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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

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(1)

PUC-SP

Priscila de Castro Busnello

Direito Penal e pós-modernidade:

bases humanistas e conteúdo ético

MESTRADO EM DIREITO PROCESSUAL PENAL

(2)

PUC-SP

Priscila de Castro Busnello

Direito Penal e pós-modernidade:

bases humanistas e conteúdo ético

MESTRADO EM DIREITO PROCESSUAL PENAL

Dissertação apresentada à Banca

Examinadora da Pontifícia

Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Direito Processual Penal sob a orientação do Prof. Doutor Cláudio José Langroiva Pereira

(3)

Banca examinadora

---

---

(4)

HUMANISTAS E CONTEÚDO ÉTICO de autoria de Priscila de Castro Busnello

A sociedade global é uma realidade. Ao mesmo tempo em que a

humanidade vivencia a dinamicidade das grandes e ininterruptas

(macro)transformações, ainda não foi possível compreender e fazer valer, de

maneira plena, os direitos fundamentais do ser humano, na qualidade de pessoa,

única e singular. Em função dessas constatações, este estudo tem como objetivo

apontar algumas formas de compreender a pós-modernidade, reconhecendo sua

importância, sem olvidar da necessidade de preservação dos direitos humanos e

da dignidade da pessoa humana para o estabelecimento das bases humanistas

mínimas do modelo para uma nova sociedade. Com a finalidade de atingir os

objetivos estabelecidos, é utilizado, inicialmente, o método da compilação, com

a associação de diferentes disciplinas, de modo a apresentar um panorama

sintético das várias perspectivas sobre as atuais mudanças nos rumos da

humanidade. Mas, com o desenvolvimento das ideias apresentadas, a

metodologia científica passa a direcionar o desenvolvimento da investigação na

busca de propostas coerentes para a conciliação entre a inevitável integração

global e a efetiva preservação da dignidade da pessoa humana. Os resultados, no

campo do Direito, apontam para a necessidade de superação dos ultrapassados

debates meramente formais e superficiais, com a atualização da compreensão

sobre o papel do direito penal na pós-modernidade. Ele deve, mais do que

nunca, corroborar o fortalecimento das condutas éticas e o comprometimento do

ser humano com seus semelhantes.

(5)

HUMANISTIC BASES AND ETHICAL CONTENT Written by Priscila de Castro Busnello

The global society is a reality. At the same time that the mankind

experiences the dynamism of the big and uninterrupted (macro)transformations,

it was not possible to comprehend and enforce, thoroughly, the fundamental

rights of the human being as a unique and singular person. Due to those

findings, this study has as main objective to understand post-modernity,

recognizing its importance, without forgetting to preserve human rights and

human dignity, to establish the minimal humanistic bases for the model of a new

society. Aim to reach the goals, a compiling method utilized, with the

association of different subjects in a way to presents a summarize panorama on

several perspectives on the update changing on the readings of humanity. But,

with the development of the presented ideas, the scientific methodology takes

the place in directing development of the investigation searching coherent

proposals to a conciliation between the inevitable global integration and the

effective preservation of the dignity of the human being. The results concerning

law indicate the need to overcome the old fashion debates with are just formal

and superficial, with un updating of the comprehension on the role of the

criminal law in post-modernity. It should, more than ever, helping strengthen the

ethical conduct and the commitment of the human being with their peers.

(6)

CONTEÚDO ÉTICO

SUMÁRIO

Introdução 07

1 Panorama jurídico 14

1.1 A crise da cultura jurídica 14

1.2 Conhecer o passado para construir o futuro 17

1.3 As mudanças de época 20

1.4 Teorias sobre a norma jurídica 22

1.5 A codificação no sistema jurídico 31

1.6 As acepções de Constituição 34

1.7 Constituição como limite 36

1.8 Constitucionalismo no século XXI: Constituição como dever 40

1.9 A Constituição Federal Brasileira de 1988 45

1.10 A Dignidade da Pessoa Humana 49

1.11 Os Direitos Fundamentais 57

1.12 A matéria penal no panorama Constitucional 63

1.13 Breves considerações sobre bem jurídico 67

2 Conjuntura Global 72

2.1 A concepção de Estado pós-moderno 72

2.2 A constante reinvenção do ser humano e o mundo fast 73 2.3 Retrato da conjuntura global atual: a crise 75

2.4 Consumo 78

2.4.1 O homem e o consumo 78

2.4.2 O sentido histórico da liberdade e da felicidade 80

2.4.3 O breve século XX: das guerras ao hiperconsumo 83

2.4.4 O paradoxo do consumo 85

2.4.5 Brasil: da luta contra a fome ao hiperconsumo 89

2.5 Informação 93

2.5.1 Informação e crise do conhecimento 93

(7)

2.5.4 Sucintas notas sobre a importância do rádio 99

2.5.5 Imprensa e seu papel 100

2.5.6 Imprensa e liberdade de expressão 101

2.5.7 Os meios de comunicação são extensões do próprio homem 102

2.5.8 O direito à informação 104

2.5.9 O poder da informação 107

2.6 Informatização 111

2.6.1 Mudança do contexto sociocultural 111

2.6.2 Tempo e espaço nos mundos on-line e off-line 112

2.6.3 Informática e sigilo 115

2.7 Globalização 118

2.7.1 O processo de globalização 118

2.7.2 O sentido da globalização 119

2.7.3 Padronização e personalidade coletiva 122

2.7.4 A globalização negativa 124

2.7.5 Crise mundial 133

2.8 O mundo mudou 135

3 Conjuntura e Direito 139

3.1 As incertezas 139

3.1.1 A sociedade e o risco 139

3.1.2 O homem e o medo 143

3.2 A proteção dos interesses menos individuais 147

3.3 A noção de Constituição Penal 152

3.4 O critério do paralelismo entre a Constituição e a legislação Penal 154

3.5 O papel da política criminal 160

3.6 Revisita às questões éticas e aspirações da pós-modernidade 166

Conclusão 174

(8)

Introdução

O grande desafio de viver o próprio tempo

A melhor forma de expressar o pensamento é a literatura. O escritor é um

artista que percebe, sente e absorve a realidade e tem o dom de traduzir suas

ideias em palavras.

A palavra solta nada transmite, pois é vazia e sem sentido, mas,

trabalhada por um artista, é elaborada, contextualizada e extrapola os limites da

significação, a ponto de invadir o pensamento do receptor da mensagem,

expandindo-se igualmente em múltiplas novas ideias, despertando sensações

inéditas e aguçando o imaginário.

Dessa forma são justificadas as citações reproduzidas ao longo do estudo.

Elas têm a finalidade de auxiliar na compreensão da mensagem contida no texto,

eminentemente científico.

Ao mesmo tempo, servem para amenizar a densidade do discurso jurídico,

pesado por natureza. Também, e acima de tudo, têm a função de facilitar a

transmissão e desenvolvimento de ideias e excitar a curiosidade.

Aliás, não apenas a literatura serviu como apoio para a transmissão das

ideias. Disciplinas auxiliares, como história, sociologia, psicologia, economia,

antropologia, filosofia e outras manifestações artísticas humanas, foram

recorrentes.

Isso porque os operadores do Direito enfrentam desafios que não se

encaixam em fórmulas matemáticas, e cujas consequências nem sempre são

(9)

A abordagem científica deve se desenvolver a partir do pensamento

complexo, com a finalidade de unificação do conhecimento, e a

multidisciplinaridade é o caminho adequado para a apreensão de ideias,

compreensão de mensagens, reflexão e desenvolvimento de soluções viáveis

para os problemas que surgem e se reinventam.

Mas abordagens multidisciplinares requerem adequada educação para a

informação. É necessário contextualizar as informações, globalizar as ideias e

construir gradativamente o conhecimento, de modo a superar a atrofia do

pensamento.

Minimizar as dificuldades para o desenvolvimento do homem e da

sociedade não é tarefa fácil, principalmente quando se atenta para o fato de que

diversos eventos estão em curso simultaneamente na Terra.

Decisões políticas, fenômenos naturais e climáticos, progressos

tecnológicos, enfim, inumeráveis eventos influem na maneira de viver do

homem, ora representando avanços em termos de desenvolvimento (individual e

social), ora ensejando a total desorientação.

A crença na possibilidade de se desenvolver estudos fragmentários e

isolados já perdeu definitivamente sua força.

Não obstante, no âmbito deste estudo, quatro fenômenos mereceram

destaque, pois contribuíram diretamente para uma verdadeira mudança de

perspectiva nos caminhos da humanidade: a informação, o consumo, a

(10)

A seleção e a divisão dos fenômenos citados são eminentemente

didáticas, pois é justamente da aderência e combinação de todos, e deles com

outros, que resulta o panorama da pós-modernidade.

Neste novel panorama, o remoto cenário de falta de acesso à informação

foi superado pela explosão informacional. Com isso, ficou evidente a

incapacidade humana de lidar com o excesso, pois informação farta, disponível

e acessível só é útil para a construção do conhecimento quando os sujeitos

dominam plenamente os instrumentos do conhecimento.

Além de farta, a informação foi transformada em produtos expostos,

verdadeiros bens de consumo oferecidos às diferentes classes culturais.

Essa hipertrofia do mercado de consumo, potencializada pelos avanços da

tecnologia, ensejou mudanças radicais nas representações e na maneira de

compreender o mundo.

A globalização, por sua vez, afetou não só a geopolítica internacional,

mas também os processos de apropriação do conhecimento e da construção das

significações.

Todos esses fenômenos insurgiram quase que concomitantemente,

revelando verdadeiras simbioses incompreensíveis, que se disseminaram no

espaço planetário nas últimas décadas.

Ao analisar a gama de processos simultâneos, muitas vezes, o foco do

estudo é direcionado ao fenômeno em si mesmo. Esse recurso pode ser válido,

por exemplo, em algumas investigações históricas, no entanto, constitui erro

(11)

Isso porque, no Direito, as abordagens devem incluir sempre o ser

humano. Simplesmente porque ele é o centro e a razão de todo o sistema

jurídico.

Portanto, neste campo, o desenvolvimento dos estudos deve compreender,

pelo menos, a análise das consequências humanas dos acontecimentos.

O fundamento reside na evidente constatação de que o ser humano não

apenas sobrevive, também convive. Não apenas existe, mas evolui. Não só

absorve informações, mas trabalha mentalmente dados recebidos, elabora novas

ideias, cria conexões, reflete e produz conhecimento. Ainda sente, sofre, pensa e

ama. Em suma, é um ser complexo.

O estudo do Direito exige, ainda, prévio conhecimento sobre experiências

e comportamentos humanos do passado, que são influenciados por infinitos

aspectos e estudados pelas mais diversas áreas do conhecimento.

Imprescindível a contextualização, pois os acontecimentos devem ser

distribuídos por tempos e lugares, sem o que não têm significação, nem valor.

Cada fato, se não é imediatamente apresentado, é modificado pelos que o

precedem e pela natureza dos homens, costumes e clima.

É essencialmente a história que fornece o panorama do passado. O

historiador conhece tudo o que foi escrito sobre determinada época e tem acesso

ao que já foi construído e desenvolvido ao longo dos anos sobre seu objeto de

estudo.

Ele capta a informação de segunda ou terceira mão, por intermédio de

fontes da época ou obras de historiadores posteriores e é capaz de expressar

(12)

Mas o certo é que ninguém pode escrever sobre seu próprio tempo de

vida, como pode e deve fazer em relação a uma época pretérita. Isso porque a

pessoa que vive está na posição de observador protagonista. É um viajante de

olhos abertos.

Os fatos de hoje não nos são transmitidos de maneira livre, já que as

pessoas que os expõem são as que podem ou querem se manifestar livremente,

sem o peso da responsabilidade por grandes questões.

Logo, durante a própria vida, o indivíduo tem condições de entender o que

se passa porque vê e ouve. Mas não está apto a analisar globalmente os

acontecimentos ou desenvolver conclusões absolutamente seguras e imutáveis

que exigem amadurecimento de ideias.

Um sistema jurídico perfeito e ideal seria possível, não fosse elaborado

pelos próprios protagonistas da história, ou seja, as gerações atuais teriam

condições de elaborar sistemas perfeitos para as do passado, e as do futuro para

as do presente, partindo de análises livres e responsáveis, seguidas de debates

conscientes e maduros.

Impossível a perfeição.

Dessa forma, considerando o grande desafio de compreender e viver o

próprio tempo, é preciso perceber o Direito não como um conjunto de regras

perfeito e ideal, mas como um ordenamento que está em permanente processo

de construção e desenvolvimento e cuja finalidade de preservar a existência

humana digna nunca pode ser perdida.

(13)

Esse é o ponto de partida do estudo.

Inicialmente foram abordados aspectos relativos ao panorama jurídico

atual, quais sejam: desenvolvimento das teorias do Direito; importância da

Constituição Federal no sistema jurídico Brasileiro; dignidade humana como

fundamento da República Federativa do Brasil e sua influência na interpretação

e aplicação dos direitos e garantias fundamentais.

Tudo com a finalidade de delinear as bases da proteção jurídico-penal e

apontar o caminho para a efetiva e precisa aplicação do Direito Penal e

Processual Penal.

Em seguida, o estudo do homem.

A partir de análises multidisciplinares, são abordados os fenômenos que

influenciam seu modo de ser e viver na pós-modernidade (consumo,

informação, informatização e globalização) e o grande desafio de compreender e

viver o próprio tempo.

É desafio, pois o homem de hoje corteja o passado sem conhecê-lo e

projeta o futuro com os olhos do capitalismo (um futuro próximo e consumista).

Falta tempo para viver o momento, já que, quando o futuro se torna

presente, a magia do desejo, agora realizado, é imediatamente substituída por

novos objetos de cobiça.

Nesse ponto, a multidisciplinaridade é o alicerce que fundamenta a

necessidade do Direito Penal e Processual Penal, recursos indispensáveis à

(14)

Na tentativa de superar dificuldades atuais relacionadas à efetividade e

adequação do sistema jurídico, emerge uma tendência de retomada das questões

éticas e morais no campo do Direito.

Em suma, este estudo tem por escopo delinear o panorama jurídico e

apresentar subsídios extrajurídicos sólidos e aptos a fundamentar a legitimidade

do Direito Penal e Processual Penal na pós-modernidade.

Sem olvidar, todavia, que a proteção jurídico-penal há que ser restrita e

exata, de modo a rechaçar tanto o descrédito da ineficácia do Direito quanto a

injustiça do excesso.

Esse é o eterno desafio do homem. Seguramente, o mais perturbador da

(15)

1 Panorama jurídico

1.1 A crise da cultura jurídica

(...) só há Direito quando a cultura se sobrepõe à técnica, a arte à

ciência, a história à dogmática, a Justiça à lei, a pessoa à instituição e

a sensibilidade crítica à vantagem econômica1.

A pós-modernidade assinala uma grande mudança de época na qual

muitos dos valores que eram considerados intocáveis cedem diante da realidade.

Grandes questões do passado, já discutidas e resolvidas outrora,

despertam para ocupar novamente o centro dos debates, provando que, ou não

foram tocadas em seu âmago, ou merecem uma reapreciação para além da mera

retomada de práticas, institutos e superstições do passado.

Observam-se, na cultura jurídica, os reflexos dessa transformação como

uma espécie de desorientação generalizada e, em certos momentos, uma

verdadeira irracionalidade humana.

Os problemas exigem respostas imediatas, portanto, o indispensável

processo de construção das bases do saber jurídico é paulatinamente substituído

por análises superficiais que dispensam conhecimentos sobre seus próprios

fundamentos.

1

(16)

Conjuntos de informações desconectadas são analisados de maneira

uniforme. Os problemas, muitas vezes, são solucionados com a adoção de

teorias importadas de realidades completamente distintas ou até incompatíveis.

O positivismo legalista do Estado corroborou para o atual cenário, pois a

crença na uniformização exclusivamente por meio da lei aboliu a capacidade de

reflexão crítica e a aceitação da pluralidade de expressões.

Dessa forma, a experiência jurídica se distancia cada vez mais do sentido

de justiça e do bom senso para se submeter à economia de mercado e às escolhas

dos governantes.

Eduardo Vera-Cruz Pinto2 observa que:

O relativismo moral, o materialismo mercantilista, a recepção das

teses psicológicas que normalizam o excesso e aceitam a violência, a

legalização da supremacia dos fortes, o simplismo demagógico do

consenso político reconduziram o jurídico a uma expressão monista

totalitária formalizada através de leis que, ignorando o Direito, se

afastam da Justiça.

Portanto, para evitar a supressão do Direito e a consequente violência

social, situação de caos e barbárie, com uso privado da força e exercício

desmedido da autotutela, há que se resgatar o seu valor axiológico e pedagógico.

Reafirmar a centralidade da pessoa humana na construção do Direito e

compreender a imponência dessa condição são os pressupostos indispensáveis

para a retomada do processo formador de uma verdadeira cultura jurídica

consistente.

2

(17)

Então, chega-se ao desafio dos dias atuais: garantir a harmonia social

com o desenvolvimento de mecanismos adequados, justos, válidos e efetivos

para a proteção da pessoa humana, de acordo com a realidade factual concreta.

Realmente, não se trata de uma tarefa fácil, diante do atual ambiente

cultural de crise moral das sociedades.

Primeiro porque simplesmente aceitar as soluções legalistas, enunciadas

em infinidades de textos, elaborados e aprovados pelo poder político, é uma

maneira de maquiar a complexidade dos fatos.

Segundo, porque a experiência histórica passa por um processo de

desvalorização no qual a busca pelo novo fomenta uma espécie de inspiração

jurídica criativa que se multiplica entre os defensores de institutos virtuais.

Terceiro, porque sem referência histórica não há perspectiva para o futuro

e a constatação da necessidade de mudança não vem acompanhada de projetos

robustos e viáveis para a substituição dos padrões existentes.

A pessoa humana é a causa e o limite do Direito e a possibilidade de

justiça pelo Direito depende da expressão social da moral individual, por

remissão aos valores do modelo comum seguido.

Dessa forma, constata-se que a cultura jurídica de hoje é reflexo de uma

crise generalizada, tanto do modelo político de criação e aplicação do Direito

quanto do próprio senso moral da sociedade.

Então, o atual momento histórico é propício para a retomada de questões

(18)

cultura jurídica, mas também à função primordial do Direito como forma de

garantir o pleno desenvolvimento humano.

A realização da justiça em cada caso requer preparo e compromisso com

os valores que instituem o jurídico.

Portanto, a retomada da experiência histórica e dos fundamentos da moral

e da ética no Direito demonstra ser um caminho possível e adequado para a

garantia da existência humana em um ambiente menos conflituoso, de justiça e

quiçá de solidariedade.

1.2 Conhecer o passado para construir o futuro

Numa época em que nenhuma fronteira territorial separa os que

procuram a Justiça pelo Direito e aqueles que o instrumentalizam para

criar e manter a injustiça; e em que se destruíram os critérios que

sustentavam esta diferença em relativizações sucessivas do bem e do

mal, o Direito Romano não pode continuar a ser mero ícone do

passado do Direito, mas a semente de um retorno ao caminho do

direito justo. No Direito Romano o futuro faz-se presente pela lição

do passado3.

Conforme já ressaltado, a experiência jurídica histórica é essencial para a

construção do Direito atual.

Conhecer a realidade passada permite analisar situações já vividas, de

modo a evitar ou minimizar as consequências dos erros cometidos.

3

(19)

Enganam-se os que pregam que as transformações na sociedade de hoje

não encontram referência histórica. Certamente desconhecem a herança cultural

de tempos remotos, ou não foram educados adequadamente para a compreensão

e desenvolvimento dos saberes essenciais à vocação de jurista.

Isso não quer dizer que seja possível, simplesmente, fazer reviver as

instituições do passado. As leis da sociedade humana não são as mesmas leis da

antiguidade, a própria inteligência humana evolui e se modifica.

O conhecimento do passado revela o que pensavam os homens antes da

nossa existência. Nesse sentido, Fustel de Coulanges4 observa:

Felizmente, jamais o passado morre completamente para o homem. O

homem pode bem esquecê-lo, mas ele o guarda sempre consigo,

porque o seu estado, tal como se apresenta em cada época, é produto e

resumo de todas as épocas anteriores. Se o homem descer ao fundo de

sua alma, nela poderá encontrar e distinguir essas diferentes épocas,

segundo o que cada uma delas nele deixou.

O marco histórico mais importante em termos de desenvolvimento

humano na esfera do Direito remonta à experiência jurídica romana, baseada no

método jurisprudencial de criação jurídica.

Tamanha sua relevância, o Direito Romano conquistou pacificamente os

povos europeus, não carecendo de imposição por qualquer autoridade política5.

4

COULANGES, Numa Denis Fustel de. A Cidade Antiga: estudo sobre o culto, o direito e as instituições da Grécia e de Roma. 2. ed. Trad. J. Cretella Jr. e Agnes Cretella. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 17.

5

(20)

A propósito, esse resgate histórico faz recordar uma das questões mais

relevantes da atualidade, qual seja, o estabelecimento das bases para uma

Europa sem fronteiras jurídicas.

Eduardo Vera-Cruz Pinto6 rechaça a ideia de unificação estrutural e

legislativa na Europa e propõe, com base na experiência romana, a necessidade

de um jurista comum pela partilha de valores, princípios, conceitos,

mentalidade, sensibilidade, linguagem e métodos:

No espaço político comum europeu tem de existir, para que ele

subsista, um jurista capaz de criar ius commune e de interpretar as normas vigentes na pluralidade que caracteriza a Europa, numa

harmonização sem uniformização, para fazer jus à reductio ad unum

romana7.

O método jurisprudencial pleno do Direito Romano seria capaz de superar

a rigidez das soluções jurídicas que simplesmente reproduzem, com apuro

técnico, a textualidade de leis.

Compreender o espírito histórico do Direito (nesse caso, do Direito

Romano) pode ser um bom caminho para enfrentar a grave crise de

credibilidade na Justiça e na realização do justo8.

6

PINTO, Eduardo Vera-Cruz. Curso de Direito Romano.Volume I: Programa. Método. História. Fontes. Actores Judiciários. (753 a.C.-395). Caiscais: Princípia Editora, 2009, p. 79.  

7 PINTO, Eduardo Vera-Cruz.

Curso de Direito Romano.Volume I: Programa. Método. História. Fontes. Actores Judiciários. (753 a.C.-395). Caiscais: Princípia Editora, 2009, p. 79.  

8

(21)

1.3 As mudanças de época

Tais são os preceitos do direito: viver honestamente (honeste vivere), não ofender ninguém (neminem laedere), dar a cada um o que lhe pertence (suum cuique tribuere)9.

Sabe-se que o Direito Romano exerceu e ainda exerce grande influência

na história dos povos civilizados. Eduardo Vera-Cruz Pinto10 assevera que

“nunca o passado de Roma esteve tão próximo do nosso presente”.

Para compreender a profundidade da afirmação, necessários alguns

comentários sobre as mudanças de época.

Arthur Kaufmann11 identifica três momentos históricos que, assim como

nosso tempo, se caracterizaram por mudanças causadoras de abandono,

renúncia, reação e angústia, diante da retomada dos fundamentos da própria

existência humana.

O primeiro momento foi a mudança da Idade Arcaica para a

Antiguidade, possivelmente com Heráclito. Em seguida, da Antiguidade para a

Idade Média, provavelmente com Santo Agostinho. Por fim, da Idade Média

para a Idade Moderna, com Pascal.

Agora, a mudança da Idade Moderna para uma quarta idade, ainda

inominada.

9

DIGESTO 1.1.10.1 Ulpiano.  

10

PINTO, Eduardo Vera-Cruz. Curso de Direito Romano.Volume I: Programa. Método. História. Fontes. Actores Judiciários. (753 a.C.-395). Caiscais: Princípia Editora, 2009, p. 165.  

11

(22)

A estrutura Moderna passa por fase de redefinição, na qual lhe são

atribuídas características diferentes. Por isso, o atual momento é conhecido

como “pós-modernidade”. Mas ainda não foi possível definir os contornos desse

novo modelo.

A incerteza e a indeterminação se multiplicam no âmbito das grandes

questões ainda não resolvidas pela humanidade, como por exemplo, o sentido da

liberdade e a relação entre Direito e Justiça.

Conforme será abordado no próximo tópico, o fenômeno jurídico é, em

geral, analisado de maneira fragmentada ou parcial. Em certos momentos, a

teoria jurídica e a filosofia do direito são havidos como totalmente

inconciliáveis.

Historicamente, a partir do século XIX, no campo da Teoria Geral do

Direito, a órbita formal se sobrepõe ao aspecto material, de modo que o Direito

não se comunique com outras tendências, em especial com a hermenêutica. As

análises passaram a ser estritamente conceituais e estruturais.

Essa visão material não deve ser rechaçada de plano, por abarcar apenas

parcialmente o fenômeno analisado, pois prepara o fundamento conceitual do

conhecimento.

No entanto, ela não realiza a totalidade do conhecimento jurídico.

Uma compreensão pluralista exige a concorrência da ciência e da filosofia

para a formação de uma integralidade fundada na razão.

(23)

1.4 Teorias sobre a norma jurídica

O conceito de Direito sempre foi um tanto quanto polêmico e

controvertido.

Não obstante, todo trabalho científico que tenha como finalidade analisar

o fenômeno jurídico, sob qualquer perspectiva, deve partir do seu embasamento

teórico, desenvolvido no âmbito da Teoria Geral do Direito.

Conforme já ressaltado, na tradição romana, o conceito de Direito é

diretamente relacionado à ideia de justiça material. O jurista atua em prol da

justiça. A dogmática e a metodologia são apenas meios a serviço de um fim: a

realização da justiça em cada caso.

Contudo, o teor semântico dessa correspondência não é unânime,

principalmente quando contextualizado historicamente, já que, sob outra

perspectiva, desenvolvida a partir do século XIX, dificultaria o desenvolvimento

de uma base concreta, apta a respaldar o trabalho jurídico, e deixa de atribuir

essência prática ao Direito.

Portanto, nessa perspectiva jurídica formal, o epicentro da ciência jurídica

é deslocado da ideia de realização da justiça, para a formulação concreta da

norma jurídica12.

Argumenta-se que, dessa forma, o trabalho se torna mais efetivo, já que a

vida humana se desenvolve sob uma infinidade de normas.

12

(24)

Inumeráveis conjuntos ordenados de regras de condutas influenciam o

comportamento dos indivíduos e dos grupos (preceitos religiosos, regras

morais, costumeiras, éticas, de boa educação etc.).

As regras de conduta permeiam a existência individual e social, e a

experiência jurídica nada mais é do que uma parte da experiência humana.

Sem a pretensão de minudenciar excessivamente, é possível identificar,

grosso modo, duas orientações relacionadas à norma jurídica. A primeira

engloba as concepções positivistas do Direito, e a segunda refere-se às

concepções não positivistas.

O elemento comum mais evidente das teorias positivistas é a separação

entre Direito e moral13.

No entanto, isso não significa impossibilidade de encontro entre os dois

elementos, indica apenas que ambos devem ser separados e as definições do

conceito e validade do direito devem ser isentas de moral.

De acordo com a perspectiva positivista, os juristas não têm que julgar a

ordem jurídica de acordo com os grandes valores éticos, porque não é uma

tarefa científica, e sim política14.

Para melhor compreensão do ponto de vista positivista, é pertinente citar a

perspectiva de Norberto Bobbio15, que adota o ponto de vista normativo para o

estudo do Direito:

13

Para o positivismo jurídico, o direito, como sistema normativo, existe independentemente da moral, da realidade econômica ou das formas de organização política.

14 COMPARATO, Fábio Konder.

Ética: direito, moral e religião no mundo moderno. São Paulo: Companhia das Letras, 2006, p. 353.

15

(25)

Com isto, entendo que o melhor modo para aproximar-se da

experiência jurídica e apreender seus traços característicos é

considerar o direito como um conjunto de normas, ou regras de conduta. Comecemos então por uma afirmação geral do gênero: a

experiência jurídica é uma experiência normativa.

Observa Norberto Bobbio que uma relação só pode ser considerada

jurídica quando regulada por uma norma jurídica, ou seja, é a norma que

qualifica a relação e a transforma em relação jurídica16.

Em suma, relação jurídica é aquela que, qualquer que seja o seu conteúdo,

é tomada em consideração por uma norma jurídica, é subsumida por um

ordenamento jurídico, é qualificada por uma ou mais normas pertencentes a um

ordenamento jurídico17.

Portanto, de uma maneira singela, afirma-se que, para o positivismo, a lei

corresponde exclusivamente aos caracteres sobre o papel dos textos legais18.

Friedrich Müller19 ressalta que o positivismo que caracteriza o universo

jurídico dos países desenvolvidos desde meados do século XIX confunde a

norma jurídica com o texto da norma no Código legal.

Os representantes mais importantes do positivismo jurídico orientado para

a normatização no século XX foram Hans Kelsen e Herbert Hart20.

16

Norberto Bobbio sustenta que as normas jurídicas pertencem à categoria geral de proposições prescritivas. A função da prescrição é de influir, modificar o comportamento alheio e a prova de sua aceitação é a execução (um comportamento prático, ainda que se faça apenas uma primeira aproximação).

17

BOBBIO, Norberto. Teoria da norma jurídica. 4. ed. rev. Trad. Fernando Pavan Baptista e Ariana Bueno Sudatti. Bauru: Edipro, 2008, p. 43.

18 MÜLLER, Friedrich.

O novo paradigma do direito: Introdução à teoria e metódica estruturantes. 2. ed. rev. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, p. 10.

19

(26)

Hans Kelsen21 desenvolve a Teoria Pura do Direito, uma teoria do Direito

positivo que teve como princípio metodológico fundamental a pretensão de

libertar a ciência jurídica de todos os elementos que lhe são estranhos.

Kelsen define o Direito como um ordenamento normativo coativo, cuja

validade baseia-se numa norma fundamental pressuposta.

Herbert Hart, por sua vez, compreende o Direito como um sistema de

regras que pode ser identificado por meio de uma regra de recognição, cuja

função corresponde à da norma fundamental de Kelsen, mas com status

diferente.

A essência da ideia positivista recebe incisivas críticas, pois a

relativização moral e axiológica causaria o esvaziamento do Direito.

Argumenta-se que o grande equívoco do positivismo é identificar o

Direito com a vontade do Estado, com o próprio Estado ou mesmo com as

normas por ele produzidas e integradas num todo ordenado e coerente, que é

designado “sistema jurídico”.

O excessivo apego à ideia de segurança baseada em leis feitas por poderes

políticos eleitos conduziria, portanto, à legitimação de situações de

arbitrariedade da lei, ofensas da pessoa humana pelo Estado e contradição entre

justiça e segurança.

20 ALEXI, Robert.

Conceito e validade do direito. Trad. Gercélia Batista de Oliveira Mendes. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2009, p. 22/23.

21

(27)

Concepções não positivistas surgem na tentativa de superar as teorias

positivistas. Em geral, seus partidários acreditam na existência de conexões

conceitualmente necessárias entre Direito e moral, e na existência de razões

normativas para que as definições de Direito e de validade do Direito incluam

elementos morais.

Adverte-se, contudo, que as orientações não positivistas alcançam desde

as teorias de antipositivismo extremado até teorias pós-positivistas do Direito.

Robert Alexy22 propõe uma definição do conceito de Direito que reúne, de

forma sistemática, os elementos da legalidade conforme o ordenamento, da

eficácia social e da correção material.

Na tripartição dos elementos, é possível identificar que o positivismo

também compartilha dos dois primeiros (com inúmeras variantes). Entretanto, a

correção quanto ao conteúdo, que se refere à inclusão de elementos morais no

conceito de Direito, é o componente diferenciador.

Robert Alexy23 salienta que o Direito possui uma dimensão ideal

necessária, que é a pretensão à correção. Apresenta a seguinte definição de

Direito:

O direito é um sistema normativo que formula uma pretensão à

correção, consiste na totalidade das normas que integram uma

constituição socialmente eficaz em termos globais e que não são

extremamente injustas, bem como na totalidade das normas

estabelecidas em conformidade com essa constituição e que

apresentam um mínimo de eficácia social ou de possibilidade de

22 ALEXI, Robert.

Conceito e validade do direito. Trad. Gercélia Batista de Oliveira Mendes. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2009.

23

(28)

eficácia e não são extremamente injustas, e ao qual pertencem os

princípios e outros argumentos normativos, nos quais se apoia e/ou

deve se apoiar o procedimento de aplicação do direito para satisfazer a

pretensão à correção.

Nesse sentido, os sistemas normativos que não formulam a pretensão à

correção não seriam sistemas jurídicos. Aqueles que formulam, mas não a

satisfazem, seriam jurídicos, mas deficientes. Dessa forma, o elemento da

correção é o diferencial que sustenta a teoria da vinculação entre Direito e

moral.

Também no campo das teorias não positivistas do Direito, encontra-se a

teoria pós-positivista, que foi concebida desde meados dos anos 60. Ela não se

contrapõe diretamente ao positivismo, mas o desenvolve.

O texto da norma no Código legal seria apenas um dado de entrada do

processo de concretização.

Direito e Moral não são considerados idênticos, mas também não são

completamente distintos. Há um intenso intercâmbio na região de tangência,

embora se deva reconhecer a existência de áreas de repulsão.

A teoria estruturante de Friedrich Müller é a mais expressiva

representação do pós-positivismo.

Parte da perspectiva de que o trabalho jurídico é um processo no qual o

ponto de partida é representado pelos enunciados das codificações (textos de

(29)

É com o caso concreto que nasce o processo, de modo que o caso da

decisão é coconstitutivo e o produto final desse processo é a produção da norma

jurídica, contida na decisão.

Friedrich Müller24 observa:

A norma jurídica criada no caso está estruturada segundo “programa

da norma” e “âmbito da norma”; ela é, portanto, um conceito

composto que torna o problema tradicionalmente irresolvido de “ser e

dever ser” operacional e trabalhável. Com isso os dualismos irrealistas

do passado do direito, tais como “norma/caso”, “direito/realidade”

podem ser aposentados, assim como a ilusão da “aplicação” do direito

como subsunção ou silogismo ou como a construção linguisticamente

não realizável de um “limite do teor literal” definível, coisificado na

linguagem.

Nesse sentido, o Direito e a realidade atuam como elementos da ação

jurídica, congregados no trabalho jurídico efetivo de caso para caso.

A teoria de Friedrich Müller faz parte do movimento pós-moderno e parte

da constatação de que a norma e a realidade não devem ser tratadas

separadamente. As normas jurídicas não existem simplesmente prontas, não

estão disponíveis para a aplicação técnica, pois a estrutura da matéria e do

problema faz parte dos elementos da sentença jurídica.

Portanto, para a teoria estruturante, a norma jurídica representa a

ideia-diretriz materialmente caracterizada, normativamente estabilizadora. A norma

decisória judicial seria a concretização da norma jurídica.

24

(30)

De fato, é possível verificar que a polêmica em relação à compreensão do

fenômeno jurídico permanece atual. As perspectivas teóricas da efetiva

dinâmica do Direito continuam a enriquecer o desenvolvimento da ciência.

E, mais do que simples teorias sobre a norma jurídica, cada estrutura

projeta consequências políticas, econômicas e também no âmbito da aplicação

prática do Direito.

A influência do positivismo jurídico, por exemplo, foi decisiva para o

avanço internacional do capitalismo.

Isso porque, com o exacerbado apego à certeza, segurança jurídica e

previsibilidade das decisões judiciais, a atividade empresarial se expandiu. Os

grandes princípios morais da ideologia liberal-capitalista sempre foram a ordem

e a segurança das relações privadas, sobretudo as de conteúdo econômico25.

Para tanto, necessário um sistema jurídico estável e com previsibilidade

de aplicação efetiva das normas. O positivismo ajustou perfeitamente essa

configuração, já que a norma jurídica que existe e funciona é necessariamente

justa e dispensa, completamente, o juízo ético.

Mas a maior crítica dirigida ao positivismo jurídico não se relaciona à

expansão do capitalismo, mas sim à contribuição para o surgimento do Estado

totalitário, já que admitiu a existência e validade jurídica de Constituição com

qualquer conteúdo.

25

(31)

Nesse sentido, a Constituição deixou de ser a proteção dos cidadãos

contra o abuso de poder, reduzindo-se à regulação do funcionamento dos órgãos

estatais.

Mesmo os defensores das teorias positivistas reconhecem que a

complexidade do mundo jurídico (e também das relações fáticas) afeta as

tentativas de identificação de características que possam distinguir as

prescrições jurídicas de outros tipos de prescrição (principalmente as morais).

Soluções puramente formais para distinguir as normas jurídicas das

morais são, em geral, fracas e insuficientes para estabelecer, com clareza, qual

seria o elemento diferencial.

Norberto Bobbio26 chega a afirmar que o mundo normativo é tão vasto

que não haveria um tipo de prescrição relevante em um ordenamento normativo

jurídico que não se encontre em algum outro sistema normativo.

Na prática, a atual mudança de época revela situações inéditas e

indiscutivelmente relevantes, a ponto de retomar com vigor as discussões sobre

teoria da norma jurídica.

Tanto os positivistas, com o excessivo apego ao legalismo estatal, quanto

os realistas, enquanto defensores do direito livre e do uso alternativo do Direito,

não apresentam soluções adequadas para a efetivação do Direito e realização da

justiça material.

26

(32)

Portanto, as visões extremadas e unilaterais são reavaliadas com base na

constatação de que a produção jurídico-científica atual converge sobre a

indispensabilidade do pluralismo entre Direito e Justiça, ciência e filosofia.

1.5 A Codificação no sistema jurídico

A ideia de Codificação já não é uma novidade, desde a Lei das XII

Tábuas. No entanto, o marco histórico moderno data de 1804. Trata-se do

Código Civil de Napoleão.

Mas, no início do século XX, ganham força, no âmbito da teoria do

direito, as discussões relacionadas à codificação no sistema jurídico. Na essência

dos debates estavam não só a necessidade/utilidade da codificação, mas também

a relação que deveria ser estabelecida entre a norma legal e a concretização e

aplicação do Direito.

Os críticos da codificação argumentam, em suma, que um Código

significa o efeito da decadência das luzes e da ciência do Direito. Por outro lado,

seus defensores acreditam que implica uma ideia de adiantamento, de progresso

nos povos, ou seja, a ordem que sucede à confusão, a civilização à barbárie.

Candido Mendes de Almeida27, adepto da codificação, argumenta:

Acreditamos tambem, que um Codigo, em qualquer ramo de

Legislação, importa a fixação de uma epocha, em que se mostra a

alteração que tem havido nas ideias, nos costumes e no modo de viver

27

(33)

de qualquer Nação, de que a lei codificada he a melhor e a mais

assignalada expressão (sic).

É certo que a ação e o comportamento do juiz estão condicionados à

norma codificada, que ainda desempenha papel dominante em relação à

sentença28.

Contudo, as funções que as codificações apresentam variam de acordo

com seu grau de coação.

Inicialmente, foi propagada a ideologia da subsunção, baseada no ideal de

segurança e certeza do Direito e para a qual a ação do juiz se resumiria a

transportar o conteúdo da norma codificada, sem adição nem diminuição, para o

caso a ser decidido.

Essa ideia de mera subsunção, simplista, já foi há muito superada, diante

do reconhecimento de que o juiz atua como criador do Direito. Nesse sentido,

Arthur Kaufmann29 se manifesta:

(...) o processo de criação jurídica mostra uma estrutura essencial mais

complicada, que contém também momentos produtivos, dialéticos,

possivelmente intuitivos, em todo caso, não exclusivamente

lógico-formais, o juiz nunca infere a decisão só da lei, mas chega ao caso

sempre com um determinado preconceito, estabelecido principalmente

pela tradição e pela situação (...) – tradução nossa.

28

HASSEMER, Winfried. O sistema do Direito e a codificação: a vinculação do juiz à lei. Revista Jurídica: órgão nacional de doutrina, jurisprudência, legislação e crítico judiciária. Ano XXXIV - no 112. Porto Alegre: Revista Jurídica Ltda, mar/abr 1986, p. 9/34.

29

(34)

Contudo, há que se reconhecer que a codificação de grandes áreas do

Direito significou a possibilidade de uma jurisprudência “certa e segura”, apta a

proteger os direitos dos cidadãos. Além disso, foi possível sistematizar o

conhecimento jurídico, facilitando o acesso, a fixação e caracterização de seus

contornos.

Também favoreceu e, de certa forma, obrigou a demonstração da correção

da sentença. Há que se demonstrar a derivação da norma codificada, pois ela

concentra os princípios norteadores acatados pela sociedade em geral.

Com a formulação de princípios de Direito embutidos em codificações,

cria-se a condição fundamental para a positivação do Direito.

A vantagem apontada na codificação é a modificação da estrutura do

sistema jurídico fundada no direito natural estático e não variável. Houve uma

evolução para um direito legislado, em princípio variável, pois decorrente de

uma legislatura e de decisões.

A ideia de sistema jurídico codificado não foi superada, pois garante a

necessária vinculação do juiz à lei, de modo que a liberdade criadora é

restringida.

Portanto, as recentes tendências de desenvolvimento de novas formas de

compreender e aplicar o Direito pressupõem a codificação. Mas não se resumem

à lei formal.

Os contornos da vinculação no sistema jurídico e os limites da

interpretação ou criação, para além do texto da norma no Código legal, são os

(35)

1.6 As acepções de Constituição

É cediço que vocábulo constituição apresenta infinitas acepções na

linguagem.

Partindo da acepção mais comum, até intuitiva, Constituição tem o

sentido de composição, formação, organização para formar uma unidade.

Sob uma perspectiva sociológica, é possível desenvolver esse conceito, já

que todo povo tem uma constituição de fato, pois é formado por elementos de

várias espécies, e tais elementos se acham organizados de certa forma,

compondo uma unidade.

Cada povo estabelece um conjunto de princípios e normas que o

diferencia dos demais, na medida em que reflete seus valores, suas necessidades

fundamentais e suas possibilidades.

A Constituição dos Estados assumiu admirável importância na vida dos

povos a partir do final do século XVIII, quando os Estados Unidos da América

adotaram uma Constituição escrita, que foi a primeira do mundo a ser colocada

em prática30.

Seus criadores pretendiam consagrar num instrumento jurídico os

objetivos políticos.

A propósito, no decorrer da história, muitas vezes o sentido político da

Constituição prevaleceu sobre o jurídico. Nessas épocas, a Constituição

representou um manifesto político formal e solene, com a definição do regime

30

(36)

político, organização do poder público e fixação das regras de participação do

povo no exercício do poder político.

Segundo Dalmo de Abreu Dallari31, Constituição em sentido jurídico

surge na Inglaterra, durante a segunda metade da Idade Média, quando, na

ocorrência de conflitos entre poderosos, se alega que os costumes antigos

deveriam ter força de lei, impedindo decisões em sentido contrário.

O conhecimento da origem histórica deixa claro que a constituição de fato

está nos fundamentos da Constituição em sentido jurídico.

E a Constituição em sentido jurídico se fortaleceu durante o século XX,

principalmente após a Segunda Guerra Mundial, deflagrada por governos

ditatoriais que propagavam o desenvolvimento de programas visando a correção

de graves desajustes sociais, sob o argumento de melhor eficiência dos governos

com o fim das barreiras constitucionais.

Contudo, depois de assumirem o poder, ampliaram a dominação e se

impuseram como ditaduras.

Essa triste passagem na história da humanidade impôs o desenvolvimento

de um novo constitucionalismo, inspirado na noção de Constituição como norma

jurídica superior, dotada de máxima eficácia jurídica e com o reconhecimento da

natureza jurídica de todos os princípios e normas nela contidas.

Vejamos, a seguir, alguns aspectos relacionados ao significado da

Constituição nas relações políticas e jurídicas.

31

(37)

1.7 Constituição como limite

A norma jurídica, em geral, é pensada e elaborada dentro de um contexto

fático momentâneo e de acordo com o tempo e o espaço. Daí o seu caráter

histórico.

A Constituição de uma comunidade política concreta, seu conteúdo, a

singularidade de suas normas e seus problemas hão de ser compreendidos de

uma perspectiva histórica agregada a uma justificação e configuração teórica32.

Por ser produzida pelo homem e para o homem, inúmeros aspectos

extrajurídicos influenciam no processo de criação, de modo que as tensões do

momento, os fenômenos econômicos, as manifestações sociais e outros

acontecimentos relevantes determinam o movimento pendular de primazia de

permissões ou proibições33.

No entanto, atualmente não se pode perder de vista que tanto os que

elaboram as leis quanto aqueles que as interpretam e aplicam têm a Constituição

Federal como ponto de partida34, parâmetro e limite35.

Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior36 advertem que

a palavra Constituição apresenta sentido equívoco, mas a definem como:

32

HESSE, Konrad. Temas fundamentais do Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 2.

33

Sempre de acordo com a forma de Estado, forma de governo e outras regras referentes ao exercício do poder.

34

Apenas para mencionar, adverte-se, contudo, que esta afirmação é válida no âmbito do constitucionalismo inspirado na noção de Constituição como norma jurídica superior.

35

Dalmo de Abreu Dallari ressalta que a Constituição é a norma jurídica superior, obrigatória para todos e de aplicação imediata (DALLARI, Dalmo de Abreu. A Constituição na vida dos povos: da idade média ao século XXI. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 316).

36

(38)

(...) a organização sistemática dos elementos constitutivos do Estado,

através da qual se definem as formas e a estrutura deste, o sistema de

governo, a divisão e o funcionamento dos poderes, o modelo

econômico e os direitos, deveres e garantias fundamentais, sendo que

qualquer outra matéria que for agregada a ela será considerada

formalmente constitucional.

Para José Afonso da Silva37, a Constituição do Estado, considerada sua lei

fundamental, seria a organização dos seus elementos essenciais:

Um sistema de normas jurídicas, escritas ou costumeiras, que regula a

forma do Estado, a forma de seu governo, o modo de aquisição e o

exercício do poder, o estabelecimento de seus órgãos, os limites de

sua ação, os direitos fundamentais do homem e as respectivas

garantias. Em síntese, a constituição é o conjunto de normas que

organiza os elementos constitutivos do Estado.

A Constituição “é a um só tempo o fundamento de validade de todas as

leis e a resultante jurídica do equilíbrio das forças políticas existentes na

sociedade”38.

Portanto, ainda que o caráter jurídico seja atualmente predominante, os

aspectos políticos também integram o conceito de Constituição.

É precária, nos dias de hoje, a crença segundo a qual a elaboração,

interpretação e aplicação da norma jurídica infraconstitucional possa ser

fundamentada apenas e exclusivamente em aspectos sociológicos ou filosóficos,

quando completamente desconectados da Lei Magna.

37 SILVA, José Afonso.

Curso de Direito Constitucional Positivo. 28. ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 38.

38

(39)

Tais aspectos (sociológicos ou filosóficos) não são desprezados. Eles

determinam, pelo menos, o sentido, a orientação da interpretação. Também

atuam como elo entre a realidade da vida e a generalidade e abstração da norma,

conferindo harmonia e legitimidade ao sistema jurídico.

Essas considerações iniciais são fundamentais quando se coteja a ordem

Constitucional vigente no Brasil.

Isso porque a Constituição Federal de 1988 é vultosa e rica em

princípios39.

Sem a pretensão de trazer a lume a polêmica sobre a acepção de

princípios, é adequada, para as finalidades deste estudo, a definição apresentada

por Celso Antônio Bandeira de Mello40:

Princípio é, por definição, mandamento nuclear de um sistema,

verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que irradia sobre

diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para

sua exata compreensão e inteligência exatamente por definir a lógica e

a racionalidade do sistema normativo no que lhe confere a tônica e lhe

dá sentido harmônico. É o conhecimento dos princípios que preside a

intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há por

nome sistema jurídico positivo41.

39

Luís Roberto Barroso, ao distinguir as funções dos princípios e regras, enfatiza que “Os princípios – notadamente os princípios constitucionais – são a porta pela qual os valores passam do plano ético para o mundo jurídico. Em sua trajetória ascendente, os princípios deixaram de ser fonte secundária e subsidiária do Direito para serem alçados ao centro do sistema jurídico. De lá irradiam-se por todo o ordenamento, influenciando a interpretação e aplicação das normas jurídicas em geral e permitindo a leitura moral do Direito”. (BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 204/205).

40

MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 948/949.

41

A definição de Celso Antônio Bandeira de Mello também é reproduzida por José Afonso da Silva in

(40)

É fato que a sociedade se tornou gradativamente mais complexa, as

angústias humanas foram globalizadas e são exigidas soluções imediatas para

problemas de grande magnitude, que em essência demandariam tempo e

reflexão.

A tarefa de solucionar casos concretos inéditos é cada vez mais

complicada, pois, como será demonstrado nos próximos capítulos, a própria

sociedade enfrenta dilemas de proporções planetárias, e cujas respostas não são

encontradas em um dos 35 volumes do Dictionnaire raisonné des sciences, des

arts et des métiers, elaborado pelos filósofos Iluministas do Século XVIII42.

Muitas vezes, as respostas também não são identificadas nas dezenas de

Códigos Jurídicos ou compilações de leis extravagantes do nosso tempo.

Nesses casos, é exigido do intérprete e aplicador da lei, ademais de

conhecimento técnico, extrema habilidade para identificar soluções possíveis e

viáveis no sistema jurídico positivo e, dentre as soluções identificadas e

possíveis, adotar a efetivamente adequada para o caso específico, de acordo com

os princípios jurídicos estabelecidos no sistema.

Portanto, a Constituição Federal é a fonte, mas também não deixa de ser o

limite da aplicação do Direito, ainda que por intermédio de princípios.

(41)

1.8 Constitucionalismo no século XXI: Constituição como dever

Observa-se que, desde o final do século XX, a história da humanidade tem

se destacado pela revalorização do direito como instrumento de harmonização

da convivência, de realização da justiça e de garantia da paz43.

Conforme ressaltado, profundas inovações começaram a se definir com o

fim da II Guerra Mundial.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 marca o início da

nova fase na história da humanidade. Em seu preâmbulo44 é expressamente

afirmado o liame entre direitos fundamentais e dignidade humana:

Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os

membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é

o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo,

Considerando que o desprezo e o desrespeito pelos direitos humanos

resultaram em atos bárbaros que ultrajaram a consciência da

Humanidade e que o advento de um mundo em que os homens gozem

de liberdade de palavra, de crença e da liberdade de viverem a salvo

do temor e da necessidade foi proclamado como a mais alta aspiração

do homem comum,

Considerando essencial que os direitos humanos sejam protegidos

pelo Estado de Direito, para que o homem não seja compelido, como

último recurso, à rebelião contra tirania e a opressão,

Considerando essencial promover o desenvolvimento de relações

amistosas entre as nações,

43

DALLARI, Dalmo de Abreu. A Constituição na vida dos povos: da idade média ao século XXI. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 287.

44

Resolução 217 A (III) da Assembléia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948.

(42)

Considerando que os povos das Nações Unidas reafirmaram, na

Carta, sua fé nos direitos humanos fundamentais, na dignidade e no

valor da pessoa humana e na igualdade de direitos dos homens e das

mulheres, e que decidiram promover o progresso social e melhores

condições de vida em uma liberdade mais ampla,

Considerando que os Estados-Membros se comprometeram a

desenvolver, em cooperação com as Nações Unidas, o respeito

universal aos direitos humanos e liberdades fundamentais e a

observância desses direitos e liberdades,

Considerando que uma compreensão comum desses direitos e

liberdades é da mais alta importância para o pleno cumprimento desse

compromisso.

A aproximação das ideias de constitucionalismo e de democracia

produziu nova forma de organização política que atende por nomes diversos:

Estado democrático de direito, Estado constitucional de direito, Estado

constitucional democrático45.

O Estado constitucional de direito aprofunda-se no último quarto do

século XX. Tem como característica central a subordinação da legalidade a uma

Constituição rígida.

A democracia, em sentido material, que dá alma ao Estado constitucional

de direito, ultrapassa a ideia de governo da maioria, pois se trata de governo

para todos (inclui minorias, grupos de menor expressão política, pobres etc.).

Nessa acepção, a democracia apresenta uma dimensão mais profunda,

pois impõe-se ao Estado, não apenas o respeito aos direitos individuais, mas

45

BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e Constitucionalização do Direito: O triunfo tardio do direito constitucional no Brasil in THEMIS - Revista da Escola Superior da Magistratura do

Estado do Ceará. Disponível em:

(43)

também a promoção de outros direitos fundamentais, de conteúdo social,

necessários ao estabelecimento de patamares mínimos de igualdade material,

sem a qual não existe vida digna, nem é possível o desfrute efetivo da

liberdade46.

A propósito, como já visto, uma das grandes mudanças de paradigma

ocorridas no século XX foi a atribuição à norma constitucional do status de

norma jurídica47.

Dessa forma, foi definitivamente superado o modelo adotado na Europa,

no qual a Constituição era considerada um documento essencialmente político,

um convite à atuação dos Poderes Públicos48.

Mudanças políticas direcionadas à proteção da dignidade humana e ao

reconhecimento e efetivação dos direitos fundamentais da pessoa, sem

discriminações, passaram a definir uma nova concepção do próprio direito.

O registro e a análise dessas inovações de excepcional importância para

cada povo em particular, e, em seu conjunto, para toda a humanidade, vêm

sendo feitos por teóricos do Direito de diversas partes do mundo, sob a epígrafe

de neoconstitucionalismo.

Luís Roberto Barroso define o neoconstitucionalismo49:

46

Luís Roberto Barroso faz distinção entre democracia em sentido material, conforme comentado, e democracia, em dimensão formal, que inclui a ideia de governo da maioria e de respeito aos direitos individuais, frequentemente referidos como liberdades públicas – como as liberdades de expressão, de associação e de locomoção – realizáveis mediante abstenção ou cumprimento de deveres negativos pelo Estado (BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 41/42).

47

Para maior aprofundamento sobre o tema recomenda-se a leitura do artigo intitulado A força normativa da Constituição in HESSE, Konrad. Temas Fundamentais do Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 121/146.

48

(44)

O neoconstitucionalismo ou novo direito constitucional, na acepção

aqui desenvolvida, identifica um conjunto amplo de transformações

ocorridas no Estado e no direito constitucional, em meio às quais

podem ser assinalados, (i) como marco histórico, a formação do

Estado constitucional de direito, cuja consolidação se deu ao longo

das décadas finais do século XX; (ii) como marco filosófico, o

pós-positivismo, com a centralidade dos direitos fundamentais e a

reaproximação entre Direito e ética; e (iii) como marco teórico, o

conjunto de mudanças que incluem a força normativa da Constituição,

a expansão da jurisdição constitucional e o desenvolvimento de uma

nova dogmática da interpretação constitucional. Desse conjunto de

fenômenos resultou um processo extenso e profundo de

constitucionalização do Direito.

Para alguns teóricos, o que se tem é a Constituição tradicional dotada de

nova eficácia, especialmente para garantia dos direitos fundamentais da pessoa

humana, razão pela qual preferem a epígrafe garantismo50.

Especificamente em relação ao garantismo, não se pode olvidar os

ensinamentos de Luigi Ferrajoli51.

Ao discorrer sobre o sentido do atual Estado Constitucional de Direito,

baseado na rigidez constitucional52, que é uma verdadeira invenção do nosso

século, Ferrajoli53 estabelece o que entende por garantismo:

49

BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e Constitucionalização do Direito: O triunfo tardio do direito constitucional no Brasil in THEMIS - Revista da Escola Superior da Magistratura do

Estado do Ceará. Disponível em:

<http://bdjur.stj.gov.br/xmlui/bitstream/handle/2011/18540/Neoconstitucionalismo_e_Constitucionaliz a%E7%E3o_do_Direito.pdf?sequence=2>. Acesso em: 08 ago. 2010.

50

DALLARI, Dalmo de Abreu. A Constituição na vida dos povos: da idade média ao século XXI. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 289.

51 Luigi Ferrajoli é professor de Filosofia do Direito e de Teoria Geral do Direito da Università de Camerino – Itália.

52

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