Neste capítulo apresentaremos algumas propriedades das integrais duplas e triplas, além apresentarmos sua interpretação geométrica e física.
Propriedades das integrais duplas e tripas
Sejam f = f (x,y), f1 = f1(x,y), f2 = f2(x,y), g = g(x,y,z), g1 = g1(x,y,z), g2 = g2(x,y,z)
funções contínuas, R e V regiões simples em R2 e R3, respectivamente, e 2 R uma
constante arbitrária. Valem as seguintes propriedades para as respectivas integrais: P1 Linearidade: " R[f1(x,y) + f2(x,y)]dA = " Rf1(x,y)dA + " Rf2(x,y)dA e $ V[g1(x,y,z) + g2(x,y,z)]dV = $ Vg1(x,y,z)dV + " Vg2(x,y,z)dV .
P2 Limitação: se f1(x,y) f2(x,y) e g1(x,y,z) g2(x,y,z), então
" Rf1(x,y)dA " Rf2(x,y)dA e $ Vg1(x,y,z)dV $ Vg2(x,y,z)dV .
P3 Integração sobre regiões disjuntas: se R1, R2, V1 e V2 são regiões simples e
dis-juntas, tais que R = R1[ R2 e V = V1[ V2, então
" Rf (x, y)dA = " R1 f (x, y)dA + " R2 f (x, y)dA 63
e $ Vg(x, y, z)dV = $ V1 g(x, y, z)dV + $ V2 g(x, y, z)dV .
Interpretação geométrica da integral dupla
Seja f = f (x,y) uma função contínua, não-negativa, ou seja, f (x,y) 0, e R uma região simples. Seja S o sólido delimitado pelo gráfico de f e a região R e V seu volume. A altura do ponto (x,y,z) 2 S é z = f (x,y) e o volume desse sólido é dV = f (x,y)dA. Dessa forma, o volume do sólido S é obtido somando-se, ou integrando-se, todos esses volumes, ou seja,
V =
"
Rf (x, y)dA.
(7.1)
No caso particular em que f (x,y) = 1, a expressão em (7.1) se reduz à área A da região R, ou seja,
A =
"
RdA.
Exercício Resolvido 7.1. Encontre o volume do tetraedro limitado pelos planos coordenados e
pelo plano x + y + z = 1.
Figura 7.1: Tetraedro do Exercício Resolvido 7.1.
Solução. A altura, dada pela coordenada z, varia de z = 0 até o plano z = 1 x y. Fixando o valor de x, que geometricamente corresponde ao plano x = const, temos que a coordenada
y varia da reta y = 0 até a reta y = 1 x. Por fim, x varia de 0 até 1, ou seja, V = Z 1 0 Z 1 x 0 Z 1 x y 0 dz dy dx = Z 1 0 Z 1 x 0 (1 x y)dy dx = Z 1 0 y xy y2 2 ! 1 x 0 = Z 1 0 1 2 x + x2 2 ! dx = x 2 x2 2 + x3 6 ! 1 0 = 1 6. ⌅
Exercício Resolvido 7.2. O cardióide é o lugar geométrico dado pela equação r = a(1 + cos✓),
a > 0. SejaR a região delimitada pelo cardióide. Encontre a área de R.
Solução. A geometria do problema nos leva naturalmente às coordenadas polares. Note que uma vez fixado o ângulo ✓, r varia de 0 até a(1 + cos✓). Dessa forma, temos
A = " RdA = Z 2⇡ 0 Z a(1+cos ✓) 0 r dr d✓ = Z 2⇡ 0 0 BBBB @ Z 1(1+cos✓) 0 1 CCCC A r dr d ✓ = Z 2⇡ 0 1 2r2 a(1+cos ✓) 0 d✓ = Z 2⇡ 0 a2 2(1 + cos✓)2d✓ = a2 2 Z 2⇡ 0 (1 + 2cos✓ + cos 2✓)2d✓.
Usando a relação 2cos2✓ = 1 + cos 2✓, obtemos
1 2 3 4 x -2 -1 1 2 y Figura 7.2: Cardióide. Z 2⇡ 0 a2 2(1 + cos✓)2d✓ = a2 2 Z 2⇡ 0 (1 + 2cos✓ + cos 2✓)2d✓ = a2 2 Z 2⇡ 0 ✓
1 + 2cos✓ +1 + cos2✓2 ◆d✓ = a2✓32✓ + 2 sin ✓ +14sin2✓◆ ⇡
0
= 3
2⇡ a2. ⌅
Interpretação física da integral dupla
Do ponto de vista físico, a expressão em (7.1) pode ser interpretada da seguinte maneira: suponha que R seja um objeto bidimensional e ⇢(x,y) sua densidade. Aqui densidade se refere a algum tipo de carga, seja gravitacional (massa) ou elétrica (carga elétrica).
Um exemplo simples de um objeto físico com estas características seria uma chapa, ou lâmina, metálica de altura desprezível. Então, a massa M da chapa é dada por
M =
"
R⇢(x, y)dA.
(7.2)
Note que de (7.2) podemos interpretar a quantia ⇢(x,y)dA = dm como o elemento de massa.
Ainda no campo da física, podemos considerar f (x,y) = y⇢(x,y), em que ⇢(x,y) denota a densidade da região R no ponto (x,y). Então a quantia
Mx= "
Ry⇢(x, y)dA (7.3)
denota o momento total da lâmina em relação ao eixo x, enquanto
My= "
Rx⇢(x, y)dA (7.4)
denota o momento total da lâmina em relação ao eixo y.
Relembrando que o centro de massa (x,y) de um objeto é o ponto em que a massa total dele poderia estar concentrada sem alterar seu momento em relação a qualquer dos eixos. Estes são encontrados através da relação
x = My
M e y =
Mx
M
em que Mx, My e M são dados por (7.3), (7.4) e (7.2), respectivamente.
Exercício Resolvido 7.3. Seja R uma lâmina de densidade ⇢(x,y) = xy delimitada pelo quadrado
de vértices (0,0), (a,a), (a,0) e (0,a). Encontre a coordenada x do centro de massa dessa lâmina.
Solução. A coordenada x do centro de massa da lâmina é
x = My M ,
em que My e M são dadas por (7.4) e (7.2), respectivamente. A nossa região de integração, por outro lado, é R = [0,a] ⇥ [0,a]. Comecemos calculando M. Temos:
M = " R ⇢(x, y) dA = Z a 0 Z a 0 xy dy dx = Z a 0 x dx ! Z a 0 y dy ! =1 4a4.
Calculemos My. Temos My= " Rx⇢(x, y) dA = Z a 0 Z a 0 x 2y dy dx =Z a 0 x2 2 0 BBBB B@y2 a 0 1 CCCC CA = a 2 2 Z a 0 x 2dx = a2 2 x3 3 a 0 =a5 6. Com isso, encontramos
x = My
M =
2
3a. ⌅
Interpretação da integral tripla
Seja f : R3! R uma função contínua e V ✓ R3 uma região simples. Nosso objetivo, aqui,
é dar significado à expressão
$
Vf (x, y, z)dV .
Do ponto de vista físico, podemos considerar V um volume em R3e f (x,y,z) a densidade, por exemplo, de massa ou carga, de um determinado objeto ou corpo. No caso em que
f (x, y, z) = 1, a expressão anterior corresponde ao volume da regiãoV.
Exercício Resolvido 7.4. Use integrais triplas para determinar o volume do sólido cuja base é
cone de altura h cujas geratrizes forma um ângulo ↵ com o eixo z e a parte superior é uma semi-esfera de raio h.
Figura 7.3: Objeto do Exercício Resolvido 7.4.
Solução. A geometria envolvida nos mostra que as coordenadas esféricas são as mais convenientes para tratar o problema. Note que nossa região pode ser descrita da seguinte
forma: a coordenada radial varia de 0 a a, o ângulo equatorial não possui restrições, ou seja, 0 < ✓ < 2⇡, enquanto o ângulo da reta ligando qualquer ponto p na superfície à origem possui um ângulo que varia de 0 a ↵. Com isso, temos
V = Z 2⇡ 0 Z ↵ 0 Z a 0 r 2sin dr d d✓ =Z 2⇡ 0 d✓ Z ↵ 0 sin d Z a 0 r 2dr = 0 BBBB BB@✓ 2⇡ 0 1 CCCC CCA 0 BBBB B@r 3 3 a 0 1 CCCC CA 0 BBBB B@cos ↵ 0 1 CCCC CA =23⇡ a3(1 cos↵).
Note que ↵ = 0 implica na situação limite em que temos um segmento de reta sobre o eixo a, entre 0 e a e, portanto, possui volume 0. Quando ↵ = ⇡/2, o objeto geométrico corresponde à meia esfera, cujo volume é V = 2⇡a3/3 e, finalmente, quando ↵ = ⇡, obtemos
a esfera de raio a, centrada na origem, e recuperamos o volume V = 4⇡a3/3. ⌅
Exercício Resolvido 7.5. Utilize integral tripla para determinar o volume do sólido contido no
cilindro x2+ y2= 1e entre os planos z = 1 e x + z = 5.
Solução: Queremos calcular o volume
Z Z Z BdV ,
com B sendo a região de integração que corresponde à intersecção do cilindro x2+ y2 = 9 e entre os planos z = 1 e x + z = 5, região esta que é representada na Figura 7.4. Observemos
Figura 7.4: Região de integração B.
é dada pela circunferência x2+ y2 = 9 de centro na origem e raio r = 3. Assim, o cálculo do
volume é dado por Z 3 3 Z p1 x2 p 1 x2 Z 5 x 1 dzdydx = Z 3 3 Z p1 x2 p 1 x2(4 x)dydx = Z 3 3(8 2x) p 9 x2dx.
Observemos agora que a integral requerida se torna de difícil cálculo (porém pode ser feita por meio de substituições trigonométricas).
Como a região de integração envolve um cilindro, refaçamos os cálculos utilizando coor-denadas cilíndricas. Já verificamos que a base do cilindro x2+ y2 = 9 tem raio r = 3. Então no plano xy podemos fazer a mudança de coordenadas x = r cos✓, y = r sin✓, de forma que teremos 0 r 3 e 0 ✓ 2⇡, enquanto z continua variando entre 1 e 5 x = 5 r cos✓. Além disso, o Jacobiano da mudança para coordenadas cilíndriccs é dado por
@(x, y, z) @(r, ✓, z) = r.
Assim, a integral se torna Z Z Z B dV = Z 3 0 Z 2⇡ 0 Z 5 r cos✓ 1 rdzd✓dr = Z 3 0 Z 2⇡ 0 (4r r 2cos✓)d✓dr = 8⇡ Z 3 0 rdr Z 3 0 r 2sin✓ ✓=2⇡ ✓=0 = 8⇡r2 2 r=3 r=0 = 36⇡. ⌅
Integrais impróprias
Nesta seção mostraremos como calcular a integral Z 1
0 e
x2dx. (7.5)
Essa integral não é facilmente calculada. Uma das razões para que isso ocorra é a inexis-tência de uma função elementar1.
1Podemos caracterizar uma função elementar como aquelas funções que são escritas de forma explícita
envolvendo apenas as operações elementares de soma, adição, multiplicação, divisão, radiciação e exponen-ciação. Exemplos de funções elementares são as racionais, trigonométricas e suas correspondentes inversas, etc.
Para resolver esta integral, comecemos com uma observação com respeito ao Exercício Resolvido 7.3. Nele, calculamos a integral
Z a 0 Z a 0 xy dy dx = Z a 0 x dx ! Z a 0 y dy ! . (7.6) Seja f (x) = x e I = Z a 0 f (x) dx. (7.7)
Note que x, na expressão (7.7), é uma variável muda, isto é, é irrelevante qual variável usemos naquela expressão, ou seja,
I = Z a 0 f (x) dx = Z a 0 f (y) dy = Z a 0 f (t) dt =··· .
Note então que
I2= I ⇥ I = Z a 0 f (x) dx ! Z a 0 f (y) dy ! = Z a 0 Z a 0 f (x)f (y) dy dx. (7.8)
Ou seja, o produto de duas integrais ordinárias nada mais é que duas integrais iteradas, que podem ser identificadas com uma integral dupla.
Consideremos (7.7), mas com f (x) = e x2 e façamos a ! 1. De (7.8) e (7.7), podemos escrever I = Z 1 0 e x2dx e I2= Z 1 0 Z 1 0 e x2e y2dx dy = Z 1 0 Z 1 0 e (x2+y2) dxdy
Podemos agora usar coordenadas polares para resolver a integral dupla acima. Diferente-mente do que tínhamos antes, nossa região de integração, agora é infinita e corresponde a todo o primeiro quadrante do plano, ou seja, 0 < ✓ < ⇡/2 e 0 < r < 1. Para a coordenada radial, podemos, ainda, escrever como 0 < r < R e R ! 1. Assim, temos
I2 = Z 1 0 Z 1 0 e (x2+y2) dxdy = Z ⇡/2 0 Z 1 0 e r2r dr d✓ =Z ⇡/2 0 Rlim!1 Z R 0 e r2r dr ! d✓ = Z ⇡/2 0 d✓ ! lim R!1 Z R 0 e r2r dr ! = lim R!1 ⇡ 2 e r2 2 1 0 = ⇡ 4,
ou seja, temos I =p⇡/2 e, então, concluímos que I = Z 1 0 e x2dx = p⇡ 2 .
Observemos que o fato de as integrais duplas envolvidas nesta parte não são integrais calculadas em regiões limitadas e, por esta razão, são chamadas de integrais impróprias .
Exercícios
Exercício 7.1. Os momentos de inércia de uma lâmina de densidade ⇢(x,y) com relação ao eixo x
e ao eixo y, respectivamente, são dados por Ix= " Ry 2⇢(x, y)dA e I y= " Rx 2⇢(x, y)dA.
Calcule a massa, o centro de massa e os momentos de inércia com relação aos eixos x e y da lâmina do Exercício Resolvido 7.3.
Exercício 7.2. Se um objeto possui densidade constante, seu centro de massa é chamado centróide.
a) Encontre o centro de massa do cardióide do Exercício Resolvido 7.2 de densidade ⇢(r,✓) = r. b) Encontre o centróide do cardióide do Exercício Resolvido 7.2.
Exercício 7.3. Calcule a integral Z 2a
0
Z p2ax x2
0 (x
2+ y2)dx dy.
Exercício 7.4. Calcule o centróide do disco semicircular x2+ y2 a2 e y 0.
Exercício 7.5. Calcule as seguintes integrais:
a) R0⇡/2e tg2xdx/ cos2x. b) R01e xdx/px.
Exercício 7.6. Seja S um corpo tridimensional de densidade ⇢(x,y,z). Os momentos em relação
aos planos coordenados xy, yz e xz são dados, respectivamente, por Mxy= $ Sz ⇢(x, y, z)dV , Myz= $ Sx ⇢(x, y, z)dV , Mxz= $ Sy ⇢(x, y, z)dV ,
enquanto seus correspondentes centros de massa são x = Myz/M, y = Mxz/M e z = Mxy/M. Os
momentos de inércia com respeito aos eixos são dados pelas expressões Ix= $ S(y 2+ z2)⇢(x,y,z)dV , I y= $ S(x 2+ z2)⇢(x,y,z)dV , I z= $ S(x 2+ y2)⇢(x,y,z)dV .
Suponha que o sólido S dado no Exercício Resolvido 7.4 tenha densidade de massa ⇢(x,y,z) =
p
x2+ y2+ z2.
a) Encontre a massa M de S.
b) Encontre os momentos em relação aos eixos coordenados. c) Determine os momentos de inércia em relação aos eixos de S. d) Encontre o centro de massa de S.
Conjunto ilimitado, 32 limitado, 32 Erro na aproximação de 1ª ordem, 11 Hessiano, 16 Integral dupla, 34 iterada, 22 tripla, 41 integral imprópria, 71 Jacobiano, 48
Método dos quadrados mínimos, 17 Matriz jacobiana, 48 Matriz Hessiana, 5 Mudança de coordenadas, 49 Polinômio de Taylor , 1ª ordem, 5 , 2ª ordem, 6 Ponto crítico, 15 de maximo, 15 extremo, 15 Região horizontalmente simples, 33 retangular, 33 simples, 33 verticalmente simples, 32 Sela ponto de, 16 Teorema de Fubini, 25
Teste da derivada segunda, 16