativo que as categorias “positiva” e “negativa” sejam mutu-amente excludentes, ou seja (B∩A = ∅). Ambas as definições (b) e (c) atendem a esse requisito, porém fica claro que para Rowthorn e Wells (1987) tanto a questão dos maiores incrementos na produtividade relativa do setor industrial quanto a da “saúde”11da economia em questão pare-cem ser centrais para o diagnóstico de um processo de desindustrialização “positiva”. Portanto a despeito da definição (c), ao contrário da definição (b), não ser coletivamente exaustiva — área pontilhada na figura 3c — a mesma parece expressar melhor o intuito dos autores da corrente tra-dicional ao captar tanto a ideia de que processos particulares de desindustrialização derivariam 10 Nos quais se observa a relação D∧ P

e.

11 Two kinds of de-industrialization can be distinguished only by observing the behaviour of per capita incomes

and unemployment through the course of time. Positive de-industrialization is associated with full employment and rising real incomes , whilst negative deindustrialization is associated with stagnant real incomes and rising unemployment. (ROWTHORN; WELLS, 1987, p.25)

(29)

do progresso tecnológico quanto a de que tal mudança não seria necessariamente indesejada pois elevados níveis de renda e emprego total ainda seriam factíveis, mesmo com as reduções relativas no emprego industrial. Em suma, as definições para os fenômenos de “desindustriali-zação”, “desindustrialização negativa” e “desindustrialização positiva” da corrente tradicional são respectivamente dadas pelas três expressões lógicas a seguir:

(1) D ↔ Ei (2) Dn↔ D ∧ (¬Pe) (3) Dp ↔ D ∧ Pi∧ Pe

As extensões da versão tradicional, que se preocupam com outras variáveis além do emprego, também podem ser expressas pelo esquema definicional desenvolvido. Para o caso de Tregenna (2009) e Chang (2010), que descrevem a desindustrialização como uma queda na participação relativa do emprego industrial no total simultaneamente a uma queda no peso relativo da pro-dução manufatureira no PIB — símbolo P IBm— teríamos as seguintes expressões lógicas:

(1) D′ ↔ Ei∧ P IBm (2) D′n ↔ D ∧ (¬Pe) (3) D′p ↔ D ∧ Pi∧ Pe

1.2.1 Desindustrialização positiva

A ideia da desindustrialização “positiva” — Dp ↔ D ∧ Pi∧ Pe—,também denominada como desindustrialização “natural”, foi primeiro formulada por Rowthorn e Wells (1987); esta ter-minologia ressalta a ideia de que alguns processos de redução relativa do emprego industrial fariam parte de uma etapa necessária ou “natural” do desenvolvimento econômico dos países e que, a despeito da redução relativa do emprego industrial observada, tais processos tomariam uma conotação “positiva”12 pois seriam consequência do progresso tecnológico e elevação da produtividade. Tal relato parte da construção de um caminho evolutivo único para todos os paí-ses, que inevitavelmente passariam por duas fases durante seu processo de desenvolvimento: Na primeira, ou fase de industrialização, se observaria, conforme aumentos na produtividade agrícola se generalizam na economia, uma crescente demanda deste setor por bens intermediá-rios e de capital bem como uma redução de sua demanda por mão de obra. Este processo geraria tanto um excedente de trabalho a ser absorvido pelos setores secundário e terciário quanto uma maior demanda por produtos industriais. O resultado final desta fase seria uma redução relativa 12 Esta ideia defendida por Rowthorn e Wells (1987) é contestada por alguns autores pois a redução do emprego

industrial, mesmo em um contexto de elevada produtividade e renda per capita, poderia ser nociva ao cresci-mento econômico e ao progresso social por afetar negativamente o setor industrial, que em uma perspectiva não setor neutra é considerado como portador de características especiais (CHANG, 2002; KALDOR, 1968; PRE-BISCH, 1962; SCHUMPETER, 1934; THIRLWALL, 1983; HIRSCHMAN, 1958) que lhe conferem status de centro dinâmico da economia.

(30)

da participação da agricultura no total da economia e de um correlato aumento da participação da indústria.

Em uma segunda fase, conforme o processo de desenvolvimento industrial avança, os ganhos em produtividade associados ao desenvolvimento tecnológico da indústria terminam por reduzir a demanda deste setor por trabalho. Concomitantemente, observaria-se que os mesmos avanços tecnológicos possuiriam a capacidade de, ao aumentar a produtividade, baratear os produtos da indústria frente aos produtos de outros setores da economia. Além disso os produtos industriais possuiriam, na média, uma menor elasticidade preço, o que faria com que reduções em seus preços não gerassem grandes aumentos nos respectivos consumos. Este triplo efeito — redução do emprego do fator trabalho, barateamento dos produtos aliado à baixa elasticidade — causaria uma redução relativa do setor industrial frente ao setor de serviços tanto sob uma ótica de valor adicionado13quanto sob uma de pessoal empregado.

Renda per Capita

Parcela do Emprego (%) 100% t0 Agricultura Serviços Indústria

Figura 4 – Variação “natural” da composição setorial do emprego

Fonte: Modificado de Rowthorn e Wells (1987, p.8)

A Figura 4 fornece uma ilustração didática deste processo “natural” de divisão histórica do emprego entre os três grandes setores da economia. A extensão temporal total do gráfico pode ser dividida — uma divisão aproximada foi marcada pela linha tracejada “t0”— em dois sub-períodos representativos de distintas etapas do desenvolvimento da composição do emprego na economia: (1) em um primeiro período, antes de “t0”, o processo de industrialização, aliado ao aumento de produtividade na agricultura, levaria a uma maciça migração de trabalhadores do campo para a indústria — e em algum grau para os serviços também —, aumentando a participação da ultima no agregado do emprego; (2) após “t0” verificar-se-ia uma segunda etapa — a etapa de “desindustrialização natural” — na qual o processo de esvaziamento do campo 13 Apesar deste fato, existe na bibliografia internacional preferência generalizada por medidas baseadas na

(31)

continuaria, sendo porém uma parcela crescente dos trabalhadores migrantes absorvidos pelo setor de serviços ao invés de pela indústria, nesta segunda etapa ocorreria também, após um pico de crescimento do emprego industrial, uma migração de trabalhadores da indústria em direção a atividades do setor de serviços — devido ao triplo efeito anteriormente destacado. Nota-se que a participação do setor agrícola no total do emprego é sempre assintoticamente decrescente, enquanto a participação do setor de serviços é sempre crescente e a da indústria cresce até um máximo, atingido no ponto “t0” e depois decresce.

contrary to popular perceptions, productivity growth in manufactming is likely to be less important than it used to be for increasing the overall growth of pro-ductivity and living standards in the advanced economies. As the process of deindustrialization continues, the overall growth of productivity will increas-ingly depend upon productivity developments in the service sector. [...] How-ever, product innovation in manufacturing will continue to be important be-cause of the spillovers to productivity growth in services (ROWTHORN; RA-MASWAMY, 1997, p.21)

1.2.2 Desindustrialização negativa

Do outro lado do espectro temos os processos de desindustrialização “negativa” e “precoce” (RICUPERO, 2014) que, como destaca Morceiro (2012, p.49), se assemelham por tratarem de situações nas quais complementarmente à redução relativa do emprego industrial não se ob-servou a emergência e adensamento de setores alternativos capazes de absorver a mão de obra excedente e funcionar como motor do crescimento da economia; e se diferenciam de acordo com seu alvo, podendo a variedade “negativa” afetar economias em qualquer estágio de de-senvolvimento e nível de renda per capita enquanto a “precoce” afeta por definição economias com baixa renda per capita — abaixo do “turning point”14 esperado. Portanto a desindustria-lização é caracterizada como “precoce” quando acomete uma economia que ainda não passou por um extenso processo de desenvolvimento15, adquirindo capacidade de endogeneizar elos tecnologicamente intensivos da cadeia produtiva, ganhar certa autonomia em relação a insumos e equipamentos importados e elevar significativamente seu patamar de renda per capita. Se já existem sérias preocupações quanto as consequências do processo de desindustrialização “natural”, que afeta países desenvolvidos, sobre a capacidade de crescimento da economia, o caso da variedade “precoce” é ainda mais critico. Em termos empíricos não parece haver ade-14 Shafaeddin (2005) por exemplo cita o patamar de U $$12000 como aquele no qual um processo de

desindus-trialização se daria de forma “natural” e não “precoce”. Porém, Palma (2005) mostra que tal ponto de inflexão tem historicamente ocorrido em patamares cada vez menores.

15 “o resultado de um longo processo de crescimento econômico, com elevado aumento da produtividade média

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rência da ideia de que os serviços estariam tomando o lugar da indústria como centro dinâmico da economia à realidade (MCCAUSLAND; THEODOSSIOU, 2012), apesar de alguns traba-lhos, tais como o de Dasgupta e Singh (2006, p.15, tradução nossa), parecem mais otimistas quanto a capacidade de determinados serviços, em determinadas economias, “atenderem aos requerimentos da definição kaldoriana de setor dinâmico, podendo ser considerados como mo-tores adicionais de crescimento”. Para Chang (2010), tal substituição — serviços como motor do crescimento — seria problemática já em termos conceituais pois o setor de serviços possuí, em geral, um escopo bastante limitado para o crescimento da produtividade além de produzir, raras exceções, “non-tradables”.

A situação seria mais grave no caso dos países periféricos, que ainda não possuem uma base manufatureira moderna consolidada. Neles, um crescimento relativo do setor de terciário — em detrimento da manufatura — pode ser especialmente perigoso pois aqueles serviços nos quais se observam taxas de crescimento elevadas são geralmente complementares à industria (CHANG, 2010), ou seja, a ausência de uma base industrial tecnologicamente avançada é um entrave ao crescimento inclusive do setor de serviços.

1.3 Causas da desindustrialização

A desindustrialização foi vinculada pela literatura especializada a uma diversificada lista de causas, serão exploradas nesta seção algumas das mais importantes, ou pelo menos que apare-cem com mais recorrência da bibliografia. A “desindustrialização positiva”, como já destacado, seria fundamentalmente uma consequência dos incrementos da produtividade industrial relati-vamente à produtividade de outros setores, se relacionando portanto às causas descritas pelos itens,2 e 316. Já a desindustrialização “negativa” estaria indiretamente associada aos itens 3 e 5 e umbilicalmente ligada à causa descrita pela subseção 1.3.1.

1. Consumo: A redução relativa no emprego industrial derivaria neste caso da existência de uma menor elasticidade renda da demanda por produtos industriais comparativamente à elasticidade da demanda por serviços — “curva de Bell” —, portanto, conforme a renda aumenta a parcela de manufaturados nas cestas de consumo das famílias cresceria menos do que a parcela dedicada aos serviços. Parte desta redução se daria, devido a efemeri-16 Nota-se porém que, apesar de impactar a produtividade esta causa não é um fenômeno associado apenas à

de-sindustrialização “natural”. Dependendo da forma de operação pode ser associada tanto a um processo “natural” quanto “precoce”.

Referências

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