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(1)UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO FACULDADE DE HUMANIDADES E DIREITO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO. IMANUEL E ESPÍRITO DE IAHWEH: Leitura e releitura do messianismo em Isaías (7,10-17; 8,23-9,6; 11,1-9). por. Suely Xavier dos Santos. São Bernardo do Campo — Junho de 2011.

(2) 2. UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO FACULDADE DE HUMANIDADES E DIREITO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO. IMANUEL E ESPÍRITO DE IAHWEH: Leitura e releitura do messianismo em Isaías (7,10-17; 8,23-9,6; 11,1-9). por. Suely Xavier dos Santos. Orientador Prof. Dr. Tércio Machado Siqueira. Tese apresentada em cumprimento parcial às exigências do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião, para obtenção do grau de Doutora.. São Bernardo do Campo — Junho de 2011.

(3) 3. A tese de doutorado sob o título “Imanuel e espírito de Iahweh: leitura e releitura do messianismo em Isaías (7,10-17; 8,23-9,6; 11,1-9)”, elaborada por Suely Xavier dos Santos foi defendida e aprovada em 26 de Abril de 2011, perante a banca examinadora composta por: Prof. Dr. Tércio Machado Siqueira (Presidente/UMESP), Prof. Dr. Milton Schwantes (Titular/UMESP), Prof.. Dr.. Lauri. Wirth. (Titular/UMESP),. Prof.. Dr.. Valmor. da. Silva. (Titular/Universidade Católica de Goiás – UCG), Prof. Dr. Renatus Porath (Titular/Escola Dominicana de Teologia – EDT).. _______________________________________ Prof. Dr. Tércio Machado Siqueira Orientador e Presidente da Banca Examinadora. _______________________________________ Prof. Dr. Jung Mo Sung Coordenador do Programa de Pós-Graduação. Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião Área de Concentração: Linguagens da Religião Linha de Pesquisa: Literatura e Religião no Mundo Bíblico.

(4) 4. Agradecimentos Um trabalho não é feito sozinha. Como diz a música: sozinho isolado ninguém é capaz. Reconhecer esta incapacidade de obter realizações sozinha é reconhecer a capacidade de outros/as em nos ajudar nos projetos e sonhos de nossa vida. Por isso, quero agradecer a todas as pessoas que direta ou indiretamente me ajudaram neste trabalho. Especialmente, faço os seguintes destaques a seguir, pois foram pessoas capazes de estar com, ainda que, mesmo que.... A gradeço em especial ao meu marido Edemir Antunes, pela paciência, solidariedade, amizade e, sobretudo, amor em todos os momentos desta caminhada. Também agradeço pelo presente recebido no apagar das luzes de 2010: nossa pequena Letícia, a nossa “alegria”.. À. minha família de Goiânia e de São Carlos pelo apoio incondicional, ainda que distantes.. A o professor, orientador e amigo Tércio Machado Siqueira, por sua paciência e solidariedade, que muito me ensinou acerca da tolerância e da possibilidade de transformação das pessoas. Um mineiro de primeira, com toda a gama de significa que isto representa. Juntamente com ele sua família, D. Emilse, Tânia e Tiago.. À s comunidades locais: Igreja Metodista em Colorado (Carrãozinho) e Jabaquara, pela compreensão e incentivo nos mais diversos momentos dessa caminhada.. À s/aos funcionárias/os do Curso de Pós-Graduação em Ciências da Religião e da Faculdade de Teologia, pela atenção e gentileza durante o curso..

(5) 5. À s/aos amigas/os: Márcio Divino e Elaine, João Marcos Didio e Celena, Margarida (tchê), Andreia e Rose, que me incentivaram e acompanharam neste período acadêmico. À Celena e a Elaine minha gratidão especial pela o empréstimo de suas habilidades lingüísticas.. A s/aos amigos da Faculdade Teologia, onde estudei e agora leciono, pois vocês também fazem parte desse processo de formação e agora de transformação.. A o IEPG pelo apoio inconteste em momentos importantes desta pesquisa..

(6) 6. SANTOS, Suely Xavier dos. Imanuel e espírito de Iahweh: leitura e releitura do messianismo em Isaías (7,10-17; 8,23-9,6; 11,1-9). São Bernardo do Campo: Umesp, 2011. Tese (Doutorado em Ciências da Religião) – Faculdade de Humanidades e Direito, Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião, Universidade Metodista de São Paulo (UMESP).. SINOPSE O objeto de pesquisa desta dissertação são as perícopes de Isaías 7,10-17; 8,23-9,6 e 11,1-9. Nelas encontra-se o cerne do pensamento messiânico de Isaías. É importante salientar que o messianismo isaiano parte da concepção de um messias que vem para governar a partir do direito e da justiça, e, assim, estabelecer a paz. O messianismo apresentado por este profeta não parte das esferas de poder da corte, mas dos pequenos e frágeis da sociedade, dotados do espírito de Javé. Há que se destacar que a profecia de Isaías é um divisor de águas no que concerne à teologia messiânica no Reino do Sul, especialmente nos profetas depois dele. Em Isaías, encontra-se a ruptura com as classes dominantes e com um messianismo bélico. A proposta deste profeta aponta para um messias frágil, mas que é movido pelo sopro, pelo movimento de Javé em suas ações. E assim, Isaías abre as portas para compreensão de um messias pobre, como retrata Zacarias, um messias servo, apresentado pelo Dêutero-Isaías, ou quem sabe um messias pastor, como proposto por Miquéias e Ezequiel e bem recebido pelas tradições do primeiro século (Jo 10,10). O messias em Isaías tem “nomes e adjetivos”: Imanuel, menino, raiz de Jessé, mas não tem rosto, não tem localização geográfica, não se enquadra em nenhum tipo messiânico desde o davidismo de Jerusalém. Este messias pode ser encontrado em qualquer época com qualquer rosto, por isso a importante releitura messiânica apresentada em textos do cristianismo nascente. Muitos deles inspirados na profecia isaiana do 8º. século a.C.. Palavras-chave: messias, messianismo, ruah Iahweh, Imanuel, criança, pastor..

(7) 7. SANTOS, Suely Xavier dos. Imanuel and spirit of Iahweh: reading and rereading of the messianism in Isaiah (7,10-17; 8,23-9,6; 11,1-9). São Bernardo do Campo: Umesp, 2011. Tese (Doutorado em Ciências da Religião) – Faculdade de Humanidades e Direito, Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião, Universidade Metodista de São Paulo (UMESP).. ABSTRACT The object of research of this dissertation are perícopes of Isaiah 7,10-17; 8,239,6 and 11,1-9. In this we meet the principal point of the messianic thought of Isaiah. It is important to observe that the isaian messianism comes from the conception of messiah that comes to govern from the right and justice, and, thus, to establish the peace. The messianism presented for this prophet don’t part of the spheres of the kingdom power, but of the small and fragile persons of the society, endowed with the spirit of Yahweh. It has to be distinguished that the prophecy of Isaiah is a watershed with respect to the messianic theology in the Kingdom of the South, especially the prophets after him. In Isaiah, we meet the rupture with the ruling classes and a warlike messianism. The proposal of this prophet points to a fragile messiah, but that is moved by the blow, by the movement of Yahweh and his action. And thus, Isaiah opens the doors for understanding a poor messiah, as Zechariah recognize, a messiah in service, presented for the Second-Isaiah, or who knows a shepherd messiah, as considered by Micah and Ezekiel and received well for the traditions of the first century (Jo 10,10). The messiah in Isaiah have “names and adjectives”: Imanuel, child, root of Jessé, but do not have face, do not have geographic localization, is not fit in the messianic type since the davidic of Jerusalem. These messiah can be found at any time with any face, by that is important a new reading messianic presented in texts of the current Christianity. Many of inspired them in the isaian prophecy of 8º. century B.C. Word-key: messiah, messianism, ruah Yahweh, Imanuel, child, pastor..

(8) 8. SANTOS, Suely Xavier dos. Imanuel y espíritu de Yahweh: primera y segunda lectura del mesianismo en Isaías (7,10-17; 8,23-9,6; 11,1-9). São Bernardo do Campo: Umesp, 2011. Tesis (Doctorado en Ciencias Religiosas) - Facultad de Humanidades y Derecho, Programa de Posgrado en Ciencias Religiosas de la Universidad Metodista de São Paulo (UMESP).. RESUMEN El objeto de la investigación de esta tesis son los pasajes de Isaías 7,10-17, 8,23-9,6 y 11,1-9, pues se supone que ahí está el corazón del pensamiento mesiánico de Isaías. Es importante destacar que el mesianismo de Isaías posee una concepción de un Mesías que viene a gobernar con la ley y con la justicia, y con ello establecer la paz. El mesianismo de este profeta no proviene de las esferas de poder de la corte, pero proviene de los pequeños y frágiles de la sociedad, dotado con el espíritu de Yahweh. Cabe señalar que la profecía de Isaías es un punto de inflexión en relación a la teología en el reino mesiánico del Sur, especialmente en los profetas después de él. Es en Isaías que se localiza la ruptura con las clases dominantes y con el mesianismo de guerra. El propósito de este profeta apunta a un mesías frágil, pero que se mueve por el soplo, por el movimiento del Yahweh en sus acciones. Y así, Isaías abre la puerta a una comprensión de un mesías pobre, como en Zacarías, un siervo mesías, presentado por el Dêutero-Isaías, o tal vez un pastor mesías, según lo propuesto por Ezequiel y Miqueas, y bien recibido por las tradiciones del siglo I (Jn 10:10). El mesías en Isaías tiene "nombres y adjetivos": Imanuel, niño, raíz de Jesé, pero no tiene rostro, no hay localización geográfica, no se ajusta a cualquier tipo mesiánico desde David en Jerusalén. Este mesías se puede encontrar en cualquier época con cualquier rostro, por eso la importancia de una segunda lectura mesiánica presentada en los textos del cristianismo primitivo. Muchos de ellos inspirados en la profecía de Isaías en el 8º. siglo a.C.. Palabras-claves: mesías, mesianismo, ruah Yahweh, Imanuel, niño, pastor..

(9) 9. SUMÁRIO. Sinopse ______________________________________________________ 06 Abstract ______________________________________________________ 07 Resumen _____________________________________________________ 08 Sumário ______________________________________________________ 09 Introdução ____________________________________________________ 14. 1. Metodologia _____________________________________________ 15 2. Sobre o texto ____________________________________________ 17 3. Revisão de Literatura ______________________________________ 18 Sendo assim... _____________________________________________ 21. I – Construindo caminhos para compreensão da figura messiânica no AT ____________________________________ 22 Considerações Introdutórias ______________________________________ 22. 1. O messias e o messianismo na antiguidade ________________________ 24 1.1. Os hititas ______________________________________________ 25 1.2. O zoroastrismo _________________________________________ 26 2. Messias e o Messianismo: uma leitura sociológica ___________________ 29.

(10) 10. 2.1. Messianismo e Milenarismo _______________________________ 32 3. O movimento messiânico e o Antigo Testamento ____________________ 33. Excurso ______________________________________________________ 37 A. Poder em Michel Foucault __________________________________ 37 B. Expressões de poder na sociedade judaíta do século 8º. a.C. ______ 38. Considerações _________________________________________________ 42. II – Olhando os horizontes: contexto histórico-social da esperança messiânica_________________________________ 43 Considerações Introdutórias ______________________________________ 43 1. Messias e messianismo em Israel ________________________________ 43 1.1. Messias no Antigo Testamento _____________________________ 44 1.2. Tradições messiânicas ___________________________________ 48 1.2.1. O messianismo de Judá ____________________________ 51 Excurso ______________________________________________________ 54 1.2.2. O messianismo de Jerusalém ________________________ 56 1.2.3. O messianismo do Norte ____________________________ 61 2. Corpus da literatura isaiana _____________________________________ 63 2.1. Contexto histórico-social de Isaías __________________________ 63 2.1.1. O cenário nacional do Sul – Judá e Jerusalém ___________ 63 2.1.2. O cenário internacional _____________________________ 65 2.1.3. A profecia isaiânica ________________________________ 69. 3. Isaías e a tradição messiânica de Jerusalém e Judá __________________ 69 Considerações _________________________________________________ 74.

(11) 11. III – Abrindo portas: a trama textual de Isaías e as possibilidades de interpretações ________________________ 75 Considerações Introdutórias ______________________________________ 75. A. A trama textual de Isaías 7,10-17 ________________________________ 77 1. Texto hebraico ___________________________________________ 80 2. Tradução literal __________________________________________ 81 3. As variantes do texto hebraico _______________________________ 82 4. Forma do texto ___________________________________________ 83 4.1. Estrutura literária do texto ____________________________ 83 4.2. A perícope nos seus aspectos internos __________________ 84 5. A inter-relação e coesão do texto ____________________________ 85 5.1. Oráculo de salvação v. 10-11 __________________________ 85 5.2. Recusa do sinal v. 12 ________________________________ 88 5.3. O sinal é dado v. 13-15 ______________________________ 90 5.4. Consequências do sinal v. 16-17 _______________________ 96. B. A trama textual de Isaías 8,23-9,6 ________________________________ 98 1. Texto hebraico ___________________________________________ 98 2. Tradução literal __________________________________________ 99 3. As variantes do texto hebraico ______________________________ 100 4. Forma do texto __________________________________________ 101 4.1. Estrutura literária da perícope ________________________ 101 4.2. A perícope e seus aspectos internos ___________________ 102 5. A inter-relação e coesão do texto ___________________________ 102 5.1. Descrição da aflição do povo v. 8,23-9,2 ________________ 102 5.2. Descrição da libertação v. 9,3-5 _______________________ 102 5.2.1. Fim do jugo v.3 ____________________________ 105 5.2.2. Fim da guerra v. 4 __________________________ 106 5.2.3. Nasce a criança v. 5 ________________________ 106 5.3. Conseqüências do nascimento da criança v. 6 ___________ 109.

(12) 12. C. A trama textual de Isaías 11,1-9 ________________________________ 110 1. Texto hebraico __________________________________________ 114 2. Tradução literal _________________________________________ 115 3. As variantes do texto hebraico ______________________________ 116 4. Forma do texto __________________________________________ 117 4.1. Estrutura literária da perícope ________________________ 117 4.2. A perícope e seus aspectos internos ___________________ 118 5. A inter-relação e coesão do texto ___________________________ 119 5.1. Um novo tempo: o rebento e a ruah de Javé v.1-3a _______ 119 5.2. Descrição do governo do broto: justiça ao pobre v.3b-5 ____ 125 5.4. Conseqüências do governo do broto v.6-8 _______________ 128 5.4. Conhecimento de Javé: plenitude do tempo v.9 __________ 130. Considerações ________________________________________________ 131. IV – Seguindo novos rumos: rupturas e releituras no projeto messiânico de Isaías _________________________________ 133 Considerações Introdutórias _____________________________________ 133. 1. O Imanuel __________________________________________________ 135 1.1. Imanuel e o davidismo ______________________________ 136 1.2. Imanuel como sinal ________________________________ 140 1.3. Imanuel: um sinal para mudanças _____________________ 142. 2. Messias criança _____________________________________________ 144 2.1. O messias para paz ________________________________ 146. 3. A ruah de Yahweh ___________________________________________ 148 3.1. O rebento e a rûaH de Yahweh: proposta de releitura ______ 152. 4. Messianismo isaiano _________________________________________ 155 4.1. Consequências do messianismo em Isaías __________________ 156.

(13) 13. 4.2. Messianismo e Davi ____________________________________ 158 5. Messianismo nos profetas pós Isaías ____________________________ 162 5.1. Miquéias: messias pastor ________________________________ 162 5.2. Jeremias: messias germe justo____________________________ 164 5.3. Ezequiel: messias broto e pastor __________________________ 165 5.4. Dêutero-Isaías (40-55): messias servo de Javé _______________ 167 5.5. Zacarias: messias pobre _________________________________ 169. 6. Messianismo judaísmo Pós-Exílico ______________________________ 172 6.1. Pretendentes messiânicos no primeiro século d.C. ____________ 174 6.2. De messias escatológico ao cristianismo ____________________ 175. Considerações ________________________________________________ 177. Conclusão ___________________________________________________ 180. Bibliografia ___________________________________________________ 184 1. Artigos ________________________________________________ 184 2. Artigos do Periódico CAPES _______________________________ 187 3. Bíblias ________________________________________________ 189 4. Dicionários e Gramáticas __________________________________ 190 5. Dissertações e Teses ____________________________________ 192 6. Outros ________________________________________________ 193.

(14) 14. INTRODUÇÃO. A motivação desta pesquisa se dá pela presença constante do tema messianismo no imaginário tanto da sociedade como das comunidades de fé. Trata-se de um tema que perpassa a vida cotidiana das pessoas e que as ajuda a lidar com suas demandas no dia a dia, sempre tendo em vista a esperança de algo melhor através de um messias. Mas, ao mesmo tempo, a própria presença da esperança messiânica já se torna, em si, uma esperança que motiva e ajuda na expectativa de dias melhores. E neste caso, especialmente para os/as cristãos/as, as profecias isaianas oferecem como que um contorno do messianismo latente. Uma criança que traz esperança! Esta é percepção quando se lê textos messiânicos em Isaías. Neste sentido, a Bíblia, através do profeta Isaías, oferece recursos para modificar uma situação limite e para alimentar uma utopia1.. 1. Utopia aqui utilizada como apresentada por Karl Mannheim para o qual a utopia, mais do que não lugar, significa a representação daquilo que não existe ainda, mas que poderá existir se o ser humano lutar para sua concretização, trata-se de algo destinado a realizar-se, o fundamento da renovação social. Segundo Mannheim: “a desaparição da utopia ocasiona um estado de coisas estático em que o próprio homem se transforma em coisa. Iríamos, então, nos defrontar com o maior paradoxo imaginável, ou seja, o do homem que, tendo alcançado o mais alto grau de domínio racional da existência, se vê deixado sem nenhum ideal, tornando-se um mero produto de impulsos. (...) o homem perderia, com o abandono das utopias, a vontade de plasmar a história e, com ela, a capacidade de compreendê-la” Cf. MANNHEIM, Karl. Ideologia e Utopia. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1976. p. 285..

(15) 15. A profecia Isaías, neste sentido é permeada de utopias, através de oráculos de julgamento e salvação. Estes conceitos estão igualmente presentes no anúncio messiânico apresentado nas perícopes, objeto desta tese, que se encontra em Isaías 7,10-17; 8,23-9,6 e 11,1-9. São narrativas que abordam o contexto imediato ao profeta e, ao mesmo tempo, apresenta uma nova perspectiva de vida, na qual estão presentes a observância da justiça e do direito.. O objetivo desta tese é perguntar sobre qual a característica messiânica apresentada pelo profeta Isaías e quais as conseqüências deste anúncio. O messianismo isaiano deve ser compreendido, antes de tudo, como uma profecia que ultrapassa os limites da historie2. Trata-se de profecias que sobreviveram ao longo do tempo, desvinculada até do ideário messiânico criado a partir da monarquia davídica jerosolimitana.. Nesta tese, o ponto de partida será a discussão sobre os conceitos de messias e messianismo no Antigo Oriente, no Antigo Testamento para em seguida apresentar o profeta Isaías e sua mensagem. Para tanto, será utilizado o trabalho exegético para análise das perícopes objeto desta tese.. 1. Metodologia Para Tiemeyer, “grande parte da atual pesquisa é interdisciplinar (...) Além disso, estudiosos freqüentemente usam uma variedade de abordagens para o material profético, dependendo do objetivo do estudo.”3 Neste sentido, este trabalho busca, através do exercício técnico, superar o desafio e unir informações de maneira interdisciplinar. Cabe salientar que o “dado coletado ‘nunca é verdadeiro’ em si e só tem utilidade ou pertinência em relação com. 2. Historie no sentido de uma historiografia narrativa que se preocupa com fatos e não com os eventos e seus desdobramentos, ainda que pertencente ao imaginário pode ser criado e recriado. 3 TIEMEYER, Lena-Sofia. "Recent Currents in Research on the Prophetic Literature”. In: The expository times. Vol. 119, nº. 4 . SAGE Publications: Los Angeles/ London/ New Delhi/Singapore, 2007. p. 161. http://ext.sagepub.com/cgi/content/abstract/119/4/161. Acessado em 15/07/2010..

(16) 16. uma problemática, com uma teoria e com uma técnica”.4 Assim sendo, esta tese se ocupou, metodologicamente, dos seguintes passos:. 1. Levantamento bibliográfico referente ao tema proposto.. 2.. Leitura. de. textos. de. orientações. teórico-metodológicas. e. levantamento de informações necessárias para o trabalho.. 3. Ampliação das fontes para a pesquisa.. Deste modo, a pesquisa bibliográfica deste trabalho, para a análise das perícopes messiânicas em Isaías, terá como ponto de partida as obras para exegese bíblica, bem como instrumentais para melhor compreensão do texto no seu contexto imediato. Para tanto, serão utilizados textos para aplicação dos métodos de interpretação da Bíblia, textos de exegese, dicionários, léxicos, artigos referentes ao tema, obras que elucidem melhor o contexto e a perícope, enfim obras historiográficas exegéticas para melhor compreensão do tema e posterior acréscimo às pesquisas referentes ao texto de Isaías.. A metodologia utilizada nesta pesquisa leva em conta os métodos exegéticos desenvolvidos na atualidade pela moderna crítica da Bíblia, com destaque para os métodos sociológico e histórico-crítico. Tendo em vista que o primeiro foi desenvolvido na América-Latina, terá uma deferência maior nesse trabalho.. O fato de que o livro de Isaías, mais especificamente nas perícopes de 7,10-17; 8,23-9,6 e 11,1-9, ser um dos poucos que fazem referência ao contexto imediato do profeta, a pesquisa também se deterá com maior abrangência nos textos de história, pois a expansão da Assíria e a guerra siroeframimita refletem o ambiente de atuação de Isaías. Compreender estes fatores externos é fundamental para elucidar as questões internas, das quais Isaías faz parte. Mesmo porque, a teologia bíblica na atualidade não faz 4. BRUYNE, P., HERMAN, J., SCHOUTHEETE, M. Dinâmica da pesquisa em ciências sociais: os pólos da prática metodológica. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1982, p.210..

(17) 17. acepção entre história e teologia5, mas acentua a correspondência entre os mesmos, e a dissociação destas concepções, históricas e teológicas, não ajudam na compreensão do todo da pesquisa bíblica-teológica atual.. 2. Sobre o texto O estudo no livro de Isaías é extenso. Isto se deve ao fato de que Isaías é um profeta que ao longo da tradição bíblica foi tido e relido como referencial para outros livros proféticos. Outro fator que explica essa extensa bibliografia dá-se pela assimilação no Novo Testamento dos textos desse profeta e sua aplicação à figura de Jesus Cristo, principalmente nos textos chamados messiânicos.. Sendo. assim,. esta. pesquisa. abordará. o. messianismo. bíblico,. especialmente, o messianismo do século 8º. a.C. a partir do profeta Isaías. Cabe salientar que nenhuma das perícopes estudadas, a saber, 7,10-17; 8,239,6 e 11,1-9, trabalha com a palavra messias, e igualmente não há um personagem que se enquadre nas suas profecias. Contudo, estes textos são messiânicos a medida que propõem um novo veio do messianismo bíblico. Segundo Louise Pettibone Smith, “sem as passagens messiânicas, o pensamento de Isaías é incompleto”6. E neste sentido, as passagens messiânicas de Isaías apontam para uma nova direção no que concerne ao messianismo.. Esta tese procura trabalhar ao longo dos capítulos o que deu origem ao pensamento e teologia messiânica no Reino do Sul, Judá e Jerusalém, além de apresentar as características teológicas que cada grupo guardou na sua tradição e que vieram a ser preponderantes na expectativa messiânica até o primeiro século da era cristã. 5. A respeito da ponte entre Teologia e História da Religião no Antigo Testamento, conferir: SCHMIDT, W. H. A fé do Antigo Testamento. São Leopoldo: EST/Sinodal, 2004. p. 13-35. 6 SMITH, Louise Pettibon. “The Messianic Ideal of Isaiah”. In: Journal of Biblical Literature. The Society of Biblical Literature, Vol. 36, No. 3/4 (1917), p.211. http://www.jstor.org/stable/3259226 Acessado em: 15/01/2009..

(18) 18. Também será abordada as perícopes conhecidas como messiânicas no livro, 7,10-17; 8,23-9,6 e 11,1-9, a partir da análise dos textos com o uso de instrumentais da exegese, especialmente, latino americana.. 3. Revisão de Literatura Esta revisão de literatura deter-se-á em textos sobre Teologia, História, Sociologia e Introdução ao Antigo Testamento, para assim tecer os fios sobre os quais será delineada esta tese. Também serão ressaltados artigos e teses que apresentam uma discussão salutar para esta pesquisa. Para um olhar sobre o messianismo no Antigo Oriente Médio7 foram pesquisados os autores: Werner Schmidit8, Fohrer9 e Norman Cohn10 para uma aproximação do termo messias e o conceito messiânico. A partir destes autores, cada um à sua maneira, discorrer-se-á sobre a gênese do movimento messiânico na antiguidade, com a singularidade de que Cohn aponta para um messianismo que cresce no zoroastrismo, este que, para o autor, surge em 1500 a.C., o que difere de muitos autores que alocam este movimento para o período de 500 a.C., como será visto alhures.. A fim de obter uma compreensão da terminologia messias, serão utilizados dicionários11 bíblicos e teológicos, além de bibliografias auxiliares que apontam para o surgimento do conceito messiânico.. 7. Nesta tese, em muitos lugares, será utilizada a sigla AOM para Antigo Oriente Médio. SCHMIDIT, Werner, H. A fé no Antigo Testamento. São Leopoldo: Sinodal, 2004. 562p. 9 FOHRER, Georg. História da religião de Israel. São Paulo: Paulinas, 1982. 507p. 10 COHN, Norman. Cosmos, caos e o mundo que virá: as origens das crenças no Apocalipse. São Paulo: Cia das Letras, 1996. 11 HARRIS, Laird Harris et all. Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1998. 3067p. JENNI, Ernest e WESTERMANNN, Claus. (ed.). Diccionario Teológico Manual del Antiguo Testamento. Vol. 1 e 2. Madrid: Cristiandad, 1978. 1272p. e 729p. MONLOUBOU, L. e DU BUIT, F. M. Dicionário Bíblico Universal. São Paulo/Petrópolis: Santuário/Vozes, 1996. 827p. MCKENZIE, John L. Dicionário Bíblico. São Paulo: Paulinas, 1984. 746p. BOTTERWEK, G. Johannes; RINGGREN, Helmer e FABRY, Heins-Josef (ed). Theological Dictionary of the Old Testament. Vol. IX. Michigan: William B. Eerdmans, 2004. 8.

(19) 19. No que se refere à bibliografia Latino-Americana, entre outros textos, há que se destacar os de Croatto12, Schwantes13 e Siqueira14 os quais apresentam uma perspectiva que elucida melhor os conflitos existentes no corpus da literatura isaiana, bem como do messianismo. Há muitos textos, como os de Schwantes15, que ajudam na compreensão da gênese desse movimento messiânico no Antigo Testamento, que tomou seus contornos, principalmente, depois do exílio babilônico, século V a.C. Schmidt16, também trabalha com o messianismo a partir do Antigo Oriente Médio (AOM) até o princípio dos movimentos apocalípticos no pósexílio.. Quanto à análise sociológica serão apontadas bibliografias como de Durkheim17, Desroche18 e Queiroz19, para uma melhor assimilação dos movimentos messiânicos e os contornos dos mesmos. Uma vez que a sociologia aborda esta questão como um movimento social, que parte de uma esperança em vigília, e vai tomando a forma de um messianismo de acordo com a estrutura analisada pela sociologia.. Na perspectiva da Teologia e História encontramos em Gerhard von Rad20 e também Schmidt21 um vasto material sobre a teologia isaiana e o contexto profético. Faz-se necessário salientar que nesta pesquisa será destacado o Primeiro Isaías, a saber, Isaías 1-39, mais especificamente parte do “Livro do Imanuel”, Isaías 6,1-9,6 + 11,1-9. 12. CROATTO, J. Severino. Isaías, Vol I:1-39 – o profeta da justiça e da fidelidade. São Paulo / Petrópolis / São Leopoldo: Imprensa Metodista/ Vozes/ Sinodal, 1989. 247p. 13 SCHWANTES, Milton. “Esperanças messiânicas e davídicas.” In: Revista Estudos Bíblicos, nº 13. São Leopoldo/Petrópolis: Sinodal/Vozes, 1989. 18-29 e SCHWANTES, Milton. Isaías (Textos Selecionados). Vol. 1 e 2. São Leopoldo: FT da IECLB, 1979. 14 SIQUEIRA, Tércio Machado. “O rei menino”. In: Revista Estudos Bíblicos, nº 54. São Leopodo/Petrópolis: Sinodal/Vozes, 1997. 15 SCHWANTES, Milton. “Esperanças messiânicas e davídicas”. op. cit. 16 SCHMIDIT, Werner, H. A fé no Antigo Testamento. op. cit. 17 DURKHEIM, Émile. Formas elementares de vida religiosa. São Paulo: Paulus, 1989. 536p. 18 DESROCHE, Henri. Dicionário de Messianismo e Milenarismo. São Bernardo do Campo: UMESP, 2000. 503p, e DESROCHE, Henri. Sociologia da esperança. São Paulo: Paulinas, 1985. 265p. 19 QUEIROZ, Maria I. Pereira. O messianismo no Brasil e no mundo. São Paulo: Alfa-Omega, 1976. 441p. 20 RAD, Gerhard von. Teologia do Antigo Testamento. Vol. 2. São Paulo: ASTE, 1974. 465p. 21 SCHMIDIT, Werner, H. A fé no Antigo Testamento. op. cit..

(20) 20. No que diz respeito à tradição messiânica no Norte, uma novidade nas pesquisas, há o texto de Ricardo Pietrantonio22. Sua tese se baseia no texto de João 11,54, o qual faz referência a Jesus em Efraim. E ainda para aprofundar sua tese, o autor salienta que existia um judaísmo que não permitia evocar a tradição de Efraim no messianismo, apenas aquele que provém de Davi. A respeito do século 8º. a.C., a obra de Herbert Donner23 traz uma discussão salutar, quando dedica um capítulo inteiro para o domínio da Assíria no período do século XII, passando pelo século 8º. a.C. até meados do século 7º. a.C. Ali se encontram informações concernentes à política de dominação Assíria, e como esta influenciou outros povos que apareceram no cenário da Palestina nos séculos que se seguiram. Donner destaca os estágios de vassalagens dos assírios e qual a posição de Judá nesse contexto. Assim, temse nessa obra uma porta de entrada para o cenário da época em que viveu o profeta Isaías. Obras como as de Schökel e Sicre24 apresentam um estudo mais exegético do texto de Isaías. Estes têm como ponto de partida a análise literária do texto e posterior exegese. Assim, eles ajudam a elucidar algumas questões sobre o livro de Isaías, cada qual com a sua leitura e releitura deste profeta. Alguns textos como de Asurmendi25 e Sicre26 escritos nas décadas de 80, ajudam a melhor compreender os aspectos das profecias do século 8º. a.C., bem como as diferenças entre profetas, videntes, visionários e homens de Deus.. 22. PIETRANTONIO, Ricardo. “El Mesias asesinado – el Mesias ben Efraim en el evangelio de Juan.” In: Revista Bíblica, ano 44, nº 5. Buenos Aires: Litodar, 1982/1. 1-63p. 23 DONNER, Herbert. História de Israel e dos povos vizinhos. Vol. 2. São Leopoldo/Petrópolis: Sinodal/Vozes, 1997. 272-503p. 24 ALONSO SCHÖKEL, L. & SICRE DIAZ, J. L. Profetas I. São Paulo: Paulus, 1988. 679p. 25 ASURMENDI, Jesus. O profetismo das origens à época moderna. São Paulo: Paulinas, 1988. 148p. Isaías 1-39. São Paulo: Paulinas, 1980. 100p. 26 SICRE, J. L. Profetismo em Israel: o profeta, os profetas, a mensagem. Petrópolis: Vozes, 1996. 539p..

(21) 21. Uma das dificuldades do “Livro do Imanuel” diz respeito à delimitação. Alguns autores delimitam a perícope de 6,1-12,6, outros de 7,1-12-6, ou ainda 6,1-9,6, o que demonstra um problema em fazer a reconstrução do texto como uma unidade literária.. Nesta pesquisa, se levará em consideração textos que retratam a questão do messianismo no “Livro do Imanuel”, como Croatto, que apresentam a delimitação de 6,1-12,6, o que diverge da posição de alguns autores, como Alonso Schökel, Sicre, Asurmendi e Schreinner os quais são a favor da delimitação proposta, a partir de 6,1-9,6. Hesket27 trabalha com as três perícopes, objeto desta tese, para fundamentar a concepção messiânica e descrever o que ele chama de rehistorização dos editores finais do livro de Isaías. O que representa um novo olhar sobre a organização canônica do texto deste profeta, como será visto alhures. Por fim, sobre o messias criança, textos como de Pereira28 e Schwantes ajudam a vislumbrar um novo conceito messiânico no livro de Isaías. Por isso eles serão utilizados com maior propriedade nos capítulos seguintes.. Sendo assim... Os temas messias e messianismos fazem parte da história das religiões. Todas elas, à sua maneira, nutrem a expectativas messiânicas e vão para além de suas condições atuais. Por isso, discorrer sobre esses temas é discorrer sobre a esperança proclamada e vivida pelas mais diversas formas de vida religiosa.. O messias aparece em determinada cultura, num determinado tempo e espaço e faz com que a história daquele lugar se transforme, seja em termos 27. HESKETT, Randal. Messianism With the Scriptural Scrolls of Isaiah. London/New York: Clark, 2007. 28 PEREIRA, Nancy P. “O messias precisa sempre ser criança”. In: Ribla, nº 24. Petrópolis/São Leopoldo: Vozes/ Sinodal, 1996. 18-26p..

(22) 22. sociais, econômicos ou religiosos, e a sociologia da religião procura desvendar e descrever o que há “por trás das palavras” e gestos deste movimento a fim de melhor estudá-lo e compreender os mecanismos que levam às pessoas a essa expectativa messiânica. No entanto, este trabalho delimitar-se-á no estudo das raízes do messianismo, as características messiânicas e os desdobramentos deste movimento na assimilação e inserção das pessoas que provocam a origem do messianismo ou daquelas que se achegam a estes movimentos..

(23) 23. I – Construindo caminhos para compreensão da figura do messias no Antigo Testamento. Considerações introdutórias. O termo. x;yvim',29. messias, no Antigo Testamento passou por várias. transformações até chegar ao conceito predominante na atualidade, que é do messias escatológico, ou seja, alguém em quem se projeta um futuro utópico para além mundo. Neste sentido, o messias há de vir para salvar o povo da situação em que se encontra. Todavia, até se aproximar dessa concepção, do messias-ungido, há uma história traditiva que começa no AOM, perpassa o Antigo Testamento e toma contornos próprios em Israel, especialmente com Davi. Esta tradição veio a ser um dos projetos de esperança em meio a crises constantes, principalmente na segunda metade do século 8º. a.C., no qual se situa o profeta Isaías.. Dessa forma, se fará uma tentativa de localizar a gestação do conceito de messias no AOM, passando pelos os hititas e o zoroastrismo, para, posteriormente, chegar a Israel e assim ao profeta Isaías. A mensagem messiânica deste profeta, mais especificamente as perícopes de 7,10-17; 8,2396 e 11,19, será analisada no capítulo 4. 29. Os termos e textos em hebraico foram retirados da Bible Works versão 7.0..

(24) 24. 1 – O messias e o messianismo na Antiguidade O ato de ungir, retratado pelo termo maxiah,30 era um costume na tradição dos povos do Antigo Oriente Médio (AOM). Havia uma implicação num primeiro momento cotidiana e, posteriormente, sagrada naquilo que recebia o óleo. E assim era ungido, ou no sentido estrito: separado, para determinada função.. O hábito de se ungir tem origem no AOM. Este desenvolveu um sistema próprio de unção, uma vez que o ato poderia acontecer com as pessoas ou com coisas. Segundo Mowinckel: No Antigo Oriente, se ungia tanto as pessoas como as coisas, derramando sobre elas ou aplicando-lhes azeites aromáticos. Se ungia, por exemplo, a pedra cúltica (massebâh); e desse modo se venerava a deidade que nela habitava ou da que era sua representação. Se considerava a primeira unção da pedra como o ato em virtude da qual se conferia um poder sobrenatural e se apresentava como pedra sagrada; ungir uma pedra queria dizer, simplesmente santificá-la. Com o passar do tempo se consagrava um templo, se ungia as diversas partes do edifício e os vasos sagrados (...). Assim, pois, este ato teria um significado sacro. A idéia originária foi, sem dúvida, que o azeite possuía uma faculdade especial, um poder ‘sagrado’, o ‘mana’,31 se adotarmos o termo usual da fenomenologia da religião.32 30. v. Será utilizado nesta tese a consoante “x” para a transliteração de , comumente transliterado por “sh”. 31 Sobre o mana no estudo da sociologia da religião Durkheim, citando Parkinson, observa o seguinte: “os melanésios acreditam na existência de uma força absolutamente distinta de qualquer força material, que age de todas as maneiras possíveis, seja para o bem, seja para o mal, e que o homem tem grande interesse em se apoderar dela e dominá-la é o mana (...). Trata-se de uma força, influência de ordem imaterial e, em certo sentido, sobrenatural; mas é através da força física que ela se revela, ou então mediante qualquer poder e superioridade que o homem possua. O mana não está fixo sobre objeto determinado; pode ser levado a toda espécie de coisas.” DURKHEIM, Émile. Formas elementares de vida religiosa. São Paulo: Paulus, 1989. p. 246. 32 MOWINCKEL, Sigmund. El que há de venir: Mesianismo y Mesias. Madrid: Ediciones Fax, 1975. p. 4-5..

(25) 25. Dessa forma, observa-se que o costume de ungir perpassa os mais variados âmbitos da sociedade, sendo que o poder atribuído a algo surge a partir da unção com o azeite. É ele que detém o caráter especial e transfere para aquilo/aquele que é ungido esse poder.. Ainda no que concerne à unção no AOM, na Mesopotâmia e no Egito surgiu o costume de se ungir, mesmo que não apareça no contexto da coroação real, mas na “instalação de um alto funcionário”,33 no qual o mesmo era ungido com azeite sobre a cabeça. A partir desta concepção, temos também outros povos e religiões que demonstram a importância da unção no seu meio. A seguir um breve esboço sobre a tradição da unção entre os hititas e o zoroastrismo, para em seguida observamos o messianismo no Antigo Testamento.. 1.1 – Unção entre os hititas Entre os povos do AOM destacam-se os hititas como uma cultura que assimilou do Egito e da Mesopotâmia a fórmula de unção, embora destes dois não se encontre evidências claras para unção do rei. Segundo Bright há dificuldades em se localizar as origens dos hititas, entrementes,. O nome deriva de um povo não indo-europeu, chamado hatti, que falava uma língua que não tinha nenhuma relação com nenhuma família lingüística conhecida. Pouco se sabe sobre este. povo.. Mas,. no. terceiro. milênio,. eles. estavam. estabelecidos, na parte norte e central da Ásia Menor, numa área perto de Hattusas (Boghazköy), que foi mais tarde capital do império hitita, e, ou eles lhes deram o seu nome ou o tomaram desse lugar. 34. 33. SCHMIDT, Werner. A fé no Antigo Testamento. op cit. p. 295 e FOHRER, Geog. História da religião de Israel. São Paulo: Paulinas, 1983. p. 178. 34 BRIGHT, J. História de Israel. São Paulo: Paulinas, 1978. p. 78..

(26) 26. Embora difícil de localizar, é sabido que os hititas, segundo Schmidt, “viveram à margem do Antigo Oriente, nos séculos anteriores à tomada da terra por Israel”.35. A respeito da unção, os hititas utilizavam-se do ato de ungir na esfera real, “o rei hitita era ungido pelo povo ou pela nobreza”,36 também havia o reconhecimento da rainha-mãe como “soberana”, tal qual aparece em Israel posteriormente.. Após esta constatação, há que se inferir o fato de Israel ter assimilado esta prática deste povo, “assim é natural a suposição de que ‘o rito em Israel e Judá remonte à prática hitita’, a qual possivelmente tenha sofrido influências egípcias, podendo Canaã ter servido de ‘elo de ligação’ (sic)”.37 Isto posto, Schmidt e Fohrer,38 asseveram que o rito hitita deu origem ao cerimonial em Israel. O rei, neste contexto, era ungido da mesma forma que aparece no Antigo Testamento.. 1.2 – O zoroastrismo O zoroastrismo é conhecido como um tipo de religião que influenciou em alguns aspectos o AOM, dentre eles Norman Cohn apresenta a tese de que a partir de 1500 a.C. começa a se desenvolver a crença numa conflagração final entre as forças do bem e do mal, da qual resultaria uma ordem eterna.39 Esta tese se baseia em documentos e tradições religiosas de 3.500 a.C., bem como na religião do zoroastrismo, que foram analisados por ele.. 35. SCHMIDT, Werner H. A fé no Antigo Testamento. p. 183. SCHMIDT, Werner H. A fé no Antigo Testamento. p. 295. 37 SCHMIDT, Werner H. A fé no Antigo Testamento. p. 295. 38 FOHRER, Geog. História da religião de Israel. p. 177. 39 COHN, Norman. Cosmos, caos e o mundo que virá: as origens das crenças no Apocalipse. São Paulo: Cia das Letras, 1996. p. 108. 36.

(27) 27. Quanto ao zoroastrismo, Cohn destaca, em primeiro lugar, o profeta e reformador da religião iraniana, Zoroastro.40 Este desenvolve também os ensinamentos da ressurreição dos mortos, a existência de um ser espiritual que encarna o mal, a ideia de que a vida dos homens segue um plano divino, a vinda de um messias redentor e o julgamento final de bons e maus.. Como assevera o autor, concepções como as supramencionadas eram inexistentes antes da pregação de Zoroastro, isto é atestado a partir de documentos e achados arqueológicos de antigos povos como os egípcios, mesopotâmicos, indianos védicos e israelitas. Para estes, o cosmos era uma ordem definitiva: o céu, a terra, a natureza e a sociedade haviam sido criados e protegidos pelos deuses. Esta ordem continuaria a ser o que sempre havia sido. A presença de forças ameaçadoras não era negada, mas reconhecida como parte complementar do cosmos.. A mudança na concepção de mundo apontada por Zoroastro foi decisiva e, de acordo com Cohn, influenciou a essência das religiões islâmica, judaica e cristã que, com pequenas variações, conservam os ensinamentos de Zoroastro. Entretanto, há que se pensar que a confluência de muitos destes ensinamentos, como a existência do julgamento final entre bons e maus, só aparece em Israel no período pós-exílico. Por isso, a tese de Cohn, sobre a influência do zoroastrismo em várias religiões, certamente ocorreu, mas num período posterior ao datado por ele.. Após esta concisa análise, ao que parece Israel assimilou, dentre outras tradições, o ato de se ungir a partir do AOM, mais especificamente dos. 40. Forma grega posterior para Zaratustra, que segundo Cohn viveu entre 1500-1200 a.C. (cf. COHN, Norman. Cosmos, caos e o mundo que virá: as origens das crenças no Apocalipse. p. 109). Esta datação difere entre alguns autores, entre eles: ELIADE, Mircea e COULIANO, Ioan P. Dicionário das Religiões. 2ª Ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999. Estes descrevem o seguinte sobre Zaratustra: “É difícil situar a reforma de Zaratustra (grego Zoroaster) no tempo. Tudo leva a crer que o reformador viveu em algum lugar do Irã Oriental, por volta do ano 1000 a.C.” p. 338. Há também: SCHLESINGER, H. e PORTO, Humberto. Dicionário Enciclopédico das Religiões. V. II. Petrópolis: Vozes, 1995. Estes situam o Zoroastro no século VII a.C., segundo eles, “Zoroastro (século VII a.C.) reformador da religião persa (...). Zoroastrismo religião dos antigos persas, fundada por Zoroastro no século VII a.C.” p. 2707. Para ABBAGNANO, N. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Mestre Jou, 1982, o zoroastrismo ocorreu no século VI a.C..

(28) 28. hititas. Apesar de cooptar essa ideia, os israelitas traduziram-na para seu modo de pensar e agir dentro de sua cultura. Isso é atestado a partir de relatos que demonstram o ato de se ungir em Israel:. 1) Na esfera cotidiana (a unção do escudo, Is 21,5); 2) No aspecto real (a unção de Saul, 1Sm 10,1; Davi, 1Sm 16,12; e Salomão, 1Rs 1,39); 3) E, posteriormente, sacerdotal41 (Ex 29,7; Lv 8,12).. Entretanto, somente a partir do retorno do exílio, por volta do século V a.C., é que há um caráter religioso-escatológico para o ungido, talvez aqui apareça o aspecto do zoroastrismo. Outro fator a destacar é o uso do óleo no cotidiano e posteriormente sacro. Conforme o Dicionário Bíblico Universal, “na vida corrente em Israel, o azeite era muito usado: para alimento (fortificante), para a toalete (perfume, sinal de alegria), medicamento (curativo de feridas)”,42 e mais tarde há uma conotação sacra com a unção real e sacerdotal.. Entrementes,. será. abordado. a. seguir. o. surgimento. e. os. desdobramentos da tradição messiânica em Israel, numa proposta que parte do AOM, entre os hititas, e toma contornos próprios no Antigo Testamento com a dinastia de Davi.. 41. A nota da Bíblia de Jerusalém, do texto de Ex 30,22-33, a respeito da unção sacerdotal destaca o seguinte: “estas prescrições a respeito do uso do azeite (como as seguintes, sobre o perfume) são tardias; todos os sacerdotes são ungidos, nenhum leigo deve sê-lo. Nos textos históricos antigos, a unção é reservada ao rei (...). Quanto aos membros do sacerdócio, não parece que a unção lhes tenha sido conferida antes da época persa. Os textos sacerdotais antigos a reservavam ao sumo sacerdote (Ex 29,7.29; Lv 4,3.5.16; 8,12). Depois foi estendida a todos os sacerdotes (aqui v.30 e 28,41; 40,15; Lv 7,36; 10,7; Nm 3,3)”. Bíblia de Jerusalém. São Paulo: Paulus, 1995. p. 151. E ainda, DE VAUX, Roland. Instituições de Israel no Antigo Testamento. São Paulo: Teológica, 2003. p. 386, descreve o seguinte: “segundo o ritual pósexílico, o sumo sacerdote era ungido, Êx 29.7; Lv 8,12 etc., e a redação final do Pentateuco estendeu a unção a todos os sacerdotes, Ex 40.12-15 etc. Mas é bem provável que esse rito não existisse antes do Exílio e que ele seja a transferência de uma prerrogativa real ao sumo sacerdote, líder da nova comunidade”. Para um maior aprofundamento consultar De Vaux na p. 435, a respeito do “Sumo Sacerdote”. 42 MONLOUBOU, L. e DU BUIT, F. M. Dicionário Bíblico Universal. São Paulo/Petrópolis: Santuário/Vozes, 1996. p. 810..

(29) 29. 2. Messias e Messianismo: uma leitura sociológica O termo messias advém da palavra hebraica maxiah, que significa ungido, aquele que foi consagrado para determinada função. No grego, a terminologia para designar o messias é cristo. Mesmo assim, estas duas vertentes, judaica e cristã, não têm a mesma concepção do messias, tanto é que para o judeu o messias tem a dimensão política devido a concepção de que o ungido seria da dinastia davidica, teria um reinado tal qual os rei de Israel no início da monarquia, por volta de 1200 a.C., e ainda não veio. Enquanto que para os cristãos, o mesmo tem uma dimensão salvífica e escatológica, o messias, Jesus Cristo, veio e ainda voltará para instaurar o reino de Deus que é eterno.. A partir da concepção de messias, surge então o messianismo como um movimento que tem como líder alguém a quem lhe é atribuído características, como será visto alhures, o qual o Dicionário de Ciências Sociais designa como fatos sociais, com duas concepções diferentes: “a crença na vinda de um enviado divino que trará aos homens a justiça, a paz, condições felizes de existência; e a ação de todo um grupo obediente às ordens do guia sagrado para instaurar na terra o estado de felicidade sonhado.”43 Assim, o movimento messiânico tem um líder que o grupo enaltece e venera como um ser redivivo.. Ainda que estes termos, messias e messianismo, sejam estudados à luz das tradições judaica e cristã, Desroche destaca o seguinte sobre messianismo:. as idéias e os fatos cobertos por essas palavras ultrapassam amplamente a área judeu-cristã. A palavra ‘messianismo’ designa, na realidade, dois conceitos distintos: um conceito teológico normativo, associado à proclamação da unicidade messiânica do fundador do cristianismo (...); um conceito 43. DICIONÁRIO DE CIÊNCIAS SOCIAIS. Rio de Janeiro: FGV, p. 746..

(30) 30. sociológico comparativo, baseado numa massa de situações, assinaladas na história das religiões, em que um personagem fundador de um movimento histórico de libertação sócioreligiosa identifica-se ou é identificado com uma Potência suprema cujas ‘ondas’ alcançam tanto a história das religiões quanto as sociedades.44. Destarte, o conceito teológico diz respeito, principalmente, a uma cultura cristã, na qual há uma concepção da chegada de um messias anunciado no Antigo Testamento. Este conceito leva ainda a disparidades no que tange a concretude da chegada do messias, pois para os cristãos o messias “já veio”, e concretiza-se na figura do Jesus de Nazaré, enquanto que na tradição judaica este messias ainda é parte de uma espera, uma vez que para estes o messias concretiza o desejo de salvação em todos os aspectos da vida do povo judeu: político, social, econômico e religioso. E mais ainda o messias tem linhagem real, por isso a ideia de um messias presente, mas que tem suas “bases” na população pobre e marginalizada, que anuncia um reino vindouro, como Jesus de Nazaré e outros messias que surgiram por volta do século I a.C., não respondem às expectativas messiânicas do povo judeu.. Quanto ao conceito histórico-sociológico do messianismo para Desroche, “o messianismo representa, neste caso, o legado comum das doutrinas que prometem a felicidade perfeita na terra sob liderança de uma pessoa, de um povo, de um partido, de movimentos coletivos”45. Nesse sentido, o messianismo é mais abrangente, e há uma concepção histórica da realidade, pois o messias pode ser alguém, ou um grupo social que luta pelos ideais do mesmo. E é justamente esse tipo de messianismo que para Desroche “constitui o âmbito específico da investigação sociológica”.46 Para Negrão, o messianismo “diz respeito à crença em um salvador, o próprio Deus ou seu emissário, e à expectativa de sua chegada, que porá fim à ordem presente, tida como iníqua e opressiva, e instaurará uma nova era de. 44. DESROCHE, Henri. Dicionário de Messianismo e Milenarismos. SBC: Umesp, 2000. p. 21. Ibidem. p. 22. 46 Idem. p. 22. 45.

(31) 31. virtude e justiça”,47 ou seja, o messianismo é uma crença que procura apresentar um emissário, e este será o salvador do povo.. De um modo geral, o messianismo tem como ponto de partida a inserção ou reconhecimento de alguém na comunidade como messias, o ungido de Deus. Negrão salienta que o messias “refere-se à atuação coletiva (por parte do povo em sua totalidade ou de um segmento de porte variável de uma sociedade qualquer) no sentido de concretizar a nova ordem ansiada, sob a condução de um líder de virtudes carismáticas”.48 Nesta perspectiva, o movimento messiânico surge a partir de fatos sociais e religiosos em uma cultura, nesta há todo um imaginário e o conjunto de acontecimentos que faz com que o messias, seja o redentor de determinado grupo.. A partir dessas concepções, é possível constatar, que para o surgimento de um movimento messiânico faz-se necessário a insatisfação do grupo frente à realidade vivida. Como destaca Queiroz, a partir de Weber e Alphandéry, “o messias é alguém enviado por uma divindade para trazer a vitória do Bem sobre o Mal, ou para corrigir a imperfeição do mundo permitindo o advento do Paraíso Terrestre, tratando-se, pois de um líder religioso e social”49. Neste sentido, o messianismo trata-se de um grupo, muitas vezes reacionário, que reivindica para si a posse de alguém que os conduzirá a uma realidade fora desta, para uma vida eterna de felicidade.. 2.1 - Messianismo e Milenarismo50. O movimento messiânico, ou messianismo, é um dos seguimentos do milenarismo, ainda que muitos tomem estes conceitos como sinônimos. O Dicionário de Messianismos e Milenarismos designa messianismo como: 47. NEGRÃO, Lísias Nogueira. “Messianismo, movimento messiânico e milenarismo”. In: Revista Brasileira de Ciências Sociais. Vol. 16 nº. 46 junho/2001. p. 1. http://www.scielo.br/pdf/rbcsoc/v16n46/a06v1646.pdf. Acessado em 15/07/2009. 48 NEGRÃO, Lísias Nogueira. op. cit. p. 1. 49 a QUEIROZ, Maria I. P. O messianismo no Brasil e no mundo. 2 Ed. São Paulo: Alfa-Omega, 1976. p. 27. 50 Aqui se fará um breve esboço sobre o tema, a fim de compreender um pouco mais sobre o messianismo e seus desdobramentos..

(32) 32. Um movimento que tem como objetivo a reinstauração do tempo perfeito, o regresso à terra perfeita ou a obtenção de ambos. Nesse tempo e nesse lugar não existiriam o sofrimento, a insegurança nem a morte. A vida se desenvolveria em paz e harmonia, em felicidade e liberdade. Associada à idéia do milênio, acha-se a crença de que este será precedido por um período de catástrofes que destruirão o mundo que se renega, i.e, que eliminarão os problemas sofridos no momento.51. O messianismo, nesta ótica, é o desdobramento de um movimento milenarista. Entretanto Queiroz destaca que eles “são movimentos em que devemos sempre encontrar, estreitamente unidos, aspectos terrestres e celestes, seja na motivação que os causa, seja nos fins que se propõem, seja nos meios de que lançam mão para atingir a estes”52, ou seja, ambos têm conotações divinas e terrenas, sendo que o milenarismo trata-se de um período de tempo, a saber, mil anos, do qual os fiéis estarão protegidos de qualquer tipo de mal. É a esperança concretizada, a utopia realizada a partir da destruição da antiga ordem, do antigo mundo e a chegada de novos tempos de paz e justiça, anunciado, neste caso, pelo messias.. A ideia da instauração de um novo tempo faz com que os seguidores dos movimentos messiânicos renunciem aos ditos prazeres desse mundo e subvertam a ordem vigente para aguardar uma nova etapa, constituindo normas e ritos para que todo o grupo siga a fim de que esse milênio chegue o mais rápido possível e os livre de todo mal. Daí surgem as várias formas do grupo reagir frente à espera, como mudança de nomes, propagar a ideia de irmandade entre todos, bem como a execração daqueles que não compactuam com a mesma crença dentro do grupo. Isso tudo para melhor vivenciarem esse momento de expectativa, ou da vinda ou do retorno do messias com o novo tempo, chamado mil anos.. 51 52. DICIONÁRIO DE CIÊNCIAS SOCIAIS. op. cit. p. 759. QUEIROZ, Maria I. P. op. cit. p.31..

(33) 33. 2.2 – O movimento messiânico e o Antigo Testamento O messianismo, ao que parece, é o fomentador do surgimento do messias.53 Este movimento que se tornou um evento que perdura várias gerações, e é motivo de tantos estudos e pesquisas, faz com que o sociológico Desroche afirme o seguinte: Na prática, o termo messianismo, tem, freqüentemente, uma significação próxima do termo ‘milenarismo’, o milenarismo sendo o movimento sócio-religioso do qual o messias é o personagem. Ambos os conceitos, em todo o caso, implicam um vínculo essencial entre fatores religiosos e fatores sociais, espiritual e temporal, valores celestes e valores terrestres, tanto na desordem cuja supressão eles preconizam, quanto na nova ordem, cuja instauração eles anunciam.54. A esperança em qualquer movimento é o motivador da reação de determinado grupo. Seja ela estruturante ou estruturada tem sempre o poder de se impor frente aos desafios propostos a cada integrante do grupo.. O messias faz parte do imaginário de um ideal, a saber, o anunciador e disseminador de uma nova ordem social, política e religiosa, pois ele chega sob os auspícios de um novo tempo. O messianismo vale-se, portanto, da esperança em vigília55 de um mundo melhor que será realizado através do ungido. Por isso, o surgimento do messias em determinado grupo, tem como precedente a espera, o desejo de mudança, a insatisfação com a situação vigente, e outros fatores que proporcionam e fomentam a expectativa messiânica. Entretanto, a esperança é sempre a mantenedora da integração do grupo no aguardo de um mundo melhor.. 53. BAILÃO, Marcos Paulo M. C. “O nascimento do messianismo judaíta”. In: Revista Estudos Bíblicos, nº 52. Petrópolis/São Leopoldo: Vozes/Sinodal, 1997. p. 9-15. 54 DESROCHE, Henri. Dicionário de Messianismo e Milenarismo. 21. 55 Conceito que designa a esperança sempre presente e que foi utilizado por DESROCHE, Henri. Sociologia da esperança. São Paulo: Paulinas, 1985..

(34) 34. Em Israel, o messianismo adquire status político-religioso com o surgimento da monarquia. Conforme Mckenzie:. Com o estabelecimento da monarquia (cf Reis), a idéia messiânica assume a forma política da monarquia israelita e o próprio rei, Davi, com sua dinastia, transforma-se no elemento dominante. do. messianismo. (...).. O. rei aparece. como. instrumento de prosperidade, que é uma das funções do ‘salvador’.56. Neste sentido, de que a monarquia utiliza o conceito messiânico, ao fazer uso do termo messianismo e messias estudado na ótica da sociologia por Maria Isaura Pereira de Queiroz, verifica-se que há uma estrutura na qual o messias se insere, ou é inserido, e que Davi se encaixa nesta composição messiânica elaborada pelas tradições que o sucederam.. De acordo com Queiroz, “a história do messias surge, pois sempre os mesmos passos: a) eleição divina; b) provação; c) retiro; d) volta gloriosa”.57 Se for aplicado este parâmetro à figura de Davi, claro que diacronicamente, observa-se que o aspecto religioso e social aparece de forma clara, conforme a tradição bíblica. Como segue:. a) Eleição: 1Sm 16,13 “Samuel apanhou o vaso de azeite e ungiu-o na presença dos seus irmãos. O espírito de Iahweh precipitou-se sobre Davi desse dia em diante. Samuel se pôs a caminho e seguiu para Ramá”.58. b) Provação: 1Sm 17,12-31, quando Davi “venceu” Golias.. c) Retiro: 1Sm 22,1-5, quando Davi parte e se refugia na caverna de Odolam. 56. MCKENZIE, John L. Dicionário Bíblico. p. 606-607. QUEIROZ, Maria Isaura Pereira. op. cit. p. 30. 58 Todas as referências bíblicas deste capítulo serão da tradução da Bíblia de Jerusalém. São Paulo: Paulus, 1995. 57.

(35) 35. d) Volta gloriosa: Em 2Sm 5, Davi é aclamado “rei” de Judá e de Israel. Neste caso há um retorno de Davi, o que configura aquilo que seria o novo momento para o povo, que ansiava pela libertação dos filisteus.. Neste roteiro apresentado, observa-se que os aspectos apontados surgem no contexto dos relatos de “Ascensão de Davi”, 1Sm 16 a 2Sm 5. Isto é, trata-se de uma tradição guardada pelos pequenos grupos da sociedade, e não a palaciana. O que denota que a gestação social do messias, quase que freqüentemente, é aderida por pessoas que sofrem e vivem numa situação limite. Quando Davi é aclamado rei há uma aceitação de sua pessoa devido suas ações em favor do povo, quem sabe até o “povo da terra”. 59. Dessa forma, conclui-se que o messianismo é um movimento que surge numa situação limite, a saber, guerra, conflitos internos e externos, oposição entre elite e o povo, enfim uma série de situações que abrem espaço para o aparecimento do movimento messiânico, que na sua gênese tem como finalidade evocar a esperança em um novo tempo. De acordo com Maria Isaura Pereira de Queiroz,. O messias é o personagem concebido como um guia divino que deve levar o povo eleito ao desenlace natural do desenrolar da história, isto é, à humilhação dos inimigos e ao restabelecimento do paraíso na terra.60 59. Para Jaci Freitas Farias “O ‘Povo da Terra’ teve a sua origem no Sul. Era formado por lavradores de Judá que, junto com os sacerdotes de Jerusalém, mantinham a dinastia de Davi e buscavam um sucessor que estivesse atento aos interesses do povo do interior. Eles fizeram reis Osias, Josias (o mais famoso), Joás e Amasias (...). Durante 100 anos, o Povo da Terra contribuiu para a política no Sul, o que resultou em grande movimentação social”. FARIAS, Jaci Freitas. “Esta é a história de Israel?!”. In: FARIAS, Jaci F. (org). História de Israel e as pesquisas mais recentes. p. 27. Para Crüsemann, “o ‘am hā´āres judaico, que são homens livres proprietários de terras em Judá, asseguram a continuidade da família de Davi, com a qual tinham estreitos laços políticos. Esta, portanto, é a força que interfere e garante o poder à dinastia tradicional.” CRÜSEMANN, Frank. A Tora. Petrópolis: Vozes, 2002. p. 299. E ainda, para um aprofundamento maior sobre o Povo da Terra, conferir: SIQUEIRA, Tércio Machado. O Povo da Terra no Período Monárquico. S. B. Campo: Umesp. 1997. (Tese de Doutorado). 195p. 60 QUEIROZ, Maria Isaura Pereira. O messianismo no Brasil e no mundo. p. 33..

(36) 36. No Antigo Testamento, a tradição messiânica tem início a partir do relato de Gênesis 49. Contudo, há divergências de muitos autores no que concerne a este começo, como salienta Sicre:. Encontramos autores que vêem as primeiras referências ao Messias em Gn 3,15, a promessa feita à mulher de um descendente que pisará a cabeça da serpente. Com isto remontam às origens da humanidade a esperança de um Messias salvador. O estudo crítico da Bíblia fez mudar de posição. Uns pensam que a esperança messiânica começa com a monarquia (séc. X a.C.), outros situam seus começos nos profetas do século VIII. Atualmente põe-se muita ênfase na época romana; segundo estes autores, até poucos anos antes de Jesus, em Israel não se falava do ‘Messias’.61. A partir deste autor percebe-se, portanto, que a gênese do messianismo é controversa, e ainda, motivo de muitas indagações. Também temos autores como Schwantes e Bailão, que destacam e asseveram o surgimento do messianismo em Gênesis 49.. Excurso A discussão a seguir apresenta uma leitura das expressões de poder na sociedade judaíta do século 8º. a.C., a partir de Michel Foucault, aplicada ao profeta Isaías.. 1. Poder em Michel Foucault Para Michel Foucault o poder não existe em si, o que existem são relações de poder que são relações de força, portanto toda relação de força exprime uma relação de poder. O poder é algo que se exerce, que se efetua, 61. SICRE, José Luiz. De Davi ao Messias: textos básicos da esperança messiânica. p. 15..

(37) 37. que funciona como uma maquinaria, mas que não possui uma localização específica, está disseminado por todo o corpo social, está presente em diferentes pontos da sociedade, sendo exercido em níveis variados, e existindo integrado ou não ao Estado.. O poder não é uma essência, nem uma coisa que pode ser apoderada, mas uma prática social, sendo, portanto, constituído historicamente. Ele funciona como uma rede que não se localiza em nenhum ponto específico, mas que perpassa toda estrutura social à qual ninguém escapa, e, por isso, não possui limites ou fronteiras.. Neste sentido, o poder não constitui uma essência, ou um corpo, ele só existe a partir das relações de poder que se encontram na socidade de um modo geral. A teia social estabelece vínculos de hierarquização que institui nas relações quem detém o poder.. Esse tipo de poder também pode ser visto na sociedade israelita dos século 8º. a.C., uma vez que é possível encontrar nela relações de poder e hierarquias que determinam quais os saberes, quais as instituições podem exercem tal poder, e também, ao mesmo tempo, vê-se poderes difusos que se estabelecem a partir de um profeta como porta-voz do povo e de suas carências. Neste caso temos no profeta Isaías um tipo de poder que veicula um determinado tipo de saber, a partir de suas profecias, que pretende ser legitimado como sendo palavra de Javé.. 2. Expressões do poder na sociedade judaíta do século 8º. a.C. Em Judá, como em outras sociedades, observa-se o poder do Estado e o. poder difuso,. neste. sentido,. destacam-se. três formas de. poder,. institucionalizado, e pelos menos uma de poder difuso na sociedade judaíta do século 8º. a.C.:.

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